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Acórdão STJ de 2024-05-21

3540/23.0YRLSB.S1

TribunalSupremo Tribunal de Justiça
Processo3540/23.0YRLSB.S1
Nº Convencional5.ª SECÇÃO
RelatorCelso Manata
DescritoresExtradição, Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal, Cumprimento de Pena, Pena de Prisão, Execução de Sentença Estrangeira, Revisão e Confirmação de Sentença Penal Estrangeira, Convenção Internacional
Data do Acordão2024-05-21
VotaçãoUnanimidade
Privacidade1
Meio ProcessualEXTRADIÇÃO / M.D.E. / RECONHECIMENTO SENTENÇA ESTRANGEIRA
DecisãoProcedência / Decretamento Total

Sumário

I – A execução de sentença penal estrangeira constitui uma forma de cooperação judiciária internacional em matéria penal que se rege, nos termos do disposto nos arts. 1.º, n.º 1, al. c) e 3.º da Lei de Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal, pelas normas dos tratados, convenções e acordos internacionais que vinculem o Estado Português e, na sua falta ou insuficiência, pelas disposições deste diploma; II – A expressão “máximo legal admissível”, contida no n.º 3 do art. 237.º do CPP, reporta-se, não ao disposto no art. 41.º do CP, mas sim ao limite máximo da moldura abstrata das penas aplicáveis ao crime concreto, previsto na parte especial daquele código, a que sejam subsumíveis os factos dados como provados pela sentença estrangeira. II - Se a pena aplicada pela sentença estrangeira ultrapassar esse limite máximo há que adaptá-la/convertê-la, de acordo com o consignado na conclusão anterior.


Texto Integral

Acordam em Conferência na 5ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça I - RELATÓRIO 1. Enquadramento O Requerente, natural do ... - República Federativa do Brasil (doravante “República do Brasil”), mas atualmente residente na ... - Portugal, foi condenado, no âmbito do processo n.°........ ...............00, por sentença n° ................11, proferida a 18 de março de 2011, pela ... Vara da Secção Judiciária de ... - transitada em julgado a 26.2.2019 –, na pena de 8 (oito) anos e 4 (quatro) meses de prisão, a ser cumprida em regime fechado, pela prática do crime continuado de recetação, previsto e punível pelos artigos 180º, §1° e 71º do Código Penal da República Federativa do Brasil (doravante “República do Brasil”). Dado residir em Portugal e na sequência de pedido da República do Brasil, foi instaurado, na ... secção do Tribunal da Relação de Lisboa, o Processo de Extradição n.°553/23.5..., no qual foi deferido o pedido, através de acórdão proferido a 9 de maio de 2023, determinando-se a entrega do recorrente às autoridades brasileiras para, naquele país, cumprir a aludida pena. Contudo, o AA solicitou o cumprimento dessa pena em Portugal, o que foi aceite pelas autoridades brasileiras. Assim e por despacho de 12 de maio de 2023, do Juiz Federal da ... Vara Federal de ..., foi decidida a suspensão da entrega do arguido até ser decidido pelas autoridades judiciais portuguesas o pedido de cumprimento da pena em Portugal. Em sequência, veio então o Ministério Público junto da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa, por solicitação das autoridades brasileiras, requerer, no Tribunal da Relação de Lisboa, a revisão e a confirmação da acima referida sentença penal proferida pela ... Vara do Tribunal de Justiça Federal de .... O pedido foi formulado ao abrigo dos artigos 95º e sgs. da Lei de Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal, aprovada pela Lei nº 144/99 de 31 de agosto (doravante LCJIMP), e dos artigos 234º a 240º do Código de Processo Penal. * * * * 2. A decisão recorrida Prosseguindo o processo, agora nesta nova forma processual, o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 10 de janeiro de 2024, decidiu declarar como revista e confirmada a sentença revidenda, passando aquela a produzir todos os seus efeitos em Portugal. É o seguinte o teor desse acórdão (transcrição integral) “I. RELATÓRIO Dando seguimento a um pedido formulado pelo condenado, e na sequência da transmissão do respectivo expediente pela Procuradoria-Geral da República, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal da Relação promoveu a revisão e confirmação de sentença penal estrangeira pela qual o cidadão brasileiro AA, nascido em ... de ... de 1969, no ..., Brasil, filho de BB e de CC, de nacionalidade brasileira, casado, empresário, titular do Passaporte emitido pela República Federativa do Brasil, n.° ......15 e da autorização de residência em Portugal n.° .......L0, válida até ... de ... de 2027, residente na Rua..., foi condenado em pena de prisão e multa, na República Federativa do Brasil, com vista ao cumprimento da pena em Portugal, com os seguintes fundamentos: Nos termos e com os fundamentos seguintes: Por sentença tipo D n.° ................11, emitida no processo n.° ....................00, pela Secção Judiciária de ..., ... Vara, Justiça Federal de Primeira Instância da República Federativa do Brasil, 2.° transitada em julgado em 26/02/2019, 3.° o requerido foi condenado na pena de 8 anos e 4 meses de prisão e 400 dias de multa no valor de 1/20 do salário mínimo vigente à época dos factos. 4.° O requerido foi condenado, em co-autoria, pelo crime continuado de Receptação Qualificada, p. e p. p. art.°s 71.° e 180, §1.° do Código Penal brasileiro. 5.° Foi o requerido condenado porque, como proprietário e sócio administrador de várias empresas comerciais, recebeu medicamentos para posterior venda, que sabia serem retirados de instituições oficiais de saúde e da rede pública de saúde, sem autorização dos respectivos responsáveis e contra a sua vontade, com isso lucrando vantagens materiais e mantendo esta actividade entre, pelo menos, Novembro de 2005 e Novembro de 2008. 6.° O requerido não foi julgado à revelia, o julgamento observou o devido processo legal, tendo-lhe sido assegurado amplo direito à defesa. 7.° A República Federativa do Brasil pediu expressamente à República Portuguesa o reconhecimento e execução da sentença penal condenatória do requerido. 8.° A sentença condenatória em causa não contém disposições, conceitos ou provisões contrárias aos princípios fundamentais do ordenamento jurídico português. 9.° Os factos pelos quais o requerido foi condenado constituem crime à luz do Código Penal português, nomeadamente, crime de Receptação, art.° 231.° n.° 1, CP, punido com pena de prisão de 5 anos ou pena de multa, ou ainda pena de 1 a 8 anos (n.° 4 do art.° 231.° CPP). 10.° À data da sua detenção, em 16 de Fevereiro de 2023, o requerido vinha trabalhando em Portugal como motorista. 11.° Residia em Portugal, na Rua..., sendo portador de licença de residência em Portugal, válida até ... de ... de 2027. 12.° A execução da sentença penal brasileira em Portugal, permite ao requerido continuar o seu projecto de vida em Portugal, onde tem já laços de residência, trabalho e vida, garantido melhores condições de reinserção social, em benefício do próprio e da comunidade em que se insere. 13.° É vontade e desejo do requerido cumprir a sua pena em Portugal. 14.° S. Exa. a Sra. Ministra da Justiça considerou admissível o pedido de execução da sentença em causa. 15.° As Justiças da República Federativa do Brasil comprometeram-se solenemente em considerar extinta a responsabilidade penal do requerido com o cumprimento integral da pena que lhe foi imposta, em Portugal. 16.° A pena de multa imposta ao requerido deve ser convertida para Euros, nos termos dos art.°s 47.° e 71.° CP. 17.° O requerido já esteve detido à ordem do processo de extradição n.° 553/23.5..., que correu termos nesta Relação de Lisboa, ... Secção, entre 16 de Fevereiro de 2023 e 17 de Fevereiro de 2023; e entre 31 de Março de 2023 e 14 de Novembro de 2023, estando actualmente em liberdade. 18.° Neste mesmo processo, chegou a ser proferido em 9 de Maio de 2023, acórdão já transitado, autorizando a extradição do requerido, estando suspensa a extradição em vista dos presentes autos. 19.° O Tribunal da Relação de Lisboa é territorialmente competente para reconhecer a sentença e determinar a sua execução. 20.° A pena imposta ao requerido não está prescrita. Pelo exposto, requer que D. A. como processo de revisão e confirmação de sentença penal estrangeira e ainda que: a) Se designe data para recolher da parte do requerido, expresso consentimento na execução em Portugal da sentença da República Federativa do Brasil supra referida; b) Seja proferida decisão de reconhecimento e confirmação da sentença para efeitos do cumprimento da pena imposta ao requerido, em conformidade com o disposto nos artigos 95.° e s. da L. n.° 144/99 de 31 de Agosto e ainda nos termos dos art.°s 234.° a 240.° CPP.  c) Transitada a decisão, se determine baixa do processo ao Tribunal de Execução de Penas de Lisboa. * Por despacho proferido nestes autos, face ao disposto no art. 99º nº 5 da lei 144/99, de 31.8, dispensou-se a audição do ora Requerido, consideraram-se adquiridos para estes autos os factos provados pessoais constantes do acórdão proferido no processo de extradição n.° 553/23.5..., da ... secção deste Tribunal – com relevância para efeitos da verificação do requisito da al. g) do nº 1 do art. 96º da Lei 144/99 – decidiu-se não se vislumbrar a necessidade de realizar quaisquer outras diligências prévias e determinou-se a notificação para alegações, ao Ministério Público e ao Requerido. O Ministério Público, notificado na pessoa da Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta neste tribunal nos termos e para o efeito do disposto no art. 1099º nº 1 do Código de Processo Civil, apresentou alegações, concluindo pela procedência do pedido de revisão e confirmação, dizendo: 1.° O Ministério Público requereu a revisão e confirmação da sentença penal de condenação do Requerido AA, proferida no âmbito do processo-crime n° .......................00, da Secção Judiciária de ..., ... Vara, Justiça Federal de Primeira Instância da República Federativa do Brasil, a 18 de março de 2011 e transitada em julgado em 26 de fevereiro de 2019, para atribuição de força executiva, tendo em vista o cumprimento da pena de prisão em território nacional. 2.° O Requerido foi condenado na pena de 8 anos e 4 meses de prisão, em regime fechado, e 400 dias de multa no valor de 1/20 do salário mínimo à época dos factos (2005 — 2008), pela prática, em coautoria e na forma continuada, de um crime de recetação qualificada, previsto e punido pelas disposições combinadas dos arts. 180.°, parágrafo 1.°, e 71.°, do Código Penal da República Federativa do Brasil, que encontra correspondência no art. 231.°, n°s. 1 e 4, do Código Penal Português. 3.° O Requerido tem nacionalidade brasileira, encontrando-se a viver e a residir em Portugal, com a mulher e o filho, sendo portador de licença de residência em território nacional válida até ... de ... de 2027. 4.° O Requerido tem trabalhado como motorista de pesados desde 1 de fevereiro de 2023. 5.º O Requerido manifestou vontade de cumprir a sua pena em Portugal. 6.° Os laços de residência, trabalho e vida em Portugal por parte do Requerido permitem concluir que a execução da sentença penal brasileira em território nacional lhe permitirá, por certo, continuar o seu projeto de vida e garantir melhores condições de reinserção social. 7.° Assim e dando por reproduzidos todos os factos e fundamentos constantes do n/ requerimento inicial, reiteramos que se encontram preenchidas as condições de execução previstas no art.96.°, da Lei n° 144/99. Pelo exposto, pr. o deferimento do pedido de revisão, confirmação e execução em Portugal da pena em que o Requerido foi condenado. O requerido, notificado, para o mesmo efeito, na pessoa da sua defensora nomeada, disse: 1. O arguido foi condenado por sentença proferida em 18 de novembro de 2011 e transitada em julgado em 26 de fevereiro 2019, proferida pela 13.° Vara do Tribunal de Justiça Federal de ..., e confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça do Estado de ..., República Federativa do Brasil, na pena de 8 anos e 4 meses, pela prática de 1 crime de receptação qualificada, previsto e punido pelos artigos 180.°, parágrafo 1.° e artigo 71.°, do Código Penal da República Federativa do Brasil, crime este que encontra correspondência no artigo 231.°, n.