I - O facto constitutivo do direito à isenção de sisa previsto no nº 31 do artigo 11º do CIMSISD é a realização do acto translativo do imóvel e não a data do início do procedimento destinado à obtenção desse benefício. II - As transacções de imóveis efectuadas após a entrada em vigor da Lei nº 30-G/00 de 29 de Dezembro, cujo nº 3 do artigo 7º revogou a isenção de sisa prevista naquele artigo, não gozam de isenção de sisa. III - O artigo 7º, nº 3 da Lei nº 30-G/00 não viola o princípio constitucional da protecção da confiança, que decorre do princípio do Estado de direito enunciado no artigo 2º da CRP.
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1.1. O Sub-Director Geral dos Impostos interpõe recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a impugnação que “A………”, com os sinais nos autos, instaurou contra o despacho de 28/11/2002 que lhe indeferiu o pedido de isenção de Imposto Municipal de Sisa. Para tal, nas alegações conclui o seguinte: A) A aliás douta sentença recorrida ao decidir anular o acto recorrido por o mesmo enfermar de vício de violação de lei, fez, salvo o devido respeito, uma incorrecta interpretação e aplicação aos factos do art. 11º do EBF e do nº 31° do art. 11° do CIMSISD, este último em confronto com o n° 3 do art. 7° da Lei 30-G/2000, de 29/12. B) Com a Lei nº 30-G/2000, o legislador pretendeu, inequivocamente, acabar com a isenção de sisa para as transmissões realizadas entre sociedades autorizadas a ser tributadas pelo novo regime de tributação dos grupos de sociedades e só foram mantidas, transitoriamente, as isenções referentes às transmissões efectuadas anteriormente à entrada em vigor da Lei 30-G/2000, desde que, nos três exercícios seguintes à transmissão as sociedades continuassem abrangidas pelo regime de tributação pelo lucro consolidado ou pelo regime especial de tributação dos lucros de sociedades (cfr. nº 3 do art.7°). C) Ao ter deliberado que a simples entrega de requerimentos, até finais do ano de 2000, solicitando a isenção de sisa, determinava o preenchimento dos requisitos da isenção, a sentença recorrida, salvo o devido respeito, foi para além da letra e do espírito do nº 3 do art. 7º da Lei 30-G/2010, tendo atribuído ou, mais propriamente, mantido, um beneficio fiscal já não contemplado por lei. D) Isto porque, em 2001 surge um novo regime de tributação de grupos de sociedades, vide art. 59º do CIRC, com a redacção que lhe foi conferida pela Lei 30-G/2010, o qual já não tem associado o beneficio fiscal de isenção de sisa para as transmissões efectuadas, a partir de 2001, entre as sociedades integradas no novo regime de tributação de grupos de sociedades. E) Daí que, a interpretação feita, pela Sentença recorrida, daquele nº 3 do art.º 7º da Lei 30-G/2010 seja, em nosso entender e salvo o devido respeito, para além de violadora da lei também inconstitucional, por violação do nº 2 do art. 103° da CRP e do principio da legalidade do sistema fiscal, que determina que os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os beneficias fiscais e as garantias dos contribuintes. F) A interpretação que a sentença recorrida faz do nº 3 do art. 7° da Lei 30-G/00, permite que o beneficio fiscal, extinto por lei a partir de certa data, 2001, ressurja e seja aplicado, face a uma interpretação que o legislador não quis, às transmissões efectuadas posteriormente à extinção do beneficio. G) Do efeito declarativo do reconhecimento do benefício que se encontrava previsto no nº 31 do art. 11° do CIMSISD, não resulta, como a sentença parece entender, que o direito à isenção de sisa se tenha constituído nas datas da entrega dos requerimentos. H) Com efeito, é completamente incorrecto e infundado não considerar o pressuposto do beneficio, “transmissão do bem” ou reconduzi-lo a uma denominada fase de execução do beneficio, quando a própria transmissão, sendo pressuposto da incidência tributária da sisa opera, simultaneamente, como facto impeditivo da tributação. I) Assim, um dos pressupostos do benefício é também a transmissão que, necessariamente, tem que se realizar num dos exercícios em que vigorava a autorização para a tributação pelo lucro consolidado, isto é, até 31/12/00. J) A data de apresentação do