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Acórdão TR Guimarães de 2021-02-18

10960/16.4T8PRT.G1

TribunalTribunal da Relação de Guimarães
Processo10960/16.4T8PRT.G1
RelatorJosé Flores
DescritoresCompetência em Razão da Matéria, Princípio da Adesão, Caducidade, Abuso de Direito, Valor da Indemnização
Nº do DocumentoRG
Data do Acordão2021-02-18
VotaçãoUnanimidade
Meio ProcessualAPELAÇÃO
DecisãoRecurso Principal Parcialmente Procedente/recurso Subordinado Improcedente
Indicações Eventuais1.ª SECÇÃO CÍVEL

Sumário

Sumário (do relator): A nulidade da sentença, prevista no art. 615º, nº 1, al. d), do Código de Processo Civil, só ocorre quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes da posição dos pleiteantes, nomeadamente os que se prendem com a causa de pedir pedido e excepções e não quando tão só ocorre mera ausência de discussão das “razões” ou dos “argumentos” invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas. Aliás, se essa falta se limita ao julgamento da matéria de facto, será antes adequada a reapreciação da respectiva decisão nos termos previstos nos arts. 640º e 662º, do Código de Processo Civil. A impugnação, por via de recurso, das decisões intercalares previstas no art. 644º, nº 3, do Código de Processo Civil, pressupõe a apresentação de requerimento elaborado nos termos do art. 637º, do mesmo Código, que concretize minimamente esse recurso distinto e permita a sua apreciação autónoma à luz da previsão do seu art. 641º. O art. 97º, nº 2, do Código de Processo Civil, estipula que a violação das regras de competência em razão da matéria que apenas respeitem aos tribunais judiciais só pode ser arguida, ou oficiosamente conhecida, até ser proferido despacho saneador, ou, não havendo lugar a este, até ao início da audiência final. A violação do princípio da adesão estabelecido no art. 71º, do Código de Processo Penal, consubstanciará não uma caducidade mas antes, se o Tribunal em que foi apresentada a demanda tiver competência puramente cível, excepção de incompetência material, o que importaria absolvição de instância ou indeferimento liminar, de acordo com o caso (cf. arts. 99º, nº 1, 590º, nº 1, 130º, da Lei nº 62/2013, 278º, nº 1, al. a), 576º, 577º, al. a), e 578º, do Código de Processo Civil). No caso em que o Tribunal for ainda materialmente competente para apreciar a pretensão na adequada instância criminal (cf. art. 130º, da L.O.S.J.), mas está impedido de o fazer na instância de natureza cível que se concretizou, estaremos perante uma excepção dilatória inominada (cf. art. 576º, nºs 1 e 2, e 577º, do Código de Processo Civil), que importaria a absolvição do Réu da instância do processo cível e não do pedido. Ocorrendo factos subsumíveis à previsão do art. 72º, nº 1, al. a) e c), do Código de Processo Penal, ainda que o pedido de indemnização cível pelos factos julgados em processo-crime pendente seja indeferido por extemporâneo, é, de acordo com o princípio da opção aí estabelecido, admissível, pelos mesmos factos, a dedução em separado e em instância cível dessa pretensão indemnizatória, direito à acção constitucionalmente garantido que não pode ser limitado por circunstâncias que não resultem de lei expressa e não respeitem o estabelecido no art. 20º, da Constituição da República Portuguesa. Não constitui abuso de direito, previsto no art. 334º, do Código Civil, a dedução dessa pretensão alternativa, ainda que dilatada num tempo circunscrito. O que se pretende em face de recurso de apelação é apenas a modificação de uma determinada decisão que, no tocante à matéria de direito, terá de ser questionada nos moldes previstos no nº 2, desse art. 639º, e, se contender com a autónoma fundamentação de facto, deve observar o que dita o art. 640º, do mesmo Código, sem prejuízo do estipulado no seu art. 662º. São inadmissíveis impugnações em bloco que avolumem num ou em vários conjuntos de factos diversos a referência à pertinente prova que motiva a pretendida alteração das decisões e que, na prática, se reconduzem a uma impugnação genérica, ainda que parcelar. A falta de especificação em sede de conclusões dos pontos da matéria a rever nos termos do art. 640º, do Código de Processo Civil, bem como da decisão que se pretende relativamente a cada um deles, é motivo de rejeição total ou parcial do recurso nessa matéria. Para os efeitos de cumprimento do ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida, cabe ao apelante argumentar, de forma concretizada, no sentido de que os meios de prova produzidos no processo, apreciados em conjunto e de forma crítica, impõem uma convicção diversa quanto à reconstituição dos factos, atingindo essa diferente versão dos factos o patamar da probabilidade prevalecente, arredando - do mesmo passo - a versão aceite pelo tribunal a quo. O advogado, beneficia das imunidades que forem necessárias ou indispensáveis ao desempenho do mandato ou função que desempenha na administração da justiça, estando sujeito, apenas a critérios de legalidade e às regras deontológicas próprias da profissão, das quais se realça a obrigação de honestidade, probidade, rectidão, lealdade, cortesia e sinceridade. Todavia, na sua actuação pública e profissional deve agir de modo adequado à dignidade e responsabilidades da função que exerce, cumprindo pontual e escrupulosamente esses deveres consignados no respectivo Estatuto e na lei, sempre, de modo “responsável”. Se os factos apurados não deixam dúvidas sobre a desadequação (desnecessidade, dispensabilidade ou inutilidade) da sua conduta e sobre intenções que não se coadunam com esse dever de agir ou as funções exercidas, cessam as imunidades previstas no art. 208º, da Constituição da República Portuguesa, e na legislação ordinária que o concretiza. Num contrato de seguro obrigatório, não são oponíveis ao lesado beneficiário, enquanto terceiro que nele não é parte, as excepções que ali são previstas e que se referem ao incumprimento ou omissão por parte do segurado ou do tomador do seguro dos deveres que para ele decorrem de tal contrato ou da lei, sem prejuízo do direito de regresso da seguradora, nos termos do art.º 101.º n.º 4 da Lei do Contrato de Seguro. Estando estabelecidas nesse tipo de contratos convenções contratuais relativas à franquia que estipulam a inoponibilidade da mesma a terceiros lesados, a demandada seguradora deve ser condenada no seu pagamento solidário. Tendo em conta o grau de culpa apurado, os danos psíquicos relativamente graves sofridos pela lesada, a situação económica que se presume ter a Ré seguradora, a circunstância de estarmos perante lesada que exerce funções como magistrada judicial e para a qual se presume serem pessoalmente determinantes os afectados valores da honra e brio profissional, afectada por diversos factos que envolvem denuncias caluniosas, disciplinares e criminais bem como actos difamatórios, julga-se equitativo o valor de 16000 euros de indemnização. Se o julgador não fixa a indemnização por danos de forma actualizada, são devidos juros desde a citação, por aplicação das disposições conjugadas dos citados artºs 566º, nº 2 e 805º, nº 3 do CC. A repartição de custas entre vários responsáveis, nos termos do art. 527º, do Código de Processo Civil, deve corresponder, com a maior acuidade possível, à proporção do vencimento de cada parte.


Texto Integral

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES 1. RELATÓRIO Veio a Autora, S. L., instaurar acção declarativa com processo comum declarativo contra os Réus A. M. e I. A., alegando, em síntese, exercer funções como juíza, sendo o 1º Réu, advogado, e sendo a 1ª Ré mãe do 2º Réu, o qual seria advogado, tendo representado a sua progenitora no âmbito dos processos-crime nº 290/06.5TABGC e 985/06.3TABGC que correram termos no 2º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Bragança e que foram, na altura tramitados pela Demandante, na altura, a exercer funções nesse Tribunal. Concluiu, pedindo a condenação dos Réus no pagamento de indemnização no referido valor de € 40.000,00, acrescida de juros de mora a contar da citação. Regularmente citado, veio o 1º Réu, A. M., deduzir Contestação a fls. 178 e ss., impugnando e excepcionando. Concluiu o 1º Réu no sentido de requerer a respectiva absolvição do pedido, deduzindo ainda pedido de intervenção principal provocada da Chamada, X Seguros Gerais, S.A. por ser a Seguradora para a qual se encontra transferida responsabilidade civil por actos praticados no exercício da profissão de advogado. Veio ainda a 2ª Ré, I. A., deduzir Contestação a fls. 339 e ss., por excepção e impugnação. Concluiu a 2ª Ré no sentido da respectiva absolvição do pedido, mais requerendo a condenação da Autora como litigante de má-fé em multa nunca inferior a € 5.000,00 e em indemnização de igual montante. *Foi deferido (fls. 401-402) o pedido de intervenção principal provocada da Seguradora X Seguros Gerais, S.A. (cf. art. 319º do C.P.C.) deduzido pelo 1º Réu, tendo a referida Chamada apresentado Contestação a fls. 405 e ss., nos termos da qual alegou excepcionou e impugnou a acção. Concluiu pela respectiva absolvição do pedido. *A Autora respondeu às excepções de caducidade da acção por violação do princípio de adesão e de prescrição a fls. 464 e ss., tendo ainda pedido a condenação do Réu, A. M., como litigante de má-fé. A fls. 616 e ss. foi proferido despacho saneador, nos termos do qual se concluiu pela improcedência da excepção relativa à violação do princípio de adesão, bem como da excepção de prescrição, indicando-se o objecto do litígio, bem como seleccionando-se os temas de prova. A Chamada e o Réu A. M. interpuseram recursos de apelação relativamente a tais decisões de indeferimento das referidas excepções, tendo o Tribunal da Relação de Guimarães (cfr. fls. 469 e ss. do apenso de recurso com subida em separado) decidido não conhecer de tais recursos quanto à questão da eventual violação do princípio de adesão (artigo 644º nº3 do CPC) e indeferido os mesmos quanto à excepção de prescrição por entender, em conformidade com o decidido em 1ª Instância, que o direito indemnizatório invocado pela Autora não se encontrava prescrito. Após audiência prévia realizou-se a audiência de discussão e julgamento, tendo de seguida sido proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente com o seguinte dispositivo: “I. Condenar os Réus, A. M. e X – Seguros Gerais, S.A. a pagar solidariamente à Autora, S. L., a quantia de € 16.000,00 (dezasseis mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal civil aplicável, contados estes desde a citação até efectivo e integral pagamento daquela quantia. II. Absolver os referidos Réus do demais peticionado. III. Absolver a Ré, I. A., da totalidade do pedido. IV. Absolver a Autora do pedido de condenação como litigante de má-fé deduzido pela Ré, I. A.. V. Absolver o Réu A. M. do pedido de condenação como litigante de má-fé deduzido pela Autora, S. L.. VI. Condenar a Autora, bem como os Réus, A. M. e X – Seguros Gerais, S.A. em custas, na proporção do respectivo decaimento, o qual se fixa em ½, para a Demandante, e ½, para os referidos Demandados.“ Inconformada com essa decisão, a Ré X, acima identificada, apresentou recurso da mesma, que culmina com as seguintes Conclusões. 1.- A. A – DA VERIFICAÇÃO DA VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ADESÃO E DA CADUCIDADE DO DIREITO DE ACÇÃO I. De acordo com a petição inicial, os factos imputados pela Recorrida aos RR. foram objecto de apreciação no âmbito dos processos-crime n.ºs 192/08.0TABGC e 177/10.7TABGC, conforme resulta dos artigos 9.º e 24.º da petição inicial. II. Por força de tal realidade, cabia à Recorrida, ao abrigo do Princípio da Adesão, previsto no art. 71.º do Código de Processo Penal, deduzir a sua pretensão indemnizatória naqueles processos. III. Em sede de petição inicial não apresentou a Recorrida a mínima explicação para ter violado o Princípio da Adesão, contemplado no art. 71.º do CPP. IV. Ora, a lei processual penal consagra o princípio da adesão obrigatória – art.º 71º do CPP. V. Em regra, o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é sempre deduzido em processo penal, só excepcionalmente podendo ser pedido, ou arbitrado, fora dele. VI. Os casos de dedução do pedido cível em separado constam taxativamente do artigo 72º do Código de Processo Penal e as situações, aí previstas, configuram excepções ao princípio da adesão incumbindo à parte que delas quer tirar proveito a alegação e prova dos pertinentes factos. VII. A Recorrida não fez qualquer prova, muito menos no momento próprio, ou seja, na petição inicial, dos fundamentos para a preterição do princípio da adesão. VIII. Não tendo tal ocorrido, e por força dos princípios do dispositivo, da preclusão e da auto-responsabilização das partes, ficou a Recorrida impossibilitada de se fazer valer de tal alegação. IX. À verificação da violação do princípio da adesão não obsta a pronúncia da Recorrida, em momento posterior ao da petição inicial, porque, a invocação da verificação de alguma(s) das excepções previstas no art. 72.º do CPP constitui, no caso concreto, uma situação de abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium, por parte daquela. X. Efectivamente, perscrutado o documento n.º 6 da petição inicial, fácil é de constatar que os presentes autos não constituem a primeira tentativa da Recorrida de reclamar dos RR. o pagamento de uma indemnização, em resultado de alegadas condutas ilícitas, apreciadas em sede do processo-crime n.º 177/10.7TABGC. XI. A Recorrida deduziu pedido de indemnização civil no âmbito daquele processo, não tendo o mesmo sido apreciado, por força da dedução extemporânea do mesmo. XII. Tendo a Recorrida deduzido pedido de indemnização civil no âmbito do processo-crime n.º 177/10.7TABGC, o qual apenas não foi admitido por ter sido deduzido extemporaneamente, é evidente que, a Recorrida não pretendia fazer-se valer de uma qualquer eventual excepção ao Princípio da Adesão, prevista no art. 72.º do CPP, ao contrário do que veio, uma vez mais, tardiamente, a alegar nos presentes autos. XIII. A Recorrida pretendia, efectivamente, deduzir o seu pedido de indemnização no âmbito do processo-crime n.º 177/10.7TABGC, tal como fez, apenas não logrando a apreciação daquele por responsabilidade própria. XIV. Nessa sequência, a instauração dos presentes autos ou, pelo menos, a invocação, tardia, da verificação de algum (s) dos fundamentos previstos no art. 72.º do CPP constitui, por tal, um abuso de direito, porquanto consubstancia uma actuação processual da Recorrida frontalmente contraditória com comportamento processual anterior (que, por culpa própria – diga-se –, soçobrou), não podendo, em consequência, o douto Tribunal a quo, como fez, ignorar toda esta essencial realidade processual e considerar, sem mais, a não verificação da excepção de violação do Princípio da Adesão. XV. A acrescer, a presente acção ter dado entrada em juízo apenas em 24 de Maio de 2016, ou seja, mais de seis anos depois da alegada prática dos factos criminosos. XVI. Com a dedução do pedido de indemnização em sede de processo-crime, criou a Recorrida nos RR. a confiança de que era sua pretensão concentrar toda a querela em volta dos factos que deram origem aos processos-crime no seu local próprio, o processo penal. XVII. Confiança que os RR. foram vendo sedimentada a cada ano que passava e que apenas viram frustrada quando, volvidos todos aqueles anos, foram confrontados com a citação para a presente acção. XVIII. Face às evidências, constantes dos autos, e à utilização abusiva, por parte da Recorrida, de institutos processuais, designadamente a presente acção declarativa de condenação, deveria o douto Tribunal a quo ter considerado verificada a excepção de violação do Princípio da Adesão, o que, neste momento, se requer a V/Exas., Venerandos Senhores Juízes Desembargadores, com a consequente absolvição da Recorrente do pedido. B – DA IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE DIREITO XIX. A responsabilidade pelos factos alegados na petição inicial encontra-se excluída das garantias acordadas através do contrato de seguro celebrado com a Recorrente. XX. Nos termos acordados através do contrato de seguro celebrado com a Recorrente, “Ficam expressamente excluídas da cobertura da presente apólice, as reclamações: a) Por qualquer facto ou circunstância conhecidos do segurado, à data do início do período de seguro, e que já tenha gerado, ou possa razoavelmente vir a gerar, reclamação; (…) ”, conf. Artigo 3.º da “Condição Especial de Responsabilidade Civil Profissional”. XXI. Acrescendo, ainda, que, “O tomador do seguro ou o segurado deverão, como condição precedente às obrigações do segurador sob esta apólice, comunicar ao segurador tão cedo quanto seja possível: a) Qualquer reclamação contra qualquer segurado, baseada nas coberturas desta apólice; b) Qualquer intenção de exigir responsabilidade a qualquer segurado, baseada nas coberturas desta apólice; c) Qualquer circunstância ou incidente concreto conhecida(o) pelo segurado e que razoavelmente possa esperar-se que venha a resultar em eventual responsabilidade abrangida pela apólice, ou determinar a ulterior formulação de uma petição de ressarcimento ou acionar as coberturas da apólice.”, conf. n.º 1 do artigo 8.º da “Condição Especial de Responsabilidade Civil Profissional”. XXII. “O segurado, nos termos definidos no ponto 1. do artigo 8.º desta Condição Especial, deverá comunicar ao corretor ou ao segurador, com a maior brevidade possível, o conhecimento de qualquer reclamação efetuada contra ele ou de qualquer outro facto ou incidente que possa vir a dar lugar a uma reclamação.”, conf. n.º 1 do artigo 10.º da “Condição Especial de Responsabilidade Civil Profissional”. XXIII. Ora, o R. Advogado, no limite, desde 09-06-2013, momento da dedução do pedido de indemnização civil, no âmbito do processo n.º 177/10.7TABGC, tinha conhecimento dos factos que lhe eram imputados pela Recorrida e que os mesmos poderiam ser potencialmente geradores da sua responsabilidade civil profissional. XXIV. Tanto mais que, já no âmbito do processo n.º 192/08.0TABGC, no qual se julgaram crimes da mesma natureza dos crimes julgados no processo n.º 177/10.7TABGC, o R. Advogado havia sido condenado no pagamento de indemnização deduzida pela mesma Recorrida. XXV. O Contrato de Seguro celebrado com a Recorrente foi-o pelo prazo de 12 meses, com data de início às 0:00 horas do dia 1 de janeiro de 2014 e termo às 0:00 horas do dia 1 de janeiro de 2015, tendo sido renovado para os períodos de seguro correspondentes às anuidades de 2015 a 2017, conforme ponto 10 das “Condições Particulares do Seguro de Responsabilidade Civil” constantes da Apólice. XXVI. Face ao exposto, demonstrado resulta que, a falta de comunicação dos factos potencialmente geradores de responsabilidade civil do R. Advogado constitui causa de exclusão da cobertura “Responsabilidade Civil Profissional”, conduzindo, necessariamente, à absolvição da Recorrente do pedido, o que, mui respeitosamente, se requer, neste momento, a V/Exas., Venerandos Senhores Juízes Desembargadores. Sem prescindir, Caso, por mera hipótese de raciocínio, que não se admite e se aventa apenas para efeitos do que, de seguida, se conclui, se considere que alguma responsabilidade poderá ser imputada à Recorrente ou ao R. Advogado, sempre se dirá que, XXVII. Deveria o Tribunal a quo ter condenado o R. Advogado no pagamento da franquia acordada e considerado que o direito de regresso da Recorrente sobre o R. Advogado não se restringe à franquia contratual. XXVIII. A inoponibilidade da franquia perante terceiro não pode significar a condenação da, ora, Recorrente naquele valor, atentos os termos da relação material controvertida dos autos, uma vez que, o Réu Advogado figura como parte principal da demanda e, por isso, responsável único pelo pagamento da franquia. XXIX. A franquia estabelecida ao capital seguro constitui uma parcela da indemnização que ficará exclusivamente a cargo do Segurado e que será deduzida do valor a pagar pela Ré Seguradora ao lesado, conforme estabelece o artigo 49.º n.º 3 do Regime Jurídico do Contrato de Seguro. XXX. Assim, e logo por aqui, resulta evidente caber ao R. Advogado o pagamento do valor de 5.000,00€, respeitante à franquia contratual. Ademais, XXXI. Refere o Tribunal a quo, na Sentença, que, a Recorrente terá, posteriormente, direito de regresso contra aquele. XXXII. Porém, tal argumentação não pode colher, uma vez que, como concluiu o Venerando Tribunal da Relação de Guimarães, em Acórdão datado de 25 de Maio de 2016: “(…) O princípio da economia processual determina a resolução da maior quantidade possível de litígios com o mesmo processo. O que interessa já não é que a instância se mantenha estável do princípio ao fim, que o tribunal possa apenas concentrar-se no objeto inicial da ação, que as partes não sejam apanhadas de surpresa pela alegação imprevisível, que a sentença saia depressa; o que interessa agora é resolver de uma vez por todas o problema que obrigou as partes a recorrerem ao tribunal, é arrumar com ele e ponto final, mesmo que isso implique prescindir da estabilidade e disciplina desejáveis. (…) Da imposição da economia de processos, em conjugação com outros princípios processuais, derivam ainda, as disposições em grande parte decorrentes da última revisão do código, que visam o aproveitamento da ação proposta e, indiretamente, evitar a propositura de nova acção para conseguir a solução do litígio.”. XXXIII. Nas palavras do Professor Manuel de Andrade: “Deve procurar-se o máximo resultado processual com o mínimo emprego de atividade, o máximo rendimento com o mínimo custo”. XXXIV. Ademais, a reforma do Código de Processo Civil, introduzida pela Lei n.º 41/2013, visou, tal como é sobejamente conhecido, ampliar os poderes do Tribunal a fim de imprimir ao processo judicial maior celeridade e economia processuais. XXXV. Como tal, caso, por mera hipótese, com a qual a Recorrente não se conforma, haja lugar ao arbitramento de algum valor indemnizatório à Recorrida, sempre o Réu Advogado terá de ser condenado no pagamento do valor da franquia (€ 5.000,00), por imperativos de economia processual, evitando a necessidade de a Recorrente ter de intentar nova acção judicial com vista ao reembolso dessa quantia. XXXVI. Nestes termos, também neste ponto, deverá o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser o R. Advogado condenado no pagamento da franquia acordada, nos termos que acima se indicaram, sob pena de violação do disposto nos artigos 405.ºe 514.º do Código Civil e, ainda, o ponto 9 das “Condições Particulares do Seguro de Responsabilidade Civil” e o ponto 15, do artigo 1.º da “Condição Especial de Responsabilidade Civil Profissional” do referido contrato de seguro, o que, mui respeitosamente, se requer a V/Exas.. Sem prescindir, XXXVII. O direito de regresso da Recorrente sobre o R. Advogado não se restringe ao valor da franquia contratual. XXXVIII. Conforme se deixou demonstrado, o R. Advogado tomou conhecimento dos factos que lhe eram imputados, o mais tardar, aquando da dedução do pedido de indemnização civil, no âmbito do processo n.º 177/10.7TABGC, a 09-06-2013. XXXIX. No entanto, tal qual resulta provado em 41. dos factos provados da Sentença, o Réu Advogado apenas comunicou à Recorrente os factos alegados na petição inicial após a sua citação, em 16-09-2016. XL. Tal qual resulta provado em 26. dos factos provados da Sentença, o R. Advogado foi, definitivamente, condenado, no âmbito do processo n.º 177/10.7TABGC, pela prática de dois crimes dolosos: um de denúncia caluniosa e outro de difamação agravada. XLI. Ora, nos termos do art. 3.º, alínea s), das “Condições Especiais” do Contrato de Seguro identificado nos autos: “Sem prejuízo de regime diverso previsto em legislação especial, satisfeita a indemnização, o segurador tem direito de regresso, relativamente à quantia despendida, contra o segurado que tenha causado dolosamente o dano ou tenha de outra forma lesado dolosamente o segurador após o sinistro.”