° 1 do Código Penal Português. 2. Conforme consta no requerimento inicial do Ministério Público, foi o requerido condenado porque supostamente era proprietário e sócio administrador de várias empresas comerciais que recebiam medicamentos para posterior venda, sendo alegadamente tais medicamentos retirados de instituições oficiais de saúde e da rede pública hospital, sem autorização dos respectivos responsáveis e contra a sua vontade, com isso lucrando vantagens materiais e mantendo esta actividade entre, pelo menos, novembro de 2005 e novembro de 2008. 3. Todavia, as empresas referidas na sentença a rever são a “C..., Ltda.”, a “A..., ME” e a “T..., ME”. O requerido era efectivamente proprietário e sócio administrador da primeira (cfr. doc. 1), sendo prestador de serviços da segunda e não proprietário/sócio administrador (cfr. doc. 2) 4. Quanto à terceira, o arguido nada tem a ver com ela, tanto que a primeira empresa e a segunda tinham como objecto social o comércio atacadista de medicamentos e drogas de uso humano, ou seja, o comércio a grosso e procediam à distribuição de medicamentos que seriam vendidos em hospitais privados (cfr. docs. 1 e 2). Enquanto que a terceira tinha como objecto social o comércio varejista de artigos médicos e ortopédicos, ou seja, o comércio retalhista (cfr. doc. 3). 5. No mais, a empresa “C..., Ltda.” encerrou em 08/06/2007, data da concessão da baixa (cfr. doc. 1), a empresa “A..., ME” encerrou, igualmente, em 08/06/2007 (cfr. doc. 2) e a empresa “T..., ME” encerrou em 10/11/2009 (cfr. doc. 3). 6. Pelo que, apesar de a sentença a rever falar no período de 2005 a 2010, isso não corresponde à verdade, pois as duas empresas que tinham como objecto social o comércio atacadista de medicamentos foram encerradas em 08/06/2007. 7. Aliás, o arguido em 2008 candidatou-se para ser vereador no Município de ..., tendo ganho o mandato (cfr. docs. 4 e 5 – fls. 2). 8. Ademais, segundo relatório pericial constante nos autos de inquérito do processo que deu origem a sentença condenatória brasileira a que alude este processo de revisão e confirmação de sentença penal estrangeira e relativamente a apreensão levada a cabo pela polícia federal à casa do aqui arguido/requerido, onde foram efectivamente apreendidas 4 caixas de STREPTASE e 1 caixa de RHOPYLAC (cfr. doc. 6), os peritos ao quesito se os produtos farmacêuticos tinham indicações de procedência de algum órgão público ou do Sistema Único de Saúde responderam não (cfr. doc. 7 – fls. 2 e fls. 12). 9. Quanto à resposta do quesito 4, os peritos responderam afirmativamente, que as embalagens continham a inscrição de “Uso Restrito a Hospitais”, na realidade era perfeitamente plausível que esses medicamentos fossem de “uso restrito a hospitais”, pois o arguido/requerido distribuía e procedia à venda de medicamentos a hospitais privados (cfr. doc. 7 – fls. 2 e fls. 12). 10. Ora, o artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, estabelece um princípio fundamental português relativo às liberdades e garantias do arguido e diz-nos que “o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso.” 11. Na verdade, não obstante o relatório pericial solicitado pelo Ministério Público Brasileiro constar no processo de inquérito, a decisão condenatória brasileira não o relevou, nem para efeitos de matéria de facto dado como provada nem para efeitos de matéria de facto dada como não provada, simplesmente omitiu essa prova que era fundamental, razão pela qual o arguido entende que não lhe foram asseguradas todas as garantias de defesa num processo criminal, principio fundamental do ordenamento jurídico português – direitos, liberdades e garantias do arguido. 12. Em todos os recursos que interpôs, o Tribunal em causa nunca se pronunciou acerca do relatório constante nos autos de inquérito e que desqualificava a qualidade dos medicamentos apreendidos, porquanto era claro que os medicamentos não eram da rede pública hospitalar. 13. Posto isto, a sentença contém disposições contrárias aos princípios do ordenamento jurídico português. 14. Em todo o caso, o arguido/requerido considera que a matéria de facto dada como provada e a dada como não provada e, consequentemente, a sua motivação é omissa e insuficiente, nos termos do artigo 100.°, n.° 3 da lei 144/99, de 31 de agosto. 15. Não são perceptíveis quais os factos realmente dados como provados e os não provados e o porquê, motivo pelo qual requer ao douto Tribunal que oficie o Tribunal Brasileiro, pedindo informações necessárias, nomeadamente quanto à questão da relevância da perícia. 16. Porquanto, ainda que este Tribunal esteja vinculado à matéria de facto considerada provada na sentença estrangeira, o n.° 3 do artigo 100.° da lei 144/99, de 31 de agosto estabelece que “em caso de omissão, obscuridade ou insuficiência da matéria de facto, o tribunal pede as informações necessárias, sendo a confirmação negada quando não for possível obtê-las.” 17. No mais, estabelece o artigo 231.º, n.º 4 do Código Penal, que “se o agente fizer da receptação modo de vida, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos”. Contudo, a lei portuguesa não estabelece a receptação qualificada conforme previsto na legislação brasileira. 18. Se verificarmos a sentença a rever não encontramos correspondência no chamado “modo de vida”. 19. Com efeito, conforme dito nos pontos anteriores e conforme documentos juntos, em 2007 já tinham sido decretadas a concessões de baixas às empresas suprarreferidas, bem como em 2008 o arguido foi eleito vereador no Município de ..., Brasil. 20. Razão pela qual, deverá o Tribunal adequar a pena aplicada naquela que ao caso caiba segundo a lei portuguesa ou reduzindo-a a mesma ao limite adequado, nos termos do artigo 237.°, n.° 3, do Código do Processo Penal. 21. Mais, conforme consta no requerimento inicial, o requerido já esteve detido à ordem do processo de extradição n.° 553/23.5..., que correu termos neste Tribunal, na ... Secção, entre 16 de fevereiro de 2023 e 17 de fevereiro de 2023; e entre 31 de março de 2023 e 14 de novembro de 2023. Esclarece ainda o requerido que esteve igualmente detido à ordem dos autos do processo brasileiro a que alude este processo de revisão e confirmação de sentença penal estrangeira entre 29 de abril de 2010 a 25 de maio de 2010, conforme consta na página 69 do requerimento inicial do Ministério Público. 22. O arguido/requerido é primário, é uma pessoa pacífica, calma e está bem inserido socialmente. 23. De todo o modo, o arguido/requerido requer a V. Ex.ª, ao abrigo do artigo 370.° do Código do Processo Penal, se digne solicitar a elaboração de relatório social ao arguido, com vista à correcta determinação da pena concreta que eventualmente possa vir a ser aplicada, designadamente para efeitos do artigo 101.° da lei n.° 144/99, de 31 de agosto que no n.° 6 estatui que “o indulto e o perdão genérico parciais ou a substituição da pena por outra são levados em conta na execução.” Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Ex.ª doutamente suprirá: a) Requer-se, nos termos do n.° 3 do artigo 100.° da lei 144/99, de 31 de agosto, que V. Ex.ª oficie o Tribunal Brasileiro de forma a pedir informações acerca da perícia junta a estes autos, efeitos de adequação da pena, nos termos do artigo 237.°, do Código do Processo Penal. b) Caso não seja possível obter tais informações junto do Tribunal Brasileiro, deverá a acção de reconhecimento e confirmação de sentença penal estrangeira ser negada, por omissão e insuficiência da matéria de facto, nos termos do artigo 100.º, n.º 3, da Lei 144/99, de 31 de agosto e por conter disposições contrárias aos princípios fundamentais do ordenamento jurídico português, nos termos do artigo 96.º, n.º 1, alínea c) da Lei 144/99, de 31 de agosto e artigo 32.º, n.º 1 da CRP. De todo o modo, requer-se a V. Ex.ª, ao abrigo do artigo 370.º do CPPenal, se digne solicitar a elaboração de relatório social ao requerido, com vista à correcta determinação da pena concreta que eventualmente possa vir a ser aplicada. Assim, decidindo, farão V. Ex.as, Venerandos Desembargadores, a Costumada e Devida Justiça. * Este Tribunal é o competente para a revisão e confirmação da sentença penal estrangeira em causa (art.s 235º nº 1 e 12º nº 3 al. d) do Código de Processo Penal). O Ministério Público tem legitimidade para promover a revisão e confirmação da sentença penal, com vista ao cumprimento da pena pelo condenado para Portugal (artigos 236º do Código de Processo Penal e 99º nº 4 e 123º da Lei 144/99 de 31.8). Nada obsta ao conhecimento da questão de fundo. Colhidos os vistos, cumpre apreciar. II. FUNDAMENTAÇÃO A) Factos assentes Com relevância para a decisão, baseados no teor dos documentos que integram os autos, consideram-se assentes os seguintes os factos: 1. O requerido sofreu a condenação transitada em julgado em 26.9.2019, junta ao requerimento inicial formulado pelo Ministério Público, nos autos da Ação Penal n° .......................00, de 08 (oito) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, a ser cumprida em regime fechado, em razão de condenação pela prática dos crimes tipificados no artigo 180, §1°, do Código Penal Brasileiro, c/c o artigo 71 do mesmo Código, melhor sintetizada no pedido de extradição: Narra a sentença condenatória, transitada em julgado em 26/02/2019, que AA, DD, EE e FF, agindo em unidade de desígnios, de forma consciente e voluntária, adquiriram e revenderam, no exercício de atividade comercial, medicamentos desviados de hospitais públicos, durante, pelo menos, o período de 2005 a 2010. Os denunciados AA e DD, sendo casados, foram proprietários e sócios-administradores da empresa C..., Ltda. (.... ................96) e administradores e proprietários de fato das empresas A..., ME (.... ................52) e T..., ME (.... .................45), empresas que usavam o nome fantasia M... ........, todas com objeto social que compreendia o comércio de medicamentos. Conforme a acusação, por meio das citadas empresas, com auxílio consciente das funcionárias, ora denunciadas, EE e FF, eram receptados medicamentos desviados da rede pública de saúde, obtidos por meio de atravessadores, para posterior reinserção no mercado. Para tal reinserção, por vezes teriam sido confeccionadas embalagens similares à original para acondicionar os medicamentos adquiridos sem caixa, com pretensa infração ao artigo 273, §1°, do Código Penal Brasileiro. A associação dos denunciados seria de caráter permanente, tendo por finalidade a receptação dos medicamentos desviados da rede pública de saúde, para posterior reinserção no mercado. A denúncia foi recebida em 27/05/2010. O réu AA apresentou defesa e foi interrogado. Contudo, do acervo probatório que se tem nos autos, que inclui diálogos interceptados com autorização judicial, restou comprovado que AA, com vontade livre e consciente, praticou o delito de receptação qualificada previsto no parágrafo primeiro, do artigo 180, do Código Penal Brasileiro. 2. Constando ainda do pedido: Após o trânsito em julgado da sentença condenatória, integralmente mantida nos Tribunais Superiores, foi deflagrada a execução definitiva da pena, com a expedição de mandado de prisão em desfavor do condenado, válido até 25/02/2031. Em 27/07/2022, sobreveio a informação de que AA encontrava-se fora do território nacional, motivo pelo qual foi expedido alerta em Difusão Vermelha de Procurado Internacional. Tipos penais: As condutas narradas acima caracterizam a prática das infrações penais dispostas no artigo 180, §1°, do Código Penal Brasileiro, c/c o artigo 71 do mesmo Código, a seguir transcrito: Código Penal Brasileiro - Decreto-Lei n. 2.848/1940 Receptação Art. 180. Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. Receptação Qualificada § 1° Adquirir, receber, transportar, conduzir, ocultar, ter em depósito, desmontar, montar, remontar, vender, expor à venda, ou de qualquer forma utilizar, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, coisa que deve saber ser produto de crime. Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa. Crime continuado Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. Prescrição: De acordo com a legislação brasileira, a ação e/ou a(s) pena(s) relativas ao processo em epígrafe não estão prescritas. 