requerimento, não é nenhum pressuposto de atribuição do benefício. Trata-se tão-somente de um simples procedimento destinado à verificação da existência dos requisitos que, conjugadamente com a data da transmissão, habilita o sujeito passivo a beneficiar da isenção. K) Ora, no caso, não estão preenchidos os pressupostos da isenção, uma vez que, até 31/12/00, não se efectuaram as pretendidas transmissões de imóveis. L) Pelo que, estando provado que não houve transmissão de imóveis no ano de, 2000, não se vê como podia a então recorrente gozar do benefício de sisa para as transmissões efectuadas a partir de 2001, não obstante o nº 3 do art. 7° da Lei 30-G/00. M) E nem se vislumbra como é que a Sentença recorrida menospreza a questão da transmissão quando é a ela que a lei expressamente se refere, designadamente no 3 do art. 7° da Lei nº 30-G/00, como facto/pressuposto do beneficio de sisa e como pressuposto de manutenção do mesmo beneficio. 1.2. Não houve contra-alegações 1.3. O Ministério Público não emitiu parecer. 2. A sentença deu como assente os seguintes factos: 1) Em 12/1/2000 o recorrente solicitou ao Exmo. Senhor Ministro da Finanças autorização para que o seu lucro tributável em IRC fosse calculado, a partir do ano de 2000, inclusive, conjuntamente com o da sociedade denominada B………”, ao abrigo do disposto no art. 59° do Código do IRC tendo obtido deferimento por um período de 5 anos compreendendo os exercícios de 2000 a 2004, por despacho do Exmo. Senhor Director de Serviços do IRC de 27/03/2000; 2) Em 23/10/2000 solicitou a recorrente ao Exmo. Senhor Ministro das Finanças nos termos do art.º 11°, n° 31 do CIMSISSD a isenção da sisa relativamente aos dois imóveis identificados no pedido; 3) A solicitação da DSISTP informa o recorrente em 2/2/2001 que não havia realizado ainda a escritura de compra e venda por estar a aguardar resposta ao pedido de isenção da Sisa; 4) O recorrente solicitou em 19/06/2001 informação sobre o estado do pedido, tendo sido informado que se encontrava pendente de informação e despacho, pedindo a DSISTP que fosse comprovada a opção pelo novo regime de tributação dos grupos de sociedades, tendo o recorrente comprovado que essa opção já havia sido efectuada; 5) Em 23/12/2002 é notificado ao recorrente o despacho ora em recurso com os pareceres que lhe estão subjacentes bem como é informado de que o seu pedido de reconhecimento de isenção havia sido deferido em 21/12/2000, mas que, com a entrada em vigor da Lei nº 30-G/2000 de 29 de Dezembro, foi revogado o nº 31 do art.º 11° do Código, sem que tivesse sido notificado o referido deferimento, por falta de tempo útil para o efeito, dada a data dos despachos e a época natalícia que decorria e, assim que, dada a referida revogação tinha perdido utilidade o deferimento ocorrido. 3. A questão que vem em recurso consiste em saber. (i) qual o momento em que se verificam os pressupostos para a concessão da isenção de sisa; (ii) e se é de aplicar ao caso o artigo 7º, nº 3 da Lei nº 30-G/2000, de 29/12, que revogou o nº 31 do artigo 11º do Código do Imposto Municipal da Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações (CIMDISD). A recorrida, que havia optado pelo regime especial de tributação dos grupos de sociedades, em 23/10/2000, solicitou ao Ministro das Finanças a isenção da sisa para a aquisição de dois imóveis, pedido que acabou por ser indeferido pelo despacho impugnado, com o fundamento em que a Lei nº 30-G/00 revogou, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2001, a norma que concedia tal benefício fiscal. A sentença recorrida anulou esse acto por considerar que: (i) o direito ao benefício fiscal reporta-se à data da verificação dos respectivos pressupostos e não à data em que se inicia o procedimento destinado à sua obtenção, como expressamente se consagra no nº 2 do art. 4º e art. 11º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF); (ii) os pressupostos da concessão da isenção prevista no nº 31 do art. 11º do CIMSISD não são a transmissão dos imóveis, mas sim que o requerente se encontre em regime de tributação pelo lucro consolidado e que o reconhecimento da isenção seja pedido antes do acto ou facto translativo do bem; (iii) o nº 3 do art. 7º