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Acórdão TCA Sul de 2011-12-07

08254/11

TribunalTribunal Central Administrativo Sul
Processo08254/11
SecçãoCA - 2.º JUÍZO
Data do Acordão2011-12-07
RelatorSofia David
DescritoresDireito de Informação, Direito de Informação Não Procedimental

Sumário

Em sede do direito à informação, designadamente não procedimental, não cabe à Administração criar quaisquer restrições, mas antes deve pautar a sua conduta por a mais ampla colaboração com o particular. Não pode a Administração adoptar uma postura passiva, remetendo para o particular a obrigação de conhecer os seus documentos e arquivos, mas ao invés, deve “conduzir” o particular na sua busca. Também não pode a Administração a pretexto de uma imprecisão do requerimento do requerente ou do seu não suprimento, pura e simplesmente, não prestar a informação, criando na prática uma restrição injustificada e não admitida ou consentida deste direito. Igualmente, não pode a Administração, a pretexto do trabalho de pesquisa que a satisfação do requerido implica ou da vastidão dos seus registos, remeter para o particular tal trabalho, desonerando-se dos seus deveres de colaboração e dos previstos no artigo 13º, n.º 5, da Lei n.º 46/2007, de 24.98, porquanto tal significaria uma verdadeira denegação do direito à informação. Apenas pode a Administração solicitar ao particular que «precise» o seu pedido, desde logo porque este vise uma precisa informação e a formule de forma imprecisa. Mas tudo à luz dos princípios da colaboração, da boa fé, da proporcionalidade e da adequação e por forma a não restringir os direitos constitucionais do particular. As exigências de identificação e precisão do requerimento do particular tem de ser ponderadas pela Administração face ao enquadramento concreto da situação e contrabalançadas com a natureza do direito em questão e o cumprimento dos princípios da colaboração, da boa fé, da proporcionalidade e da adequação. O que fica de fora da obrigação da Administração é unicamente a obrigação «de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido» ou a «obrigação de fornecer extractos de documentos, caso isso envolva um esforço despropositado que ultrapassa a simples manipulação dos mesmos» – cf. artigo 11º, n.º 5, da Lei n.º 46/2007, de 24.98.


Texto Integral

Acordam na 1ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul Vem interposto recurso da sentença do TAC de Lisboa que julgou improcedente a intimação apresentada contra o Turismo de Portugal, IP, para passagem de cópias autenticadas ou certidões ou reproduções autenticadas «de todos os actos, contratos, guias, recibos, documentos, ou, de maneira geral, de quaisquer documentos escritos de onde conste o registo integral e datado dos valores das remunerações, ajudas de custo, compensações ou benefícios auferidos, no período de tempo que mediou desde 1992 até ao presente, pelos inspectores da Inspecção Geral de Jogos, os Senhores B..., C..., D..., E..., F..., G..., H..., I..., J...e K..., qualquer que seja a sua proveniência, autor ou data da junção» e de «quaisquer outros actos, decisões, deliberações, informações, pareceres, requerimentos, promoções ou, em geral, quaisquer outros documentos escritos ou noutro suporte que determinem ou demonstrem o percurso profissional e os valores remuneratórios mensais e anuais, correntes ou extraordinários, qualquer que seja a natureza, Em alegações são formuladas pelo Recorrente as seguintes conclusões: «A. O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, a fls., datado de 21 de Setembro de 2011, notificado por ofício de notificação datado de 26 de Setembro de 2011, pelo qual se julgou improcedente a Intimação para a Passagem de Certidões que o ora Recorrente, instaurou contra a Entidade Recorrida, e em que pretendia a intimação desta para, no prazo máximo de dez dias contínuos, facultar a consulta do processo e proceder à passagem de cópias integrais autenticadas e/ou certidões de (1) todos os actos, contratos, guias, recibos, documentos ou, de maneira geral, de quaisquer documentos escritos de onde constasse o registo integral e datado dos valores das remunerações, ajudas de custo, compensações ou benefícios auferidos, no período de tempo que mediou desde 1992 até ao presente, pelos Inspectores da Inspecção Geral de Jogos, os Senhores B..., C..., D..., E..., F..., G..., H..., I..., J...e K..., qualquer que fosse a sua proveniência, autor ou data de junção, nos termos da alínea a) e b) do n.º 1 do art. 63.