3. Sua Excelência a Ministra da Justiça de Portugal considerou admissível o pedido de execução da sentença penal estrangeira, por despacho de 2.11.2023, que se transcreve: Nos termos do disposto no artigo 95.º da Lei de Cooperação Judiciária Internacional em Matéria Penal, aprovada pela Lei n.º 144/99, de 31 de agosto, verificados os requisitos previstos nos artigos 96.º, 98.º e 99.º da mesma Lei, e considerando a informação prestada pela Procuradoria-Geral da República, declaro admissível o pedido de execução de sentença penal estrangeira formulado pelas autoridades judiciárias do Brasil, proferida contra o cidadão AA pela ... Vara da Secção Judiciária de ..., Justiça Federal de Primeira Instância, transitada em julgado em 26 de fevereiro de 2019. 3. O arguido está em liberdade, em Portugal, sujeito ao termo de identidade que prestou e à obrigação de não se ausentar de Portugal, nos termos do artigo 200.º, n.º1, al. b) do Código de Processo Penal, por despacho proferido em 14.11.2023 no processo de extradição 553/23.5... que corre termos na ... secção deste Tribunal. 4. Nesse processo, por acórdão de 9.5.2023 foi autorizada “a extradição do cidadão brasileiro AA para a República Federativa do Brasil, para efeitos de cumprimento da pena de 8 (oito) anos e 4 (quatro) meses de prisão, que lhe foi imposta no processo-crime n.°........ ...............00, da ... Vara da Secção Judiciária de ..., por sentença n° ................11, de 18 de Março de 2011”. 5. Em face da suspensão do pedido de extradição por despacho proferido pela Sra. Juiz Federal da ... Vara Federal de ..., até ser decidido pelas autoridades judiciais portuguesas o pedido de cumprimento da pena em Portugal, foi decidida a suspensão da execução da entrega do Requerido ao Estado requerente por despacho de 12.5.2023. 6. À ordem do processo no qual foi condenado, o requerido esteve detido entre 29.4.2010 e 25.5.2010. 7. O requerido esteve detido à ordem do processo de extradição n.° 553/23.5..., que correu termos nesta Relação de Lisboa, ... Secção, entre 16 de Fevereiro de 2023 e 17 de Fevereiro de 2023; e entre 31 de Março de 2023 e 14 de Novembro de 2023. 4. O requerido solicitou o cumprimento da pena em Portugal, a fim de aqui cumprir o remanescente daquela pena, que não se mostra extinta por prescrição, amnistia ou outro motivo. 5. As autoridades brasileiras, concordando com o deferimento do pedido do arguido, solicitaram às autoridades portuguesas o prosseguimento da execução da pena que àquele foi imposta. 6. É em Portugal que se encontra actualmente a família e amigos do arguido, aqui vivendo e trabalhando até ser detido no processo de extradição e, conforme factos provados no processo de extradição: O extraditando veio para Portugal com a sua mulher em Abril de 2019 onde ambos residem desde então, tendo o filho de ambos se juntado a eles há cerca de 2 anos. A sua esposa e filho têm nacionalidade portuguesa. O extraditando tem autorização de residência em Portugal válida até ... de ... de 2027 e trabalha numa empresa como motorista de pesados desde 1.02.2023. A esposa do extraditando trabalha como empregada de escritório e aufere o salário mínimo. Ambos suportam o pagamento de todas as despesas essenciais e da renda da casa onde vivem, que é de 550,00€ por mês. Ambos apresentam, conjuntamente, declaração para efeitos de IRS e têm empréstimos a bancos portugueses. O extraditando toma regularmente medicação para a diabetes e hipertensão. A mulher e filho do extraditando não têm meios económicos que lhes permitam visitar o extraditando no estabelecimento prisional no Brasil, no caso de extradição do mesmo. B) Enquadramento jurídico Estabelece o art. 95º nº 1, da Lei 144/99 que as sentenças penais estrangeiras, transitadas em julgado, podem ser executadas em Portugal e o artigo 100º nº 1 do mesmo diploma dispõe que a força executiva da sentença estrangeira depende de prévia revisão e confirmação, segundo o disposto no Código de Processo Penal, que no seu artigo 235º nº 1 contém disposição semelhante. O art. 237º do Código de Processo Penal define várias condições que são necessárias para a confirmação de sentença penal estrangeira e no seu 240º determina que neste procedimento se sigam os trâmites da lei do processo civil em tudo quanto a lei especial não prevê, o que nos remete para o art. 1096º que, por seu turno, também, define vários requisitos necessários para a confirmação. Mas, nesta matéria, há que ter, ainda, em conta o disposto no art. 96º nº 1 da Lei 144/99 que prevê várias condições especiais de admissibilidade do pedido de execução, em Portugal, de uma sentença penal estrangeira. Pedido de execução que, sendo admitido, implica o cumprimento da pena em Portugal1, sendo então aplicável o disposto nos art.s 95º a 103º, 114º a 116º e 122º a 125.º daquele diploma legal. O formalismo, designadamente o de natureza administrativa previsto no artigo 99º da Lei 144/99, mostra-se cumprido e estão reunidos os requisitos de forma: • o pedido de execução foi submetido pela Autoridade Central (PGR) a apreciação do Ministro da Justiça, que o considerou admissível e autorizou a transferência do condenado para Portugal a fim de aqui cumprir a pena; • o condenado é cidadão estrangeiro que reside habitualmente em Portugal (art. 96º nº 1 al. f) da Lei 144/99); • as penas em que foi condenado o arguido respeitam a crime da competência dos tribunais do Estado estrangeiro, já que cometidos em território brasileiro, por cidadão brasileiro (art. 96º nº 1 al. a) da Lei 144/99 e art. 1096º al. c) do Código de Processo Civil); • nada indica que os mesmos factos tenham sido objecto de procedimento penal em Portugal (artigo 96º nº 1 al. d) da Lei 144/99); • esses mesmos factos, em Portugal, também são penalmente punidos, constituindo crime de receptação, previstos e puníveis pelo art. 231º nº 1 do Código Penal (art. 96º nº 1 al. e) da Lei 144/99 e art. 237º nº 1 al. b) do Código de Processo Penal); • o pedido não contraria princípios fundamentais do ordenamento jurídico português (art. 96º nº 1 al. c) da Lei 144/99 e art. 1096º al. f) do Código de Processo Civil); • existe lei e convenção que permitem que a sentença tenha força executiva em território português (art. 237º nº 1 al. a) do Código de Processo Penal); • os referidos ilícitos penais não são qualificáveis, segundo a lei portuguesa, como crimes contra a segurança do Estado (art. 237º nº 1 al. e) do Código de Processo Penal); • o processo criminal decorreu com intervenção do arguido, com observância dos princípios do contraditório e do duplo grau de jurisdição (tendo sido exercido o direito ao recurso) e nada permite fazer duvidar que as garantias de defesa do mesmo tenham sido respeitadas e este foi assistido sempre por defensor (art. 237º nº 1 al. d), do Código de Processo Penal); • a sentença condenatória, de acordo com a lei brasileira, está transitada em julgado (art. 1096º al. b) do Código de Processo Civil). Ainda em matéria de requisitos de forma, importa sublinhar: • a duração da pena imposta na sentença é superior a um ano (art. 96º nº 1 al. i) da Lei 144/99) e a duração da condenação que tem ainda de cumprir é superior a um ano (art. 3º da Convenção sobre a Transferência de Pessoas Condenadas entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa); • a transmissão da execução de sentença não depende do consentimento do condenado, já que foi este quem a solicitou; • não há motivo para duvidar da autenticidade dos documentos com que foi instruído o pedido, nomeadamente dos documentos de que consta a sentença, que são perfeitamente inteligíveis. * Os interesses que presidem a esta forma de cooperação judiciária em matéria penal são, sobretudo, os do condenado, por razões de natureza humanitária: dificuldades de comunicação devidas a barreiras linguísticas; a alienação da cultura e dos costumes locais; a falta de contactos com a família. O pressuposto ou justificação material da transferência de pessoas condenadas radica na circunstância de a reinserção social do delinquente poder aconselhar o cumprimento da pena em país diverso do da condenação. Uma das funções primordiais da pena é a reinserção social do delinquente e é tarefa do Estado proporcionar as condições para que não haja reincidência criminosa. A família é por todos reconhecida como a instituição de socialização mais importante na vida de uma pessoa. O condenado residia na ... e aí tem os seus familiares mais próximos. Dadas a deslocação do agregado familiar para Portugal, é patente que é francamente menos relevante a ligação ao país da condenação e que é em Portugal que encontra a sua estabilidade familiar, como o próprio invoca no requerimento em que requereu a sua transferência para Portugal. Por isso é legítimo concluir que o cumprimento da pena em Portugal permitirá uma melhor reinserção social do condenado2. * De acordo com o sistema de revisão e confirmação vigente no nosso ordenamento jurídico não compete aos nossos tribunais sindicar ou exercer qualquer censura sobre a decisão estrangeira, seja no âmbito da matéria de facto, seja na aplicação do direito, pois que, em regra, trata-se de uma revisão meramente formal, razão pela qual o tribunal português competente para a revisão e confirmação não se pronuncia sobre o fundo ou mérito da causa, sobre o bem fundado da decisão3. Aliás, no art. 11º nº 1 da Convenção sobre a Transferência de Pessoas Condenadas entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, assinada na Praia, em 23 de Novembro de 2005 aprovada por Resol. da AR n.º 48/2008, de 15.9 deixa claro que “apenas o Estado da condenação tem o direito de decidir sobre qualquer recurso interposto para revisão da sentença”. Porém, o Requerente, conforme se lê nas suas alegações, invocando não ter ligação às empresas referidas na sentença condenatória, o encerramento dessas empresas e a inconsideração por um relatório pericial considera que não lhe foram asseguradas todas as garantias de defesa, que “a sentença contém disposições contrárias aos princípios do ordenamento jurídico português” e que “a matéria de facto dada como provada e a dada como não provada e, consequentemente, a sua motivação é omissa e insuficiente, nos termos do artigo 100.°, n.° 3 da lei 144/99, de 31 de agosto”, pretende que se oficie ao Tribunal Brasileiro, pedindo informações necessárias, nomeadamente quanto à questão da relevância da perícia. Salvo o devido respeito, de acordo com art. 100º nº 2 al. a) da Lei 144/99, quando se pronunciar pela revisão e confirmação, o tribunal está vinculado à matéria de facto considerada provada na sentença estrangeira e só em caso de omissão, obscuridade ou insuficiência da matéria de facto é que o tribunal pede as informações necessárias (nº 3). Como resulta das alegações do requerido, o que este pretende é uma reapreciação da prova e dos meios de prova constantes da sentença revidenda o que extravasa os poderes e deveres da revisão e confirmação da sentença estrangeira nos termos do art. 100º da Lei 144/99 e o respeito devido à soberania do Estado estrangeiro. Ainda assim, apesar de, na forma, a sentença ser diferente das sentenças prolatadas no nosso país, é bem clara na descrição da factualidade que permitiu a imputação ao requerido do crime em causa, ao assentar que o requerido e mulher eram apenas “administradores e proprietários de fato das empresas A..., ME (…) e T..., ME” (sublinhado do relator), que “por meio das citadas empresas; com auxílio consciente das funcionárias, ora denunciadas, EE e FF; eram receptados medicamentos desviados da rede pública de saúde, obtidos por meios atravessadores, para posterior reinserção no mercado”. “Para tal reinserção, por vezes teriam sido confeccionadas embalagens similares à original para acondicionar os medicamentos adquiridos sem caixa”. “A associação dos denunciados seria de caráter permanente, tendo por finalidade a receptação dos medicamentos desviados da rede pública de saúde, para posterior reinserção no mercado”. Bem assim, relativamente à prova pericial, também a sentença consigna a existência de “cópia de laudo de exame de produto farmacêutico” e afirma “ademais, as provas técnicas e de apreensão, mesmo quando produzidas na fase inquisitória, possuem o caráter de prova, e não de meros indícios, pela presença do contraditório, ainda que postergado para a ação penal”.  