da Lei nº 30-G/2000, ao revogar o nº 31 do art. 11º do CIMSISD, não tem eficácia retroactiva, porque não veio regular sobre os pressupostos dos pedidos de isenção ainda pendentes. Diferente é o entendimento do recorrente, para quem o pressuposto do benefício é a “transmissão do bem” e não a data da apresentação do requerimento. Por isso, “a interpretação que a sentença recorrida faz do nº 3 do art. 7° da Lei 30-G/00, permite que o beneficio fiscal, extinto por lei a partir de certa data, 2001, ressurja e seja aplicado, face a uma interpretação que o legislador não quis, às transmissões efectuadas posteriormente à extinção do beneficio”, o que é inconstitucional por violação do nº 2 do artigo 103º da CRP. Esta questão já foi julgada, quer por este Tribunal, quer pelo Tribunal Constitucional, numa argumentação que, a nosso ver, se deve continuar a defender. As normas invocadas nos autos são as seguintes: O nº 31 do artigo 11º do CIMSISD preceitua que ficam isentas de sisa, “as transmissões realizadas entre sociedades autorizadas a ser tributadas pelo lucro consolidado, desde que as mesmas se operem durante os exercícios em que vigorar a autorização para a tributação segundo aquele regime”. O n.º 3 do artigo 7º da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro prescreve que, "é revogado o n.º 31.º do artigo 11.º e o n.º 7.º do artigo 16.º do Código do Imposto Municipal de Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações, deixando de beneficiar da isenção de imposto municipal de sisa as transmissões anteriores à entrada em vigor da presente lei logo que as sociedades deixem de estar abrangidas, nos três exercícios seguintes ao da transmissão, pelo regime da tributação pelo lucro consolidado ou pelo regime especial de tributação dos lucros de sociedades". Perante estas normas, a jurisprudência procurou resolver dois problemas: (i) o momento da constituição do direito ao benefício fiscal; (ii) a determinação do âmbito temporal da nova lei e da lei antiga. Quanto ao primeiro, nos acórdãos desde Tribunal de 18/04/2007 e de 16/1/2008, proferidos nos recursos nº 0905/06 e nº 0316/07 (in, www.dgsi.pt), entendeu-se, ao contrário do decidido na sentença recorrida, que o pressuposto da constituição do benefício fiscal na esfera jurídica do contribuinte é a “transmissão dos prédios”. Diz-se que: «da análise do referido art. 11, n.º 31 ressalta com mediana evidência que o legislador elegeu como pressuposto da constituição do benefício fiscal na esfera jurídica do contribuinte, ainda que esteja dependente de reconhecimento, com efeito meramente declarativo (art. 4.º, n.º 2 do EBF), pela administração fiscal, a realização do acto translativo, “enquanto facto tributário do qual emerge a obrigação tributária” e não, como se decidiu no aresto recorrido, a data do início do procedimento destinado à obtenção do benefício». Ficou, pois, decidido que o facto relevante para a determinação da norma aplicável (no tempo) é o da transmissão dos imóveis, e não o do requerimento do pedido de isenção da sisa, como se decidiu na sentença recorrida. Na verdade, a expressão normativa «transmissões realizadas», parece não deixar dúvidas que o direito à isenção apenas nasce com a transmissão e não com a aquisição do “estatuto” de sociedade sujeita ao regime de regime da tributação pelo lucro consolidado ou pelo regime especial de tributação dos lucros de sociedades. A previsão da norma tem dois pressupostos: um objectivo, que é a transmissão e outro subjectivo, que é a sujeição ao regime especial de tributação. Por isso, apenas a verificação histórica destes dois pressupostos fará nascer o direito à isenção. Ora, se o facto constitutivo do direito à isenção da sisa é a transmissão dos prédios, e se até à data da revogação do benefício não ocorreu qualquer a transmissão, então aquele direito nunca poderia ter surgido na esfera jurídica da recorrida, ainda que tivesse sido peticionado em data anterior à extinção do benefício. Quando muito poder-se-á dizer que a aplicação da revogação do referido benefício fiscal aos actos translativos realizados pelas sociedades que na data da revogação estavam abrangidas pelo regime tributação pelo lucro consolidado ou pelo regime