. XLII. Face ao exposto, demonstrado fica que, o direito de regresso da Recorrente não se restringe ao valor da franquia, estendendo-se, ao invés, a qualquer indemnização que esta tenha de vir a satisfazer à Recorrida. XLIII. Nestes termos, requer a V/Exas., também nesta parte, seja a douta Sentença corrigida, determinando-se que, o direito de regresso da Recorrente deverá abranger tudo quanto esta tenha que vir a pagar à Recorrida. Sempre sem prescindir, C – DA DESPROPORÇÃO DO VALOR INDEMNIZATÓRIO XLIV. Caso por mera hipótese de raciocínio, que não se admite, se considere existir lugar a responsabilidade civil, por parte da Recorrente e do R. Advogado, sempre a indemnização arbitrada à Recorrida se revela de absolutamente excessiva. XLV. As indemnizações pela violação do bem jurídico vida situam-se muito próximas do valor de 40,000,00€, montante peticionado pela Recorrida, nos presentes autos. XLVI. Ora, tendo a Recorrida peticionado um valor indemnizatório de €40.000,00 e tendo Tribunal arbitrado o montante de €16.000, é evidente que este valor se revela desproporcionado, urgindo-se a sua correcção, nesta sede, com a competente redução do montante indemnizatório, o que, mui respeitosamente, se requer a V/Exas., Venerandos Senhores Juízes Desembargadores. A acrescer, E ainda e sempre sem prescindir, D – DA ERRADA CONTABILIZAÇÃO DE JUROS XLVII. “O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir.”, conf. n.º 1 do artigo 805.º do Código Civil. XLVIII. Sendo certo que, “Se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido (…)”, conforme dispõe o n.º 3 do artigo 805.º do Código Civil. XLIX. Ora, o montante peticionado pela Recorrida não se pode considerar líquido apenas pelo facto de ter sido reclamada a condenação em quantia certa, porquanto o montante devido pelos alegados danos decorrentes de responsabilidade civil profissional do R. Advogado – o que se alega sem conceder – não se encontrava determinado até à prolação da Sentença. L. Como tal, a obrigação de juros só se constituiu – isto sem prejuízo de tudo o alegado no presente recurso – com a Sentença que, em concreto, determinou o montante devido a título de indemnização, contabilizando-se os juros moratórios somente desde a data do respectivo trânsito em julgado. LI. Consequentemente, quaisquer juros de mora que possam vir a ser devidos à Recorrida, o que se alega sem conceder, só se poderão contabilizar a partir do trânsito em julgado da Sentença condenatória. LII. Face ao exposto, caso, por mera hipótese, que não se admite, se considere existir alguma responsabilidade da Recorrente ou do R. Advogado, deve a Decisão proferida ser alterada, também neste segmento, passando a determinar-se que os juros moratórios sejam devidos desde a data do trânsito em julgado da Sentença dos autos, o que, mui respeitosamente, se requer a V/Exas.. Continuando sempre sem prescindir, E – DO ERRO NA FIXAÇÃO DAS CUSTAS DOS AUTOS LIII. A fixação das custas no âmbito da Sentença não pode subsistir. LIV. A Recorrida pediu a condenação dos RR. no pagamento do valor de € 40.000,00, tendo o Tribunal a quo fixado a indemnização a arbitrar à Recorrida no valor de €16.000,00, pelo que, a Recorrida decaiu em €24.000,00. LV. Nessa medida, a percentagem de decaimento da Recorrida foi de 60%, ao passo que, o decaimento dos RR. foi de 40%. LVI. Por assim ser, errou o Tribunal a quo ao fixar em partes iguais as custas dos autos, uma vez que, o decaimento das partes é, na realidade, de 60/40. LVII. Face ao exposto, caso, por mera hipótese, que não se admite, se considere existir responsabilidade da Recorrente ou do R. Advogado, deve a Sentença de 1.ª Instância ser alterada quanto às custas, devendo as mesmas passar a ser fixadas em 60% para a Recorrida e 40% para os RR., o que, mui respeitosamente, se requer a V/Exas.. LVIII. Com a sua Decisão, violou Tribunal a quo o disposto nos artigos 71.º e 72.º do Código de Processo Penal, 334.º, 405.º, 496.º, n.º 1, 514.º e 805.º, n.º 3, do Código Civil, 49.º, n.º 3, e 137.º do RGCS, bem como os artigos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 8.º e 10.º das Condições Especiais do Contrato de Seguro, e os Pontos 7 e 9 das Condições Particulares do Contrato de Seguro. NESTES TERMOS, E NOS MAIS DE DIREITO QUE, V/EXAS., DOUTAMENTE, SUPRIRÃO, REQUER, MUI RESPEITOSAMENTE, SEJA O PRESENTE RECURSO JULGADO TOTALMENTE PROCEDENTE… Em resposta e deduzindo recurso subordinado, a Autora alegou, em suma: A. 1. Por douta sentença datada de 06.03.2020, decidiu o Tribunal recorrido: g) Condenar os Réus, A. M. e X – Seguros Gerais, S.A. a pagar solidariamente à Autora, S. L., a quantia de € 16.000,00 (dezasseis mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal civil aplicável, contados estes desde a citação até efectivo e integral pagamento daquela quantia. h) Absolver os referidos Réus do demais peticionado. i) Absolver a Ré, I. A., da totalidade do pedido. j) Absolver a Autora do pedido de condenação como litigante de má-fé deduzido pela Ré, I. A.. k) Absolver o Réu A. M. do pedido de condenação como litigante de má-fé deduzido pela Autora, S. L.. l) Condenar a Autora, bem como os Réus, A. M. e X – Seguros Gerais, S.A. em custas, na proporção do respectivo decaimento, o qual se fixa em ½, para a Demandante, e ½, para os referidos Demandados. 2. Inconformada com a decisão ora em crise veio a Recorrente X interpor recurso da mesma invocando, em súmula: h) a violação do princípio da adesão e a caducidade do direito de acção. i) exclusão da responsabilidade civil da Ré X j) da responsabilidade pelo pagamento da franquia contratual k) da extensão do direito de regresso l) da errada contabilização dos juros m) da desproporção do montante indemnizatório. n) do erro na fixação das custas. 3. A Ré X sustenta, no seu articulado, que, no caso sub judice, foi violado o principio da adesão e caducou o direito de acção da ora Autora. 4. A questão da violação do principio da adesão e, consequentemente, da competência material dos tribunais cíveis para conhecer dos pedidos formulados pela Autora já não pode ser conhecida na fase processual em que se encontram os presentes autos por três motivos. a) O primeiro decorre do douto acórdão já proferido no âmbito dos presentes autos por este mesmo Venerando Tribunal “pese embora se considere que eventual violação do princípio da adesão obrigatória ao processo penal leva à incompetência material do tribunal cível (não configurando assim uma excepção dilatória inominada) situação que permitiria o recurso imediato, nos termos dispostos pelo art. 644º nº 2, al. b) do Código do Processo Civil, o facto é que tal questão não foi assim configurada pelas partes, nem pelo Tribunal recorrido, entendendo este tratar-se de excepção dilatória inominada”. b) o segundo prende-se com o facto de os ora réus se terem conformado com decisão já proferida por este mesmo Tribunal que se recusou conhecer dessa mesma questão suscitada pelos Réus no seu anterior recurso, pois dela não reclamaram nem interpuseram recurso. c) O terceiro decorre do disposto no art. 97º , nº 2, do CPC, dispositivo segundo o qual a violação das regras da competência em razão da matéria que apenas respeita aos tribunais judiciais só pode ser arguida ou oficiosamente conhecida, até ser proferido despacho saneador, ou, não havendo lugar a este até ao início da audiência de discussão e julgamento. 5. No caso concreto, houve lugar à prolação de despacho saneador, sem que, tal como resulta do anterior acórdão, tenham as partes até então invocado a excepção da incompetência material do Tribunal recorrido, pelo que, lhes está agora vedado arguir a referida excepção em sede recursiva. 6. Nos presentes não ocorreu a violação do princípio da adesão obrigatória ao processo penal pelos motivos expostos no despacho-saneador a) quanto aos factos vertidos nos artigos 11º a 24º da Petição Inicial, investigados no âmbito do referido processo criminal nº 177/10.7TABGC e, em abstracto, integradores dos crimes de denúncia caluniosa (artigo 365º nº1 e 2 do CP) e de difamação caluniosa e agravada (artigos 180º nº1, 183º nº1 alínea b) e 184º do CP com referência ao respectivo artigo 132º nº2 alínea l) (cfr. Doc. nº5 junto com a Petição Inicial cfr fls 137 e ss) verifica-se que a queixa criminal apresentada pela Autora quanto a tais factos foi deduzida em 30/3/2010, só tendo, no entanto, sido deduzida acusação contra os Réus, A. M. e I. A., quanto a tais factos em 27/5/2013, ou seja, mais de 8 meses após a notícia do crime (por via da queixa criminal apresentada pela Demandante). Mais se verifica ainda, e sobretudo, que entre o momento da prolação da acusação (27/5/2013) e o início do julgamento (em 24/6/2016) decorreram mais de 8 meses em que o processo esteve em fase de instrução, o que sempre permitiria à Demandante não ter de esperar mais tempo para deduzir o pedido de indemnização civil em separado. Nesse sentido, forçoso se torna considerar que sempre a Autora poderia deduzir o pedido de indemnização civil em separado ao abrigo da alínea a) do artigo 72º do CP. b) quanto ao segundo dos referidos crimes (de difamação caluniosa agravada), sempre se estaria perante um crime semi-público, susceptível de fazer admitir a dedução em separado do pedido de indemnização civil ao abrigo, nesta hipótese, da alínea c) do mesmo artigo 72º do CP. 7. Quanto à segunda questão suscitada pela Recorrente X, a de que os presentes autos não constituem a primeira tentativa de a Recorrida reclamar dos Réus o pagamento de compensação pelos danos sofridos em virtude da conduta do Réu A. M., a mesma já foi apreciada por este Tribunal no seu anterior aresto proferido no âmbito dos presentes autos que considerou que tal questão era uma questão nova, apenas suscitada em sede de recurso, motivo pelo qual o Tribunal não conheceu da mesma, pelo que, salvo o devido respeito por melhor opinião estava vedada à Recorrente suscitar a mesma questão novamente no recurso ora interposto. 8. Porém, e ao contrário do sustentado pela Ré X nunca estaria vedada à ora Autora a possibilidade de deduzir o respectivo pedido indemnizatório ainda que o mesmo tivesse sido indeferido por razões de extemporaneidade porque o art. 72º não prevê tal impossibilidade. 9. Sustenta a Ré X na conclusão XXVI que a falta de comunicação por parte do Réu A. M. dos factos potencialmente geradores da responsabilidade civil do mesmo constitui causa de exclusão da cobertura “Responsabilidade Civil Profissional”, e, como tal deve a Ré ser absolvida do pedido formulado no âmbito dos presentes autos. 10. O contrato de seguro de responsabilidade civil ora em causa é um seguro de responsabilidade civil profissional em que os segurados são os advogados com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados e destina-se a assegurar a cobertura dos riscos inerentes ao exercício da advocacia e a consequente indemnização por danos decorrentes de dolo, negligência, omissão ou erro profissional do Advogado. 11. O contrato de seguro ora em causa é de natureza obrigatória. 12. O referido contrato foi celebrado pelo prazo de 12 meses, com data de início às 0.00 horas do dia 1 de janeiro de 2014 e termo às 0.00 do dia 1 de Janeiro de 2015, tendo sido renovado para os períodos de seguro correspondentes às anuidades de 2015 a 2017”- cláusula décima das Condições Particulares do Seguro de Responsabilidade Civil. 13. As partes estipularam na cláusula sétima das condições particulares do referido contrato que “O segurador assume a cobertura da responsabilidade do segurado por todos os sinistros reclamados pela primeira vez contra o segurado ou contra o tomador do seguro ocorridos na vigência de apólices anteriores, desde que participados após o início da vigência da presente apólice, sempre e quando as reclamações tenham fundamento em dolo, erro, omissão ou negligência profissional, coberta pela presente apólice, e, ainda, que tenham sido cometidos pelo segurado antes da data de efeito da entrada em vigor da presente apólice, e sem qualquer limitação temporal da retroactividade”. 14. A Ré X não pode opor à ora Autora, enquanto lesada (beneficiária), alheia à relação contratual titulada pela apólice de seguro ora em causa a excepção material de direito material da falta de oportuna comunicação/participação dos factos potencialmente geradores de uma reclamação por responsabilidade civil uma vez que o contrato de seguro ora em causa é de natureza obrigatória. 15. A Ré X também não pode opor à Autora a franquia contratual uma vez que de acordo como disposto no art. 146º, nº 1, do Regime Jurídico do Contrato de Seguro que nos contratos de seguro obrigatório, como é o contrato de seguro ora em apreço, o lesado tem o direito de exigir o pagamento directamente ao segurador, e o nº 3 do mesmo dispositivo legal que “salvo disposição regulamentar ou contratual em sentido diverso, não pode ser convencionada solução diversa da prevista no nº 2 do art. 138º”, noma que prevê que salvo disposição em contrário o dano a atender para efeito do principio indemnizatório é o disposto na lei geral, ou seja, nos termos previstos no art. 562º do CPC, que dispõe que o dano há-de ser indemnizado de forma a reconstituir a situação que se verificaria caso não ocorresse a lesão, o que impede a dedução de qualquer franquia. 16. No tocante à existência e dimensão do direito de regresso da Ré X sobre o Réu A. M., que a Ré X pretende ver discutida nos presentes autos, salvo o devido respeito por melhor opinião, tal discussão não pode ser feita nos mesmos, devendo a mesma ser remetida para os meios próprios legalmente previstos para o efeito. 17. Relativamente aos juros de mora os mesmos encontram-se correctamente fixados uma vez que o Tribunal não procedeu à actualização do montante indemnizatório conforme decorre da decisão ora em crise. 18. A Autora apenas discorda do montante indemnizatório que lhe foi fixado pelo Tribunal a quo, porquanto pese embora o Tribunal tenha considerado que os danos infligidos à ora Autora revelam intensidade e continuidade do dolo com que os mesmos foram praticados, atenta à gravidade dos danos – não podendo olvidar-se aqui que o ora Réu A. M. não se limitou a atingir a Autora na sua honra e consideração pessoal, mas também a Autora enquanto profissional, querendo passar a imagem de que a mesma é desprovida dos mais sagrados valores de que um Magistrado deve ser baluarte, como a imparcialidade, diligencia e urbanidade, e o lapso temporal já decorrido sem que o mesmo tenha interiorizado o desvalor da sua acção, deve ser arbitrado à ora Autora o montante indemnizatório peticionado no seu requerimento inicial, a saber 40000,00€ a título de compensação por todos os danos a esta causados pela conduta do ora Réu. A decisão ora recorrida violou o art 496º do CC. TERMOS EM QUE Deve a decisão recorrida ser revogada apenas no que tange ao quantum indemnizatório atribuído à Autora devendo o mesmo ser fixado no montante peticionado pela mesma no seu requerimento inicial… Igualmente o Réu A. M. impugnou a sentença proferida, concluindo nos seguintes termos: I – DA INCOMPETÊNCIAABSOLUTA E MATERIAL DO TRIBUNAL “A QUO” E VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA SUFICIÊNCIA E ADESÃO DO PROCESSO PENAL A) A autora e aqui recorrida constituiu-se assistente no Proc. 177/10.7/ABGC e fez emergir a factualidade da presente acção na factualidade da acusação destes autos do processo criminal como melhor resulta da p.i.. B) A ora recorrida constitui-se assistente nos referidos autos e formulou pedido de indemnização civil no Proc 177/107TABGC e o mesmo não foi admitido por extemporaneidade, pedido cível que o ora recorrente não foi notificado; C) O Tribunal da Comarca de Bragança é materialmente incompetente para julgar o caso sub judice mostrando-se violado o disposto no artº 96 do CPC; D) A presente demanda viola os princípios da suficiência e adesão do processo penal consagrados nos artºs 7º e 71º do Código de Processo Penal que foram exercidos no Proc.º 177/107TABGC; E) A presente acção constitui abuso de direito, má-fé processual e utilização indevida da tutela jurisdicional, devendo a autora ser condenada como litigante de má-fé; III – MATÉRIA DE FACTO E DE DIREITO ALEGADA PELO RECORRENTE NA CONTESTAÇÃO QUE DEVE SER DADA COMO PROVADA PELO VENERANDO TRIBUNAL 1 – As peças produzidas e aludidas na p.i. foram-no no estrito cumprimento do mandato judicial que a primeira ré lhe conferiu, 2 - No âmbito de tal mandato, foi elaborada no interesse da mandante sua constituinte I. A. e cumprindo as suas instruções, cumprindo o seu exercício profissional como Advogado de acordo com a sua consciência, a praxe forense e as legis artis. 3 - O mandatário tem uma actuação em nome, no interesse e por conta de outrem, motivo pelo qual, a responsabilidade por tal actuação deve ser imputada na esfera jurídica do mandante. 4 - O mandatário forense actua ao abrigo do sagrado princípio da Independência (cf. art. 84.º dos EOA) e tem discricionaridade técnica. 5 - Incumbido do mandato in casu de apresentar uma queixa a elaboração da peça processual foi feita de acordo com a interpretação que fez dos factos alicerçados em documentos e cassetes áudio e ainda de acordo com a interpretação que fez as normas jurídicas sancionatórias. 6 - Apresentou tal peça em juízo como era seu dever profissional, tendo-se-lhe afigurado a existência de indícios de ilícitos criminais bastantes para ser sujeita e apreciada pelas diversas instâncias judiciais. 7 - Se os factos constituem ou não infracções de natureza disciplinar ou criminal isso é matéria para ser apreciada e decidida nas diversas fases processuais e pelas diversas instâncias judiciais. 8 - O mandatário apenas tem que cumprir com o seu dever profissional de concretizar o direito de queixa que os cidadãos têm de colocar às instâncias judiciais a apreciação das suas pretensões, sendo assim as regras de funcionamento do Estado de Direito. 9 - Sendo certo que, o art. 208.º da Constituição da República Portuguesa “a lei assegura aos Advogados as imunidades necessárias ao exercício do mandato e regula o patrocínio forense como elemento essencial à administração da justiça”. 10 - Os advogados gozam ainda de imunidade e do direito do livre exercício do patrocínio forense e ao não sancionamento pela prática de actos conformes ao estatuto da profissão, como resulta da previsão contida no art. 114º, nº 1 e 3 al. b) da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais. 11 - Não estando em causa as relações de parentesco, que nunca foi invocado, mas se conhecidas como a autora faz questão de realçar, então deveria ter tido mais respeito por alguém que no exercício do patrocínio forense está até a exercer o mandato em causa da sua ascendente! 12 - Assim, o direito é até um dever, porque a defesa dos direitos estava confiada a outro mandatário e porque como melhor abaixo se verá, nunca o segundo Réu “viu tanta asneira junta num processo só”, se é que de simples “asneiras” se tratavam ou trataram, se viu na obrigação de patrocinar os interesses da aqui 1ª ré, cuja justeza bem conhecia. 13 - Por outro lado ainda, realça-se que o patrocínio forense é uma prerrogativa legal dos Advogados, o Estatuto dos Magistrados quer Judiciais quer do MP, dá-lhes o direito de patrocínio forense em causas de parentes próximos e dispensamo-nos de remeter para as facti species porque o Tribunal bem as conhece. 14 - As expressões que foram atribuídas ao 2º R. no art. 5, que não têm nada de ofensivo, não foram essas as que ele proferiu. Felizmente, que agora fica tudo gravado, para não haver distorções, como aquelas que a Autora imputou: 15 - O 2º R. nem sequer sabia qual a Faculdade frequentada pela Autora que até foi uma boa faculdade, a de Coimbra, embora, a média de curso tivesse sido bem fraquinha, rectius, a média com que a maioria fica! O que estava em causa era a aplicação do Direito e essa ou a maneira como o foi ”até parecia que não tínhamos frequentado as mesmas Faculdades e lido os mesmos livros” e foi essa a expressão utilizada para enfatizar a má aplicação do Direito! 16 - Itens 6 e 7 da p.i., o requerimento assim foi, que juntava o acórdão do TRP num outro processo idêntico em que realçava o princípio “ in dubio pro reo” e confirmava o despacho de não pronúncia da arguida aqui 1ª R. num outro Processo (o de Valongo) em tudo idêntico ao 290/06.5TABG, requerimento que concluia por pedir agravação da audiência que a aqui Autora indeferiu por falta de fundamento legal!!!!!, cf. 17 - Foi preciso interpor recurso para obter a gravação!!!, conforme docs que se encontram nos autos. 18 - No dito Proc. 290 tinham sido cometidas as maiores barbaridades jurídicas por diversos magistrados (dois do JIC e do MP), quando estávamos em presença de matérias ao alcance de qualquer Estudante de Direito nas cadeiras de Direito Penal e Processo Penal. 19 - No Proc. 290/06 cuja cópia digital integral se encontra nos autos cf DVD e que aqui se dá por integralmente reproduzida para os legais efeitos, cometeu-se a “barbaridade” de indeferir todos os meios de prova requeridos no requerimento de instrução, por serem considerados dilatórios, quando se requeria prova documental indiciadora da inocência da arguida, aqui 1ª ré. 20 - Nesse requerimento de instrução em que a arguida requeria ser ouvida pelo JIC, foi indefrido, PASME-SE com o fundamento de que tinha declinado declarações em sede de inquérito e estando devidamente acompanhada de defensor, sabia a arguida das consequências dos seus actos!, estamos a citar de memória .... 21 - Mas esta mostruosidade jurídica está retratada e documentada nos actos, salvo erro, com promoção do MP! 22 - Também a Autora em sede de audiência de julgamento negou a palavra à arguida (aqui Ré), em ofensa ao seu indeclinável direito de ser ouvida. 23 - Está documentado na transcrição das declarações da assistente nesses autos e está documentada na transcrição do depoimento da aí assistente. 24 - De facto, a Autora nos processos que indica tomou decisões muito polémicas e escandalosas até, que foram comentadas durante, pelo menos, oitos meses nos cafés de Bragança, que é um meio pequeno, conforme ela o confessou e reconheceu em sede de declarações em audiência (presencialmente não obstante estar colocada no Açores! engrossando as centenas de faltas ao serviço, justificadas necessariamente com documentos médicos) conforme transcrição das suas declarações que se encontram do DVD. Senão vejamos 25 - A decisão tomada pela Autora no Proc. 290/06 5TABGC constituiu o maior escândalo que considerou difamação agravada por calúnia uma cidadã (a aqui Ré e ali arguida I. A.) que se queixou que na sua conta do Banco ... lhe tinham sido requisitados cheques sem o seu consentimento e que quatro desses cheques apareceram depositados nas contas da queixosa/filha. 26 - A mesma cidadã que requereu que fossem juntos os cheques e os documentos que serviram para requisitar e levantar a série de cheques para se efectuar uma peritagem à letra e assinatura, o banco não juntou uns e outros, porquanto, os cheque originais tinham sido destruídos ao abrigo de legislação e os documentos de requisição e levantamento da série de cheques foram dados por extraviados!!! 27 - A segurança das contas e transacções bancárias tinham sido postas em causa, geraram a maior desconfiança nas muitas dezenas de pessoas que souberam do caso e Autora, a Juíza S. L. ainda considerou que foi cometido um crime de difamação agravado por calúnia! 28 - Porventura, por uma funcionária bancária ter aparecido à última hora a prestar declarações dizendo que a letra constante em dois dos cheques era semelhante à dela e que teria sido a mesma que preencheu dois cheques, o que até pode ser verdade, como também com toda a probabilidade terá sido também a mesma funcionária que entregou uma série de cheques a pessoa que não a titular da conta, sem que esta ainda os tivesse requisitado. 29 - E se o Banco ... e a funcionária estivessem seguros da normalidade das transacções teriam apresentado os documentos que a cliente/arguida I. A. protestou serem apresentados em juízo para as letras e assinaturas serem objecto de perícia judicial. 30 – Só que, em tais documentos constava a funcionária/o que interveio quer na requisição dos cheques, quer na sua entrega e quando se fosse demonstrar por peritagem que a assinatura da requisitante dos cheques e do seu levantamento não tinha sido a titular da conta, facilmente se concluiria qual a situação em que tal funionário/a ficava perante a entidade empregadora/Banco .....! 31 - No Proc. 985/06 a Autora e Juíza S. L. não deixou de proferir decisões mais escandalosa ainda. 32 - De facto, a assistente E. D. filha de I. A..tinha instruído o pedido de indemnização civil (no Proc. 290/06) com uma informação psiquiátrica em que se imputava aos progenitores a “rejeição total desde a nascença” e outros disparates. 