Não há, pois, omissão, obscuridade ou insuficiência da matéria de facto que justifique qualquer pedido de informações, nem se encontram disposições contrárias aos princípios do ordenamento jurídico português, pelo que a pretensão do requerido não pode ser atendida. * As penas de prisão e de multa são previstas pela lei portuguesa e conformam-se com os seus limites máximos. Contudo, vem o requerido alegar que deve “o Tribunal adequar a pena aplicada naquela que ao caso caiba segundo a lei portuguesa ou reduzindo-a a mesma ao limite adequado, nos termos do artigo 237.°, n.° 3, do Código do Processo Penal e ainda que se deve “solicitar a elaboração de relatório social ao arguido, com vista à correcta determinação da pena concreta que eventualmente possa vir a ser aplicada”. O requerido não tem razão, importando, sobre esta questão, ter em conta o seguinte: O nº 3 do art. 237º do Código de Processo Penal impõe que, se a sentença penal estrangeira tiver aplicado pena que a lei portuguesa não prevê ou pena que a lei portuguesa prevê, mas em medida superior ao máximo legal admissível, a sentença é confirmada, mas a pena aplicada converte-se naquela que ao caso coubesse segundo a lei portuguesa ou reduz-se até ao limite adequado. Trata-se de disposição que visa acautelar a observância dos princípios fundamentais do nosso Direito Penal consagrados na Constituição da República Portuguesa, designadamente nos seus art.s 29º e 30º e, por isso, de carácter imperativo4, mormente em matéria de restrição automática de direitos, na medida em que o art. 30º nº 4 da Constituição da República Portuguesa estabelece que “nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos”. Foi em observância dos mesmos princípios constitucionais que o Estado Português, ao aprovar, para ratificação, a Convenção Relativa à Transferência de Pessoas Condenadas celebrada em Estrasburgo, a 21 de Março de 1983, pelos Estados membros do Conselho da Europa formulou, entre outras, a declaração de reserva de que, “quando tiver de adaptar uma sanção estrangeira, Portugal, consoante o caso, converterá, segundo a lei portuguesa, a sanção estrangeira ou reduzirá a sua duração, se ela ultrapassar o máximo legal admissível na lei portuguesa”. Como resulta da apreciação feita anteriormente acerca dos requisitos legais para a revisão e confirmação de sentença penal estrangeira, não cabe ao Estado da execução exercer qualquer censura sobre o teor e os fundamentos da decisão revidenda, seja no âmbito da matéria de facto, seja quanto à aplicação do direito, nem tal juízo de censura se compreende no âmbito e finalidades do processo de revisão e confirmação da sentença estrangeira. Cabe-lhe, porém, no cumprimento da norma legal contida no nº 3 do art. 237º do Código de Processo Penal, adaptar a pena estrangeira se não estiver prevista na lei portuguesa, convertendo-a na correspondente sanção aqui prevista, ou, tratando-se de pena que ofenda princípios fundamentais constitucionalmente consagrados, “expurgando-a” na parte correspondente. A questão coloca-se porque a pena concretamente aplicada é superior à pena máxima aplicável para o crime de receptação no ordenamento jurídico-penal português, a que corresponderia pena máxima de cinco anos de prisão (art. 231º nº 1 do Código Penal) ou de oito anos de prisão, no caso de receptação como modo de vida (art. 231º nº 4 do Código Penal). Todavia, o “máximo legal admissível” refere-se aos limites máximos legais da pena de prisão consagrados nos nºs 1 e 2 do art. 41º do Código Penal5. Só em relação a estes limites gerais e abstractos faz sentido convocar o princípio constitucional da duração limitada das penas do art. 30º nº 1 da Constituição da República Portuguesa. Diminuir uma pena de prisão concretamente fixada em medida inferior a 20 anos de prisão (ou 25 anos nos casos previstos) já implica um juízo de censura inadmissível sobre o teor e fundamentos de direito da decisão revidenda, quando a moldura penal de cada crime é determinada por preocupações de política criminal e necessidades de prevenção geral que variam consoante os Estados. Tomando o caso concreto, da leitura da parte decisória da sentença revidenda resulta que a pena-base privativa da liberdade foi fixada em 5 anos de prisão mas, porém, a pena foi aumentada para 8 anos e 4 meses decorrente da continuidade delitiva, nos termos doo art. 71º do Código Penal do Brasil, explicando-se: “Ademais, tendo os acusados, mediante mais de uma ação, praticado dois ou mais crimes, devem os subsequentes, pelas condições de tempo, lugar e maneira de execução, ser havidos como continuação do primeiro, fazendo incidir a causa de aumento prevista no art. 71 do CP (crime continuado) no que se refere a tal ilícito” (sublinhado do relator). Ou seja, a continuidade delitiva tem um sentido jurídico substancialmente diferente da continuação criminosa em Portugal, sendo uma circunstância qualificativa modificativa da pena, ao contrário do que ocorreria em Portugal em que se justificaria a realização de um cúmulo jurídico. Efectivamente, como é sabido nem todos os ordenamentos jurídicos adoptam o sistema do cúmulo jurídico, persistindo noutros ordenamentos os sistemas da absorção, da agravação ou exasperação e da acumulação material6. Assim, a interpretação de que o “máximo legal admissível” constante da declaração de reserva do Estado Português significa a pena máxima da moldura penal do crime concretamente em apreciação, comportaria uma distorção inadmissível do sistema, com base em especificidades do ordenamento jurídico-penal português, como o caso em apreço deixa patente. Assim, a pretendida ponderação sobre o limite máximo de cada crime não pode nem deve ser efectuada por respeito pela decisão soberana dos Tribunais do Estado da condenação. Não se justifica, assim, a pretendida elaboração de relatório social ao requerido nem a redução da pena. * Deixa-se consignado que a circunstância de ter sido o requerido – que requereu o cumprimento da pena de prisão em Portugal – a suscitar as questões supra apreciadas gerou alguma perplexidade, especialmente quando pugna pelo não reconhecimento da sentença penal estrangeira (o que inviabilizaria o seu próprio pedido para cumprir a pena em Portugal) porquanto se ponderou se não estaria em causa um uso reprovável do processo para, através dessas objecções, conseguir o que até agora não conseguiu no processo de extradição: o não cumprimento da pena. Porém, tendo em atenção que assumiu o risco de lhe ser negado o cumprimento da pena em Portugal, o que determinaria a cessação da suspensão do processo de extradição e um aumento das possibilidades de ser extraditado para o Brasil, considera-se que, apesar dos riscos assumidos que só à defesa cabe avaliar, está em causa uma posição que não pode nem deve ser questionada por este tribunal. * Estão, pois, verificados os requisitos da revisão e confirmação da sentença supra identificada, quanto às penas de prisão e multa, pelo que há que deferir o pedido e indeferir as pretensões formuladas pelo requerido nas suas alegações, sendo certo que a pena de multa deve ser convertida em Euros, nos termos dos art.s 98º nº 4 da Lei 144/99, sendo o valor diário da multa o que resultar da conversão em Euros na data do trânsito em julgado da presente decisão do valor de 1/20 do salário mínimo vigente no Brasil em 2010 (R$510), ou seja R$25,5 de taxa diária, num montante global de 10200 R$ correspondente a 500 dias de multa. III. DECISÃO Acordam, em conferência, os juízes da 3ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, em: • Indeferir as pretensões formuladas pelo Requerido nas suas alegações; • Declarar revista e confirmada a sentença proferida pelo tribunal da República Federativa do Brasil, supra identificado, com vista à execução em Portugal da pena em que foi condenado o arguido AA. Determina-se que, no cumprimento da pena de prisão, seja levado em conta todo o tempo de detenção do arguido no Brasil e o tempo de detenção à ordem do processo de extradição 553/23.5..., que corre termos nesta Relação de Lisboa, ... Secção. Sem tributação (art. 26º da Lei 144/99 de 31.8). Após trânsito em julgado, comunique à Procuradoria-Geral da República e ao proc. 553/23.5..., da ... Secção. Oportunamente, cumpra-se o disposto no art. 103º nº 3 da Lei 144/99 de 31.8.” * * * * 1. O recurso Inconformado com essa decisão, dela veio interpor recurso AA, terminando as suas motivações com as seguintes conclusões (transcrição Integral): “III - CONCLUSÕES 1. O arguido, ora recorrente, foi condenado por sentença proferida em 18 de novembro de 2011 e transitada em julgado em 26/02/2019, proferida pela 13.º Vara do Tribunal de Justiça Federal de ..., e confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça do Estado de ..., República Federativa do Brasil, na pena de 8 anos e 4 meses, pela prática de 1 crime de receptação qualificada, previsto e punido pelos artigos 180.º, parágrafo 1.º e artigo 71.º, do Código Penal da República Federativa do Brasil, crime este que encontra correspondência no artigo 231.º, n.º 1 do Código Penal Português . 2. Conforme resulta do acórdão recorrido, os factos que motivaram a condenação do requerido são puníveis pela lei portuguesa, nos termos do artigo 231.º, n.º1 do Código Penal Português, cuja pena máxima é de 5 anos de prisão. 3. O Tribunal recorrido declarou revista e confirmada a sentença revidenda, passando aquela a produzir todos os seus efeitos em Portugal. 4. É entendimento do recorrente que o tribunal “a quo” interpretou a norma prevista no artigo 237.º, n.º 3, do Código do Processo Penal, em sentido diverso da interpretação na qual considera que deveria ter sido aplicada. 5. Diz o artigo 237.º, n.º3do Código doProcessoPenal: “Se a sentença penalestrangeira tiver aplicado pena que a lei portuguesa não prevê ou pena que a lei portuguesa prevê, mas em medida superior ao máximo legal admissível, a sentença é confirmada, masa pena aplicada converte-se naquela que aocasocoubesse segundo a lei portuguesa ou reduz-se até ao limite adequado. Não obsta, porém, à confirmação a aplicação pela sentença estrangeira de pena em limite inferior ao mínimo admissível pela lei portuguesa.” 6. É entendimento do recorrente que quando o artigo 237.º, n.º 3 estabelece que a pena aplicada converte-se naquela que ao caso concreto coubesse segundo a lei portuguesa, lei é clara ao referir que teremos sempre de verificar a moldura penal do crime em concreto correspondente segundo a lei portuguesa. 7. Todavia, entende o Tribunal recorrido que o “máximo legal admissível” refere-se aos limites máximos legais da pena de prisão consagrados nos nºs 1 e 2 do art. 41º do Código Penal”, ou seja, às penas de 20 anos e de 25 anos de prisão no casos especialmente previstos na lei. 8. Diz, ainda, o Tribunal recorrido que “diminuir uma pena de prisão concretamente fixada em medida inferior a 20 anos de prisão (ou 25 anos nos casos previstos) já implica um juízo de censura inadmissível sobre o teor e fundamentos de direito da decisão revidenda, quando a moldura penal de cada crime é determinada por preocupações de política criminal e necessidades de prevenção geral que variam consoante os Estados” 9. Contudo, o Tribunal ao não ter aplicado a norma prevista no artigo 237.º, n.º 3 do Código do Processo Penal, olvidou-se de que o artigo 101.º, n.º 1 e 2 da lei n.º 144/99, de 31 agosto estabelece que “a execução de uma sentença estrangeira faz-se em conformidade com a legislação portuguesa”. 10. Significa isto, salvo melhor opinião em contrário, que em matéria de execução da pena e prevenção geral e especial da pena, devem valer as regras do Estado de execução da pena. Ou seja, tendo sempre presente o artigo 71.º do Código Penal. 11. Diz, igualmente, o Tribunal “a quo”, “da sentença revidenda resulta que a pena base privativa da liberdade foi fixada em 5 anos de prisão, mas, porém, a pena foi aumentada para 8 anos e 4 meses decorrente da continuidade delitiva, nos termos do art. 71.º do Código Penal do Brasil”. Também, aqui, veja-se que a pena base foi fixada em 5 anos de prisão, pelo que não nos parece censurável a adequação da pena estrangeira à pena que a lei portuguesa aplica ao caso concreto. 