º CPA, B. E, bem assim, de (2) quaisquer outros actos, decisões, deliberações, informações, pareceres, requerimentos, promoções ou, em geral, quaisquer outros documentos escritos ou noutro suporte que determinem ou demonstrem o percurso profissional e os valores remuneratórios mensais e anuais, correntes ou extraordinários, qualquer que seja a sua natureza, auferidos por qualquer dos trabalhadores acima referidos, no período designado no ponto anterior, nos termos das alíneas a), b) e d) do n.º 1 do art. 63.º do CPA (“Intimação para a Passagem de Certidões”). C. Com a interposição do presente recurso, pretende a Recorrente a revogação da anterior decisão (decisão de 1.ª instância), que determinou a improcedência do pedido de intimação para passagem de certidões supra descrito. D. Com efeito, a sentença proferida pelo Tribunal a quo encontra-se inquinada por vícios de decisão (erros de julgamento), cuja apreciação se impõe na presente sede. No essencial, vislumbram-se dois vícios de violação de lei decorrentes da interpretação dada quer à i) extensão e limitações do direito à informação, quer ao ii) ónus de identificação dos documentos administrativos solicitados. E. Atentos os termos da sentença ora recorrida, forçoso é concluir que a decisão proferida pelo tribunal a quo, constitui, a final, uma inaceitável denegação ao direito do Recorrente, enquanto particular dotado de interesse legítimo, ao acesso à informação constante de documentos administrativos, e bem assim uma clamante violação da lei fundamental. F. Os direitos de informação procedimental e o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos são direitos de natureza análoga aos “direitos, liberdades e garantias”, partilhando, portanto, do mesmo regime, designadamente a aplicabilidade directa e a limitação da possibilidade de restrição apenas nos casos expressamente previstos na Constituição e mediante lei geral e abstracta; G. Não pode a distinção – operada pelo Tribunal a quo – entre direito à informação procedimental e direito à informação não procedimental ser feita em termos tais que restrinja inadmissivelmente o direito dos particulares à informação. H. O direito de informação deve ser interpretado de forma integrada – e deve, ademais, ser entendido em termos tais que não violem as finalidades que lhe subjazem: a da garantia da transparência da actuação da administração pública e a do envolvimento dos cidadãos nas decisões que afectam a sua esfera jurídica. I. Mais importa assinalar, o patente desequilíbrio de forças entre Recorrente e Recorrida (com manifesta superioridade da Recorrida) e bem assim relembrar que o fundamento do pedido de certidões, objecto do presente litígio visa assegurar o ressarcimento dos prejuízos sofridos pelo ora Recorrente, com a reconstituição da sua carreira ou, in minimum, o pagamento das indemnizações correspondentes às remunerações globais que deveria sucessivamente ter auferido se a sua progressão na carreira não tivesse sido violada, conforme decisão transitada em julgado. Sendo a decisão proferida, de que ora se recorre, susceptível de vir a determinar a impossibilidade de materialização da decisão judicial proferida e transitada em julgado, impedindo o recurso à tutela executiva. J. Forçoso é concluir que não assiste razão ao entendimento sufragado pelo tribunal a quo, incorrendo a sentença proferido em erro de julgamento e decorrente vício de violação de lei, desde já se requerendo seja a decisão proferida revogada por outra que determine a procedência do pedido de intimação para passagem de certidão. K. Ora, in casu, o Recorrente requer, precisamente, o acesso a informações respeitantes a procedimentos concretos – cuja tramitação diz respeito a funcionários determinados e cuja identificação resulta perfeitamente individualizada dos termos em que é feito o pedido. Na medida em que tal identificação resulta, já, da individualização dos procedimentos em causa, e na medida em que a consagração de tal ónus não tem qualquer cabimento lógico – nem encontra qualquer sentido útil – no âmbito de pedidos de informação que se refiram a elementos agregados a procedimentos, que, pela sua própria natureza, estão já, suficientemente individualizados. L. Para além do mais, não deve, ser o pedido de certidões in casu apreciado à luz dos normativos previstos pela Lei n.º 46/2007 de 24 de Agosto, mas, antes, e apenas, à luz do constante do CPA – cujos termos são, aliás, aqueles que foram seguidos pela tramitação principal do pedido formulado pelo ora Recorrente no âmbito do respectivo pedido de certidões ou reproduções autenticadas – M. Ainda que se admitisse – o que não se concede – que, por via da aplicação ao caso concreto do artigo 13.