33 - Tal informação tinha sido retirada de um relatório que a E. D. tinha apresentado na Segurança Social para efeitos de obter reforma por invalidez. 34 - A aqui 1ª Ré e arguida nos autos do Proc. 290/06, protestou pela falsidade intelectual dos documentos, factos que eram do conhecimento de centenas de pessoas da cidade de Bragança, freguesia de … e circunvizinhas. 35 – A Autora e Juíza S. L. estando até em causa sérios indícios de ilícitos criminais de natureza pública, por eventual fraude à Segurança Social indeferiu o requerimento de todos os actos probatórios em contrário, obstruindo até o depoimento das testemunhas como flagrantemente consta da cassete audio (existe nos autos do Proc. 290/06 transcrição do depoimento) em depoimento da testemunha A. M.. 36 - Conhecida que é agora o trajecto profissional da Autora e as centenas de faltas dadas ao serviço, já vê e necessariamente por documentos médicos, compreendida está a sua aversão a peritagens médico-legais e aos depoimentos que como o da testemunha A. M. que no Proc. 290/06, considerou disparates o que constava dos documentos médicos e no que a “rejeição total desde a nascença” diz respeito e que tanto incomodaram a Autora! 37 - Aliás, a factualidade em torno de eventuais ilícitos à Segurança Social foi mandada investigar pelo TRP no Proc.º 985/06 e o DIAP Bragança investigou indiciariamente os factos e concluiu por indiciários ilícitos e fraude à Segurança Social tendo remetido o inquérito para o DIAP Porto conforme consta do DVD junto aos autos. 38 - Eram estas decisões escandalosas que o CSM devia ter sancionado mas o Inspector, F. S. informou/relatou que tudo decorreu dentro da normalidade! Assim informado, o CSM decidiu-se pelo arquivamento da participação! 39 – E a linguagem utilizada pelo 2º R. nas peças processuais descritas pela Autora foi tão “criminosa”, como criminosa foi a mesma linguagem que foi utilizada pela mesma e por seu mandatário no processo de reclamação e posterior recurso contencioso para o STJ da notação de classificação de suficiente que lhe foi atribuída, cf. docº nº 1 junto com a contestação. SENÃO VEJAMOS 40 - O sobredito docº nº 1 junto de fls 1 a 266 constitui o recurso que a aqui Autora interpôs da decisão do Plenário do CSM que lhe atribuiu a classificação de “Suficiente” na Inspecção Extraordinária desde o primeiro ano que ingressou na Comarca de Bragança até à data que requereu licença sem vencimento de longa duração, que requereu por se ter incompatibilizado com os Serviços de Inspecção e o Conselho Superior de Magistratura. 46 – A linguagem do recurso que a recorrida interpôs da decisão do CSM para o STJ utiliza ainda linguagem mais truculenta da que foi utilizado pelo recorrente, cf. doc. nº 1. 41- O Relatório de fls 70 e ss dá ainda conta da reclamação da aqui assistente e vejamos a linguagem e o tom, ao que se julga pela própria pena, porque não consta a alusão a mandatário/advogado: 42 - Como se pode ver, a aqui Autora classificada no início da sua carreira profissional com a notação de “Suficiente”, lutava pelo escalão superior de Bom e fê-lo com a expressão vigorosa constante dos documentos e registamos que, não obstante a dureza da linguagem utilizada, os interveniente como o Relator da Reclamação que a Dra S. L. fez para o Plenário do CSM, o Procurador-Geral Adjunto junto STJ e os Relatores em diversas qualidades, o Conselheiro Relator no STJ, sem qualquer estranheza nossa, não vimos qualquer alusão ao excesso de linguagem, aceitando a natural e democrática Liberdade de expressão da reclamante e recorrente, constitucionalmente consagrada e muito menos, a reacções de tipo disciplinar ou criminal! 42 - O requerimento da 1ª Ré I. A. e que despoletou toda a situação, subscrito naturalmente pelo seu mandatário e no seu interesse e que terminava por requerer uma cópia das gravações da audiência de julgamento do Proc. 290/06.3TABGC, que a aqui Autora (como já foi referido) indeferiu por falta de fundamento legal!, 42 - Com a serenidade que se impunha, um qualquer outro magistrado/a teria deferido o requerido e devolvido à procedência as imputações se as tivesse considerado injustas ou inoportunas, que até nem era o caso. 42 - Em tal requerimento em que se anunciava expor superiormente os factos, enviado ao Proc. 290/06 e ao Proc. 583/07 (este processo foi o que resultou do novo inquérito para o qual a autora remeteu no Proc. 290 com certidão de todo o processado), que pretendia ser um alerta para todas as ilegalidade cometidas e de as reparar neste Proc. 583/07. 43 – A aqui Autora que já se encontrava acossada pelo CSM (cf docº nº 1 a autora tinha sido notada de classificação de suficiente na comarca anterior à transferência para Bragança), entrou manifestamente em pânico, comportamento objectivamente revelado para quem tivesse tido algum “problema” com o organismo tutelar, tendo-se ulteriormente constado isso mesmo nos círculos judiciários da comarca de Bragança e agora comprovados pelos documentos juntos. 44 – Assim, ss pretensas calúnias profissionais e o autoproclamado brio profissional que a Autora vem reclamando e que alegadamente foi posto em causa pelos Réus deste processo, estão espelhados nos documentos juntos que revelam e provam à saciedade, que não há calúnias, mas exercício de direitos, com a linguagem que cada um julgue mais apropriada e adequada ao caso. 45 - É que à Autora lhe foi atribuída uma classificação de “Suficiente” (o mais baixo na escala de valores positivos que vai de Suficiente a Muito Bom, já que o escalão inferior determinaria a irradiação de funções) na comarca de ingresso e imediatamente ao ano anterior a que se reportam os factos (ano de 2005) cf. docº nº 1. 46 - Classificação que lhe tem sido mantida em duas inspecções extraordinárias, que não foram motivadas por qualquer conduta dos Réus neste processo, como o comprovam os documentos juntos, cf. pags 1 a 266. 47 – Assim a factualidade vertida nos itens 31º a 41 tem que ver com o contencioso e confronto que a Autora tem tido desde o início da sua carreira profissional com o órgão que a superintende, ou seja, o Conselho Superior da Magistratura. Senão vejamos 48 - O que consta a fls 77 e que se transcreve um dos itens da reclamação da aqui autora para o Plenário do CSM. “Efectivamente, a “necessidade” de continuação dos presentes autos e a escolha do seu momento são da exclusiva responsabilidade do CSM, que fez arrastar um processo de Inspecção ao longo de 5 anos, defendendo-o apesar de “ilegal”, até à última instância, desgastando e esgotando a Reclamante ao longo desse período em perseguição veemente de um objectivo ilegalmente traçado, sujeitando-a às consequências daquele processo também ilegais, e forçando-a, por esgotamento físico e psicológico, a pedir a suspensão das suas funções e a abdicar do seu vencimento” destacado e sublinhado nossos. 49 - A aqui Autora apesar de toda a perseguição do CSM tinha no seu seio, rectius, nos Serviços de Inspecção, um “aliado”, o Dr. F. S. (cf. fls 77 ao fundo) que propôs “Bom” de notação classificativa e foi rejeitado, 50 - O mesmo que instruiu o processo de queixa que a Ré I. A. fez junto do CSM, que não viu nenhuma ilegalidade e tudo foi normal: foi normal que a Juíza S. L. indeferisse o pedido das gravações no Proc. 290/06., que não a tivesse sido ouvida durante o Processo e durante a audiência como o requereu e manifestou, etc. etc. etc. como já foi alegado. 1 Da acta do Plenário do CSM de 5/05/2015 consta que foi indefrido o requerimento de pedido de reposição de vencimentos a abonos durante o período de licença sem vencimento! Cf. doc. nº 2 junto 51 – O mesmo que ficou à conversa com a Autora no final da tomada de declarações e tratando-se de uma conversa particular, não se coibiu de a narrar em sede de audiência do Processo 177/10 .conforme declarações transcritas juntas no DVD A. M. . 52 - A magistrada S. L. que foi sancionada pelo CSM com pena de “advertência registada” por “violação dos deveres de zelo e de criação no público de confiança na administração da justiça” cf. fls 130 ao fundo do docº nº 1. 53 – Por maioria de razão e por mais desconfiança no público geraram as sobreditas decisões polémicas e escandalosas nos Proc. 290/06 e 985/06 que foram comentadas durantes uns oito meses nos cafés e estabelecimentos comerciais da cidade de Bragança, conforme declarações até da assistente em sede de audiência, que confirma o alarme público, conforme transcrição do suas declarações e constantes do DVD junto aos autos. 54 – Vangloria-se a Autora que a queixa contra si apresentada na PGR/Porto (Proc. 295/09.4PRT) num processo com muitas vicissitudes que a seu tempo serão aclaradas, foi arquivada. 55 – A Autora furtou-se ao interrogatório e entrasse de baixa como é seu timbre, sem que tivesse justificado a falta, porque teria tido uma boa oportunidade de se justificar. 56 - A queixa foi de facto arquivada curiosamente pela mesma pessoa que interveio no Processo de Vinhais e no Proc. 987, o que teve seguimento do Proc. 290, que a magistrada que a arguida I. A. devia ser pronunciada, e o Tribunal da sem antes se ter referido os laivos Kafkianos manifestamente existentes no processo, cujo acórdão e processo se encontra junto aos autos aos autos em formato digital! 57 – Os factos denunciados, como se mostra dos respectivos autos, o requerimento de instrução enfermava de erros técnico-jurídicos que impediram o JIC junto do TRP de apreciar substancialmente o teor da queixa, pelo que, os factos participados ainda não foram objecto de controle jurisdicional, conforme despacho do JIC que se protesta juntar aos autos, sendo certo que ainda não se encontram prescritos! 66 – Vangloria-se a Autora que o 2º R. foi condenado no Proc. 192/08.0TABGC no Tribunal de Vinhais um tribunal de proximidade e o Relator (o Dr. José Carreto) no TRP foi curiosamente um amigo confesso da Autora, casado com uma Advogada com processos, obviamente, na comarca de Bragança. 58 – Sabe a Autora agora muito bem que toda essa factualidade foi considerada em conformidade com os actos da profissão de advogado tendo sido “absolvido” pelo Conselho de Deontologia do Porto da Ordem dos Advogados e Conselho Superior, conforme documentos nos autos 59º - Assim, a imputação do item 44 da p.i. devolve-se à procedência, porquanto o R. que é muito zeloso do cumprimento dos deveres deontológicos, e tendo mais do triplo da idade em carreira profissional que a Autora, o seu registo disciplinar mantém-se puro e sem mácula, enquanto que, o da Autora acusa uma Repreensão Registada documentalmente comprovada e consta que terá uma outra dos tempos da comarca que antecedeu o exercício da Comarca de Bragança! 60 – Essa arbitrária condenação ainda há-de fazer correr muita tinta e a Autora ainda há-de vir a assistir à reparação dos danos por parte dos Tribunais competentes e que as solidariedades corporativas não compensam! profissional e foram dois e não três os processos como erradamente consta do item F) A sentença recorrida não tendo conhecido da matéria de facto das contestações e documentos abundantes de quanto se alegou e melhor consta da rubrica III e dos itens 1 a 60 antecedentes efeitos é nula nos termos do no nº 1 al . d) do artº 615.º do Código de Processo Civil, nulidade que expressamente se invoca para os legais efeitos; G) A matéria do item 13 da matéria de facto dada como provada é verdadeira só que o Conselho Superior da Ordem dos Advogados através de acordão de 27 de Outubro de 2018 em que é recorrente o aqui também recorrente e recorrida a Dra. S. L. aqui também recorrida aprovou o parecer do relator que fez um relato histórico da jurisprudência da Ordem dos Advogados na matéria e revogou a decisão do Conselho de Deontologia do Porto que aplicou a sanção disciplinar de “advertência” cf acórdão respectivo e doc. de fls ... junto com o Requerimento Probatório remetido aos autos em 13 de Fevereiro de 2019 pelo que se impõe uma reapreciação desta matéria de facto dada como provada com decisão em conformidade. É matéria documental superveniente provada por documento e que o Tribunal “a quo” devia ter levado em conta e não ter dado como provada a decisão do Conselho de Deontologia do Porto e fazer referência que essa decisão foi revogada pelo Conselho Superior da Ordem dos Advogados, termos em que, o item da matéria de facto deve ser corrigido pelo Venerando Tribunal; H) É verdadeiro o disposto o disposto no item 14 mas a matéria dada como provada dos itens 15 a 16 são frases retiradas do contexto da queixa e dos documentos de suporte e constituiu um exercício intelectualmente nada abonatório de quem cirurgicamente andou à caça de matéria incriminatória, matéria que vem expressamente impugnada. I) Assim, a matéria dos itens 14 a 16 que são frases desgarradas do contexto e da respectiva participação pag 1 a 37 do docº nº 9 do DVD e as imputações aí referidas estão alicerçadas nos documentos que com a mesma participação foram apresentados e que se encontram como docº nº 9 no DVD junto aos autos pelo ora recorrente e corresponde ao Proc. 295/09.4TRPRT pp 38 a 181 e que constituíram a forma como o ora recorrente interpretou a factualidade e as factispecies que foram convocadas, tudo no âmbito do exercício do mandato forense e prorrogativas legais e constitucionais. J) Uma apreciação descomprometida dos aludidos documentos de fls 1 a 188, participação/queixa e respectivos documentos, facilmente concluirá que se trata de normal procedimento de queixa legal e constitucionalmente consagrado e não é pelo facto de a participada ser uma juíza que os factos “viram” difamação e calúnia quando até existe suporte documental e como exercício do direito de queixa e normal exercício do mandato forense deve ser apreciado e julgado por este Venerando Tribunal; K) Os itens 18 e 19 também são impugnados porque o recorrente limitou-se a fazer uma exposição de factos ao CSM e tendo sido aberto inquérito, o CSM que tem poder discricionário na matéria entendeu não converter em processo disciplinar e arquivou o inquérito. Nada mais normal e note-se que também a aqui recorrida apresentou queixa na Ordem dos Advogados e os Conselhos no seu conjunto – Deontologia e Superior – não viram qualquer infracção disciplinar. A ora recorrida exerceu o seu direito de queixa junto da Ordem dos Advogados que não sancionou o ora recorrente, como o recorrente apresentou uma exposição no CSM e que se decidiu pelo arquivamento. Nesta conformidade deve a factualidade ser apreciada e julgada como a normalidade da praze forense e revogar e extrair as consequências legais; L) O Item nº 17 tem que ser ainda complementado com a requerida instrução conforme consta do docº nº 9 fls 795 a 800 não tendo sido analisada o teor da participação e respectiva documentação por erro técnico-jurídico, cf. pag. 800 e considerada por este Venerando Tribunal actividade processual normal e nada tem de censurável para o aqui recorrente; M) Os Itens 18, 19, 20 e 21 não se pode retirar que não tenha havido infracção, essa foi a conclusão do Inspector Judicial e o CSM tem poder discricionário, sendo que, a leitura dos documentos de fls 38 a 181 do documento nº 9, inclusive, a gravação da audiência do Proc. 290 inculcam a conclusão oposta à do Sr. Inspector Judicial. E sem necessidade de ouvir a gravação basta ler o depoimento da assistente no Processo 290 E. D. pag. 147 e ss do docº nº 9 e verificar que a arguida I. A. pretendeu falar por duas vezes e no final do depoimento da E. D. a aqui recorrida não lhe deu a palavra, tendo sido coartados os seus direitos de defesa e audição em sede de julgamento, termos em que, este Venerando Tribunal terá de extrair a conclusão que a actividade forense e profissional do aqui recorrente é absolutamente natural e nada tem de censurável. N) A conclusão inserta do item 27 dada como provada encontra-se mal julgada esta matéria de facto dada como provada e a participação de fls 1 a 37 do documento nº 9 inserto no DVD e os documentos de fls 38 a 181 são o normal exercício do direito de queixa e as imputações e o elemento subjectivo são uma obrigação técnico-juridica de quem elabora a participação, como técnico-juridica é a interpretação dos factos constantes da inúmera documentação, como técnico jurídica é a subsunção das normas jurídicas incriminadoras à respectiva factualidade. Questão diferente é a de saber se tais factos e comportamentos constituem ilícitos criminais, isso depende da interpretação de que lhe for dada e de quem as aprecia. Se todas as queixas e acusações do MP que se frustram logo em sede de inquérito, outras em sede de instrução, outras em sede de julgamento, outras ainda em sede de apreciação nos tribunais superiores fossem consideradas ilícitos difamatórios teríamos meio mundo a litigar nos Tribunais contra o outro meio mundo e essa não é seguramente a prática do quotidiano. Da leitura da participação e documentos de fls 1 a 181 do documento nº 9 do DVD o que tem que se concluir é o exercício do direito de queixa de uma cidadã legal e constitucionalmente consagrado feito ao abrigo constitucional e legal do patrocínio forense de um profissional do foro, sendo esta a conclusão que este Venerando Tribunal deve extrair e decidir com as legais consequências. O) O item 27 da matéria dada como provada é um exercício meramente intelectual e subjectivo e não encontra suporte documental a não ser na sentença do Proc. 177/107TABGC, mas o Tribunal Cível tem que na nossa óptica ser independente de outros Tribunais e a documentação referida de fls 1 a 181 do documento nº 9 implica que seja considerado o exercício do direito de queixa feita por um profissional do foro e está a coberto da imunidade constitucional e legal e como tal deve ser apreciada e julgada por este Venerando Tribunal. P) Os itens 28 e 29 dados como provados não têm qualquer suporte probatório a única testemunha arrolada pela Autora Dra. C. G. nada sabia e nada referiu em concreto refugiando-se no “não me lembro” foram muitos os requerimentos e dizia não saber da existência do Processo 583/07.04TABGC e que se iniciou por certidão extraida do Proc. 290/06.5TABGC. O depoimento da referida testemunha e na gravação fornecida ao recorrente encontra-se imperceptível, mas de facto não sabia dos problemas da Autora na comarca de ingresso em Montalegre/Boticas donde veio transferida para Bragança com a classificação de suficiente e iniciou as suas funções em Bragança logo com um mês de faltas!, cf. docº nº 1 junto com a contestação. A testemunha Dra. C. G. que trabalhou sete anos com a aqui recorrida na Comarca de Bragança, não soube do Processo Disciplinar que lhe foi instaurado pelo CSM em Bragança, não soube das classificações de suficiente, não soube dos recursos para o STJ de tais classificações as mais baixas da tabela classificativa, porque, a imediatamente abaixo determinaria a irradiação de funções e da magistratura. A testemunha não soube do pedido de licença se vencimento, não soube do pedido de reversão de abonos no período da licença sem vencimento e que foram indeferidos pelo CSM!. A testemunha em causa soube isso sim referir que os requerimentos do ora recorrente eram constantes e que a ora recorrida tinha conhecimento, mas quando instada sobre o Processo 583/07.04TABGC para onde esses requerimentos eram carreados nada a testemunha sabia! e desconhecia o respectivo desfecho que tinha culminado com um despacho de não pronúncia e que veio a ser confirmado pelo Venerando TRP, quando a mesma factualidade a autora e aqui recorrida tinha visto um “crime de difamação agravado por calúnia”!, quando tinha prova documental nos autos que faziam presumir a inocência da arguida I. A. aqui co- demandada nestes autos! A autora tudo fez para afastar da defesa da I. A. o aqui recorrente e ver confirmado no novo processo de inquérito o seu insólito despacho e apreciação da matéria de facto a considerar a factualidade de difamação agravada por calúnia!. Era nossa intenção remeter para a gravação do respectivo depoimento e já tomamos a conveniente posição processual e remeter para os concretos momentos da gravação mas encontra-se imperceptível, mas pode ser que o Venerando Tribunal tenha melhor sorte na gravação que lhe seja enviada e que deve requisitar e possa indagar da inocuidade do referido depoimento e que o Tribunal “a quo” levou em conta como consta de fls 20 da sentença ao fundo, mas que se impugna pelas razões já aduzidas. De facto, o documento nº 1 apresentado com a contestação demonstram o histórico de quando havemos de afirmar e a autora que é uma pessoa com grandes fragilidades fisicas, psicológicas e profissionais e protagonizou na Comarca de Bragança nos casos da co-demandada I. A. grande alarido social atentas as polémicas decisões que proferiu nos processos em que foi parte e que andaram meses e até anos a ser discutidos nos cafés da cidade como o confessou a própria Autora e aqui recorrida nas suas declarações em sede de audiência de julgamento no Processo 177/ 10.7TABGC, termos em que, o depoimento da testemunha Dra. C. G. amiga e colega da aqui recorrida e que foi a sua “testemunha de serviço” não deve ser valorado e assim deve ser decidido por este Venerando Tribunal; Q) Os itens 31 a 39 correspondem a transcrição de cláusulas da apólice ou contrato de seguro e não deve ser levadas à matéria de facto como provada porque matéria de direito infraestadual e devem ser eliminados; R) Os itens 31 a 39 se forem matéria de facto então todas as cláusulas constantes da apólice ou contrato de seguro entre a X e a Ordem dos Advogados devem ser levadas à matéria de facto ainda que dadas por integralmente reproduzidas. S) A sentença viola o art. 208.º da Constituição da República Portuguesa que decreta “a lei assegura aos Advogados as imunidades necessárias ao exercício do mandato e regula o patrocínio forense como elemento essencial à administração da justiça”. T) A sentença viola o art. 114º, nº 1 e 3 al. b) da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais e que diz: “os advogados gozam ainda de imunidade e do direito do livre exercício do patrocínio forense e ao não sancionamento pela prática de actos conformes ao estatuto da profissão, como resulta da previsão contida; U) A sentença viola o artº 1º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro aprovado pelo DL nº 72/2008 de 16 de Abril na parte em que condena o recorrido solidariamente com a seguradora; V) A sentença viola o artº 805, 805º nº 3 do Código Civil e o código das Custas Judiciais Termos em que, O Venerando Tribunal deve ser dado provimento ao recurso e revogar a sentença da 1ª instância,… Não foram produzidas mais alegações. O Tribunal a quo emitiu pronúncia sobre a nulidade invocado pelo Recorrente A. M., julgando-a não verificada. 2. QUESTÕES A DECIDIR Nos termos dos Artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, as conclusões delimitam a esfera de actuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial. (1) Esta limitação objectiva da actividade do Tribunal da Relação não ocorre em sede da qualificação jurídica dos factos ou relativamente a questões de conhecimento oficioso, desde que o processo contenha os elementos suficientes a tal conhecimento (cf. Artigo 5º, nº 3, do Código de Processo Civil). Também não pode este Tribunal conhecer de questões novas (2) que não tenham sido anteriormente apreciadas porquanto, por natureza, os recursos destinam-se apenas a reapreciar decisões proferidas. (3) As questões enunciadas pelo/a (s) recorrente (s) podem sintetizar-se da seguinte forma. Ré X: - Da verificação da violação do princípio da adesão e da caducidade do direito de acção; - Da exclusão da responsabilidade pelos factos alegados na petição inicial de acordo com o contrato de seguro celebrado com a Recorrente; - Se o Tribunal a quo deveria ter condenado o R. Advogado no pagamento da franquia acordada e considerado que o direito de regresso da Recorrente sobre o R. Advogado não se restringe à franquia contratual; - Se esse direito de regresso da Recorrente sobre o R. Advogado vai além do valor da franquia contratual; - Da (des)proporção do valor da indemnização deferida; - Da errada contabilização de juros; - Do erro na fixação das custas dos autos. Autora: - Da adequação do valor da indemnização à previsão do art. 496º, do Código Civil. Réu A. M. - Da incompetência absoluta e material do tribunal a quo; - Da violação dos princípios da suficiência e adesão do processo penal; - Do abuso de direito, má-fé processual e utilização indevida da tutela jurisdicional, e litigância de má-fé da Autora; - Alteração da decisão de facto; - Da nulidade da sentença, prevista no nº 1 al. d) do artº 615.