12. Na medida em que a continuidade delitiva tem um sentido diferente da continuação criminosa em Portugal, mais uma razão para se adequar a pena, nos termos previstos no artigo237.º, n.º3 do CódigodoProcessoPenal, vistoque a lei portuguesa não prevê o agravamento pela continuidade delitiva conforme previsto na lei brasileira. 13. Errou o Tribunal recorrido ao não ter aplicado a norma constante do artigo 237.º, n.º 3 do Código do Processo Penal. 14. Para além do exposto, existem decisões de tribunais superiores que entendem que a adequação da pena terá de se converter naquela que a lei portuguesa estabelece ou reduzindo-a ao limite adequado para o crime em questão. 15. Segundo decisão proferida no âmbito do processo n.º 20/14.8YRCBR pelo Tribunal da Relação de Coimbra, em 10/07/2014, em que o arguido fora condenado a 14 anos de prisão pelo crime de homicídio voluntário na forma tentada no Grã-Ducado do Luxemburgo, o Tribunal ao confirmar e rever a sentença penal estrangeira, entendeu que “a pena de prisão aplicada na sentença revidenda ultrapassa o máximo legal fixado pela lei portuguesa para o crime em questão”, motivo pelo qual reduziu-a até ao limite de 8 anos e 6 meses de prisão. Diz esse Tribunal “neste quadro, considerando o critério aplicável previsto no art. 71º do C. Penal, tendo em conta o modo de cometimento do facto, a personalidade do recluso e as exigências de prevenção geral e especial, requeridas pelo caso, reduz-se a pena aplicada pelo Tribunal de Apelo do Grão-Ducado do Luxemburgo, nos termos do art. 237.º, n.º 3 do C. Processo Penal, a 8 anos e 6 meses de prisão.” 16. Mais, segundo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 20/03/2014, proferido no âmbito do processo n.º 131/14.0YRLSB-9, o Tribunal reviu e confirmou a sentença aplicada ao ali arguido, reduzindo a pena a 12 anos de prisão. Efectivamente, neste processo o arguido tinha sido condenado no Reino da Tailândia por um crime contra a lei dos estupefacientes na pena de prisão perpétua, pena esta proibida pelo ordenamento jurídico português, razão pela qual o Tribunal reduziu-a ao limite adequado, convertendo-a na pena de 12 anos. Sucede que, aplicando o raciocínio versado no acórdão recorrido, por uma questão de lógica, deveria esse Tribunal ter aplicado o máximo legal da pena de prisão, ou seja, 20 anos, conforme previsto no artigo 41.º, n.º 1, do Código Penal, contudo não o fez (sublinhado nosso). 17. Porquanto, conforme Maia Costa, no seu Código de Processo Penal Comentado, “há lugar à redução da pena, nos termos previstos no nº 3 do art. 237.º do Código do Processo Penal e esta redução até ao ‘limite adequado’ não significa a redução da pena até àquele limite, podendo a pena ser fixada em medida inferior ao limite máximo previsto na lei nacional.” 18. Pelo que, deveria o Tribunal recorrido converter a pena aplicada naquela que ao caso coubesse segundo a lei portuguesa ou reduzindo-se a mesma ao limite adequado. 19. O Tribunal recorrido violou a norma prevista no artigo 237.º, n.º 3, do Código do Processo Penal, bem como a norma prevista no artigo 101.º, n.º 1 e 2 da lei n.º 144/99, de 31 agosto que estabelece que “a execução de uma sentença estrangeira faz-se em conformidade com a legislação portuguesa”. Pelo exposto, e nos melhores de Direito, sempre com o mui douto suprimento de V. Exa., o douto Acórdão recorrido deverá ser revogado e ser substituído por outro que se pronuncie quantos aos argumentos supra aduzidos, designadamente a conversão da pena aplicada na sentença penal estrangeira naquela que ao caso coubesse segundo a lei portuguesa ou reduzindo-se a mesma ao limite adequado.” 2. A resposta do Ministério Público O Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa veio apresentar a sua resposta, a qual termina com as seguintes conclusões (transcrição integral): “EM CONCLUSÃO: 1. O recorrente AA, de nacionalidade brasileira, foi condenado por sentença de 18 de novembro de 2011, transitada em julgado a 26 de fevereiro de 2019, proferida no âmbito do Processo n° .......................00, da ... Vara do Tribunal de Justiça Federal de ..., confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça do Estado de ..., República Federativa do Brasil, na pena de 8 anos e 4 meses de prisão e 400 dias de multa no valor de 1/20 do salário mínimo vigente à época dos factos, pela prática, em coautoria e na forma continuada, de um crime de recetação qualificada, previsto e punido pelos arts.l80.°, parágrafo l.º, e 71.°, do Código Penal da República Federativa do Brasil. 2. No âmbito do referido processo as autoridades brasileiras emitiram mandado de detenção com eficácia internacional, requerendo a sua extradição para cumprimento da pena. de prisão em que foi condenado, o qual deu origem ao Processo n° 553/23.5..., da ... Secção do Tribunal da Relação de Lisboa. 3. No decurso do processo de extradição, AA manifestou intenção de cumprir a pena em Portugal, país onde reside, com a mulher e o filho, desde abril de 2019, sendo titular de licença de residência em território nacional válida até ... de ... de 2027. 4. As autoridades brasileiras, na sequência do peticionado pelo recorrente, solicitaram às autoridades portuguesas a suspensão do pedido de extradição e o prosseguimento da execução da pena que àquele foi imposta, apresentando para o efeito pedido formal de reconhecimento e execução da sentença penal condenatória. 5. O Ministério Público, ao abrigo do disposto nos arts. 95.°, da Lei n°144/99, de 31de agosto, e 234.° a 240.°, do Código de Processo Penal, promoveu o reconhecimento e execução da sentença penal estrangeira que condenara AA. 6. O Tribunal a quo, considerando verificados os requisitos de revisão e confirmação da sentença penal estrangeira, veio a declarar revista e confirmada a sentença proferida pelo Tribunal da República Federativa do Brasil, com vista à execução em Portugal da pena de prisão em que aquele foi condenado, levando-se em conta todo o tempo de detenção no Brasil e o tempo de detenção à ordem do processo de extradição 553/23.5... 7. O recorrente discorda de tal decisão, por entender que o "máximo legal admissível" a que alude o art. 237.°, n°3, do Código de Processo Penal, diz respeito à pena máxima da moldura penal prevista no Código Penal português para o crime pelo qual veio a ser condenado. 8. No entanto, conforme se salienta no acórdão recorrido, «a pretendida ponderação sobre o limite máximo de cada crime não pode nem deve ser efetuada por respeito pela decisão soberana dos tribunais do Estado de condenação». 9. A revisão e confirmação de sentenças condenatórias não pode operar alterações no decidido pelo Tribunal estrangeiro competente, a menos que ocorra qualquer das hipóteses previstas no n°3, do art. 237.°, do Código de Processo Penal: a sentença penal estrangeira tiver aplicado pena que a lei portuguesa não prevê ou pena que a lei portuguesa prevê, mas em medida superior ao máximo legal admissível, caso em que a sentença é confirmada, mas convertendo-se a pena aplicada naquela que ao caso coubesse segundo a lei portuguesa ou reduzindo-se a mesma ao limite adequado, 10. No caso em apreço nenhuma destas situações se verifica, sendo que a natureza e a duração da concreta sanção aplicada no Estado de condenação (Brasil) se mostram compatíveis com a legislação do Estado de execução (Portugal). 11. Por outro lado, cremos ser claro que o disposto no art. 101.°, n°s. 1 e 2, da Lei n°144/99, de 31 de agosto, não tem o alcance que o recorrente lhe pretende atribuir, mas unicamente o de significar que a execução da pena se faz de acordo com a lei portuguesa, e não no sentido da aplicação da lei penal portuguesa à sentença revidenda, convertendo a respetiva pena em outra tida como mais favorável ao condenado. 11. Assim, mostrando-se preenchidos os pressupostos legais do pedido e não ocorrendo qualquer dos requisitos gerais negativos de cooperação judiciária, impunha-se proceder à revisão e confirmação da sentença penal estrangeira nos seus exatos termos. 12. Nesta conformidade, entendemos que nenhuma censura merece o acórdão proferido a 10 de janeiro de 2024 pelo Tribunal da Relação de Lisboa,” 3. O Parecer do Digníssimo Procurador-Geral Adjunto Admitido o recurso e remetido o mesmo a este Supremo Tribunal de Justiça, o Ministério Público emitiu parecer, no sentido do não provimento, consignando, no essencial, o seguinte (transcrição parcial): 4.2. Nos termos do art. 234.º, n.º 1, do Código de Processo Penal: 1 - Quando, por força da lei ou de tratado ou convenção, uma sentença penal estrangeira dever ter eficácia em Portugal, a sua força executiva depende de prévia revisão e confirmação. (…) O 237.º seguinte, por sua vez, estabelece que: 1 - Para confirmação de sentença penal estrangeira é necessário que se verifiquem as condições seguintes: a) Que, por lei, tratado ou convenção, a sentença possa ter força executiva em território português; b) Que o facto que motivou a condenação seja também punível pela lei portuguesa; c) Que a sentença não tenha aplicado pena ou medida de segurança proibida pela lei portuguesa; d) Que o arguido tenha sido assistido por defensor e, quando ignorasse a língua usada no processo, por intérprete; e) Que, salvo tratado ou convenção em contrário, a sentença não respeite a crime qualificável, segundo a lei portuguesa ou a do país em que foi proferida a sentença, de crime contra a segurança do Estado. 2 - Valem correspondentemente para confirmação de sentença penal estrangeira, na parte aplicável, os requisitos de que a lei do processo civil faz depender a confirmação de sentença civil estrangeira. 3 - Se a sentença penal estrangeira tiver aplicado pena que a lei portuguesa não prevê ou pena que a lei portuguesa prevê, mas em medida superior ao máximo legal admissível, a sentença é confirmada, mas a pena aplicada converte-se naquela que ao caso coubesse segundo a lei portuguesa ou reduz-se até ao limite adequado. Não obsta, porém, à confirmação a aplicação pela sentença estrangeira de pena em limite inferior ao mínimo admissível pela lei portuguesa. Como assinala Eduardo Maia Costa in Código de Processo Penal comentado, António Henriques Gaspar e outros, Almedina, 4.ª edição revista, págs. 884-885, aos requisitos da confirmação da sentença penal estrangeira previstos no art. 237.º do Código de Processo Penal acrescem ainda os impostos nos arts. 6.º, 7.º e 96.º da Lei n.º 144/99. 4.3. Conforme referido, o acórdão recorrido confirmou a sentença da ... Vara da Secção Judiciária de ... que condenou o recorrente na pena de 8 anos e 4 meses de prisão pela prática de um crime continuado de recetação qualificada, p. e p. pelos arts. 180.º, § 1.º, e 71.º do Código Penal Brasileiro. Como os factos em causa integram a descrição típica do crime de recetação do art. 213.º, n.º 1, do Código Penal Português, punido com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias, coloca-se a questão de saber se a sentença penal brasileira aplicou pena «em medida superior ao máximo legal admissível» pela lei portuguesa e se, nessa decorrência, o Tribunal da Relação de Lisboa estava obrigado a proceder à sua conversão «naquela que ao caso coubesse segundo a lei portuguesa» (art. 237.º, n.º 3, do Código de Processo Penal). O acórdão recorrido afastou a possibilidade de conversão por entender que «o “máximo legal admissível” refere-se aos limites máximos legais da pena de prisão consagrados nos n.ºs 1 e 2 do art. 41.º do Código Penal. Só em relação a estes limites gerais e abstractos faz sentido convocar o princípio constitucional da duração limitada das penas do art. 30.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa. Diminuir uma pena de prisão concretamente fixada em medida inferior a 20 anos de prisão (ou 25 anos nos casos previstos) já implica um juízo de censura inadmissível sobre o teor e fundamentos de direito da decisão revidenda, quando a moldura penal de cada crime é determinada por preocupações de política criminal e necessidades de prevenção geral que variam consoante os Estados». Em seu apoio invocou o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 30 jan2008, processo 0714604, relatado pelo desembargador Guerra Banha, alojado na base de dados www.dgsi.pt, no qual se pode ler: «Se na sentença estrangeira a rever o arguido foi condenado na pena de 15 anos de prisão pela prática de um crime para o qual a lei portuguesa prevê pena de prisão com o máximo de 10 anos, não há que operar qualquer redução da pena, à luz do nº 3 do art. 237.