especial de tributação dos lucros de sociedades implica frustração de expectativas fundadas e legítimas na subsistência de um beneficio fiscal, violando-se, desse modo, o princípio da confiança. Mas agora o problema assume outros contornos, pois é necessário saber se a «norma revogatória» constante da primeira parte do nº 3 do artigo 7º da Lei nº 30-G/2000, aplicável a transacções ocorridas depois da sua entrada em vigor e a sociedades abrangidas pelo regime de tributação do lucro consolidado ou pelo regime especial de tributação dos lucros de sociedades é inconstitucional por violação do princípio da irretroactividade da lei fiscal ou o princípio da protecção da confiança. O problema foi colocado ao Tribunal Constitucional que, no acórdão nº 128/09, de 12/3/09, não julgou inconstitucional «a norma ínsita ao artigo 7.º, n.º 3 da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, na parte em que revoga o n.º 31 do artigo 11º do Código Municipal de Sisa e de Imposto sobre Sucessões e Doações quando aplicável a transacções ocorridas depois da sua entrada em vigor e a sociedades abrangidas pelo regime de tributação do lucro consolidado». Quanto à questão da proibição da retroactividade da lei fiscal considerou o Tribunal que: «a retroactividade proibida no n.º 3 do artigo 103.º da Constituição é a retroactividade própria ou autêntica. Ou seja, proíbe-se a retroactividade que se traduz na aplicação de lei nova a factos (no caso, factos tributários) antigos (anteriores, portanto, à entrada em vigor da lei nova). Ora, se o Supremo Tribunal Administrativo entende, como se viu já, que o que constitui a relação jurídica é, neste caso, a transmissão dos imóveis – por ser esse, no seu entendimento, o facto tributário hoc sensu, ou o facto-pressuposto da constituição da obrigação tributária – tem forçosamente que concluir-se também que, antes dele, não existia nada que se assemelhasse a uma «relação tributária» já formada. Assim sendo, deve dizer-se que decorre dos autos que o acto constitutivo da relação tributária (aquele que o Supremo Tribunal Administrativo elegeu enquanto momento relevante para determinação da lei aplicável (no tempo)) decorreu depois da entrada em vigor da lei nova: com efeito, a Lei nº 30-G/2000 entrou em vigor em 2001; os actos de transmissão de imóveis foram declarados em 2003. Quer isto dizer que, in casu, a norma sob juízo se aplicou a factos novos, ocorridos depois da sua entrada em vigor. Não havendo por isso – e retomando a formulação tradicional do princípio da irretroactividade da lei fiscal – aplicação da lei nova a factos (tributários) antigos, não pode igualmente concluir-se que existiu violação do disposto no nº 3 do artigo 103º da CRP». Mas se a lei não é retroactiva, há todavia um “facto passado” susceptível de criar expectativas jurídicas em obter a isenção de sisa, que é o pedido efectuado antes da extinção do benefício. Pode sustentar-se que a revogação do benefício fiscal operada pela norma do artigo 7º, nº 3 da Lei n.º 30-G/2000 atinge a «convicção» (as expectativas juridicamente criadas) de quem gozaria desse benefício durante o período em que estava abrangida pelo regime de tributação pelo lucro consolidado ou pelo regime especial de tributação dos lucros de sociedades. Este caso de «retroactividade inautêntica ou retrospectiva» só pode ser tratado à luz do princípio da protecção da confiança. O referido acórdão do Tribunal Constitucional procurou indagar se o «especial estatuto» das sociedades sujeitas ao regime especial de tributação indicado no nº 31 do artigo 11 do CIMSISD justificava a existência de uma expectativa jurídica que, à luz do princípio da confiança, torne inconstitucional a norma do nº 3 do artigo 7º da Lei nº 30-G/2000. E chega à conclusão que não, com a seguinte argumentação: “A norma sancionada, incluída na categoria de benefício fiscal, veio, muito simplesmente, revogar um tratamento excepcional. Por outras palavras, e considerando a regra geral à data aplicável, segundo a qual todas as transmissões, a título oneroso, do direito de propriedade ou de figuras parcelares desse direito, sobre bens imóveis são tributadas em sede de Sisa, o que n.º 31 do artigo 11.