º do Código de Processo Civil; - Da violação do disposto nos arts. 208º, da Constituição da República Portuguesa, e 114º, nº 1 e 3 al. b) da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais; - Da violação do artº 1º do Regime Jurídico do Contrato de Seguro aprovado pelo DL nº 72/2008 de 16 de Abril na parte em que se condena o recorrido solidariamente com a seguradora - Da violação do art. 805º, nº 3, do Código Civil e do código das Custas. Judiciais. Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir 3. FUNDAMENTAÇÃO 3.1. Da nulidade da sentença, prevista no art. 615º, nº 1, al. d), do Código de Processo Civil No seio das conclusões que objectivam o recurso interposto, o Apelante A. M. atribui à sentença em crise (F) a omissão do conhecimento “da matéria de facto das contestações e documentos” incluídos no relato feito no item III., itens 1. a 60., das mesmas conclusões. Sem qualquer filtro, essa “matéria” é constituída pela reprodução do articulado contestatório do Apelante, incluindo factos, direito, opiniões e apreciações subjectivas, referências probatórias. O Tribunal a quo, pronunciou-se no sentido de considerar essa arguição imprecisa, não atender à circunstância de terem sido tidos em conta factos considerados relevantes e o vício previsto nessa al. d) não contender com a matéria de facto. Vejamos. Antes de mais, temos de notar que o Apelante não cumpriu aqui minimamente o ónus de alegação e conclusão que sobre o si impende (cf. art. 639º, do C.P.C.), tendendo para repetição, sem qualquer selecção dos argumentos fácticos e jurídicos, por si aduzidos numa fase embrionária do processo, ou seja, dos que seriam pertinentes neste momento em que já existe uma pronúncia do Tribunal sobre aqueles e ainda sem qualquer tentativa de cumprir o dever de síntese que se impõe em sede de conclusões, ou seja, de modo prolixo. Entrando na apreciação do vício arguido, dita o art. 615º, nº1, alínea d) do Código de Processo Civil, que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Trata-se de um vício formal, em sentido lato, traduzido em error in procedendo ou erro de actividade que afecta a validade da sentença. Esta nulidade está directamente relacionada com o Artigo 608º, nº2, do Código de Processo Civil, segundo o qual “O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.” Neste circunspecto, há que distinguir entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos pelas partes. Conforme já ensinava ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, V Vol., p. 143, “ São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer de questão de que devia conhecer-se, e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzida pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.” Ou seja, a omissão de pronúncia circunscreve-se às questões/pretensões formuladas de que o tribunal tenha o dever de conhecer para a decisão da causa e de que não haja conhecido, realidade distinta da invocação de um facto ou invocação de um argumento pela parte sobre os quais o tribunal não se tenha pronunciado. (4) Esta nulidade só ocorre quando não haja pronúncia sobre pontos fáctico-jurídicos estruturantes da posição dos pleiteantes, nomeadamente os que se prendem com a causa de pedir pedido e excepções e não quando tão só ocorre mera ausência de discussão das “razões” ou dos “argumentos” invocados pelas partes para concluir sobre as questões suscitadas. (5) A questão a decidir não é a argumentação utilizada pelas partes em defesa dos seus pontos de vista fáctico-jurídicos, mas sim as concretas controvérsias centrais a dirimir e não os factos que para elas concorrem. Deste modo, não constitui nulidade da sentença por omissão de pronúncia a circunstância de não se apreciar e fazer referência a cada um dos argumentos de facto e de direito que as partes invocam tendo em vista obter a (im)procedência da acção. (6) Nas palavras precisas de Tomé Gomes, Da Sentença Cível, p. 41, « (…) já não integra o conceito de questão, para os efeitos em análise, as situações em que o juiz porventura deixe de apreciar algum ou alguns dos argumentos aduzidos pelas partes no âmbito das questões suscitadas. Neste caso, o que ocorrerá será, quando muito, o vício de fundamentação medíocre ou insuficiente, qualificado como erro de julgamento, traduzido portanto numa questão de mérito.» Não há omissão de pronúncia quando a matéria, tida por omissa, ficou implícita ou tacitamente decidida no julgamento da matéria com ela relacionada, competindo ao tribunal decidir questões e não razões ou argumentos aduzidos pelas partes. (7) O juiz não tem que esgotar a análise da argumentação das partes, mas apenas que apreciar todas as questões que devem ser conhecidas, ponderando os argumentos na medida do necessário e suficiente. (8) Assim, incumbe ao juiz conhecer de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente deve conhecer (Artigo 608º, nº2, do Código de Processo Civil) à excepção daqueles cujo conhecimento esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outros. O conhecimento de uma questão pode fazer-se tomando posição directa sobre ela, ou resultar da ponderação ou decisão de outra conexa que a envolve ou a exclui. (9) Não ocorre nulidade da sentença por omissão de pronúncia quando nela não se conhece de questão cuja decisão se mostra prejudicada pela solução dada anteriormente a outra. (10) A não concordância da parte com a subsunção dos factos às normas jurídicas e/ou com a decisão sobre a matéria de facto de modo algum configuram causa de nulidade da sentença – Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17.5.2012, Gilberto Jorge, 91/09. Feitas estas considerações gerais, torna-se patente que a arguição do Recorrente é, ab initio, infundada, dado que se reporta ao julgamento da matéria de facto e quando muito poderia dar lugar a uma apreciação da respectiva decisão nos termos previstos nos arts. 640º e 662º, do Código de Processo Civil, caso seja identificado algum ponto relevante, o que aqui seguramente não sucedeu dado que o arguente se limitou a, basicamente, pretender uma repetição do julgamento da primeira instância e de todo o seu articulado. Improcedente, portanto, esta nulidade. 3.2. Da incompetência absoluta e material do Tribunal No seu recurso da sentença que conheceu do mérito da presente demanda, o Réu A. M. alega, em suma, que decorre da conjugação do dispositivo dos arts. 96º, do Código de Processo Civil, 7º e 71º, do Código de Processo Penal, que o Tribunal recorrido é absolutamente incompetente para apreciar a matéria em causa. Todavia, essa questão não foi abordada pelo Tribunal a quo na única decisão que foi alvo da sua impugnação recursiva (11). Note-se que o requerimento de recurso do Apelante apenas se reporta a essa sentença com a qual não se “conforma” o que, de acordo com o expresso supra em 2., obsta, aqui, ao conhecimento dessa questão. Sem prejuízo disso ou, ainda que assim não se entendesse, sucede que essa conclusão sempre estaria votada ao insucesso, dado que essa matéria, como adianta a Apelada nas suas alegações, em assunto conexo alegado pela co-Ré X, não é de conhecimento oficioso pelo Tribunal nesta fase do processo. Com efeito, sendo certo que do citado art. 96º, do Código de Processo Civil, decorre que determinam a incompetência absoluta do tribunal: a) A infracção das regras de competência em razão da matéria e da hierarquia e das regras de competência internacional, também é certo, e o Apelante faz por ignorar tal evidência, que o art. 97º, nº 2, do mesmo Código, estipula que a violação das regras de competência em razão da matéria que apenas respeitem aos tribunais judiciais só pode ser arguida, ou oficiosamente conhecida, até ser proferido despacho saneador, ou, não havendo lugar a este, até ao início da audiência final. Como assinalam Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa (12), o regime geral do art. 97º, nº 1, do C.P.C., “modifica-se quando se trate de incompetência material circunscrita à ordem dos tribunais judiciais (situação tida por menos grave do que a prevista no nº 1). Apenas pode ser invocada pelas partes ou suscitada pelo juiz até ser proferido o saneador (podendo, é claro, integrar o próprio despacho saneador) ou, não havendo lugar a este, até ao início da audiência final.” Ora, é patente que o caso desenhado pelo Apelante nas suas motivações é apenas respeitante aos tribunais judiciais pelo que, quando este alegadamente arguiu essa excepção em sede de alegações de recurso que visaram o despacho saneador proferido nos autos, estava precludida essa possibilidade, assim como estava esgotada a viabilidade de o Tribunal a quo dela conhecer oficiosamente, o que sempre demandaria a improcedência desta excepção. 3.3. Violação do princípio da adesão e a caducidade do direito de acção Nas suas alegações, a Ré X defende que a Autora violou o princípio da adesão previsto no art. 71º, do Código de Processo Penal, “sem explicação”, pois nada disse sobre isso na sua petição inicial, sendo inadmissível que se considere o que diz a esse respeito em sede de resposta a arguição dessa excepção. E se tal não bastasse, entende a mesma Recorrente que a Apelada sempre agiu em abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium, por já ter deduzido essa pretensão indemnizatória no processo-crime mas o mesmo ter sido indeferido por extemporaneidade. A Apelante invocou então o que considerava ser uma excepção peremptória, que importaria a sua absolvição do pedido. Esta é uma questão que vamos conhecer por iniciativa desta Recorrente, já que, relativamente ao Apelante A. M., estamos, também neste caso, perante matéria que não foi discutida na sentença recorrida mas sim, antes disso, em despacho saneador autónomo, que este verdadeiramente não impugnou, de acordo com o que acima já expusemos em 3.1., pelo que não iremos conhecer dessa parte do seu recurso, sem prejuízo do que infra se afirma sobre os argumentos coincidentes da Ré X. Esta Ré, embora tenha dito que impugnava a sentença, acrescentou no seu requerimento dirigido ao Tribunal recorrido (cf. citado art.637º, nº 1) que pretendia que fosse conhecida a impugnação que havia deduzido, pedindo a subida das alegações intempestivas então apresentadas. Embora julguemos que este último pedido carece de sentido (havia sim que motivar nova impugnação nos termos do cit. art. 644º, nº 3), esta Recorrente não deixou, porventura com a devida cautela, de renovar argumentos em sede do recurso agora apresentado, pelo que julgamos minimamente satisfeito o formalismo pressuposto nessas normas. Sobre essa excepção, o Tribunal a quo proferiu decisão de improcedência afirmando, em suma, o seguinte: “No caso dos autos e no que respeita aos factos invocados sob os artigos 11º a 24º da Petição Inicial, investigados no âmbito do referido processo criminal nº 177/10.7TABGC e, em abstracto, integradores dos crimes de denúncia caluniosa (artigo 365º nº1 e 2 do CP) e de difamação caluniosa e agravada (artigos 180º nº1, 183º nº1 alínea b) e 184º do CP com referência ao respectivo artigo 132º nº2 alínea l) (cfr. Doc. nº5 junto com a Petição Inicial – cfr. fls. 137 e ss.), verifica-se que a queixa criminal apresentada pela Autora quanto a tais factos foi deduzida em 30/3/2010, só tendo, no entanto, sido deduzida acusação contra os Réus, A. M. e I. A., quanto a tais factos em 27/5/2013, ou seja, mais de 8 meses após a notícia do crime (por via da queixa criminal apresentada pela Demandante). Mais se verifica ainda, e sobretudo, que entre o momento da prolação da acusação (27/5/2013) e o início do julgamento (em 24/6/2016) decorreram mais de 8 meses em que o processo esteve em fase de instrução, o que sempre permitiria à Demandante não ter de esperar mais tempo para deduzir o pedido de indemnização civil em separado. Nesse sentido, forçoso se torna considerar que sempre a Autora poderia deduzir o pedido de indemnização civil em separado ao abrigo da alínea a) do artigo 72º do CP. Acresce que, pelo menos, no que respeita ao segundo dos referidos crimes (de difamação caluniosa agravada), sempre se estaria perante um crime semi-público, susceptível de fazer admitir a dedução em separado do pedido de indemnização civil ao abrigo, nesta hipótese, da alínea c) do mesmo artigo 72º do CP.” Descendo ao tema e renovando argumentos que este Tribunal da Relação de Guimarães, pela mão deste relator, já sufragou no Acórdão inédito proferido no Proc. 732/17.4T8EPS.G1, na conferência de 31.10.2018… De acordo com a fundamental norma do art. 20º, da Constituição da República Portuguesa, (1) a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos. Dita o art. 71º, do Código de Processo Penal, que o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei. No entanto, logo de seguida, o seu art. 72º excepciona que, (1) o pedido de indemnização civil pode ser deduzido em separado, perante o tribunal civil, quando: a) O processo penal não tiver conduzido à acusação dentro de oito meses a contar da notícia do crime, ou estiver sem andamento durante esse lapso de tempo; b) O processo penal tiver sido arquivado ou suspenso provisoriamente, ou o procedimento se tiver extinguido antes do julgamento; c) O procedimento depender de queixa ou de acusação particular; d) Não houver ainda danos ao tempo da acusação, estes não forem conhecidos ou não forem conhecidos em toda a sua extensão; e) A sentença penal não se tiver pronunciado sobre o pedido de indemnização civil, nos termos do n.º 3 do artigo 82.º; f) For deduzido contra o arguido e outras pessoas com responsabilidade meramente civil, ou somente contra estas haja sido provocada, nessa acção, a intervenção principal do arguido; g) O valor do pedido permitir a intervenção civil do tribunal colectivo, devendo o processo penal correr perante tribunal singular; h) O processo penal correr sob a forma sumária ou sumaríssima; i) O lesado não tiver sido informado da possibilidade de deduzir o pedido civil no processo penal ou notificado para o fazer, nos termos do n.º 1 do artigo 75.º e do n.º 2 do artigo 77.º 2 - No caso de o procedimento depender de queixa ou de acusação particular, a prévia dedução do pedido perante o tribunal civil pelas pessoas com direito de queixa ou de acusação vale como renúncia a este direito. Na verdade o facto criminoso pode dar origem a duas reacções: uma de natureza criminal que se revela na aplicação ao faltoso de uma pena; e a outra de natureza civil que se consubstancia na separação dos danos causados pelo crime. (13) De acordo com o regime vigente no nosso ordenamento jurídico, à primeira vista, o citado art. 71º, estabelece, como norma, um regime de adesão obrigatória (que alguns, como Sá Gomes, contestam data a maior dimensão do universo do art. 72ºm nº 1, al. c)), ao processo penal para que se obtenha alguma dessas reacções pelo ilícito penal. Como assinala Cristina Dá Mesquita (14), “a solução adoptada no actual direito processual (penal e civil) português foi determinada pela «natureza consequencialmente complexa do facto material que dá origem a ambas as acções», pelo «princípio da economia processual», o objectivo de «promover o resultado de uniformização de julgados», a «ideia de maior rapidez de decisão sobre a reparação devida pelo crime», as «vantagens que possam resultar da própria cooperação dada, em função ou por força de interesses privados, ao processo penal», e o fim de «uma eficaz protecção a muitas vítimas de uma infracção penal».” Todavia, nos casos previstos no art. 72º, designadamente nos de responsabilidade civil emergente de crimes cujo procedimento criminal depende de queixa (crimes de natureza semipúblico) ou de acusação particular (crimes de natureza particular), o legislador estabeleceu claramente, seja excepção ou regra, o princípio da opção (15), que faculta ao lesado a possibilidade de se subtrair ao processo penal para obter a compensação dos danos sofridos com o crime, submetendo o pedido um tribunal não penal. Sendo certo que em casos com os previstos nas suas als. b), in fine, e e), estaremos mais perante uma necessidade do que de uma opção. Com efeito, “o princípio da adesão é mitigado pela admissibilidade em vários casos da acção de responsabilidade em separado perante os tribunais civis, cujos fundamentos são importantes para compreender a independência processual da acção instaurada em separado”. Daí que, nos casos de crime semipúblicos ou particulares: (1) não exista a obrigatoriedade de adesão (artigo 72.º, n.º 1, b), CPP); (2) deduzida acção civil antes da queixa fica impedido futuro processo penal (artigo 72.º, n.º 2, do CPP), e (3) tendo havido lugar a queixa o lesado pode este posteriormente desistir da mesma e instaurar acção de responsabilidade nos tribunais civis — cfr. acórdão do TRP de 26/5/2003 (Cunha Barbosa), processo n.º 0250567. Para além do poder de escolha originário do titular do direito de acção civil nos crimes semipúblicos, outras hipóteses de separação admitida pela lei têm em atenção o direito do lesado à instauração de acção de responsabilidade civil não condicionada pelo processo penal. Com efeito, a obrigatoriedade da adesão só vigora (independentemente da gravidade do crime) na fase de inquérito pelo período de 8 meses, a contar da notícia do crime, decorrido esse prazo sem que tenha sido deduzida acusação fica na disponibilidade do lesado propor a acção em separado nos tribunais civis.” (…) A amplitude dos casos em que cessa a obrigatoriedade de adesão e a margem de livre decisão do lesado nessa sede revelam que o ordenamento tem subjacente a susceptibilidade de pendência simultânea de dois processos independentes fundados em factos constitutivos similares, um sobre a responsabilidade criminal e outro relativo à responsabilidade civil. Hipóteses em que a tramitação da acção civil é exclusivamente regulada pela lei processual civil, em sintonia com a sua independência. (16) No caso em apreço, começaremos por dizer que nenhum dos Apelantes questionou oportunamente a matéria de facto subjacente àquela decisão intercalar, que assim se consolidou. E da mesma não restam dúvidas de que a notícia dos factos criminosos (cf. art. 241º e ss., do Código de Processo Penal) atendidos ocorreu com a denúncia escrita ocorrida em 30.3.2010 e que o respectivo inquérito só culminou, mais de três anos depois, com a dedução de acusação em 27.5.2013 (17). Tanto basta para que se considere literalmente preenchida a previsão do citado art. 72º, nº 1, al. a), mediante a qual a simples delonga entre a notícia do crime e a dedução de acusação que ultrapasse os 8 meses permite a opção pela jurisdição cível para exercício do direito de acção em causa, tal como entendeu a decisão recorrida. Em complemento, sempre se poderia defender, como já fizemos na decisão acima citada e foi dito pelo despacho recorrido, pelo menos no respeitante àquele crime de natureza semipública, cujo procedimento criminal está regulado no art. 188º, nº 1, al. a), do Código Penal, que estaríamos cumulativamente, perante a excepção alternativa prevista no citado art. 72º, nº 1, al. c). Temos em mente outra jurisprudência que considera, de modo diverso e secundando a posição da Apelante, nas circunstâncias apurados, que decorreu um prazo de “caducidade” da acção, uma vez expirado o prazo para deduzir o pedido de indemnização cível no seio da acção crime pendente (18). Contudo, com o devido respeito, não é essa a posição que julgamos acertada, antes a que ficou expressa no acórdão acima citado: se o Tribunal em que foi apresentada a demanda tem competência puramente cível, ou seja, não tem competência criminal, a violação do disposto no art. 71º consubstancia a excepção de incompetência material, o que importaria absolvição de instância (19) ou indeferimento liminar, de acordo com o caso (cf. arts. 99º, nº 1, 590º, nº 1, 130º, da Lei nº 62/2013, 278º, nº 1, al. a), 576º, 577º, al. a), e 578º, do Código de Processo Civil) (20); por outro lado, no caso em que o Tribunal é ainda materialmente competente para apreciar a pretensão na adequada instância criminal (cf. art. 130º, da L.O.S.J.), mas está impedido de o fazer na instância de natureza cível que se concretizou, estaremos sim perante uma excepção dilatória inominada (21) (cf. art. 576º, nºs 1 e 2, e 577º, do Código de Processo Civil), que importaria a absolvição do Réu da instância do processo cível e não do pedido. Isso assente, carece de fundamento qualquer limitação desse direito de opção que não se contenha no que a lei (22), maxime o citado art. 72º, do Código de Processo Penal, expressa, sob pena de se proceder a uma interpretação ilegal, à luz do que dispõe o art. 9º, do Código Civil, se não mesmo inconstitucional, na medida em que limita de forma inadmissível o direito fundamental expresso no acima citado art. 20º da Constituição da República Portuguesa (cf. art. 18º, da mesma Constituição). Conforme salienta Lebre de Freitas (23): “O direito de acção é, por isso, hoje pacificamente entendido como um direito público totalmente independente da existência da situação jurídica para a qual se pede a tutela judiciária, afirmando-se como existente: ainda que ela na realidade não exista, a afirmação basta à existência do processo, com o consequente direito à emissão da sentença. Aliás, nem sequer a falta dessa afirmação nem a do conflito de interesses que está na base de todo o processo civil dispensam a sentença judicial”. Posto isto e até perante o que já se afirmava na decisão em crise, falta fundamento ao que se afirma no item III. e IX. das conclusões da Apelante, sem qualquer suporte jurídico, quando ao contraditório pertinente: a Autora não deixou de expressar na sua petição inicial, ao reportar-se à sua causa de pedir e cumprindo o disposto no art. 5º, nº 1, 1ª parte, do C.P.C., factos suficientes para o Tribunal avaliar a sua competência, nos termos acima expostos, tal como foi feito (e as partes não questionaram em sede própria – cf. arts. 640º e 662º, do C.P.C.). Assim como não se concebe que não tivesse oportunidade de contradizer as excepções invocadas pela Ré, além de mais, em respeito do fundamental dispositivo dos arts. 3º, do C.P.C., e 20º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa. Sem prejuízo do exposto, discordando respeitosamente de jurisprudência que nesta matéria tem invertido o que decorre da previsão do art. 342º, nº 2, do Código Civil (24), sempre o ónus de alegar essa matéria impeditiva ou extintiva julgamos que seria da parte que pretenda aproveitar esse seu efeito (cf. art. 5º, nº 1, in fine, do C.P.C.), sem prejuízo do poder-dever do próprio Tribunal que pretendesse averiguar factos que entendesse e pudesse conhecer oficiosa e oportunamente (cf., v.g., arts. 6º, 411º, 578º e 579º, do C.P.C.). Em conclusão, verificadas as excepções acima anotadas (as do art. 72º, do C.P.P.), está legitimada a opção da Autora na demanda que protagoniza nesta instância cível, improcedendo a excepção “peremptória” invocada pela Ré/Apelante. Assinale-se que no item E das suas conclusões dedicadas a esta matéria, o Recorrente A. M. conclui que, sic: A presente acção constitui abuso de direito, má-fé processual e utilização indevida da tutela jurisdicional, devendo a autora ser condenada como litigante de má-fé. Na parca motivação que aduz sobre esse tema, sem qualquer referência legal, o Apelante alega que isso resulta da dedução nesta demanda de um pedido que foi julgado extemporâneo. Todavia, correspondendo a essa singeleza, diremos apenas que, como acima expusemos, trata-se de um direito adjectivo legítimo que em nada traduz essas singelas imputações, que assim se devem considerar improcedentes. 