º da Lei n.º 46/2007 de 24 de Agosto, fosse exigido que do pedido apresentado pelo ora Recorrente, constassem “os elementos essenciais à sua identificação”, sempre se diria que o pedido do Recorrente satisfaz essa exigência de identificação – encontrando-se perfeitamente enquadrado e delimitado pela referência concreta a uma lista de inspectores expressamente identificados, relativamente aos quais apenas são exigidos os documentos referentes às remunerações e benefícios que para eles advieram do exercício das suas funções, durante um período de tempo determinado (desde 1992 até ao presente). N. O pedido formulado pelo ora Recorrente delimita, com exactidão, os funcionários abrangidos (sujeitos), referindo, ainda, que de todos os documentos referentes a tais funcionários, apenas se pretendem aqueles que se debruçarem sobre as remunerações por eles auferidas (objecto) desde 1992 até ao presente (enquadramento temporal). O. A identificação de um “processo individual”, acompanhada, ademais, da identificação da temática da documentação que se requer e do âmbito temporal a que esta se deve reportar, constitui preenchimento suficiente do artigo 13.º da Lei n.º 46/2007 de 24 de Agosto, P. Impendia, pois, sobre a ora Recorrida, o dever de colaboração que alicerça o direito à informação dos particulares, e nos termos do qual a Administração se encontra obrigada a “prestar a informação sobre a (sua) existência e conteúdo [dos actos a que se refere o pedido de informação], sob pena de denegar o acesso aos documentos administrativos” (artigo 7.º do CPA), Q. Não conhece o particular, nem tem de conhecer os concretos departamentos em que se pode encontrar a referida informação, resultando irremediavelmente prejudicado o direito do particular caso lhe seja imposto semelhante limite ao acesso à informação, que naturalmente, dificilmente conseguirá alcançar, caso tenha que ser o próprio - conforme aparenta sugerir o Tribunal a quo – a coligir a informação em causa com recurso aos seus próprios meios. R. O pedido formulado pelo ora Recorrente identifica, de forma completa e cabal, os elementos necessários ao apuramento dos documentos requeridos, fazendo referências concretas aos sujeitos, objecto e enquadramento temporal de tais documentos. S. Assim sendo, forçoso é concluir que não assiste razão ao entendimento sufragado pelo tribunal a quo, incorrendo a sentença proferido em erro de julgamento e decorrente vício de violação de lei, desde já se requerendo seja a decisão proferida revogada por outra que determine a procedência do pedido de intimação para passagem de certidão.» Em contra-alegações pelo Recorrido são formuladas as seguintes conclusões: Sem vistos prévios, cumpre decidir. Os Factos A sentença recorrida considerou indiciariamente assentes os seguintes factos: O Direito Alega o Recorrente nas várias conclusões do recurso, que a sentença recorrida incorre em erro de julgamento, por fazer uma incorrecta interpretação do direito de informação em apreço e apreciar o pedido do ora Recorrente à luz o artigo 13.º da Lei n.º 46/2007, de 24.08, quando o deveria ter apreciado apenas à luz do CPA e por considerar que o seu pedido não estava suficientemente individualizado, delimitado ou identificado. No que se refere à imputação à sentença de erro de julgamento por aplicar o artigo 13.º da Lei n.º 46/2007, de 24.08, e não apenas o CPA, claudicam as alegações do Recorrente. Face à matéria provada e que não vem contestada, o pedido de informação por si feito integra-se claramente na informação não procedimental, cujo regime está regulado precisamente na Lei n.º 46/2007, de 24.08. Estão em causa informações que se integram no âmbito de procedimentos relativamente aos quais o ora Recorrente é totalmente alheio, não interessado nos mesmos. Tratam-se de informações relativas a procedimentos que envolvem 10 inspectores da IGJ, procedimentos nos quais o ora Recorrente nunca interveio e onde não estará identificado. Também nas decisões ali havidas o Recorrente não terá um interesse próprio e individualizado. Portanto, nenhum erro de julgamento pode ser imputado à sentença recorrida por aplicar o artigo 13.º da Lei n.º 46/2007, de 24.08, ao caso em apreço. Mas esse erro já procederá na medida em que foi negada procedência ao pedido, por se ter considerado que o pedido do Recorrente não estava suficientemente individualizado, delimitado ou identificado e por isso não preenchia o exigido no artigo 13º, n.