º do CIMSISSD determina é que, a esta regra geral, se aplique uma excepção à incidência do imposto: transacções entre sociedades, em princípio sujeitas a imposto de Sisa, estarão isentas de Sisa quando as sociedades relevantes sejam tributadas ao abrigo do regime do lucro consolidado. Esta excepção é, todavia, condicionada: as transacções serão isentas de Sisa conquanto que as sociedades transmitentes e transmissária se mantenham abrangidas pelo regime de tributação do lucro consolidado nos três anos seguintes ao da transmissão (cfr. n.º 7 do artigo 16.º do CIMSISSD). Este regime aponta, necessariamente, para uma natureza precária da isenção. A este respeito, importa ainda dizer que outro elemento há, para além do que dispõe o n.º 7 do artigo 16.º do CIMISISSD, que indicia o carácter necessariamente temporário da isenção. Ao integrar-se na categoria geral dos benefícios fiscais (artigo 1º, nº 2 do Estatuto dos Benefícios Fiscais), a isenção apresenta-se tendencialmente como uma medida de natureza conjuntural, ou seja, decorrente de uma opção legislativa por natureza mutável. Se se recordar a distinção feita, a propósito dos elementos essenciais do imposto, por Alberto Xavier (Manual de Direito Fiscal, I, Lisboa, 1974, p. 282) entre contribuinte isento e não contribuinte, a situação da recorrida é a de uma contribuinte que, em dado contexto temporário, se viu na posição de contribuinte isento. Assim sendo, e atentando agora aos pressupostos ou requisitos da protecção de confiança que se deixaram já enunciados, necessário é concluir pelo não preenchimento de, pelo menos, dois desses pressupostos. Desde logo, não pode afirmar-se que, in casu, tenha o Estado (maxime, o legislador) encetado comportamentos capazes de gerar nos privados «expectativas» de continuidade (pois desde o momento em que a isenção foi aprovada que os particulares sabem tratar-se, aqui, de uma situação excepcional e condicionada). Depois, também não pode considerar-se que fossem fundadas em «boas razões» as expectativas privadas de manutenção do regime jurídico da isenção: já que de nenhum elemento do regime de Sisa se pode deixar de retirar a regra geral segundo a qual todas as transmissões de imóveis são objecto de tributação, a revogação da norma que previa a isenção não podia surgir aos olhos da recorrida como algo de improvável ou inverosímil. Atenta a especial natureza desta isenção – que, repete-se, desde o início da sua consagração assumia uma natureza condicional (porque dependia da manutenção de uma situação de tributação do lucro consolidado pelo prazo mínimo de três anos) – dos autos decorre, pois, que a recorrida tem, aqui, unicamente uma expectativa de manutenção de um status quo, expectativa esta que não pode considerar-se juridicamente relevante para o efeito de merecer a tutela dispensada pelo princípio constitucional da tutela da confiança. Adianta-se ainda que também o terceiro requisito – o de que a recorrida fez planos de vida, investimentos, tendo em conta a expectativa da continuidade do «comportamento» estadual – não se afigura preenchido. Pode, neste caso, indagar-se sobre a existência de um «investimento» na confiança sob duas perspectivas: a de que a recorrida transmitiu os imóveis apenas porque confiava que esta transmissão estaria isenta de Sisa; ou, ainda, a de que a recorrida optou pelo regime de tributação pelo lucro consolidado apenas porque confiava que as transmissões «entre-grupo» não seriam tributadas em sede de Sisa. Quanto à primeira vertente enunciada, decorre claramente dos autos não ter ocorrido este investimento. Com efeito, à data das transmissões, a recorrida sabia já que não lhe seria eventualmente aplicável o regime de isenção de Sisa. Acresce que não se pode afirmar, com certeza, ter a recorrida optado pelo regime de tributação pelo lucro consolidado apenas porque este regime lhe proporcionava a vantagem consubstanciada na isenção de Sisa, no âmbito das transmissões entre sociedades do mesmo grupo económico. É certo que a concessão de uma isenção de pagamento de imposto de Sisa, no caso das transmissões realizadas entre sociedades do mesmo grupo económico, foi gizada pelo legislador com o intuito de incentivar a criação de «grupos empresariais» pois, caso contrário, seria necessário justificar o tratamento privilegiado destas transmissões face a todas as outras transmissões que são não-isentas de Sisa. Mas, a este respeito, importa notar que a isenção de Sisa não era a única vantagem decorrente da opção por este regime de tributação. Na verdade, o regime de tributação pelo lucro consolidado (introduzido pelo Decreto-Lei n.