3.4. Abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium Nas suas conclusões a Apelante X, suscita a questão da violação do disposto no art. 334º, do Código Civil. No seu entender, a circunstância de a Apelada ter deduzido previamente, no processo-crime em que foram julgados os factos em apreço, o pedido de indemnização cível que nesta instância apresentou, indicia que não queria aproveitar a excepções do citado art. 72º, do Código de Processo Penal, o que, nos termos por si expostos em XIII. a XVIII., importa que o Tribunal considere verificada a apontada excepção. Neste ponto o Recorrente A. M. secunda a posição da co-Apelante, sem contudo sustentar essa conclusão ou sequer apontar qualquer norma violada que importasse a reapreciação do julgado, o que só por si imporia a improcedência dessa sua conclusão (E)). Antes disso, como já acima notámos, essa matéria não seria sequer conhecida por esta sua iniciativa, porque este Apelante não impugnou a decisão em causa, como acima já assinalámos. Resta, portanto, apreciar esse “abuso” à luz do que alega a Recorrente X, ao que a Autora contrapôs, além de mais, existência de caso julgado no Acórdão proferido por este Tribunal em 2019. Começando pela análise desta objecção, diremos que a mesma carece de sustento dado que, visto o texto da referida decisão, a pronúncia emitida circunscreveu-se ao abuso no âmbito da excepção de prescrição que foi aí conhecida, mais concretamente no tocante à invocação de interrupção do respectivo prazo, coisa distinta do aqui discutido preenchimento da previsão do citado art. 334º na invocação do disposto no art. 72º, do Código de Processo Penal. Além disso, à semelhança do que vimos defendendo, esta questão, do abuso de direito, seria sempre de conhecimento oficioso, pelo que, ainda que constitua questão não suscitada previamente perante Tribunal recorrido, sempre se imporia o seu conhecimento ao abrigo da excepção notada no item 2., supra, uma vez suscitada pela parte (porque, ressalva-se, o conhecimento oficioso não deixa de pressupor a existência de factos pertinentes ou que motivem a apreciação dessa excepção). E aqui, apreciando estas motivações da Apelante, convenhamos, esses factos, ab initio, não revelam o abuso configurado no art. 334º, do Código Civil. Com efeito, sobre esse abuso de direito, rege o disposto no art. 334º, do Código Civil, onde se estabelece que é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito. A figura do abuso de direito surge como uma forma de adaptação do direito à evolução da vida, serve como válvula de escape a situações que os limites apertados da lei não contemplam por forma considerada justa pela consciência social vigorante em determinada época, evitando que, observada a estrutura formal do poder que a lei confere, se excedam manifestamente os limites que se devem observar tendo em conta a boa-fé e o sentimento de justiça em si mesmo. (25) A ordem jurídica protege os interesses dos membros da comunidade, enquanto entre si se harmonizam e coexistem; isto é, protege-os enquanto são dignos de protecção e necessitados dela. (26) Como refere Meneses Cordeiro (27): O abuso do direito apresenta-se, afinal, como uma constelação de situações típicas em que o Direito, por exigência do sistema, entende deter uma actuação que, em princípio, se apresentaria como legítima. (…) Surgem situações atípicas, ocorrências de sobreposição e ocorrências desfocadas, em relação aos núcleos duros dos diversos tipos. No entender deste mesmo Professor, podem encontrar-se cinco subinstitutos, ausentes dos nossos manuais até há bem pouco tempo: venire contra factum proprium, inalegabilidade formal, suppressio, tu quoque e desequilíbrio no exercício. Todos eles traduzem concretizações de uma ideia tradicional: a da proibição do abuso do direito. Finalmente: todos apelam ao adensamento de um princípio clássico: a boa-fé. (…) O primeiro e, porventura, mais impressivo tipo de actos abusivos organiza-se em torno da locução venire contra factum proprium ou, mais simplesmente, venire. De origem canónica e com raízes controversas, o venire ficou a dever boa parte da sua carreira à musicalidade da sua fórmula latina. Estruturalmente, o venire postula duas condutas da mesma pessoa, lícitas em si, mas diferidas no tempo. Só que a primeira — o factum proprium — é contraditada pela segunda — o venire. O óbice que justificaria a intervenção do sistema residiria na relação de oposição que, entre ambas, se possa verificar. Há diversas sub-hipóteses. O venire é positivo quando se traduza numa acção contrária ao que o factum proprium deixaria esperar; será negativo caso redunde numa omissão contrária no mesmo factum. Sendo positivo, o venire pode implicar o exercício de direitos potestativos, de direitos comuns ou de liberdades gerais. O venire só é proibido em circunstâncias especiais. Para as explicar, surgiram duas grandes fundamentações dogmáticas: — doutrinas da confiança (CANARIS); — doutrinas negociais (WIELING). Para as doutrinas da confiança (72), o venire seria proibido quando viesse defrontar inadmissivelmente uma situação de confiança legítima gerada pelo factum proprium. Para as negociais, o agente ficaria vinculado, em termos negociais, pelo factum proprium em causa; ao perpetrar o venire, estaria a violar a vinculação daí derivada. (…) IV. Prevalecem hoje as doutrinas da confiança, as quais têm obtido o apoio da literatura portuguesa interessada. Na verdade, o princípio da confiança surge como uma mediação entre a boa-fé e o caso concreto. Ele exige que as pessoas sejam protegidas quando, em termos justificados, tenham sido levadas a acreditar na manutenção de um certo estado de coisas. Várias razões depõem nesse sentido. Em termos antropológicos e sociológicos, podemos dizer que, desde a sedentarização, a espécie humana organiza-se na base de relacionamentos estáveis, a respeitar. No campo ético, cada um deve ser coerente, não mudando arbitrariamente de condutas, com isso prejudicando o seu semelhante. Juridicamente, a tutela da confiança acaba por desaguar no grande oceano do princípio da igualdade e da necessidade de harmonia, daí resultante: tratar o igual de modo igual e o diferente de forma diferente, de acordo com a medida da diferença. Ora, a pessoa que confie, legitimamente, num certo estado de coisas não pode ser tratada como se não tivesse confiado: seria tratar o diferente de modo igual. V A tutela da confiança, embora convincente, só pode operar, na falta de preceitos jurídicos, quando se mostrem reunidos especiais pressupostos. De outro modo, poderíamos transformar a sociedade num colete-de-forças, que prejudicasse as iniciativas individuais necessárias para dar corpo à liberdade e para possibilitar a inovação e o progresso. (28) Acresce, como defende J.M. Coutinho de Abreu de modo incisivo, que o abuso de direito deve ser concebido “como um comportamento que, aparentando ser exercício de um direito, se traduz na não realização dos interesses pessoais de que esse direito é instrumento e na negação dos interesses de outrem.” (29) Defende este Autor que o abuso de direito deve ser compreendido, numa tríplice vertente: “1) É abusivo o comportamento emulativo, isto é, o que visa apenas prejudicar outrem; 2) sempre que de um comportamento derivem utilidades actuáveis pelo direito invocado, quando a essas utilidades se juntem (escusadas) desutilidades para outrem (já não cobertas pelo direito), há, nessa medida, abuso de direito; 3) É abusivo o comportamento que se diz exercício de um direito quando – não constituindo tal exercício, mesmo em abstracto uma vantagem objectiva –, se revela resultar dele, em concreto, apenas (ou sobretudo) uma desvantagem para terceiro.” Na aplicação prática desse instituto há ainda que ter em mente, como já acima fomos adiantando e afirma Meneses Cordeiro (30), que ela depende de terem sido alegados e provados os competentes pressupostos — salva a hipótese de se tratar de posições indisponíveis. Além disso, as consequências que se retirem do abuso devem estar compreendidas no pedido feito ao Tribunal, em virtude do princípio dispositivo. Verificados tais pressupostos, o abuso do direito é constatado pelo juiz, mesmo quando o interessado não o tenha expressamente mencionado: é, nesse sentido, de conhecimento oficioso. O Tribunal pode, por si e em qualquer momento, ponderar os valores fundamentais do sistema, que tudo comporta e justifica. Além disso, não fica vinculado às alegações jurídicas das partes. No caso, alega a Recorrente, em primeiro lugar, em suma, que a simples dedução, frustrada por extemporaneidade, do exercício processual do direito substantivo em causa – direito à indemnização dos danos invocados – gerou confiança de que a Apelada apenas iria demandar os responsáveis na instância crime. Ora, na sequência do que acima expusemos, não vemos que se possa atribuir a essa actuação qualquer investimento na confiança dos demandados (facto que aliás não foi oportunamente alegado ou demonstrado – art. 5º, do C.P.C.) de que a Apelada auto-constrangeria o seu direito à acção nesses termos ou que quisesse com isso significar que apenas os confrontaria nessa instância cível (assim como não consideramos abuso de direito a invocação deste argumento pela Apelante depois de em contestação não se ter suscitado essa questão!), perante a alternativa ou opção oportuna e admissível de o fazer nesta instância. Caso contrário, isso levar-nos-ia, desde logo, repita-se, a considerar limitado, de forma inadmissível esse direito fundamental ou qualquer alternativa processual, sucessiva ou não, que o legislador implementou ou admite em diversas circunstâncias. No que diz respeito ao alegado decurso do tempo, “mais de seis anos” de dilação entre as duas demandas, estaríamos antes, em tese, perante um caso que a doutrina apelida de supressio. Nas palavras de Meneses Cordeiro (31), “a suppressio é uma forma de tutela do beneficiário, confiante na inacção do agente. Teríamos, no fundo, uma espécie de venire, em que o factum proprium seria constituído por uma simples inacção. Esta, porém, nunca poderá ser tão clara e óbvia como um comum factum proprium. Por isso, o correspondente modelo de decisão será um pouco mais complexo do que o da habitual tutela da confiança: — um não-exercício prolongado; — uma situação de confiança, daí derivada; — uma justificação para essa confiança; — um investimento de confiança; — a imputação da confiança ao não-exercente. O quantum do não-exercício será determinado pelas circunstâncias do caso: o necessário para convencer um homem normal, colocado na posição do real, de que não mais haveria exercício. A justificação será reforçada por todas as demais circunstâncias ambientais capazes de conformar essa convicção, legitimando-a. Quer isto dizer que, no fundo, o confiante ex bona fide, vê surgir, na sua esfera, uma nova posição jurídica: será a surrectio (surgimento), contraponto da suppressio.” Na situação em apreço, já dilucidámos a inexistência de razões para considerar uma cimentada uma “confiança” adversa ao exercício do direito de acção em curso, sendo que, se nos ativermos ao factor “tempo” decorrido, as alegações da Apelante consubstanciam uma renovada discussão do prazo de prescrição estabelecido pelo Acórdão proferido em 2019 e, antes disso, pelas normas em vigor, ou seja, pretende, na prática a Recorrente gerar por via do disposto no art. 334º, um regime legal que existe e já foi aplicado ao caso, aliás, em termos que são mais restritivos do que os das normas substantivas que estabelecem limites temporais para o exercício do direito em causa, violando assim a subsidiariedade desse instituto. Esta circunstância está assim claramente regulada, o que ab initio, torna inadmissível a aplicação da norma residual do art. 334º, do Código Civil, ou a configuração de qualquer “abuso”, que redundaria na admissão de um prazo de prescrição do direito em causa que já foi negado à Apelante e no qual agora insiste com outras vestes. Do que fica dito, resulta que não se encontra verificado qualquer facto que permita considerar preenchida essa excepção, pelo que julgamos, também nesta parte, improcedente a apelação. 3.5. REAPRECIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO JULGADA Dita o art. 662º, do Código de Processo Civil que (1) a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. 2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente: a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento; b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova; c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta; d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados. Por sua vez, nos termos do Artigo 640º, nº 1, do Código de Processo Civil, «Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.” No que toca à especificação dos meios probatórios - «Quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes” (Artigo 640º, nº 2, al. a) do Código de Processo Civil). Como afirma Luís Filipe Espírito Santo, nos termos gerais do artigo 627º, nº 1, do Código de Processo Civil, o recurso, constituindo uma forma de impugnação de uma decisão judicial desfavorável, pressupõe essencialmente a possibilidade de reapreciação da questão jurídica ou de facto, em regra por um tribunal de nível superior ao que a proferiu. (…) Por outro lado, no conhecimento do objecto do recurso é basicamente apreciada a legalidade da decisão recorrida, em concreto o juízo de facto e de direito que incidiu sobre pretensão submetida ao veredicto judicial, naquele único e singular circunstancialismo, e não a tomada em consideração (pelo tribunal superior) de questões novas não suscitadas nem discutidas em 1ª instância (32). (…) O recurso interposto pela parte inconformada com a decisão judicial que desatendeu a sua pretensão tanto pode abranger a sindicância pelo tribunal superior relativamente à decisão de facto, como à decisão de direito. Trata-se de dois planos de análise que revestem, no percurso intelectual a seguir pelo julgador, clara autonomia, implicando formas de abordagem singulares e próprias que não se confundem. (33) A propósito, interessa ter presente que o art. 639º, nº 1, do C.P.C., estipula a regra geral a que deve obedecer a impugnação recursiva ao prever que o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. E, como acima salientámos, o que se pretende nesta fase é apenas a modificação de uma determinada decisão que, no tocante à matéria de direito, terá de ser questionada nos moldes previstos no nº 2, desse art. 639º, e se contender com a autónoma fundamentação de facto, deve observar o que dita no acima citado art. 640º, do mesmo Código, sem prejuízo do estipulado no invocado art. 662º. Como refere Abrantes Geraldes (34), sendo certo que actualmente a possibilidade de alteração da matéria de facto é agora assumida como função normal da Relação, verificados que sejam os requisitos que a lei consagra, certo é que nessa operação “foram recusadas soluções que pudessem reconduzir-nos a uma repetição do julgamento, tal como foi rejeitada a admissibilidade de recursos genéricos contra a errada decisão da matéria de facto, tendo o legislado optado por restringir a possibilidade de revisão de concretas questões de facto controvertidas relativamente às quais sejam manifestadas e concretizadas divergências por parte do recorrente. De acordo com este mesmo autor e Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, em, síntese, o sistema actual de apelação que envolva a impugnação sobre a matéria de facto exige ao impugnante, o seguinte: “a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões; b) Deve ainda especificar, na motivação, os meios de prova constantes do processo ou que nele tenha sido registados que, no seu entender, determinam uma decisão diversa quanto a cada um dos factos (35); c) Relativamente a pontos de facto cuja impugnação se funde, no todo ou em parte, em provas gravadas, para além da especificação obrigatória dos meios de prova em que o recorrente se baseia, cumpre-lhe indicar com exactidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considera oportunos; (…) e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos (36), exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos e pendor genérico e inconsequente; (…). Sublinha ainda o mesmo autor que não existe, quanto ao recurso da matéria de facto despacho de aperfeiçoamento. Tendo em mente esta exigência do dispositivo do citado art. 640º, entende ainda Abrantes Geraldes que, mediante uma apreciação rigorosa, decorrente do princípio da auto-responsabilidade das partes (37), sempre com respeito do princípio da proporcionalidade, da letra e espírito da lei, “a rejeição total ou parcial do recurso respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve verificar-se em alguma das seguintes situações: A falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (cf. arts. 635º, nº 4, e 641º, nº 2, al. b)); Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados (art. 640º, nº 1, al. a)); Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g., documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc); Falta de indicação exacta, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente cada segmento da impugnação.” Sobre esta última exigência a nossa posição mudou, em consonância com o que tem sido a evolução da jurisprudência deste Tribunal da Relação de Guimarães e de outros tribunais de recurso, como ficou dito em Ac. de 19.11.2020 (38), por nós subscrito: “Em síntese, as conclusões têm a importante função de definir e delimitar o objecto do recurso e, desta forma, circunscrever o campo de intervenção do tribunal superior encarregado do julgamento. Deste modo, sendo a impugnação de matéria de facto uma autêntica questão fundamental, susceptível de conduzir a decisão diferente, deve ela ser incluída nas conclusões das alegações, de forma sintética mas obviamente com indicação expressa e precisa dos pontos de facto impugnados e com as correspondentes conclusões sobre a decisão a proferir nesse domínio. (39)” Decorre também dessa leitura, conforme jurisprudência recente do Supremo Tribunal de Justiça que devemos ter em conta, de acordo com o disposto no art. 8º, nº 3, do Código Civil, que não são admissíveis impugnações em bloco que avolumem num ou em vários conjuntos de factos diversos a referência à pertinente prova que motiva a pretendida alteração das decisões e que, na prática, se reconduzem a uma impugnação genérica, ainda que parcelar. É exemplo disso o recente Ac. do S.T.J., de 20.12.2017, onde, em sumário, se escreveu o seguinte: sic: I- A alínea b), do nº 1, do art. 640º do CPC, ao exigir que o recorrente especifique “os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida”, impõe que esta concretização seja feita relativamente a cada um daqueles factos e com indicação dos respectivos meios de prova, documental e/ou testemunhal e das passagens de cada um dos depoimentos (40). II - Não cumpre aquele ónus o apelante que, nas alegações e nas conclusões, divide a matéria de facto impugnada em três “blocos distintos de factos” e indica os meios de prova relativamente a cada um desses blocos, mas omitindo-os relativamente a cada um dos concretos factos cuja decisão impugna. Nesse sentido o mesmo Supremo Tribunal considerou, em acórdão inédito de 14.06.2018, relatado pelo Conselheiro A. Joaquim Piçarra, em apreciação e confirmação de acórdão relatado por nós que envolvia essa matéria, no Proc. 2926/16.0T8BRG.G1.S1, em síntese e a propósito, que, sic: Não observa o ónus impugnatório fixado no art. 640º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, o impugnante da decisão da matéria de facto que, de forma confusa, prolixa e ambígua, não indica com precisão e certeza o sentido decisório a adoptar (41), nem correlaciona a parte concreta dos depoimentos ou documentos oferecidos relativamente a cada um do conjunto alargado de factos impugnados (42). Além disso, como já acima se foi adiantando e afirma Ana Geraldes, in “Impugnação e reapreciação da decisão da matéria de facto”,: « (…) tal como se impõe que o Tribunal faça a análise crítica das provas (de todas as provas que se tenham revelado decisivas), (…), também o recorrente, ao enunciar os concretos meios de prova que devem conduzir a uma decisão diversa, deve fundar tal pretensão numa análise (crítica) dos meios de prova, não bastando reproduzir um ou outro segmento descontextualizado dos depoimentos. Como é sabido, a prova de um facto não resulta, regra geral, de um só depoimento ou parte dele, mas da conjugação de todos os meios de prova carreados para os autos. E ainda que não existam obstáculos formais a que um determinado facto seja julgado provado pelo Tribunal mediante o recurso a um único depoimento a que seja atribuída suficiente credibilidade, não deve perder-se de vista a falibilidade da prova testemunhal quotidianamente comprovada pela existência de depoimentos testemunhais imprecisos, contraditórios ou, mais grave ainda, afectados por perjúrio. Neste contexto, é facilmente compreensível que se reclame da parte do recorrente a explicitação da sua discordância fundada nos concretos meios probatórios ou pontos de facto que considera incorrectamente julgados, ónus que não se compadece com a mera alusão a depoimentos parcelares e sincopados, sem indicação concreta das insuficiências, discrepâncias ou deficiências de apreciação da prova produzida, em confronto com o resultado que pelo Tribunal foi declarado. Exige-se, pois, o confronto desses elementos com os restantes que serviram de suporte para a formulação da convicção do Tribunal (e que ficaram expressos na decisão), com recurso, se necessário, às restantes provas, v.g., documentais, relatórios periciais, etc., apontando as eventuais disparidades e contradições que infirmem a decisão impugnada.” Por sua vez, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9.2.2012, Abrantes Geraldes, 1858/06 (43), afirmou-se, relativamente ao regime semelhante do art. 690ºA, do Código de Processo Civil revogado, que: «Insurgindo-se contra uma decisão fundada em determinados meios de prova que ficaram concretizados na motivação, era suposto que se aprimorasse na enunciação dos reais motivos da sua discordância traduzidos na análise crítica (e séria) da prova produzida e não na genérica discordância quanto ao facto de o tribunal de 1ª instância ter dado mais relevo a umas testemunhas do que a outras. Ónus esse que deveria passar pela análise conjugada dos diversos meios de prova, relevando os que foram oralmente produzidos e os de outra natureza constantes dos autos. Em face de tantas e tão graves distorções em relação aos trâmites impostos pela lei, não seria exigível que a Relação desse seguimento à referida pretensão genérica, justificando-se a rejeição do recurso na parte respeitante à decisão da matéria de facto. Com efeito, o regime legal instituído não acolhe de forma alguma a impugnação genérica e imotivada de todos os pontos inscritos na base instrutória, do mesmo modo que se afastou de um modelo alternativo que impusesse à Relação a realização de um segundo julgamento. O que está subjacente ao regime vigente é a impugnação especificada e motivada dos pontos relativamente aos quais existe discordância, levando a que a Relação repondere a decisão que foi tomada sobre determinados pontos de facto, servindo-se dos meios de prova que se mostram acessíveis. Resulta deste excurso pela doutrina e jurisprudência que o ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida não é observado quando o apelante: (i) se insurge genericamente quanto à convicção formada pelo tribunal a quo; (ii) se limita a sinalizar que existe um meio de prova, v.g., testemunha, que diverge dos factos tidos como provados pelo tribunal a quo, pretendendo arrimar – sem mais – nesse meio de prova uma decisão de facto diversa da expressa pelo tribunal a quo. Com efeito, o tribunal de primeira instância – no âmbito do contexto de justificação – elabora uma motivação-documento em que explicita as razões que permitem, ou não, aceitar os enunciados fácticos como verdadeiros. Nessa motivação, o juiz a quo valora o conjunto dos meios de prova que foram carreados para o processo, expressando uma convicção que tem que ser objectivável e intersubjectiva (44). O standard de prova do processo civil é, na maioria dos casos, o da probabilidade prevalecente (“more-likely-than-not”) que se consubstancia em duas regras fundamentais: (i) entre as várias hipóteses de facto deve preferir-se e considerar-se como verdadeira aquela que conte com um grau de confirmação relativamente maior face às demais e (ii) deve preferir-se aquela hipótese que seja “mais provável que não”, ou seja, aquela hipótese que é mais provável que seja verdadeira do que seja falsa (45). Assim sendo, cabe ao apelante – para efeitos de cumprimento do ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida – argumentar, de forma concretizada, no sentido de que os meios de prova produzidos no processo, apreciados em conjunto e de forma crítica, impõem uma convicção diversa quanto à reconstituição dos factos, atingindo essa diferente versão dos factos o patamar da probabilidade prevalecente, arredando - do mesmo passo - a versão aceite