º do Código de Processo Penal, visto que aquela pena de 15 anos de prisão não excede o limite máximo geral previsto no n.º 1 do art. 41.º do Código Penal Português». A Sr.ª procuradora-geral-adjunta no Tribunal da Relação de Lisboa acompanhou esta posição e em seu reforço chamou ainda à colação os seguintes dois acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça (ambos publicados na base de dados www.dgsi.pt): Acórdão de 19 mai2010, processo 301/09.2TRPRT.S1, relatado pelo conselheiro Pires da Graça, em cujo sumário se observa que: «XIV - Por “máximo legal admissível” entende-se os limites máximos legais da pena de prisão consagrados nos n.ºs 1 e 2, do art. 41.º do CP, pois só em relação a estes limites gerais e abstractos faz sentido convocar o princípio constitucional da duração limitada das penas previsto no art. 30.º, n.º 1, da CRP. XV - Tentar interpretar aquela expressão com outro significado, mormente para significar a pena máxima da moldura penal do crime concretamente em apreciação, ou a aplicação de regimes especiais previstos na ordem jurídica portuguesa comportaria uma distorção inadmissível do sistema, com base em especificidades do ordenamento jurídico-penal português, em confronto com os ordenamentos dos Estados estrangeiros, que como é sabido também adoptam sistemas de penas divergentes do cúmulo jurídico, como os sistemas da absorção, da agravação ou exasperação e da acumulação material das penas – neste sentido, Eduardo Correia, Direito Criminal, II, 1971 (reimpressão), págs. 211 a 215. XVI - A entender-se de outro modo seria menosprezar-se ostensivamente a cooperação inter-nacional acordada e restringir-se desadequadamente a revisão e confirmação da sentença penal estrangeira, pelo que, desde que verificadas as condições gerais estabelecidas na Lei 144/99, bem como as condições especiais de admissibilidade nada obstará ao exequatur da sentença penal estrangeira no Estado de execução». Acórdão de 11jul2012, processo 166/11.4YREVR.S1, relatado pelo conselheiro Rodrigues da Costa, o qual, embora sem se pronunciar expressamente sobre o alcance da expressão «máximo legal admissível», decidiu: «IV - Na revisão e confirmação de sentença estrangeira há que acatar tal e qual o decidido, como manifestação de reconhecimento da soberania do órgão decisor de outro país, a menos que objecções de fundo, conexionadas com princípios estruturantes do direito penal pátrio e que têm a ver com direitos fundamentais consignados na Constituição, impliquem ajustamentos de alguns aspectos da sentença revidenda, a fim de a adequar ao direito nacional. As únicas hipóteses de ajustamento previstas pela nossa lei são as já mencionadas. V - O nosso sistema de revisão e confirmação de sentenças estrangeiras é, por regra, meramente formal, não competindo ao tribunal português exercer censura ou crítica à sentença revidenda, nem pronunciar-se sobre o fundo ou mérito da causa». Embora não se desconheça a existência de opinião dissonante (v. o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 10 jul2014, processo 20/14.8YRCBR, relatado pelo, então, desembargador Vasques Osório, acessível na base de dados www.dgsi.pt e citado na conclusão 15.ª do recurso), cremos que o entendimento do acórdão recorrido é o mais correto. Como (também) referem M. Simas Santos e M. Leal-Henriques, in Código de Processo Penal anotado, 1.º volume, 2.ª edição, reimpressão, 2004, Editora Rei dos Livros, pág. 1122: «As regras estabelecidas no n.º 3 [do art. 237.º] visam salvaguardar certos princípios da ordem pública portuguesa de carácter penal e constitucionalmente consagrados». Esses princípios estão assentes nos arts. 24.º, n.º 2 (em caso algum haverá pena de morte), 25.º, n.º 2 (ninguém pode ser submetido a penas cruéis, degradantes ou desumanas) e 30.º, n.ºs 1 (não pode haver penas nem medidas de segurança privativas ou restritivas da liberdade com carácter perpétuo ou de duração ilimitada ou indefinida, concretizado ao nível da lei ordinária nos arts. 41.º, n.ºs 1 a 3, 83.º, n.º 2, 84.º, n.º 2, e 92. n.º 2, todos do Código Penal), 3 (a responsabilidade penal é insuscetível de transmissão), 4 (nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos) e 5 (os condenados a quem sejam aplicadas pena ou medida de segurança privativas da liberdade mantêm a titularidade dos direitos fundamentais, salvas as limitações inerentes ao sentido da condenação e às exigências próprias da respetiva execução), da nossa Lei Fundamental. Ora, a partir do momento em que os mesmos estejam salvaguardados (e, claro está, que estejam reunidos os demais pressupostos estabelecidos nos mencionados arts. 6.º, 7.º e 96.º da Lei n.º 144/99), outra solução não resta ao Tribunal Português que não seja reconhecer e confirmar a sentença penal estrangeira. Vale a pena recordar agora a síntese de Eduardo Maia Costa, in obra citada, págs. 885-886 (destaques a negrito da nossa autoria): «Havendo divergência entre o regime punitivo da lei portuguesa e o da lei estrangeira aplicada seguem-se as seguintes regras: Se a sentença revidenda tiver aplicado uma pena que a lei portuguesa não prevê, a sentença é confirmada, mas a pena é convertida na que seria aplicável segundo a lei portuguesa. Se a divergência tem a ver com a moldura penal, respeitar-se-á a pena fixada, se inferior a limite mínimo previsto na lei portuguesa (geral ou da moldura penal respetiva). Se tiver sido fixada uma pena superior ao limite máximo da moldura penal do tipo legal correspondente da lei portuguesa, manter-se-á essa pena. Se, porém, a pena exceder o limite máximo geral admissível segundo a lei portuguesa, a pena será reduzida “até ao limite adequado”, ou seja, a pena será sempre reduzida, podendo ser fixada em medida inferior ao limite máximo previsto na lei portuguesa (n.º 3 deste artigo)». Saliente-se, enfim, que o disposto no art. 101.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 144/99, cuja violação também é assacada ao acórdão recorrido, «não tem o alcance que o recorrente pretende atribuir-lhe, mas unicamente o de significar que a execução da pena se faz de acordo com a lei portuguesa, e não no sentido da aplicação da lei penal portuguesa à sentença revidenda, convertendo as respectivas penas em outras tidas como mais favoráveis ao condenado» (citado acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11jul2012 relatado pelo conselheiro Rodrigues da Costa). Nada mais se oferecendo aduzir, emite-se parecer no sentido da confirmação do acórdão recorrido.” 4. Ausência de resposta ao Parecer Notificado o recorrente do parecer do Ministério Público nada veio responder. 5. Sequência processual Após exame preliminar e vistos legais, foram remetidos os autos à Conferência, cumprindo agora explicitar os fundamentos e a deliberação tomada. II- Delimitação das questões a conhecer no âmbito do presente recurso 2.1- Visando permitir e habilitar este Supremo Tribunal a conhecer as razões de discordância da decisão recorrida e tal como tem sido, aliás, posição pacífica da jurisprudência, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões, devidamente congruentes, que o(s) recorrente(s) extrai(em) da respetiva motivação, sem prejuízo da ponderação das questões que sejam de conhecimento oficioso. (7) 2.2- Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, a questão a decidir no presente recurso consiste em saber se a expressão “máximo legal admissível”, contida no nº 3 do artigo 237º do Código de Processo Penal, se reporta aos limites máximos legais da pena de prisão consagrados no nº 1 do art. 41.º do Código Penal ou se, pelo contrário, essa expressão remete para os limites máximos das penas abstratas previstos, para cada crime, na parte especial do mesmo diploma legal. Ou seja, o que importa decidir é se existe fundamento para revogar o acórdão recorrido e determinar a sua substituição por outro que converta/adapte a pena aplicada na sentença penal estrangeira por outra que aplique uma pena que se situe abaixo do limite máximo da moldura abstrata prevista no Código Penal Português para o crime a que são subsumíveis os factos dados como provados. III – Fundamentação 3.1. Os Factos Os factos a ter em consideração nos presentes autos são os que foram dados como provados na sentença brasileira e que constam no acórdão recorrido que atrás transcrevemos integramente. Com efeito, nos termos do disposto na al. a) do nº 1 do artigo 100º da LCJIMP, o tribunal português está vinculado à matéria de facto considerada provada na sentença estrangeira. Assim, apenas há a acrescentar que, por requerimento de 14 de maio de 2024, foi junto ao processo documento, atestando que, por despacho datado de 8 de abril de 2024, a ... Vara Federal – Privativa de Execuções Penais e Crimes Dolosos Contra a Vida, concedeu indulto da pena de multa imposta a AA, no valor de R$ 17.331,13 (dezassete mil, trezentos e trinta e um reais e treze centavos). 3.2. O Direito 3.2.1. Nota introdutória A execução de sentença penal estrangeira constitui uma forma de cooperação judiciária internacional em matéria penal que se rege, nos termos do disposto nos artigos 1º, nº 1, alínea c) e 3º da LCJIMP, “pelas normas dos tratados, convenções e acordos internacionais que vinculem o Estado Português e, na sua falta ou insuficiência, pelas disposições deste diploma”. Portugal não está, neste momento, vinculado a qualquer tratado, convenção ou acordo internacional que tenha aplicação ao caso em apreço. A este propósito, importa sublinhar que não faz sentido a alusão, no acórdão recorrido, ao disposto no nº 1 artigo 11º da Convenção sobre a Transferência de Pessoas Condenadas entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, assinada na Praia, em 23 de novembro de 20058. Com efeito, essa Convenção não tem aplicação ao caso dos autos, desde logo porque o recorrente já se encontra em Portugal (e, portanto, não necessita de ser transferido para o nosso país. Acresce que o aludido artigo 11º, nº 1 não tem o significado que o acórdão recorrido lhe pretende emprestar, pois apenas estabelece ser o Estado da condenação o único competente para decidir recurso de revisão de sentença. Ou seja, reporta-se ao que, em Portugal, constitui o recurso extraordinário de revisão de sentença previsto nos artigos 449º e sgs. do Código de Processo Penal e não, ao processo de revisão de sentença penal estrangeira que, também em Portugal, se encontra estabelecido nos artigos 234º e sgs. do mesmo Código9. De qualquer forma, esta e outras convenções podem ter interesse em termos hermenêuticos e serão abordadas em momento posterior do presente acórdão. Por outro lado, a convenção concebida para situações similares à dos autos é a Convenção Europeia sobre o Valor Internacional das Sentenças Penais, de 28 de maio de 1970, que Portugal assinou a 10 de maio de 1979, mas relativamente à qual ainda não consumou o depósito do instrumento de adesão. Ou seja, tal convenção ainda não tem força jurídica no nosso país. Com efeito, nos termos do nº 2 do artigo 19º da Convenção referida, “a Convenção entrará em vigor no primeiro dia do mês seguinte ao decurso de um prazo de três meses, contado da data do depósito do instrumento de adesão junto do Secretário-Geral do Conselho da Europa”10. Assim, as normas aplicáveis ao caso em apreço são os artigos 95º a 103.º da LCJIMP. Nos termos do disposto nos nºs 1 e 2 do artigo 100º desse diploma: “Artigo 100º Revisão e confirmação de sentença estrangeira 1 - A força executiva da sentença estrangeira depende de prévia revisão e confirmação, segundo o disposto no Código de Processo Penal e o previsto nas alíneas a) e c) do nº 2 do artigo 6º do presente diploma. 