º1, daquela lei. O direito à informação é um direito de natureza análoga aos direitos liberdades e garantias, que vem consagrado no artigo 268º, n.º 2, da CRP, que só pode ser restringido nos casos expressamente previstos na Constituição e por lei geral e abstracta. Partilha tal direito de informação do regime aplicável aos direitos, liberdades e garantias e a sua interpretação ter-se-á que fazer necessariamente àquela luz. Vigora aqui a regra do princípio do arquivo aberto ou da administração aberta, legalmente consagrado nos artigos 65º do CPA e 1º da Lei n.º 46/2007, de 24.98. O acesso à informação não procedimental compreende os direitos de consulta, de reprodução e de informação sobre a existência e conteúdo dos documentos administrativos – cf. artigos 5º e 11º da Lei n.º 46/2007, de 24.98. Nesta matéria não cabe à Administração criar quaisquer restrições, mas antes deve pautar a sua conduta por a mais ampla colaboração com o particular. Não pode a Administração adoptar uma postura passiva, remetendo para o particular a obrigação de conhecer os seus documentos e arquivos, mas ao invés, deve “conduzir” o particular na sua busca. Daí, a indicação do artigo 13º, n.º 5, daquela Lei, para que os funcionários prestem a assistência na identificação dos documentos pretendidos, «designadamente informando sobre a forma de organização e utilização dos seus arquivos e registos». (cf. ainda artigo 7º do CPA). Na mesma senda, estipula o artigo 9º a obrigação da indicação de um responsável pelo acesso à informação e o artigo 10º a obrigação de divulgação da informação. Igualmente, o artigo 13º, n.º 4, obriga a que a Administração indique ao requerente a deficiência de que padeça o seu requerimento, a fim de a mesma ser suprida e poder ser totalmente satisfeito o direito de informação do particular. Na regulamentação legal do acesso à informação não procedimental, ou seja, na Lei n.º 46/2007, de 24.98, prevê-se ainda no artigo 13º a forma como o particular deve formular o pedido de acesso – por escrito através «de requerimento do qual constem os elementos essenciais à sua identificação». E como acima se assinalou, se a Administração considerar que o pedido não é «suficientemente preciso» deve indicar ao requerente essa deficiência e convidá-lo a supri-la – cf. artigo 13º, n.º 4, da Lei n.º 46/2007, de 24.98. Mas ainda aqui, no âmbito deste juízo, a Administração haverá de agir em prol da satisfação do requerido, actuando em favor da satisfação do direito de informação do requerente, à luz do regime constitucional que enforma este direito. Não pode a Administração a pretexto de uma imprecisão do requerimento do requerente ou do seu não suprimento, pura e simplesmente, não prestar a informação, criando na prática uma restrição injustificada e não admitida ou consentida deste direito. Também não pode a Administração, a pretexto do trabalho de pesquisa que a satisfação do requerido implica ou da vastidão dos seus registos, remeter para o particular tal trabalho, desonerando-se dos seus deveres de colaboração e dos previstos no artigo 13º, n.º 5, da referida Lei, porquanto tal significaria uma verdadeira denegação do direito à informação. Apenas pode a Administração solicitar ao particular que «precise» o seu pedido, desde logo porque este vise uma precisa informação e a formule de forma imprecisa. Mas tudo à luz dos princípios da colaboração, da boa fé, da proporcionalidade e da adequação e por forma a não restringir os direitos constitucionais do particular. O que fica de fora desta obrigação da Administração, é unicamente a obrigação «de criar ou adaptar documentos para satisfazer o pedido» ou a «obrigação de fornecer extractos de documentos, caso isso envolva um esforço despropositado que ultrapassa a simples manipulação dos mesmos» - cf. artigo 11º, n.º 5, da Lei n.º 46/2007, de 24.98. Mas ainda aqui há que parametrizar esta regra face ao regime constitucionalmente aplicável e ainda à luz dos princípios da colaboração, da boa fé, da proporcionalidade e da adequação. Na sentença sub judice considerou-se que o ónus de identificação dos documentos cujo acesso se pretende impende sobre o interessado, não cabendo à Administração verificar todo o seu arquivo com vista à eventual localização da informação pretendida. Porém, da matéria factual apurada resulta que foi pedido pelo Recorrente para que se procedesse à passagem de cópias integrais autenticadas e/ou certidões de todos os actos, contratos, guias, recibos, documentos ou, de maneira geral, de quaisquer documentos escritos de onde constasse o registo integral e datado