pelo tribunal a quo. Cabe ao apelante colocar-se na posição do juiz a quo e exercitar - ele próprio - a apreciação crítica da prova, hierarquizando a credibilidade dos meios de prova (enunciando os parâmetros que majoram ou diminuem a credibilidade de cada meio de prova), concluindo por uma versão alternativa dos factos. Deste modo, este exercício não se basta com a mera enunciação da existência de meios de prova em sentido oposto/diverso da versão dos factos tida como provada pelo tribunal a quo. A existência de sentidos díspares dos meios de prova é conatural a qualquer processo judicial pelo que o cumprimento do ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto não pode ter-se por observado com tal enunciação singela. É incumbência do apelante actuar numa dupla vertente: (i) rebater, de forma suficiente e explícita, a apreciação crítica da prova feita no tribunal a quo, (ii) tentando demonstrar que a prova produzida inculca outra versão dos factos que atinge o patamar da probabilidade prevalecente. Assim, não chega sinalizar a existência de meios de prova em sentido divergente, cabendo ao apelante aduzir argumentos no sentido de infirmar directamente os termos do raciocínio probatório adoptado pelo tribunal a quo, evidenciando que o mesmo é injustificado e consubstancia um exercício incorrecto da hierarquização dos parâmetros de credibilização dos meios de prova produzidos, ou seja, que é inconsistente. Em suma, não observa o ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida o apelante que se abstém de desconstruir a apreciação crítica da prova, realizada pelo tribunal a quo na decisão impugnada, limitando-se a assinalar que existe um meio de prova em sentido diverso do aceite como prevalecente pelo mesmo tribunal. Com refere Abrantes Geraldes (46) - As referidas exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor. Trata-se a final, de uma decorrência do princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo. Tendo em mente a interpretação do art. 640º, que acima enunciamos, analisemos a pretensa impugnação dos Apelantes. * Descendo ao caso. O Apelante A. M., nas conclusões onde deveria precisar os factos cuja reapreciação pretendia, sob o seu título III., “MATÉRIA DE FACTO E DE DIREITO ALEGADA PELO RECORRENTE NA CONTESTAÇÃO QUE DEVE SER DADA COMO PROVADA PELO VENERANDO TRIBUNAL”, itens 1 a 60, reproduz, nos moldes já acima descritos (3.1.), o que havia alegado no seu articulado contestatório. Na sequência dessa reprodução, pede que se julgue nula a sentença, por omissão de pronúncia sobre essa “matéria de facto”, o que já acima foi indeferido e não tem, portanto, qualquer reflexo na reparação da decisão em apreço. De resto, esse segmento das suas conclusões, que já apelidámos de prolixo, é o exemplo daquilo que o legislador quis evitar com o dipositivo do citado art. 640º, como acima deixámos explicado, uma tentativa inadmissível de repetir o julgamento feito na primeira instância em vez de discutir de forma precisa eventuais erros do mesmo. Pelo exposto, indefere-se essa reapreciação genérica da matéria contida nessas conclusões (cf. art. 640º, nº 1,m al. a), do C.P.C.). Na seguinte conclusão (G), o Apelante impugna a decisão do item 13. dos factos provados, em função do que resulta de documento alegadamente junto aos autos com requerimento probatório de 13.2.2019, pretendendo que essa matéria seja “corrigida”. Compulsados os autos, no processo digital, sob a Ref. 31533506, com data/registo de 13.2.2019, encontramos junto documento que reproduz Parecer e decisão do Concelho Superior da Ordem dos Advogados que emite pronúncia sobre recurso do Apelante da decisão mencionada nesse ponto 13. que, como aí se relata, considerou relevante apenas e só sobre a seguinte expressão do “Sr. Advogado” usada em requerimento dirigido ao Tribunal de Bragança no processo 290/06.5TABGC – “ostensiva e grosseira imparcialidade”. Nesse escrito consta que foi decidido aprovar o parecer e revogar aquela anterior deliberação. A Autora não questionou a falsidade deste documento autêntico, apenas impugnando o seu relevo probatório de forma genérica. Cremos, portanto e ao abrigo do disposto no art. 662º, nº 1, do Código de Processo Civil, que deve ser complementada a matéria desse item 13. em conformidade, como infra ficará a constar no lugar próprio. Na impugnação dos itens 14. a 16. (conclusões H) a J)), o Recorrente aparentemente não discute a veracidade dos factos julgados assentes, no entanto quando se trata de precisar o sentido da decisão pretendida relativamente a cada um deles, remete para uma vaga contextualização e para o teor de um conjunto vasto de documentos, à luz de considerações de direito impróprias para a reapreciação desse concreto julgamento factual. Por isso, julgamos que incumpriu o disposto no art. 640º, nº 1, als. b) e c), do Código de Processo Civil, pelo que se rejeita esta outra impugnação. Essa abordagem que recorre essencialmente a considerações de direito ou de interpretação da matéria factual julgada, repete-se na impugnação que o Apelante faz dos itens 17, 18, 19, 20 e 21 (K a M). Aqui também aparentemente não se discorda do que ficou assente e aliás resulta de prova documental indiscutida. Mais uma vez, coloca-se em causa apenas o seu relevo, sem indicar qualquer decisão alternativa, motivo pelo qual se rejeita esta impugnação (cf. art. 640º, nº 1, al. e), do C.P.C.). Na conclusão seguinte, o Recorrente afirma que o item 27 dos factos julgados assentes (N e O) foi “mal julgada”. Remete-se, para o efeito, novamente de forma imprecisa e acrítica, para um série vasta de escritos, a reapreciação dessa matéria à luz de considerações de direito impróprias para a impugnação que se propõe, dos diversos factos objectivos e subjectivos contidos nesse ponto da decisão em crise. Renovou-se, portanto, uma incerteza do sentido da decisão que, no entender do Apelante, deveria ser proferida, incumprindo-se outra vez o disposto no citado art. 640º, nº 1, al. c), aqui também sem discussão dos argumentos aduzidos na sentença em crise, pelo que se rejeita esta outra impugnação. No tocante aos itens 28 e 29, o Apelante diz apenas que não existe qualquer suporte probatório dessa matéria (P), sem indicar qual o sentido da decisão a proferir quanto a cada um dos factos subjectivos inscritos nesses pontos da decisão. Acresce que suporta essa impugnação, além de mais, em prova gravada, mais precisamente em depoimentos de testemunhas para os quais remete de forma genérica, sem precisar, por alguma forma, as passagens dessa gravação ou dos depoimentos que pudessem ser relevantes e são requisito indispensável à sua admissão. A alegação de que essa gravação é deficiente não obsta a essa conclusão e o seu relevo decorrerá sempre da oportuna arguição nos termos do actual art. 155º, nº 4, do C.P.C.. Pelo exposto, rejeita-se essa impugnação ao abrigo do citado art. 640º, nºs 1, al. c), e 2, al. a), do Código de Processo Civil. Por fim, o Apelante questiona a decisão positiva dos itens 31 e 39 da decisão de facto positiva da sentença, pedindo que não sejam levados à matéria de facto dada como provada, porque se trata de “matéria de direito infraestadual e devem ser eliminadas”. Neste ponto não estamos já no âmbito de verdadeiros erros de julgamento sujeitos ao regime do art. 640º, do Código de Processo Civil, mas antes, em tese, perante patologias da decisão, entre as quais se encontra a integração na sentença, na parte em que se enuncia a matéria de facto, de pura matéria de direito. (47) Sucede que a apreciação feita pelo Recorrente carece de sustento: a matéria inserta nesses pontos da decisão é matéria de facto que consubstancia o negócio jurídico ou encontro de vontades que suporta o contrato de seguro em discussão. Insurge-se ainda o Apelante, sem verdadeiramente justificar normativamente essa sua objecção, contra a transcrição circunstanciada do contrato em apreço, ainda aqui sem razão porque não demonstra a necessidade de outra solução dispositiva e ainda porque, na verdade, a decisão em crise teve o cuidado de dar como reproduzidas todas as condições do “aludido contrato”, tal como resulta da ressalva contida no item 31.. Em sede de motivação, o Recorrente faz outro tipo de considerações que não são enunciadas nessas conclusões (48) e nos remetem para interpretação factual ou jurídica imprópria para o efeito pretendido. Pelo exposto, improcede o que o Recorrente pretende com as conclusões que formula em Q e R. Ainda neste âmbito da impugnação da matéria de facto julgado, deixa-se aqui assinalado, em coerência com o que ficou acima dito, quer no ponto 2., quer neste ponto 3.5., sobre o ónus de objectivação da mesma em sede de conclusões e a delimitação da esfera de actuação deste tribunal de apelação que daí resulta, que não se conhecem outras referências ou impugnações da decisão positiva e negativa que o Apelante inscreve nas suas motivações mas não foram assinaladas nas suas conclusões. Ainda que assim não se entenda, sempre essas as mesmas se devem considerar rejeitadas, ao abrigo do disposto nos citados arts. 635º, nº 4, e 640º, nº 1, do Código de Processo Civil. 3.6. FACTOS A CONSIDERAR a) Factos provados. 1. A Autora é Juíza de Direito, tendo exercido funções no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Bragança. 2. Por seu turno, o 1º Réu, A. M., é Advogado com domicílio profissional na Rua …, nº …, Ermesinde. 3. Na qualidade de advogado, o 1º Réu foi defensor da sua mãe, a 2ª Ré, I. A., no âmbito do proc. 290/06.5TABGC que correu termos no aludido 2º Juízo do Tribunal Judicial de Bragança e em que esta era arguida. 4. Ainda na mesma qualidade, o 1º Réu representou a 2ª Ré, sua mãe, no âmbito do proc. 985/06.3TABGC, no qual esta era assistente. 5. No dia 26/2/2008, teve lugar, no âmbito do proc. 985/06.3TABGC debate instrutório presidido pela Autora e em que o 1º Réu, na altura advogado da 2ª Ré, assistente em tal processo, se dirigiu à Demandante, dizendo-lhe: “V. Exa. não percebe nada de nada…eu acho até que não devemos ter frequentado as mesmas faculdades, não devemos ler os mesmos livros e não temos os mesmos valores.” 6. No dia 13/8/2008, o 1º Réu deu entrada no Tribunal Judicial da Comarca de Bragança requerimento dirigido ao proc. nº 290/06.5TABGC, no qual constavam os seguintes dizeres: “para que conste e para quem estes autos vir, saber que o despacho que remeteu os autos para inquérito por pretenso crime mais grave do que aquele de que a arguida vinha acusada é uma iniquidade, atestada pelo douto e extenso aresto do Venerando Tribunal da Relação do Porto (…) e que julgou os factos em dissídio com a assistente sua filha que correram termos no Tribunal Judicial de Valongo (…). Será que o Tribunal de Bragança está tão cego que não vê o “claramente visto” como dizia o Poeta? E mais cego que o cego, como diz o adágio popular, é aquele que não ver. Que acontecimentos estranhos se estarão a passar para que o Tribunal de Bragança não aprecie e julgue os factos dos seus processos, com a imparcialidade, a clareza e a justeza que se impõe, vendo-se obrigado a participar superiormente os factos, por tão anómalas decisões. QUE “JUSTIÇA” VEM A SER ESTA???”Que VALORES ÉTICO-JURÍDICOS constituem o referencial dos Magistrados do Tribunal de Bragança e que têm apreciado e julgado os processos da aqui arguida??? Magistrados que não efectuaram as diligências requeridas, que não ouviram a arguida em sede de julgamento quando tencionava falar e as suas testemunhas foram desconsideradas pelo tribunal que ignorou os documentos e falta deles, revelando o processo ostensiva e grosseira parcialidade e porque a arguida pretende fundadamente expor superiormente os factos, vem requerer cópia da gravação da audiência”. 7. A 18/3/2008, o 1º Réu deu entrada no Tribunal Judicial da Comarca de Bragança de novo requerimento, desta feita, dirigido ao Proc. nº 985/06.3TABGC, onde, entre outros dizeres, fez constar que, durante o debate instrutório realizado nesses autos “O tribunal denunciava ou deixava antever a decisão de não pronúncia.” 8. A 10/4/2008, o 1º Réu endereçou à Autora uma carta por si assinada com conteúdo que infra se transcreve: “Vem a presente nos termos do art. 91º da Ordem dos Advogados, para lhe comunicar que pretendo subscrever procedimento disciplinar junto do Conselho Superior da Magistratura por V. Excia, em meu entendimento, ter violado gravemente os seus deveres enquanto magistrada judicial e no exercício dos mesmos e isto nos proc. 290/06.5TABGC e 958/06.3TABGC em que é arguida e assistente, respectivamente, I. A. que patrocino. Do meu ponto de vista, V. Excia. violou de forma muito grave os seus deveres nas altas funções em que está investida, conforme se denunciou nesse processo (…). O requerimento das cassetes áudio naquele processo pretendeu ser e é um grito de indignação pelo que considero o iníquo despacho e pretendeu reparar uma mancha que nos referidos autos pende sobre o bom nome de uma anciã portuguesa honesta e honrada, que como muito bem sabe é quem me deu o ser e que muito bem conheço(…) Sente-se indignada e é um direito seu, que partilho, porque este modus operandi e julgandi nos Tribunais, tem que se denunciar a outras instâncias, para a ele se por cobro.” (…) Além da referida denúncia, irá ser apresentada queixa dos magistrados que intervieram no processo junto do CSM (…) As razões serão expostas na participação em questão. Mais comunico que irei também apresentar queixa por no processo (…) ter indeferido o pedido de gravação do debate instrutório (…) O demais alegarei na participação. Participarei da resposta / comentário que me deu em sede de alegações (…) As razões serão expostas na participação em questão”. 9. Na sequência dos factos identificados em 1) a 8), a Autora participou criminalmente contra os Réus, tendo o processo-crime subsequente corrido termos no Tribunal Judicial da Comarca de Vinhais sob o nº 192/08.0TABGC P1; 10. Findando com a prolação de Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto em 29/9/2010, o qual condenou o 1º Réu, A. M., pela prática de 3 crimes de injúria com publicidade agravado, previstos e puníveis pelos artigos 180º nº1, 183º nº1 alínea a) e 184º do Código Penal, bem como por um crime de injúria agravado, previsto e punível pelos artigos 180º nº1 e 184º do mesmo diploma, na pena única de 350 dias de prisão, substituído por igual tempo de multa à taxa diária de € 25,00, no montante global de € 8.750,00 e em indemnização à Autora no valor de € 10.000,00. 11. Em data não concretamente apurada, mas situada em 2008, a Autora apresentou participação disciplinar do 1º Réu junto da Ordem dos Advogados em razão dos factos descritos em 1) a 8), em particular, das expressões por este dirigidas à Demandante e referidas em 5) e 6); 12. Tendo a Ordem dos Advogados concluído que a maioria das referidas expressões, embora infelizes, não atingiriam um carácter de ofensa ou insultos em termos de poder constituir infracção disciplinar, sendo tal, no entanto, o caso quanto à imputação por parte do 1º Réu à Autora de que, no âmbito do proc. 290/06.5TABGC esta teria agido com “ostensiva e grosseira parcialidade”; 13. Razão pela qual, por acórdão datado de 6 de Junho de 2014, o Conselho de Deontologia do Porto da Ordem dos Advogados aplicou ao 1º Réu a sanção disciplinar de “advertência” prevista na alínea a) do nº1 do artigo 125º do EOA, tendo essa decisão sido revogada por decisão proferida em sede de recurso interposto junto do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, com data de 13.10.2018, conforme escrito, que aqui se dá por reproduzido, junto com o requerimento de 13.2.2019, Ref. 3153350. 14. No dia 28/8/2009, os 1º e 2º Réus, em documento assinado por ambos, a 2ª Ré, na qualidade de queixosa, e o 1º Réu, na qualidade de advogado, entregaram junto do Tribunal da Relação do Porto uma participação criminal contra a Autora, imputando-lhe a prática, no processo comum singular nº 290/06.5TABC e, no processo de instrução nº 985/06.3TABGC, bem como no exercício das funções atribuídas à Demandante enquanto magistrada judicial, dos crimes de abuso de poder, favorecimento pessoal, denegação de justiça, coacção agravada e prevaricação. 15. Na participação aludida em 14), os 1º e 2º Réus fizeram constar os seguintes dizeres: que a Autora “nega o direito de a aqui participante fazer prova documental e pericial do facto contrário”; que a Autora “cortou a palavra” à 2ª Ré quando esta pretendia referir-se ou esclarecer determinados factos e que a Demandante “não pretendeu esclarecer” certos factos e “cortou a palavra e desviou para outro assunto” e “a participada queria ainda falar antes das declarações da assistente e (tal) não lhe foi permitido pela participada (Autora)” e que a 2ª Ré “pediu licença para falar, tendo (a Autora) impedido”, “não lhe concedeu logo a palavra “nem no final das declarações da assistente, como era seu indeclinável direito” e “só lhe concedeu a palavra no final e antes do encerramento da audiência para cumprir a formalidade e mesmo aqui (…) cortou-lhe por diversas vezes a palavra”; que, com a permissão da Autora “ao contrário, a assistente falou do que quis”, “do mesmo modo as testemunhas da assistente, “caso que não aconteceu com a testemunha da 2ª Ré e com o próprio 1º Réu”, a quem a Demandante “não deixou esclarecer os factos que eram do seu conhecimento e relacionados com o caso em dissídio” e “impediu (…) de falar”; que a Autora “não deixou esclarecer as questões e em vez de procurar saber a verdade dos factos, impede de os mesmos serem relatados, rectius, foram relatados muito a custo” e “impediu o esclarecimento dos factos, violando os seus deveres funcionais, incorrendo em abuso de poder e favorecimento pessoal.”; que a ora Autora “violando conscientemente e intencionalmente os seus deveres funcionais, com a sua conduta omissa (…), frustrou a actividade probatória que a (2ª Ré) se propunha fazer” e “com a sua conduta omissiva (…) impediu a realização e a pretensão da justiça a que a aqui participante tem ius (…), prejudicando-a e beneficiando com a sua conduta omissiva o autor do falso relatório e sua apresentante em juízo”; 16. Mais fizeram constar da aludida participação os 1º Réus o que se segue: “Que a Autora, além de prejudicar conscientemente a (aí) Ré (…) “teve comportamento (…) em sede de julgamento que revela objectivamente um pré-juízo de censura criminal sobre a arguida (a Ré, I. A.); que “a assistente e as suas testemunhas disseram tudo o que quiseram a propósito e a despropósito do objecto da discussão da causa, o mesmo não acontecendo com as testemunhas da arguida (a Ré, I. A.) “cujos depoimentos foram obstruídos pela participada (a Autora, S. L.); que a ora Autora “fazia perguntas sugestivas às testemunhas no sentido de obter matéria incriminatória da arguida (a referida Ré), “cujos depoimentos foram obstruídos pela participada ( ora Autora); que a ora Autora “fazia perguntas sugestivas às testemunhas no sentido de obter matéria incriminatória da 1ª Ré e impedindo a recolha de matéria no sentido da absolvição.”; que “a audiência de discussão e julgamento decorreu num ambiente de adversidade e hostilidade em relação à arguida e suas testemunhas, tudo isto permitido e acalentado pela participada que não cuidou objectiva e serenamente a recolha de prova.”; que a ora Autora decidiu “no seu arbitrário critério” e “no seu arbitrário e abusivo critério” “esteve com má-fé na apreciação da prova” e quanto a certa prova documental “ignorou-a de uma maneira ostensiva.”; que a ora Autora “de uma maneira ostensiva e arbitrária (…) remete aos autos para novo inquérito” e “foi intencionalmente e com abuso de poder em que se encontra investida (…) remeteu os autos para novo inquérito, sujeitando e prejudicando a arguida (…) à violência de novo procedimento criminal”.; que “apesar de tudo o que foi escrito, nem assim o Tribunal caiu em si e reconheceu as gritantes injustiças cometidas na pessoa da ora participante (a Ré, I. A.); que a ora Autora “revela objectivamente o pré-juízo de não culpabilidade e as perguntas feitas à testemunha são feitas nesse sentido”, “perguntas que ao mandatário da Ré (o Réu, A. M.) não foram permitidas em conformidade, rectius, foram conduzidas para que nada a testemunha pudesse esclarecer”; que a ora Autora “prosseguiu com a conduta omissiva de nada querer investigar” e teve uma “conduta (…) verdadeiramente impressionante (…) reveladora de uma arrogância e prepotência, absolutamente inusuais nos meios judiciais, indiciadora de abuso de poder”; que a ora Autora “abusando dos poderes em que se encontra investida não ordenou a recolha da prova requerida, impedindo consciente e voluntariamente que a mesma prova se produzisse e tudo isto para favorecer os arguidos e prejudicar (a Ré, I. A.), impedindo mesmo que a matéria fosse investigada e indiciária dos crimes públicos denunciados” “e impediu consciente e voluntariamente que a (referida Ré) fizesse até prova das imputações que à sua honra (…) lhe foram infligidas (…), tudo isto com o propósito de prejudicar a aqui 1º Ré (I. A.), incorrendo a Autora no crime previsto e punível nos termos do nº1 e 2 do art. 369º do Código Penal.”; que “a conduta da participada é revestida de arbitrariedade e prepotência”; que a Autora (S. L.) “não cuidou de investigar, está para lá do nosso alcance compreender como alguém titular do órgão de soberania Tribunal, tenha esta estranha maneira de valorar a factualidade”; que a ora Autora ao “apresentar queixa criminal contra a aqui participante (a Ré I. A.) e seu mandatário (o Réu A. M.) “agiu com o propósito de pressionar, intimidar ou ameaçar e impedir que a 1ª Ré e seu mandatário, aqui 2ª Réu, expusessem superiormente os factos”, “propósito que (…) conseguiu, mas incorreu no crime previsto e punível nos termos do nº1 do artigo 154º do Código Penal, com as agravantes constantes das alíneas b) e d) do nº1 do artigo 155º”; que a ora Autora “abusa das altas e nobres funções em que foi investida e não cumpre com os seus deveres funcionais.”; “que a ora Autora “coloca-se à margem do Direito tal qual é entendido pelo sentido dominante dos juristas e da sociedade, ao que julgamos de uma maneira voluntária e consciente”, sendo os seus “comportamentos relatados (…) completamente espúrios e não consentidos no seio da magistratura em que a participação se insere.”; que a Autora “revelou um profundo desprezo pelos valores da família (…) colocando-se à margem do sentir comum da mesma sociedade.”; que a ora Autora tem “uma concepção do mais autoritário que se pode conhecer do exercício dos poderes de soberania dos Tribunais, tem uma concepção do exercício do mandato forense mais subserviente que também se pode imaginar, que nem no período do Estado Novo isso acontecia e até no que aos Tribunais Plenários diz respeito.”; que a Autora “revela um profundo desprezo pelos valores da família e objectivamente também é reveladora de uma consciência ético-jurídica mal formada, porquanto denuncia ter sido atingida pela crise de valores que atravessa um pouco toda a sociedade; que a ora Autora “derramou no múnus jurisdicional de que se encontra investida uma clara e inequívoca desonra que é reprovada e intolerada no seio da nossa sociedade, sendo que as suas chocantes decisões são conhecidas de centenas de pessoas da cidade de Bragança, bem como da freguesia e freguesia circunvizinhas”.; que “vir agora a participada (a Autora, S. L.) com base no depoimento inconclusivo da funcionária do mesmo banco, depoimento requerido com habilidades da ora denominada esperteza urbana, considerar que a aqui 1ª Ré (I. A.) cometeu um crime de difamação por calúnia agravada, isto está fora do mais elementar senso do cidadão comum, dos inúmeros cidadãos, que não compreendem este tipo de decisões dos Tribunais, como não compreendem as da Autora.”; “que a conduta da participada é chocante para as populações em causa, como é chocante para qualquer consciência mínima e eticamente bem formada, só se podendo conceber em espíritos empedernidos e mentes conspurcadas pelo materialismo e outros ismos”, situando-se a Autora “nos antípodes daquele outro magistrado, que é bom de ver, interpreta o sentimento global geral da nossa sociedade”; que a Autora “cola-se à margem do Direito tal qual é entendido pelo sentido dominante dos juristas e da sociedade, ao que julgamos de uma maneira voluntária e consciente”, sendo os seus “comportamentos relatados (…) completamente espúrios e não consentidos no seio da magistratura em que a participante se insere.”; que a participada (Autora) actua “manchando com a sua conduta o bom nome que é devido à magistratura judicial.” 