2 - Quando se pronunciar pela revisão e confirmação, o tribunal: a. Está vinculado à matéria de facto considerada provada na sentença estrangeira; b. Não pode converter uma pena privativa de liberdade em pena pecuniária; c. Não pode agravar, em caso algum, a reação estabelecida na sentença estrangeira.” Por outro lado, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 234º e no artigo 237º, ambos do Código de Processo Penal: “Artigo 234º Necessidade de revisão e confirmação 1 – Quando, por força da lei ou de Tratado ou Convenção, uma sentença penal estrangeira dever ter eficácia em Portugal, a sua força executiva depende de prévia revisão e confirmação.” “Artigo 237º Requisitos da confirmação 1 - Para confirmação de sentença penal estrangeira é necessário que se verifiquem as condições seguintes: a. Que, por lei, tratado ou convenção, a sentença possa ter isso força executiva em território português; b. Que o facto que motivou a condenação seja também punível pela lei portuguesa; c. Que a sentença não tenha aplicado pena ou medida de segurança proibida pela lei portuguesa; d. Que o arguido tenha sido assistido por defensor e, quando ignorasse a língua usada no processo, por intérprete; e. Que, salvo tratado ou Convenção em contrário, a sentença não respeite a crime qualificável, segundo a lei portuguesa ou a do país em que foi proferida a sentença, de crime contra a segurança do Estado. 2 - Valem correspondentemente para confirmação de sentença penal estrangeira, na parte aplicável, os requisitos de que a lei do processo civil faz depender a confirmação de sentença civil estrangeira. 3 - Se a sentença penal estrangeira tiver aplicado pena que ali portuguesa não prevê ou pena que a lei portuguesa prevê, mas em medida superior ao máximo legal admissível, a sentença é confirmada, mas a pena aplicada converte-se naquela que ao caso coubesse segundo a lei portuguesa, ou reduz-se até ao limite adequado. Não obsta, porém, à confirmação a aplicação pela sentença estrangeira de pena em limite inferior ao mínimo admissível pela lei portuguesa.” 3.2.2. O disposto no nº 3 do artigo 237º do Código de Processo Penal Não constando da Lei n.º 144/99 de 31 de Agosto qualquer disposição que especifique quais as regras que o tribunal português, que opera a revisão e confirmação da sentença estrangeira, deve observar quanto à medida da pena fixada na sentença proferida no Estado da condenação, haverá lugar à aplicação subsidiária das normas do Código de Processo Penal tal como resulta do disposto no artigo 3.º, n.º 2, da citada Lei n.º 144/99 de 31 de Agosto ou, o mesmo é dizer que rege a este propósito o disposto no artigo 237.º, n.º 3 do Código de Processo Penal. Como atrás se deixou consignado, a questão que se coloca nos presentes autos é a de saber como interpretar a expressão “máximo legal admissível” ínsita no nº 3 do artigo 237º do Código de Processo Penal. O acórdão recorrido entende, pelas razões que deixámos transcritas, que tal expressão se reporta ao limite máximo da pena de prisão previsto na Parte Geral do Código Penal, mais propriamente no seu artigo 41º. O recorrente considera que tal expressão se reporta ao limite máximo do tipo legal a que são subsumíveis os factos por que foi condenado. Ou seja, no caso em apreço e conforme reconhecido pelo acórdão recorrido, o crime de recetação, previsto e punível pelo artigo 231º do Código Penal, com pena de prisão até 5 anos ou com pena de multa até 600 dias (nº1); ou com pena de prisão de 1 a 8 anos (nº2). Em suma, enquanto de acordo com a interpretação do acórdão recorrido o recorrente teria de cumprir uma pena de prisão de 8 (oito) anos e 4 (quatro) meses, face ao entendimento deste último essa pena tinha de ser convertida numa outra pena, calculada de acordo com a legislação portuguesa e que nunca poderia ultrapassar o limite de 5/8 anos de prisão. Desde já se consigna a nossa concordância com este entendimento, não se acompanhando o decidido no acórdão recorrido, pelas razões que passaremos a expor. Com vista a proceder a uma correta interpretação do disposto no n.º 2 do artigo 237.º julgamos ser indiscutível dever partir do seguinte postulado: a expressão “medida superior ao máximo legal admissível”, constante do primeiro segmento desta norma, e a expressão “limite inferior ao mínimo admissível”, terão que necessariamente referir-se à mesma realidade jurídica. Por outras palavras, e concretizando, ou ambas as expressões se referem ao mínimo e ao máximo da pena prevista na lei portuguesa para a infração com base na qual o condenado foi sentenciado no Estado da condenação, ou ambas se referem aos limites mínimo e máximo das penas de prisão admissíveis, em geral, pela lei portuguesa. Não nos restam dúvidas que a primeira asserção é a correta na medida em que a segunda se mostra de configuração manifestamente impossível. No artigo 41º do Código Penal, coexistem dois “limites máximos” da pena de prisão. Com efeito, dispõem os nºs 1 e 2 desse artigo 41º o seguinte: “Artigo 41º Duração e contagem dos prazos da pena de prisão 1 – A pena de prisão tem, em regra, a duração mínima de 1 mês e a duração máxima de 20 anos. 2 - O limite máximo da pena de prisão é de 25 anos nos casos previstos na lei.” Ou seja, uma primeira dificuldade que encontramos no entendimento expresso no acórdão recorrido é a de saber a que limite máximo devíamos considerar. Com efeito, parece-nos legitimo perguntar se o limite máximo referido é o da regra do nº 1 do artigo 41º do Código Penal ou da exceção, prevista no nº 2 do mesmo artigo. Por outro lado, e como atrás se deixou consignado, o limite mínimo da pena de prisão previsto no artigo atrás transcrito está fixado em 1 (um) mês. Assim e mais uma vez na interpretação do acórdão recorrido, o limite mínimo a que se reporta a segunda parte do nº 3 do artigo 237º do Código de Processo Penal seria de um mês. Contudo, nos termos do disposto no artigo 96º nº 1 alínea i) da LCJIMP, não é admissível, em termos gerais, a revisão e confirmação de sentença estrangeira que aplique pena de prisão inferior a 1 (um) ano de prisão11. Ou seja, o limite mínimo a que se reporta a segunda parte do nº 3 do artigo 237º não pode ser nunca o do n.º 1 do artigo 41º do Código Penal, já que este é inferior a 1 (um) ano de prisão, pelo que esse limite mínimo não poderá deixar de corresponder ao previsto na lei portuguesa para a infração com base na qual o condenado foi sentenciado no Estado da condenação. Razão por que, sendo assim, a expressão “medida superior ao máximo legal admissível” constante do primeiro segmento do n.º 3 do artigo 237.º do Código de Processo Penal não poderá deixar de referir-se ao mínimo e ao máximo da pena prevista na lei portuguesa para a infração com base na qual o condenado foi sentenciado no Estado da condenação. Por outro lado, e como refere o Juiz Conselheiro Lopes da Mota12: “Deve notar-se que o regime de execução de sentenças penais estrangeiras estabelecido nos artigos 95º e seguintes da Lei nº 144/99, reproduz o dos artigos 89º e seguintes do Decreto-lei nº 43/91, 22 de janeiro (revogado pelo artigo 166º da Lei nº 144/99), que tem por fonte, nomeadamente, os artigos 42º e 44º da Convenção Europeia sobre o Valor Internacional das Sentenças Penais (“European Convention on the International Validity of Criminal Judgements”), de 28.5.1970, do Conselho da Europa, assinada por Portugal em 1979, mas ainda não ratificada (cfr. Manuel A. Lopes Rocha e Teresa Alves Martins, Cooperação Judiciária em Matéria Penal (Comentários), Aequitas/Editorial Notícias, 1992). De acordo com o artigo 44º desta Convenção, se o pedido de execução for aceite, o tribunal do Estado de execução deve substituir a pena privativa da liberdade imposta no Estado da condenação por uma pena prevista na lei interna do Estado de execução para o mesmo crime, a qual, não podendo agravar a situação do condenado (proibição da reformatio in pejus) e estando vinculada aos factos escritos na condenação (artigo 42º), pode ser de duração diferente da imposta no Estado da condenação. Como se refere no respetivo relatório explicativo, este artigo confere ao Estado de execução o direito de adaptar a sanção ao seu próprio sistema penal (cfr. “Explanatory Report – ETS 70 – International Validity of Criminal Judgements”, em www.coe.int). No caso de sentenças penais estrangeiras - lê-se no preâmbulo do Decreto-lei nº 43/91 – “exige-se a revisão e confirmação da sentença estrangeira, para que possa produzir efeitos em Portugal, segundo a tradição do direito português, reafirmada no Código de Processo Penal vigente. A ordem de execução é precedida da conversão das sanções impostas no estrangeiro nas correspondentes da lei portuguesa” Também de acordo com Manuel A. Lopes Rocha e Teresa Alves Martins13: “A decisão de reconhecimento tem por fim permitir, à sentença estrangeira, a produção de efeitos jurídicos constantes das regras internas. Nesta conformidade desempenha uma função de facto jurídico e a decisão de reconhecimento, mais do que versar sobre uma relação substancial que já foi objeto da sentença estrangeira, tem um alcance puramente processual. Nessa medida, analisa-se como uma conditio juris relativamente à sentença estrangeira. Dito de outro modo, aquilo que tem o valor de ato jurídico no sistema originário, deve ter igualmente esse valor no outro sistema não em razão da qualificação originária, mas em razão do facto novo da “nacionalização”, da expressão da vontade do juiz, em virtude da qual um simples facto material, produtor de efeitos jurídicos (facto jurídico em sentido próprio) se transforma em facto jurídico voluntário correlativo (acto jurídico). Diferentemente do reconhecimento de uma sentença civil, o da sentença penal deve fixar imperativamente, no quadro da legislação do país da execução, a pena ou medida a executar. A disparidade das legislações penais, tanto no que respeita às sanções como no que concerne às suas modalidades de execução, implica o reconhecimento, ao juiz do Estado da execução, do poder de adaptar a sanção infligida à luz das normas da sua legislação. A decisão estrangeira será assim modificada num dos seus aspetos essenciais, e, por via disso, a medida tomada pelo juiz do Estado da execução, mesmo quando aceitar a decisão estrangeira na parte relativa a declaração de responsabilidade do condenado, determina, em função da sua própria lei, a natureza e o quantum da pena, bem como todas as consequências que dela decorrem. (…) Face a todo o exposto, entende-se que o acórdão recorrido deve ser revogado e substituído por outro que, analisando os factos dados como provados na sentença estrangeira, a adapte à legislação nacional, aplicando ao recorrente uma pena que não ultrapasse o limite máximo da moldura abstrata do crime de recetação, previsto e punível pelo artigo 231º do Código Penal. 3.2.3. Considerações complementares – As Convenções Relativas à Transferência de Pessoas Condenadas Como atrás se deixou consignado, dado que o recorrente reside atualmente em Portugal, não existe convenção, tratado ou acordo internacional que seja aplicável ao caso em apreço. Contudo, a análise das convenções que se reportam à transferência de condenados para cumprirem a pena noutro Estado têm interesse, não só pelo contributo que podem dar a nível hermenêutico, mas, sobretudo, porque a pena aplicável numa dessas situações não pode ser diferente da que será aplicada nos presentes autos. Com efeito e tendo em conta que as penas aplicadas no processo que correu termos na República do Brasil são rigorosamente iguais, se porventura um deles ainda aí se encontrasse, mas tivesse nacionalidade portuguesa e pedisse para cumprir a respetiva pena em Portugal, a determinação de tal sanção não podia ser diferente da que será usada para estabelecer a pena a cumprir pelo coautor que reside no nosso país. 3.2.3.1. A Convenção sobre Transferência de Pessoas Condenadas entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa. Dispõe o artigo 9º da convenção acima referida o seguinte: Artigo 9º Execução 1 – A transferência de qualquer pessoa condenada apenas poderá ter lugar se a sentença for exequível no Estado para o qual a pessoa deva ser transferida. 2 – O Estado para o qual a pessoa deve ser transferida não pode: a. Agravar, aumentar ou prolongar a pena ou a medida aplicada no Estado da condenação, nem privar a pessoa condenada de qualquer direito para além do que resultar da sentença proferida no Estado da condenação; b. Alterar a matéria de facto constante da sentença proferida no Estado da condenação. 