dos valores das remunerações, ajudas de custo, compensações ou benefícios auferidos, no período de tempo que mediou desde 1992 até ao presente, pelos Inspectores da IGJ, B..., C..., D..., E..., F..., G..., H..., I..., J...e K..., qualquer que fosse a sua proveniência, autor ou data de junção, bem assim como de quaisquer outros actos, decisões, deliberações, informações, pareceres, requerimentos, promoções ou, em geral, quaisquer outros documentos escritos ou noutro suporte que determinem ou demonstrem o percurso profissional e os valores remuneratórios mensais e anuais, correntes ou extraordinários, qualquer que seja a sua natureza, auferidos por qualquer dos trabalhadores acima referidos, no período antes designado. Alegou o Recorrente que com este pedido visava dotar-se de elementos que lhe permitissem proceder à reconstituição do trajecto remuneratório típico de trabalhadores, que o Recorrente considerava equiparar-se se não fosse uma conduta alegadamente ilícita da IGJ. Queria o Recorrente apurar qual a exacta medida das perdas patrimoniais por si experimentadas e conhecer quais as fases e datas de trajectos profissionais relativamente aos quais o seu deveria ser similar, por forma a proceder, a final, à execução de uma decisão judicial transitada em julgado. Ou seja, tem de ser face a este enquadramento concreto que a Administração tem de ponderar as exigências de identificação e precisão do requerimento do particular e contrabalança-las com a natureza do direito em questão e o cumprimento dos princípios da colaboração, da boa fé, da proporcionalidade e da adequação. E nesta ponderação cabia à Administração considera suficientemente preciso o requerimento do ora Recorrente, por se delimitar o pedido com relação aos 10 inspectores que se identificam nominalmente e com relação aos anos de 1992 até ao presente e por se indicar que se visam os actos, contratos, guias, recibos, documentos ou, de maneira geral, de quaisquer documentos escritos de onde constem o registo integral e datado dos valores das remunerações, ajudas de custo, compensações ou benefícios auferidos por tais trabalhadores, assim como os actos, decisões, deliberações, informações, pareceres, requerimentos, promoções ou, em geral, quaisquer outros documentos escritos ou noutro suporte que determinem ou demonstrem o percurso profissional e os valores remuneratórios mensais e anuais, correntes ou extraordinários, qualquer que seja a sua natureza, auferidos por aqueles trabalhadores naquele período. A tarefa de aferir se tais elementos constam apenas dos processos individuais destes 10 inspectores e de que concretos documentos constam ou se constarão de outros procedimentos avulsos, não pode ser remetida pura e simplesmente para o particular. Tal remissão seria exigir ao particular a tarefa hercúlea de conhecer e consultar todos os procedimentos da Administração em que pudessem estar tais documentos, identificá-los e delimitá-los concretamente, o que na prática seria denegar o seu direito de informação. O Recorrente também não solicitou que se criassem documentos específicos que satisfizessem a a sua busca ou que se fornecesse «extractos de documentos», que pudessem envolver «um esforço despropositado que ultrapassa a simples manipulação dos mesmos». Limitou-se a pedir, ao fim ao cabo, todos os documentos relativos àqueles 10 inspectores, desde 1992 até ao presente, que indiquem todos os valores que auferiram, seja de que natureza for e que indiquem os respectivos percursos profissionais. Este pedido está delimitado e precisado, cumprindo o artigo 13º da Lei n.º 46/2007, de 24.08, pois o Recorrente indicou os «elementos essenciais» à identificação do seu pedido de informação. Por esta razão tem de ser concedido o seu pedido de informação e haverá que revogar-se a decisão sindicada. Corroborando este raciocínio remete-se para o Ac. do STA n.º 896/07, de 17.11.2008 (in http://www.dgsi.pt), que apesar de prolatado ao abrigo de anterior regime é aqui plenamente aplicável, no qual se defendeu o seguinte: «será inaceitável que, perante um pedido de informação em que não está em causa nenhuma das limitações acima apontadas, a Administração responda com um “venha, consulte e informe-se”, na medida em que uma tal resposta não só viola o princípio de colaboração estabelecido no citado art.º 7.º do CPA como também viola o direito de ser informado sobre a existência e conteúdo dos documentos na posse da Administração estatuído no n.º 2 do art.º 7.