17. A participação aludida em 14) a 16) deu origem ao processo de inquérito nº 295/09.4TRPRT que correu termos na Procuradoria Geral Distrital no Porto, o qual terminou com a prolação de despacho de arquivamento, porquanto, no entender da Sra. Procuradora Geral Adjunta que o subscreveu, não havia qualquer indício objectivo ou subjectivo que decorresse da intervenção da aqui Autora e dos actos por si praticados em qualquer dos processos referidos na denúncia criminal que se pudesse acolher na descrição típica de cada um dos ilícitos que lhe eram imputados em tal participação. 18. Em data não concretamente apurada os 1º Réus, A. M. e I. A. (o primeiro na qualidade de mandatário da segunda, esta, na qualidade de queixosa), remeteram ao Conselho Superior da Magistratura uma exposição recebida por aquele órgão em 23/1/2010 em que aqueles imputavam à Autora a prática de ilícitos de natureza disciplinar, nomeadamente, a violação do dever de isenção e correcção a que a Demandante está vinculada por força do disposto nos artigos 3º nº4 alínea a) e f) e nº 5 e 10 do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ) por factos alegadamente praticados no âmbito do proc. 290/06.5TBBGC. 19. A participação referida em 15) deu origem ao inquérito nº 10-4/INQ do CSM, o qual foi arquivado “por não se mostrar indiciada a prática de qualquer infracção de natureza disciplinar por parte da Exma. Juíza”; 20. Concluindo o despacho de arquivamento que a versão dos factos narrada pelos 1º Réus “não (tinha) qualquer suporte nas gravações das declarações e depoimentos produzidos em sede de audiência de discussão e julgamento, nem nas atas exaradas”. 21. Mais referindo que tal exposição parecia “surgir como retaliação ao procedimento criminal instaurado pela Exma. Juíza contra ambos (os 1º Réus), bem como “Também não devem olvidar-se as relações de parentesco existentes entre eles (os 1º Réus, filho e mãe, respectivamente) e os interesses de ambos no despacho das várias decisões neles proferidas, nem sempre impugnadas pelos meios adequados ao que acresce as relações de inimizade com a contraparte, tudo impedindo um distanciamento necessário e uma análise objectiva e desapaixonada das questões ali suscitadas.” 22. No dia 30 de Setembro de 2009, na 1ª sessão de audiência de discussão e julgamento realizada no âmbito do proc. nº 192/08.0TABGC que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Vinhais, o 1º Réu, referindo-se à Autora, proferiu as seguintes declarações: “aquilo que eu escrevi (…) eu assumo integralmente”, repetindo tal expressão, pelo menos, duas vezes; “efectivamente escrevi isso (…) e tenho boas razões, tenho boas razões para o dizer.”; “eu não retiro rigorosamente nada daquilo que disse, porque eu entendo que efectivamente é esse o meu entendimento e tenho boas razões para o ter, que os despachos ali foram iníquos, foram extremamente (…) injustos (…) eu disse as razões (…) mantenho-as e não retiro”; “isto não pode acontecer nos Tribunais, considero que isto é um bom exemplo daquilo que não pode acontecer nos Tribunais, e é aí, é aí, (…) que (…) que se anuncia que se vai expor superiormente (…) os factos”, a “participante foi “parcial” (…) do meu ponto de vista (…) na valoração da prova”, “foi grosseiro (…) do meu ponto de vista houve negligência grosseira neste caso concreto”, “na minha opinião, de facto houve negligência grosseira ali, na apreciação (…) da prova, houve.” 23. Por força do descrito em 14) a 22), a Autora participou criminalmente dos 1º Réus, A. M. e I. A., imputando-lhes a prática de um crime de denúncia caluniosa, um crime de difamação agravada e um crime de difamação agravada com publicidade, tendo tal participação dado origem ao proc. nº 177/10.7TABGC; 24. No âmbito do qual foi deduzida acusação contra os 1º Réus, entendendo o Ministério Público que estes haviam incorrido na prática de um crime de difamação caluniosa, previsto e punível pelo artigo 365º nº1 e 2, em concurso real e efectivo com um crime de difamação caluniosa, previsto e punível pelos artigos 180º nº1 e 183º nº1 alínea b) e agravada pelo artigo 184º com referência ao artigo 132º nº2 alínea l), todas as disposições legais do Código Penal. 25. Foi requerida a abertura de instrução pelos 1º Réus, tendo os mesmos sido pronunciados pela prática de um crime de denúncia caluniosa, previsto e punível pelo artigo 365º nº1 e 2, sendo ainda o 1º Demandado, A. M., pronunciado pela prática de um crime de difamação com publicidade agravado previsto e punível pelos artigos 180º, 183º nº1 alínea a) e 184º por referência ao artigo 132º nº2 alínea l), todas as disposições legais do Código Penal. 26. Nessa sequência, foi proferida sentença, confirmada por acórdão do Venerando Tribunal da Relação do Porto, proferido em 28/2/2018 e transitado em julgado, nos termos da qual o aqui Réu e aí arguido, A. M., foi condenado, em concurso real, pela prática de um crime de denúncia caluniosa e de um crime de difamação agravada em cúmulo jurídico na pena única de 265 dias de multa à taxa diária de € 20,00, sendo absolvido do crime de difamação agravada com publicidade de que vinha igualmente pronunciado e sendo a aqui Ré e aí arguida, I. A., absolvida de todos os crimes de que vinha pronunciada. 27. Com as participações deduzidas pelos 1º Réus e que deram origem ao proc. nº 295/09.4TRPRT, bem como ao inquérito do CSCM nº 10-4/INQ, o 1º Demandado, A. M., actuou de forma voluntária, livre e consciente, pretendendo que, contra a Demandante fossem instaurados processo criminal e processo disciplinar, bem sabendo que a Autora não havia praticado quaisquer ilícitos susceptíveis de censura penal ou disciplinar e que, ao assim actuar, atentava contra a realização da justiça, bem como imputou à Demandante factos e expressou sobre a mesma palavras e considerações identificadas em 15) e 16) com o propósito alcançado de a ofender na sua honra, honorabilidade profissional e consideração, sabendo que a mesma era magistrada judicial a exercer tais funções no Tribunal de Bragança, e que os aludidos comportamentos eram proibidos e punidos pela lei criminal. 28. Em razão do referido em 14) a 27), a Autora sentiu-se gravemente ofendida na sua honra, consideração, bom nome, dignidade e brio profissional; 29. Sofrendo, em função de ter de prestar depoimento nos processos aludidos em 23), de ser suspeita ou arguida nesses processos e de ver colocada em causa a sua isenção e imparcialidade, desgaste emocional, vexame, humilhação e revolta, sentindo-se a Demandante magoada, transtornada, desgostosa, indignada e desgastada com tal situação. 30. A 1ª Ré, I. A., possuía, à data dos factos aludidos em 14) 27) cerca de 80 anos, tendo actualmente 88 anos de idade, sendo pessoa de pouca instrução e não possuindo quaisquer conhecimentos jurídicos. 31. Entre a 2ª Ré, X – Seguros Gerais, S.A. e a Ordem dos Advogados foi celebrado um contrato de seguro de grupo temporário do ramo de responsabilidade civil, titulado pela apólice nº ………58, mediante o qual aquela se obrigou a segurar a responsabilidade civil profissional dos advogados com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados em prática individual ou societária com um limite de € 150.000,00 por sinistro (cfr. condições particulares, gerais e especiais do aludido contrato junto a fls. 416v. e ss., cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para todos os efeitos). 32. Prevê o artigo 2º da Condição Especial de Responsabilidade Civil Profissional constante do aludido contrato de seguro o seguinte: “Mediante o pagamento do prémio e sujeitos aos termos e condições da apólice, a presente tem por objectivo garantir ao segurado a cobertura da sua responsabilidade económica emergente de qualquer reclamação de Responsabilidade Civil de acordo com a legislação vigente que seja formulada contra o segurado durante o período de seguro pelos prejuízos patrimoniais causados a terceiros por dolo, erro, omissão ou negligência cometida pelo segurado ou por pessoal pelo qual ele deva legalmente responder no desempenho da actividade profissional ou no exercício de funções nos órgãos da Ordem dos Advogados”. 33. Nos termos ainda do artigo 4º da aludida Condição Especial: “É expressamente aceite pelo tomador do seguro e pelos segurados que a presente apólice será competente exclusivamente para as reclamações que sejam apresentadas pela primeira vez no âmbito da presente apólice: a) Contra o segurado e notificadas ao segurador; b) ou contra o segurador em exercício de acção directa; c) Durante o período de seguro ou durante o período de descoberto resultantes de dolo, erro, omissão ou negligência profissional cometidos pelo segurado após a data retroactiva.” 34. Ainda nos termos do ponto 12) do artigo 1º da aludida Condição Especial, constitui “Reclamação”: “Qualquer procedimento judicial ou administrativo iniciado contra qualquer segurado ou contra o segurador, quer por exercício de acção directa, quer por exercício de direito de regresso, como suposto responsável de um dano abrangido pelas coberturas da apólice”, bem assim como “Toda a comunicação de qualquer facto ou circunstância concreta conhecida pela primeira vez pelo segurado e notificada por este ao segurador de que possa: (i) derivar eventual responsabilidade abrangida pela apólice; (ii) determinar a ulterior formulação de uma petição de ressarcimento; ou (iii) fazer funcionar as coberturas de apólice. 35. Finalmente, prevê o ponto 7) das Condições Particulares do Seguro de Responsabilidade Civil o seguinte: “O segurador assume a cobertura da responsabilidade do segurado por todos os sinistros reclamados pela primeira vez contra o segurado ou contra o tomador do seguro ocorridos na vigência de apólices anteriores, desde que participados após o início da vigência da presente apólice, sempre e quando as reclamações tenham fundamento em dolo, erro, omissão ou negligência profissional coberta pela presente apólice, ainda, que tenham sido cometidos pelo segurado antes da dada de efeito da entrada em vigor da presente apólice e sem qualquer limitação temporal da retroactividade.” 36. Por último, prevê o ponto 9) das Condições Particulares do Seguro de Responsabilidade Civil supra-referido a existência de franquia de € 5.000,00 por sinistro, devendo entender-se por aquela, de acordo com o ponto 15) do artigo 1º da Condição Especial de Responsabilidade Civil Profissional, a “importância que, em caso de sinistro, fica a cargo do segurado e cujo montante está estipulado nas Condições Particulares.”, referindo, no entanto, o ponto 15) do artigo 1º que a mesma não é oponível a terceiros lesados, o mesmo referindo, de resto, o artigo 7º de tal Condição Especial. 37. Ainda de acordo com o aludido contrato de seguro, o segurado (no caso, o 1º Réu) deveria comunicar à Seguradora (no caso, a 2ª Ré) ou ao corretor “com a maior brevidade possível” o conhecimento de qualquer reclamação efectuada contra ele ou qualquer outro facto ou incidente que pudesse razoavelmente vir a gerar uma reclamação (cfr. nº 1 do artigo 10º da Condição Especial de Responsabilidade Civil Profissional); 38. Devendo tal comunicação – dirigida ao corretor ou ao segurador - ser posteriormente comunicada no prazo máximo e improrrogável de 8 dias. 39. O contrato de seguro aludido em 31) foi celebrado pelo período de 12 meses com início às 0h00 de 1 de Janeiro de 2014 e termo às 0h00 do dia 1 de Janeiro de 2015, tendo sido renovado para os períodos correspondentes às anuidades de 2015 a 2017. 40. Os processos nº 192/08.0TABGC e 177/10.7TABGC foram, respectivamente, instaurados nos anos de 2008 e 2010, altura em que a responsabilidade civil profissional do 1º Réu estava transferida para a seguradora Y (Europe), Lda., tendo o primeiro processo tido decisão final em 29/9/2010 e o segundo decisão final em 28/2/2018. 41. O 1º Réu apenas comunicou à 2ª Ré, Seguradora, os factos e circunstâncias alegados na Petição Inicial deduzida pela Autora nestes autos e referenciados nos pontos 14) a 27) após a sua citação para os presentes autos em 16/9/2016. 42. No âmbito do proc. 290/06.5TABGC em que era assistente E. D. e arguida a Ré I. A., a Autora apenas presidiu ao julgamento, tendo indeferido requerimento de prova deduzido pela aludida Ré destinado a obter uma perícia às assinaturas apostas nos talões de levantamento de 4 cheques, uma vez que o Banco... havia informado nos autos que tais talões haviam sido extraviados. 43. No predito julgamento, a Autora ouviu a aludida Ré, aí arguida, no início e no final do julgamento, fazendo-o de forma serena e com respeito, não lhe tendo retirado a palavra, o mesmo acontecendo no que respeita ao depoimento do Réu, A. M., aí testemunha, a quem se dirigiu também de forma correcta e urbana. 44. Ainda no referido proc. 290/06.5TABGC a Autora, enquanto juiz do processo, proferiu despacho de alteração substancial dos factos, imputando à aí arguida, a Ré, I. A., crime mais grave do que aquele de que vinha acusada, tendo, nessa sequência, e perante a oposição da arguida a tal alteração, absolvido esta da instância e extraído certidão para novo inquérito criminal, sendo que tal decisão não foi impugnada pela arguida, tendo, em consequência, transitado em julgado. 45. Finalmente, ainda no mesmo processo, a Autora indeferiu pedido deduzido pelo Réu, A. M., entretanto nomeado mandatário pela Ré, I. A., no sentido de esta obter a gravação do julgamento, tendo em vista a participação pela referida Ré da Demandante para efeitos de instauração de um processo disciplinar junto do Conselho Superior da Magistratura, ordenando ainda a extracção de certidão para efeitos de eventual instauração de procedimento criminal e comunicação à Ordem dos Advogados relativamente às expressões utilizadas pelo Réu, A. M., em tal requerimento e referidas em 6). 46. No proc. 985/06.3TABGC em que a aqui Ré, I. A., figurava como assistente, tendo deduzido acusação particular contra os arguidos, E. D., J. D., S. D. e J. G., o Ministério Público não acompanhou tal acusação particular e arquivou o inquérito quanto aos demais factos susceptíveis de integrar crime público ou semipúblico, tendo, nessa sequência, os referidos arguidos, E. D., J. D. e J. G., requerido a abertura de instrução, fase essa presidida pela Autora. 47. Na aludida fase de instrução, a Autora, por considerar tal prova irrelevante para o objecto do processo, indeferiu requerimento deduzido pela aí assistente, I. A., tendo em vista a junção de certidões de habilitações literárias da aí arguida, E. D., e a sujeição desta última arguida a perícia médico-forense, nessa sequência, e realizado o debate instrutório, tendo proferido decisão de não pronúncia dos arguidos aludidos em 46), decisão essa confirmada, quer quanto ao indeferimento do aludido requerimento de prova da assistente, quer quanto à decisão de não pronúncia dos referidos arguidos, por acórdão do Tribunal da Relação do Porto datado de 25/3/2009. b) Factos não provados. A. Que a Autora, no âmbito do aludido proc. 290/06.5TABGC, tivesse indeferido o requerimento de prova apresentado pela Ré, I. A., no requerimento de abertura de instrução por esta deduzido (apenas tendo indeferido o requerimento de prova deduzido na Contestação da referida Ré, ali arguida, nos termos referidos em 42) dos factos provados). B. Que, no julgamento do proc. 290/06.5TABGC, a Autora, enquanto juiz que presidiu a tal diligência, tivesse negado a palavra à Ré, I. A., aí arguida. C. Que no julgamento do proc. 290/06.5TABGC, a Autora tivesse coarctado a palavra ao Réu, A. M., aí testemunha. D. Que, na fase de instrução do proc. 985/06.3TABGC, a Autora tivesse obstruído o depoimento das testemunhas. E. Que as decisões proferidas pela Autora no âmbito dos proc. 290/06.5TABGC e 985/05.3TABGC, na medida em que geradoras de escândalo, tivessem sido comentadas nos cafés de Bragança durante 8 meses. F. Que a Ré, I. A., tivesse conhecimento das participações criminal e disciplinar apresentadas pelo Réu, A. M., em seu nome e deduzidas contra a Autora aludidas em 14) a 22), tendo aprovado o respectivo conteúdo. 3.7. DO DIREITO APLICÁVEL 3.7.1. Da violação do disposto nos arts. 208º, da Constituição da República Portuguesa, e 114º, nº 1 e 3 al. b) da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais Em matéria de direito os temas que este Réu expressamente suscita nas suas conclusões reduzem-se, a final e além do já acima enunciado, aos expostos nos itens S) a V), incluindo o dessa alegada violação das normas que regem a sua actividade com o que, embora não o chegue a dizer, pretenderá excluir a tipicidade ou ilicitude da conduta exposta. Cumpre, antes de mais, dizer que a decisão da matéria de facto considerada pela decisão recorrida se manteve praticamente intocada e, no que toca aos factos essenciais relativos à causa de pedir discutida, sem qualquer reparo. Na verdade a alteração do item 13., que apenas se admite para eventual ponderação de solução jurídica que não consideramos viável, não afasta a relevância dos factos assentes expostos em 14. a 19. e 27., supra, que consubstanciam parte dos pressupostos cumulativos da responsabilidade civil extracontratual que sustenta a demanda da autora e está prevista, v.g., no art. 483º, do Código Civil. Sem prejuízo disso, sempre se dirá que a jurisdição disciplinar exercida no Acórdão citado em 13., que cirurgicamente apreciou tão-somente a relevância do uso da expressão nele visada e acima assinalada, estando longe de abordar toda a factualidade que aqui se discute, não constrange de qualquer forma a decisão deste Tribunal (cf. arts. 5º, nº 3, do Código de Processo Civil, e 203º, da Constituição da República Portuguesa), e é, por si, independente da responsabilidade civil e criminal decorrente da prática do mesmo facto (cf. art. 116º, nº 1, do E.O.A.), sem prejuízo, inversamente, do que nessa jurisdição se quiser (esse) atender do processo criminal instaurado (cf. nº 3, do mesmo artigo desse Estatuto). Está, assim, prejudicado o conhecimento do presumido reflexo jurídico da vasta impugnação da matéria de facto essencial, aduzida sem sucesso, por este Recorrente (cf. arts. 608º, n.º 2, 663º, n.ºs 2 e 6, ambos do Código de Processo Civil), pelo que nos iremos ater aos temas explorados pelo Apelante nas suas conclusões S) e seguintes. No tocante à invocada imunidade… Os advogados desempenham uma função determinante na garantia do Estado de Direito Democrático e na boa administração da justiça, tal como decorre deste normativo e de outras normas, de cariz ordinário. Por isso, estabelece esse art. 208º, da Constituição da República Portuguesa, que: A lei assegura aos advogados as imunidades necessárias ao exercício do mandato e regula o patrocínio forense como elemento essencial à administração da justiça. Era, na altura em que foram praticados os factos em causa (2009/2010) o caso do invocado art. 114º, da L.O.F.T.J. (Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro), onde se estipula que (1) a lei assegura aos advogados as imunidades necessárias ao exercício do mandato e regula o patrocínio forense como elemento essencial à administração da justiça. 2 - Para a defesa dos direitos e garantias individuais, os advogados podem requerer a intervenção dos órgãos jurisdicionais competentes. 3 - A imunidade necessária ao desempenho eficaz do mandato forense é assegurada aos advogados pelo reconhecimento legal e garantia de efectivação, designadamente: a) Do direito à protecção do segredo profissional; b) Do direito ao livre exercício do patrocínio e ao não sancionamento pela prática de actos conformes ao estatuto da profissão; c) Do direito à especial protecção das comunicações com o cliente e à preservação do sigilo da documentação relativa ao exercício da defesa. Já no âmbito dessa Lei de 1999, a norma do seu art. 6º prescrevia que (1) os advogados participam na administração da justiça, competindo-lhes, de forma exclusiva e com as excepções previstas na lei, exercer o patrocínio das partes, e que (2) no exercício da sua actividade, os advogados gozam de discricionariedade técnica e encontram-se apenas vinculados a critérios de legalidade e às regras deontológicas próprias da profissão. Actualmente, na Lei nº 62/2013, o legislador ordinário repete nos seus arts. 12º e 13º essa imunidade estabelecida na norma fundamental do citado art. 208º. Nesse art. 12º, precisa-se que (1) o patrocínio forense por advogado constitui um elemento essencial na administração da justiça e é admissível em qualquer processo, não podendo ser impedido perante qualquer jurisdição, autoridade ou entidade pública ou privada. (2) Para defesa de direitos, interesses ou garantias individuais que lhes sejam confiados, os advogados podem requerer a intervenção dos órgãos jurisdicionais competentes, cabendo-lhes, sem prejuízo do disposto nas leis do processo, praticar os actos próprios previstos na lei, nomeadamente exercer o mandato forense e a consulta jurídica. (3) No exercício da sua actividade, os advogados devem agir com total independência e autonomia técnica e de forma isenta e responsável, encontrando-se apenas vinculados a critérios de legalidade e às regras deontológicas próprias da profissão. Por sua vez, o art. 13.º, concretiza essa imunidade do mandato conferido a advogados, estabelecendo que: (1) A lei assegura aos advogados as imunidades necessárias ao exercício dos actos próprios de forma isenta, independente e responsável, regulando-os como elemento indispensável à administração da justiça. (2) Para garantir o exercício livre e independente de mandato que lhes seja confiado, a lei assegura aos advogados as imunidades necessárias a um desempenho eficaz, designadamente: a) O direito à protecção do segredo profissional; b) O direito ao livre exercício do patrocínio e ao não sancionamento pela prática de actos conformes ao estatuto da profissão; c) O direito à especial protecção das comunicações com o cliente e à preservação do sigilo da documentação relativa ao exercício da defesa; d) O direito a regimes específicos de imposição de selos, arrolamentos e buscas em escritórios de advogados, bem como de apreensão de documentos. No momento da prática dos factos em apreço, estabelecia o art. 77º, do E.O.A. (Estatuto da Ordem dos Advogados - Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro) Art. 76.º (Princípios gerais) (1) O advogado exercita a defesa dos direitos e interesses que lhe sejam confiados sempre com plena autonomia técnica e de forma isenta, independente e responsável. (…) Art. 83º (Integridade) (1) - O advogado é indispensável à administração da justiça e, como tal, deve ter um comportamento público e profissional adequado à dignidade e responsabilidades da função que exerce, cumprindo pontual e escrupulosamente os deveres consignados no presente Estatuto e todos aqueles que a lei, os usos, costumes e tradições profissionais lhe impõem. (2) - A honestidade, probidade, rectidão, lealdade, cortesia e sinceridade são obrigações profissionais. Artigo 84.º (Independência) O advogado, no exercício da profissão, mantém sempre em quaisquer circunstâncias a sua independência, devendo agir livre de qualquer pressão, especialmente a que resulte dos seus próprios interesses ou de influências exteriores, abstendo-se de negligenciar a deontologia profissional no intuito de agradar ao seu cliente, aos colegas, ao tribunal ou a terceiros. Art. 85º (Deveres para com a comunidade) (1) - O advogado está obrigado a defender os direitos, liberdades e garantias, a pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e instituições jurídicas. (2) - Em especial, constituem deveres do advogado para com a comunidade: a) Não advogar contra o direito, não usar de meios ou expedientes ilegais, nem promover diligências reconhecidamente dilatórias, inúteis ou prejudiciais para a correcta aplicação de lei ou a descoberta da verdade; b) Recusar os patrocínios que considere injustos; c) Verificar a identidade do cliente e dos representantes do cliente, assim como os poderes de representação conferidos a estes últimos; d) Recusar a prestação de serviços quando suspeitar seriamente que a operação ou actuação jurídica em causa visa a obtenção de resultados ilícitos e que o interessado não pretende abster-se de tal operação; e) Recusar-se a receber e movimentar fundos que não correspondam estritamente a uma questão que lhe tenha sido confiada; f) Colaborar no acesso ao direito; g) Não se servir do mandato para prosseguir objectivos que não sejam profissionais; h) Não solicitar clientes, por si ou por interposta pessoa. Artigo 90.