º 414/87, de 31 de Dezembro, alterado pela Lei n.º 71/93, de 26 de Novembro) proporcionava outras vantagens para o grupo societário, nomeadamente: a eliminação total da dupla tributação, em sede de IRC e de imposto sobre as Sucessões e Doações por Avença, relativamente aos lucros/dividendos distribuídos entre as sociedades do grupo, a não realização de quaisquer retenções na fonte, em sede de IRC, nas relações entre as sociedades do grupo, a possibilidade de as mais e menos-valias apuradas na transmissão onerosa de elementos do activo imobilizado, assim como quaisquer ganhos e perdas realizados em transacções entre as diversas sociedades do grupo não serem consideradas ganhos/perdas na determinação da matéria colectável em sede de IRC e a possibilidade de compensação dos lucros e prejuízos gerados no mesmo ano pelas diversas sociedades do grupo (Assim, Luís Belo, “As novas regras da tributação pelo lucro consolidado”, Fisco, Vol. 5, Julho 1994, pp. 3-11 e, do mesmo autor, “Algumas reflexões ao nível do impacto sobre os grupos económicos da designada reforma fiscal”, Fisco, Vol. XII, t. 99/100, pp. 67-83. Por esta razão, não se pode aqui dizer que tenha sido necessariamente a isenção sob análise a justificação da opção da recorrida por este regime de tributação. Ou seja, não se vislumbra aqui que a recorrida tenha realizado um investimento na confiança da manutenção do regime legal vigente. Assim sendo, também o terceiro requisito para protecção da confiança não se afigura, no caso, preenchido. Não tem por isso razão o tribunal a quo quando sustenta ser materialmente inconstitucional a norma ínsita ao artigo 7.º, n.º 3 da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, na parte em que revoga o n.º 31 do artigo 11.º do Código Municipal de Sisa e de Imposto sobre Sucessões e Doações”. Concordamos basicamente com esta jurisprudência constitucional, o que necessariamente conduz à improcedência do recurso. 4. Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso do Supremo Tribunal administrativo em: a) - Conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida; b) - Negar provimento à impugnação judicial e manter os despacho impugnado. c) - Custas pela recorrida, apenas na 1ª instância. Lisboa, 7 de Dezembro de 2011. – Lino Ribeiro (relator) - Casimiro Gonçalves - Dulce Neto. Segue acórdão de 23 de Fevereiro de 2012: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo O Sub-Director Geral dos Impostos vem solicitar a rectificação de um erro de escrita na fundamentação do acórdão que, no seu entender, pode suscitar dúvidas quanto ao sentido da decisão. Cumpre decidir. O acórdão proferido nos autos concedeu provimento ao recurso interposto pelo requerente, revogou a sentença recorrida e negou provimento à impugnação judicial, mantendo o despacho impugnado. Na parte dos fundamentos, após se reproduzir a posição que o Tribunal Constitucional produziu sobre a matéria, que vai no sentido defendido pelo recorrente, diz-se o seguinte: «concordamos basicamente com esta jurisprudência constitucional, o que necessariamente conduz à improcedência do recurso». Ora, há manifestamente um lapso de escrita, porque tudo o que se tinha acabado de escrever, e com o qual se concordou, era no sentido da procedência do recurso, como de resto de conclui na parte decisória do acórdão. Por isso, nos termos dos artigos 716º e 667º do CPC impõe-se, em conferência, corrigir tal erro de escrita. Pelo exposto, acordam em rectificar a parte do acórdão onde se lê «concordamos basicamente com esta jurisprudência constitucional, o que necessariamente conduz à improcedência do recurso», passando a ler-se «concordamos basicamente com esta jurisprudência constitucional, o que necessariamente conduz à procedência do recurso». Sem custas. Lisboa, 23 de Fevereiro 2012. - Lino Ribeiro (relator) - Casimiro Gonçalves - Dulce Neto.