3 - Na execução da pena, observam-se a legislação e os procedimentos do Estado para o qual a pessoa tenha sido transferida. Ora, como já atrás deixámos consignado, a atribuição de força executiva à sentença estrangeira depende de prévia revisão e confirmação, a qual deverá ser realizada nos termos do disposto na LCJIMP e no Código de Processo Penal. Assim, regressamos à situação inicial, havendo que adotar as soluções preconizadas aquando da interpretação do disposto no artigo 237º, nº 3 do Código de Processo Penal. Com efeito nos termos do “Manual Sobre Transferência de Pessoas Condenadas” (a que aludimos na nota 9) refere a Procuradoria-Geral da República14, na pág. 8, o seguinte: “O Tribunal português não poderá agravar a pena imposta no Estado de condenação, nem imporá pena inferior, a menos que se trate de pena superior ao máximo permitido pela lei portuguesa. Neste caso, a sentença é confirmada, mas a pena a aplicar será convertida, ou reduzida, de acordo com o máximo legal aplicável em Portugal.” 3.2.3.2. A Convenção sobre Transferência de Pessoas Condenadas do Conselho da Europa. A Convenção Relativa à Transferência de Pessoas Condenadas, concluída no Conselho da Europa a 21 de março de 1983,15 entrou em vigor em Portugal a 1 de outubro de 1983 e na República do Brasil a 1 de outubro de 202316. Nos termos do disposto no nº 1 do seu artigo 9º17: “As autoridades competentes do Estado de execução devem: a. Continuar a execução da condenação imediatamente ou com base numa decisão judicial ou administrativa, nas condições referidas no artigo 10º; ou b. Converter a condenação, mediante processo judicial ou administrativo, numa decisão desse Estado, substituindo assim a sanção proferida no Estado da condenação por uma sanção prevista pela legislação do Estado de execução para a mesma infracção, nas condições referidas no artigo 11º.” Por outro lado, nos termos do disposto no artigo 10º18: “1 - No caso de continuação da execução, o Estado da execução fica vinculado pela natureza jurídica e pela duração da sanção, tal como resultam da condenação. 2 – Contudo, se a natureza ou a duração desta sanção forem incompatíveis com a legislação do Estado da execução, ou se a legislação desse Estado o exigir, o Estado de execução pode, com base em decisão judicial ou administrativa, adaptá-la à pena ou medida previstas na sua própria lei para infrações da mesma da natureza. Quanto à sua natureza, esta pena ou medida corresponderá, tanto quanto possível, a imposta pela condenação a executar. Ela não pode agravar, pela sua natureza ou duração, a sanção imposta no Estado da condenação nem exceder o máximo previsto pela lei do Estado da execução.” (sublinhado nosso) Finalmente, nos termos do disposto no artigo 11º19 1 - No caso de conversão da condenação aplica-se o processo previsto pela lei do Estado da execução. Ao efetuar a conversão, a autoridade competente: a. Ficará vinculada pela constatação dos factos na medida em que estes figurem explicita ou implicitamente na sentença proferida no Estado da condenação; b. Não pode converter uma sanção privativa da liberdade numa sanção pecuniária; c. Descontará integralmente o período de privação da liberdade cumprido pelo condenado; e d. Não agravará a situação penal do condenado nem ficará vinculada pela sanção mínima eventualmente prevista pela lei do Estado da execução para a infração ou infrações cometidas 2 - Quando o processo de conversão tenha lugar após a transferência da pessoa condenada, o estado da execução manterá essa pessoa detida ou tomará outras medidas de modo a assegurar a sua presença no Estado da execução, até ao termo desse processo.” Por último, importa referir que, ao ratificar esta Convenção, Portugal formulou um conjunto de reservas, das quais importa, para o caso em análise, consignar as seguintes: a. “Portugal utilizará o processo previsto na alínea a) do nº 1 do artigo 9º, nos casos em que seja o Estado de execução; b. Execução de uma sentença estrangeira efetuar-se-á com base na sentença de um tribunal português que a declare executória, após prévia revisão e confirmação; c. Quando tiver de adaptar uma sanção estrangeira, Portugal, consoante o caso, converterá segundo a lei portuguesa, a sanção estrangeira o reduzirá a sua duração, se ela ultrapassar o máximo legal admissível na lei portuguesa;(…)” Face a este conjunto de norma importa começar por explicar que, como se pode ler no relatório explicativo da respetiva convenção, a diferença fundamental entre o procedimento de "continuação da execução", previsto no artigo 10º, e o procedimento de "conversão da condenação", previsto no artigo 11º, é que, no primeiro caso, o tribunal de execução continua a executar a sentença proferida pelo tribunal de condenação (eventualmente adaptada nos termos do nº 2 do artigo 10º), enquanto no segundo caso, a sanção é convertida numa sanção do Estado de condenação, o que tem por resultado que a pena executada já não se baseia diretamente na sanção imposta no Estado de condenação.20 Ou seja, embora o procedimento previsto na alínea a) do artigo 9º e explicitado no artigo 10º, consagre, como regra, a manutenção da natureza e duração da pena imposta no Estado da condenação, sempre que a duração dessa pena seja superior ao limite máximo da pena abstrata prevista na legislação do Estado de execução para o crime a que são subsumíveis os factos praticados, este Estado pode reduzir essa pena, por forma a situá-la dentro da moldura abstrata prevista na sua legislação para esse crime. Com efeito, é mesmo isso que resulta da Recomendação R (84) 11 do Conselho de Ministros aos Estados Membros, relativa à informação sobre a Convenção Relativa à Transferência de Pessoas Condenadas e que a seguir se transcreve em tradução do signatário21: Que pena será cumprida após a transferência? - (Estados que aplicam o procedimento de "continuação da execução") A duração máxima da pena a cumprir após a transferência corresponderá à duração da pena inicial, deduzida de qualquer privação da liberdade sofrida no Estado da condenação antes da data da transferência. Se a duração da pena imposta no Estado da condenação for superior à pena prevista para a mesma infração no Estado da execução ou se as duas penas forem de natureza diferente, a pena inicial será adaptada à pena que melhor corresponda ao direito do Estado de execução, sendo que a sanção resultante não será nem mais longa nem mais grave do que a pena inicial. (sublinhado nosso) Aqui chegados, podemos concluir que a reserva relativa à redução da sanção contida na sentença estrangeira ao “máximo legal admissível na lei portuguesa” reporta-se ao limite máximo da sanção estabelecida na moldura abstrata dos diferentes crimes previstos na parte especial do Código Penal. Ou seja, e voltando ao caso em apreço, também a expressão “máximo legal admissível”, contida no nº 3 do artigo 237º do Código de Processo Penal, se reporta à pena máxima prevista na parte especial do Código Penal estabelecida para o concreto crime a que se reportam os factos dados como provados na sentença estrangeira a rever e confirmar. 3.2.4. Conclusão Face a todo o exposto, conclui-se que, tendo em conta que, no caso em apreço, a sentença proferida pela ... Vara da Secção Judiciária de ... – República Federativa do Brasil – aplicou a AA a pena de 8 (oito) anos e 4 (quatro) meses de prisão, pela prática do crime continuado de recetação, previsto e punível pelos artigos 180º, §1° e 71º do Código Penal da República do Brasil, e dado que os factos que estiveram na base de tal condenação são puníveis pelo artigo 231º do Código Penal Português com pena de prisão cujo limite máximo se situa nos 5 (cinco) anos ou nos 8 (oito) anos – caso se considere que o agente fez da recetação modo de vida -, há que adaptar aquela pena a esta moldura penal, nos termos do disposto no nº 3 do art. 237º do Código de Processo Penal. IV – Decisão Pelo exposto, julga-se o recurso procedente quanto à adaptação/conversão da pena de prisão solicitada, a efetuar no Tribunal recorrido nos termos atrás mencionados no ponto 3.2.4. Sem custas Supremo Tribunal de Justiça, 21 de maio de 2024 (Processado e revisto pelo relator - artigo 94º, nº 2 do Código de Processo Penal) Celso Manata (Relator) Jorge Bravo (1º Adjunto) Antero Luís (2º Adjunto) __________________________________________ 1. Convenção sobre a Transferência de Pessoas Condenadas entre os Estados Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, assinada na Praia, em 23 de Novembro de 2005 aprovada por Resol. da AR n.º 48/2008, de 15.9, e art.s. 95º a 103º, 114º a 116º e 122º a 125º, da Lei 144/99.↩︎ 2. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25.2.2010, no proc. 42/10.8YFLSB, em www.dgsi.pt.↩︎ 3. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2.2.2011, no proc. 301/09.2TRPRT.S1, em www.dgsi.pt.↩︎ 4. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 26.02.97, no proc. 933/96, em www.dgsi.pt sob o n.º 9610933.↩︎ 5. Neste sentido, o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 30.1.08, no proc. 0714604, em www,dgsi.pt.↩︎ 6. Sinteticamente definidos por Eduardo Correia em Direito Criminal II, 1971 (reimpressão), pg.s 211 a 215.↩︎ 7. Neste sentido, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição, Editorial Verbo, pág. 335; Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª edição, Edições Rei dos Livros, pág. 103, Ac. do STJ de 28/04/1999, CJ/STJ, 1999, Tomo 2, pág. 196 e Ac. do Pleno do STJ nº 7/95, de 19/10/1995, DR I Série A, de 28/12/1995.↩︎ 8. Aprovada por Resolução da Assembleia da República n.º 48/2008, de 15 de setembro ratificada pelo Decreto do Presidente da República nº 66/2008, de 15 de setembro e que se encontra em vigor em Portugal e na República Federativa do Brasil, respetivamente desde 1 de março de 2010 e de 1 de agosto de 2009.↩︎ 9. “Esta interpretação é confirmada na pág. 29 do pelo “Manual Sobre Transferência de Pessoas Condenadas”, emitido pela Procuradoria-Geral da República a propósito desta Convenção e que está disponível em manual_transf_pessoas_condenadas.pdf (ministeriopublico.pt)↩︎ 10. Tradução do signatário↩︎ 11. Dizemos “em termos gerais” já que, em circunstâncias muito especiais, essa condição pode ser dispensada (cfr. nº 5 do artigo 96º da LCJIMP).↩︎ 12. Ac. do STJ de 23 de fevereiro de 2023 – Proc. 1626/21.4YRLSB.S1 in www.dgsi.pt↩︎ 13. “Cooperação Judiciária em Matéria Penal (Comentários), Aequitas/Editorial Notícias, 1992, pags. 155 e ss.↩︎ 14. Na qualidade de Autoridade Central que lhe foi conferida pelo artigo 2º do Decreto do Presidente da República nº 66/2008, de 25 de agosto – publicado no Dário da República I série A de 15 de setembro de 2008.↩︎ 15. Esta convenção foi aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República nº 8/93, de 20 de abril e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 8/93, de 20 de abril (publicada no Diário da República I Série A, de 20 de abril de 1993).↩︎ 16. A República do Brasil ratificou esta convenção a 26 de junho de 2023.↩︎ 17. Cuja epígrafe é: “Efeitos da transferência para o Estado da execução”↩︎ 18. Cuja epígrafe é: “Continuação da execução”↩︎ 19. Cuja epígrafe é: “conversão da condenação”↩︎ 20. Cfr. Ponto 46 do Rapport explicatif – STE 112 – Transférement des personnes condamnées (convention) disponível em STCE 112 - Rapport explicatif de la Convention sur le transfèrement des personnes condamnées (coe.int)↩︎ 21. Quelle sera la peine à purger après le transfèrement? - (Etats appliquant la procédure de «poursuite de l'exécution»:) La durée maximale de la peine à purger après le transfèrement correspondra à la durée de la peine initiale restant à purger après déduction de toute remise accordée en (l'Etat de condamnation) avant la date du transfèrement. Si la durée de la peine infligée en (l'Etat de condamnation) est plus longue que celle de la peine encourue pour la même infraction en (l'Etat d'exécution) ou si les deux peines sont de nature différente, la peine initiale sera alignée sur la peine qui correspond le mieux dans la législation de l'Etat d'exécution), la peine résultante ne pouvant toutefois être ni plus longue ni plus sévère que la peine initiale↩︎

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