º da Lei 65/93. Acrescendo que, em muitos casos, atenta a dificuldade em identificar a documentação onde se encontra a informação pretendida, uma tal resposta corresponderia a uma verdadeira denegação do direito à informação. É certo que este dever de informação não compreende, como é lógico e evidente, a elaboração de dossiers estruturados ou sínteses da documentação existente e bem assim o seu tratamento ou sistematização, nem a obrigação de produzir uma nova documentação com o propósito de satisfazer o pedido do Requerente porque tais actividades ultrapassam o dever legal de colaboração e de informação, mas também o é que a inexistência da obrigação de proceder a tais trabalhos não pode ser cobertura para uma interpretação minimalista do dever constitucional de prestar informações e de, na prática, constituir um boicote ao seu cumprimento. Ou seja, também aqui, importa que quer o Requerente da informação como a Administração ajam segundo os princípios da boa fé, da proporcionalidade e da adequação e tenham em conta que a prossecução do interesse público se deve fazer sempre no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos (vd. art.º 4.º do CPA). Pode, assim, concluir-se que a resposta da Administração não pode ser evasiva e tem de ser adequada às circunstâncias do caso concreto, o que quer dizer que, se necessário, poderá implicar a prestação das informações e dos esclarecimentos indispensáveis a uma profícua consulta. Mas, por outro lado, não compreende o tratamento, a sistematização ou a sintetização da informação solicitada. Ou seja, e dito de forma diferente, a resposta da Administração terá de ter em conta as circunstâncias de cada caso mas não poderá olvidar os direitos que assistem ao interessado e, por isso, nunca poderá constituir, sob a aparência da legalidade, uma verdadeira denegação ao direito de informação .(…).Deste modo, é inaceitável que a Administração lhe tenha respondido de uma forma que pode ser assim resumida “a consulta dos documentos pretendidos está à sua disposição por isso pode vir, consultar e informar-se” visto que uma tal resposta não só se traduz numa violação dos princípios da colaboração e da administração aberta e do dever de informar a que os Requeridos estão vinculados como também, na prática, corresponde a uma verdadeira denegação do direito de acesso às informações pretendidas constantes da documentação em seu poder. Com efeito, como é evidente, é de muito difícil concretização, senão de concretização impossível, que qualquer cidadão ou instituição, perante os milhares de documentos existentes em cada Ministério pudesse, por si só, apurar as contratações de consultadoria jurídica que cada um fez e obter as informações ora em causa. ». Não obstante o acima afirmado, nota-se, que tais documentos encerrarão indicações nominativas e dos autos não resulta que os inspectores a quem os dados dizem respeito tenham autorizado ora Recorrente a aceder a esses dados. Porém, face às razões invocadas pelo Recorrente, haverá de ter-se por demonstrado o interesse directo, pessoal e legitimo por banda do Recorrente no acesso a tais dados. Tal interesse também se mostra suficientemente relevante face a um princípio de proporcionalidade, não havendo razões para lhe negar o acesso aos dados nominativos que possam constar dos documentos peticionados – cf. artigo 6º, n.º 5, da Lei n.º 46/2007, de 24.08. A Decisão: Pelo exposto, acordam em conceder provimento ao recurso e, revogando-se a decisão recorrida, julga-se procedente o pedido de intimação e condena-se a entidade requerida a proceder à passagem de cópias integrais autenticadas e/ou certidões de todos os actos, contratos, guias, recibos, documentos ou, de maneira geral, de quaisquer documentos escritos de onde conste o registo integral e datado dos valores das remunerações, ajudas de custo, compensações ou benefícios auferidos, no período de tempo que mediou desde 1992 até ao presente, pelos Inspectores da IGJ, B..., C..., D..., E..., F..., G..., H..., I..., J...e K..., qualquer que seja a sua proveniência, autor ou data de junção, bem assim como de quaisquer outros actos, decisões, deliberações, informações, pareceres, requerimentos, promoções ou, em geral, quaisquer outros documentos escritos ou noutro suporte que determinem ou demonstrem o percurso profissional e os valores remuneratórios mensais e anuais, correntes ou extraordinários, qualquer que seja a sua natureza, auferidos por qualquer dos trabalhadores acima referidos, no período antes designado. Lisboa, de Dezembro de 2011 (Sofia David) (Carlos Araújo) (Teresa de Sousa)

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