º (Dever geral de urbanidade) No exercício da profissão o advogado deve proceder com urbanidade, nomeadamente para com os colegas, magistrados, árbitros, peritos, testemunhas e demais intervenientes nos processos, e ainda funcionários judiciais, notariais, das conservatórias, outras repartições ou entidades públicas ou privadas. Art. 92º (Princípios gerais) (1) - A relação entre o advogado e o cliente deve fundar-se na confiança recíproca. (2) - O advogado tem o dever de agir de forma a defender os interesses legítimos do cliente, sem prejuízo do cumprimento das normas legais e deontológicas. Art. 99º (Responsabilidade civil profissional) (1) - O advogado com inscrição em vigor deve celebrar e manter um seguro de responsabilidade civil profissional tendo em conta a natureza e âmbito dos riscos inerentes à sua actividade, por um capital de montante não inferior ao que seja fixado pelo conselho geral e que tem como limite mínimo (euro) 250000, sem prejuízo do regime especialmente aplicável às sociedades de advogados. (2) - Quando a responsabilidade civil profissional do advogado se fundar na mera culpa, o montante da indemnização tem como limite máximo o correspondente ao fixado para o seguro referido no número anterior, devendo o advogado inscrever no seu papel timbrado a expressão 'responsabilidade limitada'. (3) - O disposto no número anterior não se aplica sempre que o advogado não cumpra o estabelecido no n.º 1 ou declare não pretender qualquer limite para a sua responsabilidade civil profissional, caso em que beneficia sempre do seguro de responsabilidade profissional mínima de grupo de (euro) 50000, de que são titulares todos os advogados portugueses não suspensos. No Código de Processo Civil então vigente estabelecia o art. 154º, nº 2 (actual art. 150º/2) (aplicável ao processo penal ex vi art. 3º, do Código de Processo Penal), que não é considerado ilícito o uso das expressões e imputações indispensáveis à defesa da causa. Do exposto, sobressai que o Réu/Apelante, agindo como advogado, beneficia das imunidades que forem necessárias ou indispensáveis ao desempenho do mandato ou função que desempenha na administração da justiça, estando sujeito, apenas a critérios de legalidade e às regras deontológicas próprias da profissão, das quais se realça a obrigação de honestidade, probidade, rectidão, lealdade, cortesia e sinceridade. Na sua actuação pública e profissional deve agir de modo adequado à dignidade e responsabilidades da função que exerce, cumprindo pontual e escrupulosamente os deveres consignados no seu Estatuto e, sempre, de modo “responsável”. Perante esse enquadramento, é lícito aos advogados o uso de expressões e imputações indispensáveis à defesa da causa, como se encontra previsto no citado normativo do Código de Processo Civil. Todavia, a referência à necessidade ou cariz indispensável das “imunidades” de que deve beneficiar ou a reflexa licitude da actuação prevista no citado art. 154º, nº 2, remete-nos (art. 9º, do Código Civil) para uma permissão que não deixa de ter limites, nomeadamente na lei ou nas regras deontológicas estabelecidas e não é, portanto, um direito absoluto de irresponsabilidade que, aliás, haveria de ferir vários dispositivos de ordem constitucional e ordinária concorrentes. Aliás, já o Estatuto que regia a actividade do Apelante à época dos factos deixava claro que essa responsabilidade pode existir e deve até ser garantida por seguro, nos termos do citado art. 99º. Deste modo, a imunidade que a lei assegura aos senhores advogados é a imunidade necessária ao exercício do mandato, o que pressupõe o exercício do mandato de acordo com o princípio da necessidade, da adequação e da proporcionalidade (note-se que “a lei assegura aos advogados as imunidades necessárias ao exercício do mandato…”, o que tem implícita uma limitação a tais imunidades, pois que elas existem apenas na medida do necessário ao exercício do mandato). A imunidade não é, pois, absoluta já que tem como limite a conformidade do exercício do mandato ao estatuto da profissão, estatuto que lhe impõe “um comportamento público e profissional adequado à dignidade e responsabilidade da função que exerce, cumprindo pontual e escrupulosamente os deveres consignados no presente estatuto”, devendo – no exercício da profissão – “proceder com urbanidade, nomeadamente para com os magistrados…”, “defender os interesses legítimos do cliente, sem prejuízo do cumprimento das normas legais e deontológicas” e “exercer o patrocínio dentro dos limites da lei e da urbanidade…”(art.ºs 83, 90, 92 e 105 do EOA). A partir do momento em que tais limites são ultrapassados – tendo em conta, designadamente, o princípio da necessidade e da proporcionalidade – deixa de ter fundamento ou justificação a invocada imunidade, na medida em que colide com outros direitos fundamentais, igualmente com consagração constitucional, como seja o direito à honra e bom nome. – Cf. Ac. do Tribunal da Relação de Évora, de 28-02-2012. (49) Já escrevia Alberto dos Reis (50), a propósito de previsão similar à do art. 154º, nº 2, do Código de Processo Civil - Não pode admitir-se que o advogado, ou o solicitador, ou a parte use de linguagem desbragada e despejada com prejuízo do respeito devido às instituições, às leis e ao tribunal; mas é absolutamente indispensável que esta censura não se exerça em deterimento do sagrado direito de defesa. Tem de reconhecer-se ao advogado a liberdade de dizer, por escrito ou oralmente, tudo o que for necessário à defesa da causa que lhe está confiada. Claro que, para defender eficazmente os interesses do seu constituinte, o advogado não precisa de insultar, agredir ou vexar quem quer que seja, nem tão pouco de ofender a dignidade do tribunal, o decoro da lei ou o prestígio das instituições. Mas há circunstâncias especiais em que se compreende e justifica um certo vigor de linguagem, em que, mesmo a pessoa mais disciplinada e comedida, é naturalmente levado a usar expressões severas e enérgicas. Não obstante, o mesmo Professor já se queixava de que há quem se “compraza em converter a demanda numa luta áspera e sombria, em que nada se poupa”, “prática indecorosa e abominável, contra a qual toda a severidade disciplinar é perfeitamente legítima e indispensável” e lembrava que uma discussão pode ser “animada e viva, sem deixar de ser correcta”: “A verdade é que o uso de linguagem agressiva e despejada nunca pode ser útil à defesa da causa”. Ora, no presente caso, os factos apurados não deixam dúvidas sobre a desadequação (desnecessidade, dispensabilidade ou inutilidade) da conduta do Apelante à luz das regras acima citadas, na medida em que ficou expressamente assente que o mesmo agiu, ainda que sob as vestes de mandatário forense, não só ciente (51) da falsidade das imputações que formulou em procedimentos criminais e disciplinares por si desencadeados para o efeito mas também com a intenção ilegal e não incluída nos seus propósitos funcionais, de ofender (e não de defender), bem como ciente da ilegalidade dessas condutas (cf. item 27. dos factos assentes). Tanto basta para se julgar que a decisão em apreço não violou os citados dispositivos legais ao responsabilizar civilmente o Apelante, por conduta claramente desconforme à lei, incluindo que a que já então estabelecia o seu estatuto e, portanto, fora do âmbito das imunidades de que beneficiava. Devem, por isso, improceder as conclusões vertidas em S) e T). 3.7.2. Da violação do art. 1º do D.L. nº 72/2008. Estamos aqui (item U)) perante questão que o Apelante não excepcionou no seu articulado contestatório, onde devia ter apresentado toda a sua defesa (cf. art. 573º, nº 1, do Código de Processo Civil), ressalvadas a excepções previstas, v.g., quanto a factos supervenientes, que aqui não foram invocadas ou verificadas. Pelo exposto, trata-se de matéria, que sem deixar de ter qualquer sustento nas normas citadas (cf. art. 9º, do Código Civil) é nova, pelo que, pelas razões já adiantadas supra em 2., não será aqui conhecida. 3.7.3. Da exclusão da responsabilidade da Recorrente X por incumprimento do dever de comunicação A Apelante seguradora questiona nos itens XIX. a XXVI. das suas conclusões a oponibilidade de determinadas cláusulas do contrato celebrado consigo, maxime, de entre as visadas no item LVIII. das suas conclusões, as que importam um dever especial de comunicação, como são, na sua opinião, as contidas nos artigos 3º e 8º das “Condições Especiais” do contrato referido em 31. dos factos assentes e que aí se dão por reproduzidas (juntas com a contestação, a fls. 416 e ss./2º Vol.). Contudo, nessa impugnação, a Apelante, embora reproduza nas suas motivações, de forma sincopada, a respectiva fundamentação da sentença, em bom rigor não a rebateu e, seguramente, não discute que a mesma decisão, em parte não foi reproduzida, considerou que estávamos perante excepção que não era oponível a terceiros, nomeadamente à aqui Autora. Com efeito, depois de discutir outro argumento que a Ré não discute, relacionado com a alegada falta de alegação de matéria pertinente, o Tribunal a quo concluiu o seguinte. “Mas mesmo que assim não fosse – e julga-se ser – o mais relevante é que, conforme referido no aresto supra-aludido, bem como no acórdão STJ de 14/12/2016 (relator: António da Silva Gonçalves) para casos semelhantes, sendo o contrato de responsabilidade civil de advogado um seguro obrigatório que visa primordialmente o interesse da protecção dos terceiros beneficiários eventualmente prejudicados pela conduta geradora de responsabilidade civil do mandatário, resulta do artigo 100º nº4 da Lei 72/20085 que o beneficiário do seguro não pode ser prejudicado pelo eventual incumprimento do dever por parte do segurado de comunicar a reclamação à seguradora, tendo esta apenas hipótese, nesse caso, de exercer o direito de regresso sobre o segurado. Donde, as excepções deduzidas pela Ré Seguradora não sejam oponíveis, nos termos do nº4 do artigo 100º da Lei 72/2008 à aqui Autora no sentido de excluírem a responsabilidade daquela Demandada.” É indiscutido que estamos perante um contrato de seguro do ramo da responsabilidade civil, obrigatório, que consubstancia um contrato a favor de terceiro, tal como considerou a decisão recorrida e nenhum dos recorrentes, incluindo a Autora, coloca em causa (cf. art. 635º, nº 5, do Código de Processo Civil). É também indiscutível que a esse contrato (item 39. dos factos assentes) é aplicável o D.L. nº 72/2008, já que este entrou em vigor em 1.1.2009 e o contrato de seguro em apreço teve o seu início de vigência, como ficou assente em 2014 (cf. arts. 2º a 3º desse diploma legal). Acontece, como já disse a sentença recorrida e vem sendo entendido, em posição dominante que aqui sufragamos, que em face desse quadro factual e normativo, em situações em que estejam em causa cláusulas de redução ou de exclusão fundadas no incumprimento pelo segurado de deveres de participação do sinistro à seguradora, estas são inoponíveis ao lesado, em resultado do que prescreve o art. 101º, nº 4, do referido D.L. nº 72/2008. A título de exemplo e porque se prende com matéria similar à aqui se discute permitimo-nos reproduzir o que a esse respeito ficou dito no recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 16.5.2019 (52) – “Não existindo dúvidas sobre a natureza obrigatória do seguro de responsabilidade civil profissional dos advogados (cfr. art. 99º, no 1, do Estatuto da Ordem dos Advogados, aprovado pela Lei no 15/2005, de 26 de Janeiro, em vigor à data dos factos relevantes, preceito correspondente ao actual art. 104º, no 1, do EOA, aprovado pela Lei n.o 145/2015, de 9 de Setembro) nem sobre a aplicação da Lei do Contrato de Seguro ao contrato de seguro dos autos (uma vez que, nos termos do art. 7º do Decreto-Lei no 72/2008, esse regime entrou em vigor em 01/01/2009 e o contrato de seguro dos autos iniciou a sua vigência em 01/01/2014 - cfr. factos provados L) e M)), a decisão da Relação não merece censura. Estando em causa o confronto de cláusulas contratuais com norma legal imperativa, a resposta não poderia ser senão no sentido de esta última prevalecer sobre aquelas cláusulas. Cfr., neste sentido, e apreciando casos essencialmente idênticos aos dos autos, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 26/05/2015 (proc. no 231/10.5TBSAT.C1.S1) e de 14/12/2016 (proc. no 5440/15.8T8PRT-B.P1.S1), consultáveis em www.dgsi.pt. (…). Conclui-se, assim, pela não exclusão da situação de responsabilidade civil do âmbito de cobertura do seguro dos autos por falta de comunicação prévia pelo segurado (o aqui 1º R.) à seguradora (a aqui 2ª R. Recorrente).” Em face do que fica dito, não podemos também de deixar aqui de concluir que a exclusão excepcionada pela Recorrente X não procede, ficando prejudicado o conhecimento dos demais argumentos deduzidos a esse respeito (cf. arts. 5º, nº 3, e 608º, nº 2, do C.P.C.). 3.7.4. Da (i) responsabilidade pelo pagamento da franquia Argumenta a Recorrente X que o Tribunal recorrido violou o dispositivo dos arts. 405º (53) e 514º (54), do Código Civil, bem como os pontos 9, das Condições Particulares do contrato em apreço, e o art. 1º, nº 15, das respectivas Condições Especiais. Justificando essas violações, a Apelante alega que a inoponibilidade da franquia perante terceiro não pode significar a sua condenação solidária nesse valor, uma vez que o Réu advogado figura como parte principal e, por isso, único responsável pelo seu pagamento. Adianta ainda que isso também resulta do disposto no art. 49º, nº 3 (55), do citado D.L. nº 72/2008. Começando por esta última alegação, diremos que essa norma constitui uma previsão supletiva que em nada exclui o entendimento seguido pela primeira instância, nomeadamente tendo em conta precisamente a norma do invocado art. 405º, do Código Civil. O mesmo se diga desta última norma legal e da previsão do citado art. 514º. Foi precisamente ao abrigo da liberdade contratual prevista na regra geral do art. 405º, nº 1, do C.C., que foi possível estabelecer as convenções que ficaram assentes em 36. dos factos apurados supra, ou seja, a franquia, o seu montante, bem como a inoponibilidade da mesma a terceiros lesados que em nada contraria ou é posta em causa pela previsão do citado art. 1º, nº 15, onde se define o conceito de franquia e se repete essa inoponibilidade! Acresce, sem discutirmos aqui aspectos que a Recorrente não suscitou, que esta, contrariamente ao que alega, está nos autos, ao lado do Réu A. M., como interveniente principal, de acordo com a decisão incidental proferida a fls. 401/402, que transitou em julgado. Dito isto, conformando-se a Recorrente com a sua responsabilidade solidária pelos danos em apreço, só se compreende esta sua argumentação, incluindo a referência ao citado art. 514º, como resultado de algum equívoco. Ademais, os Acs. do Tribunal da Relação de Évora de 2.10.2016 e 8.11.2018, que a Apelante invoca em abono da sua tese, partem ambos de uma realidade factual diametralmente oposta nesta matéria, já que entenderam estar contratualmente prevista a oponibilidade dessa franquia a terceiros. (56) Insurge-se ainda a Apelante contra a passagem da sentença onde se afirma a esse respeito que apenas terá direito de regresso no caso da franquia estipulada. Em sustento da sua posição, invoca Ac. deste Tribunal da Relação de Guimarães, de 25.5.2016 (57), no qual as afirmações citadas por si se reportam a decisão que discutia a admissibilidade de um articulado superveniente, coisa que aqui não se verifica. De qualquer modo, entendemos que essa impugnação da Recorrente resulta de uma deficiente interpretação do julgado, que deve ser, como qualquer declararão, devidamente interpretada. O contexto dessa afirmação é o da discussão da imputação imediata desse montante e o que o Tribunal quis dizer foi tão-somente que, sem prejuízo da sua condenação solidária no pagamento à Autora do valor respectivo, sempre poderá a Ré, em tese, exercer o seu direito de regresso em relação ao outro devedor solidário relativamente ao mesmo (montante), nada se tendo obstado à reclamação, por essa via, do restante montante da indemnização declarada. Aliás, o dispositivo da sentença nada disse que apontasse para esse limitação. Certo é que este Tribunal de apelação nunca poderia satisfazer a pretensão formulada pela Ré em XLIII., que está para além do objecto da acção em apreço. De resto, a Apelante de uma forma, mais uma vez, aparentemente equivocada, sustenta a propósito que se deve proferir decisão que condene o “Réu Advogado” no pagamento da franquia, esquecendo, porventura, que este foi condenado no pagamento solidário de toda a indemnização deferida ou, pretendendo, coisa inadmissível, que este Tribunal o condene a pagar a si e desde já esse valor. Mais, em abono dessa pretensão invoca novamente jurisprudência deste Tribunal (58) que partiu de premissa factual diversa, como é bom de ver pelo item 37. que a própria transcreve nas suas motivações. Por tudo isso, devem improceder estas conclusões (XXVII. a XLIII.) 3.7.5. Da fixação do valor indemnizatório É comum ao Recurso da Ré X e da Autora o tema do quantitativo da compensação pecuniária fixada pelo Tribunal recorrido (o Apelante A. M. apenas o aborda nas suas motivações, ou seja, não o incluiu nas conclusões que objectivam/limitam o seu recurso). A primeira Apelante, X, conclui que sendo o valor do bem jurídico vida valorado em montante próximo de 40000 euros, o valor deferido, 16000 euros, é desproporcionado, tendo sido violado o disposto no art. 496º, nº 1, do Código Civil (XLV. e XLVI.). Já a Apelante subordinada defende, em suma pelas razões expostas em 18. das suas conclusões, que o valor a deferir deve ser o peticionado, ou seja, 40000 euros, tendo sido violado o mesmo dispositivo legal. Sobre esse desvalor ficou assente toda a factualidade (itens 14. a 19. e 27.) que configura os ilícitos criminais em causa (os mencionados no item 26.), bem como a sua repercussão na pessoa da lesada, nos termos vertidos em 28. e 29.. Estão em causa dois ilícitos criminais praticados como dolo: um crime de denúncia caluniosa previsto no art. 365º, nºs 1 e 2, do Código Penal, e um outro de difamação agravada, p. e p. nos arts. 180º, nº 1, 183º, nº 1, al. b), e 184º, por referência ao art. 132º, nº 2, al. l), do mesmo Código (cf. decisão mencionada no item 26. dos factos assentes e junta a fls. 863 v., que nesse aspecto qualificativo aqui se considera ao abrigo do disposto no art. 662º, nº 1, do Código de Processo Civil). Nesse primeiro ilícito, como se assinala no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 12.10.2006 (59), a incriminação em presença protege quer a realização da justiça quer o bom nome, a honra e consideração do caluniado - “Com referência àquele Código, o citado preceito legal está inserido no respectivo capítulo III, «Dos crimes contra a realização da justiça», do título V, «Dos crimes contra o Estado», do livro II, «Parte especial». Aquela inserção denota que o bem jurídico protegido com a incriminação da denúncia caluniosa é, desde logo, a realização da justiça. E, substancialmente, assim se deve entender. Naquele quadro normativo, sendo caluniador e caluniado pessoas diversas, com a apontada incriminação pretende-se necessariamente salvaguardar a eficácia da justiça e, por isso, a realização desta. Visa-se que os meios da justiça penal sejam justamente direccionados para a protecção de bens jurídicos constitucionalmente relevantes e só nessa direcção, o que não sucede sempre que a denúncia, participação ou suspeita constitui uma calúnia. O direito de participação próprio de um Estado de direito material (ver nota 17) pressupõe, além do mais, uma cidadania responsável, o que não sucede com o caluniador, que, desde logo, afronta a realização da justiça, um dos desideratos daquele Estado e, por isso, bem supra-individual que importa salvaguardar, constituindo a incriminação da denúncia caluniosa uma forma de tutela desse bem. Entender o contrário seria como que considerar a denúncia caluniosa como uma difamação agravada, o que não parece ter sido propósito legislativo, atenta a inserção sistemática referenciada. Na realização da justiça não se esgota, contudo, a esfera de protecção da incriminação da denúncia caluniosa. Com ela protege-se igualmente o bom nome, a honra e consideração do caluniado. Salvaguarda-se, pois, a personalidade moral, dignificando-se a pessoa, valor essencial, com expressa consagração constitucional. Com efeito, o direito à integridade moral, e em particular ao bom nome e à reputação, encontra expressão nos artigos 25.º e 26.º da nossa lei fundamental, o que lhe confere uma dimensão axiológica. «Na sua expressão mais simples a protecção da integridade [...] moral consiste no direito a não agressão ou ofensa ao [...] espírito, por quaisquer meios [...] Consagra-se, assim, uma tutela constitucional firme [...] contra violações do direito à integridade moral consubstanciadas, designadamente, em quaisquer formas de denegrir a imagem ou o nome de uma pessoa», sendo que «o direito ao bom nome e à reputação tem um alcance jurídico amplíssimo, situando-se no cerne da ideia de dignidade da pessoa. A relevância constitucional da tutela do bom nome e da reputação legitima a criminalização de comportamentos como a calúnia». Do ponto de vista da tutela normativa, enquanto tipo de ilícito no nosso quadro jurídico-penal, a denúncia caluniosa assume, pois, uma natureza pluridimensional.” No crime de difamação (60): “Na jurisprudência interna vem sendo entendido que (sic): “O crime de difamação tutela o bem jurídico honra, assente na imputação indirecta de factos e juízos desonrosos (art. 180.º do CP). A difamação consiste na imputação a alguém, levada a terceiros e na ausência do visado, de facto ou juízo que encerre em si uma reprovação ético-social, sendo ofensivos da honra e consideração do visado, enquanto pretensão de respeito que decorre da dignidade da pessoa humana e pretensão ao reconhecimento da dignidade moral da pessoa por parte dos outros. A lei não exige o propósito de ofender a honra e consideração de alguém, bastando a consciência, por parte do agente, de que a sua conduta é de molde a produzir a ofensa da honra e consideração de alguém.” No caso esse crime de difamação agravado importa ainda a ofensa da honra funcional da lesada. Posto isto, o substrato constitucional da honra subjectiva consta do artigo 25.º, n.º 1 (61), na parte em que se refere à integridade moral, enquanto o da honra objectiva consta do art. 26.º, n.º 1 (62), na parte em que se refere ao bom nome e à reputação. O artigo 26.º protege a imagem pública da pessoa, mas é o artigo 25.º que garante a tutela do seu “espírito”. (63) Esse bem de natureza pessoal tem ainda previsão no ordenamento ordinário, de que são exemplo os arts. 70º (64) e 484º (65), do Código Civil. Tendo em conta o referido factualismo e a natureza dos bens envolvidos, de natureza pessoal e fundamental, vejamos se assiste razão a algum dos Recorrentes. A norma que está aqui directamente em causa, o art. 496º, do Código Civil, estipula que (1.) na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. (4) O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º (66); (…), ou seja, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso. Por isso, o julgador tem de considerar nesse juízo de equidade, o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem, tal como prescreve este última norma. Convém desde logo sublinhar que todos os danos acima referidos foram indiscutivelmente gerados por conduta exclusivamente imputável ao segurado na Ré X, seguradora esta que se presume ter um capital significativo, e que, em sua substituição, nos termos contratados (cf. item 31. dos factos assentes), é obrigada a reconstituir a situação anterior ao dano, sabendo nós que a indemnização pecuniária é, em alguns casos, nomeadamente nos danos não patrimoniais, uma compensação demasiado simples que nunca terá, por natureza e de forma completa, o efeito reparador visado nos arts. 562º e 566º, do Código Civil. Acresce que estamos perante condutas reveladoras de grau de culpa acentuado, por serem dolosas, traduzindo dolo directo (cf. item 27. dos factos assentes) e intenso, patenteado na conduta multifacetada que ficou apurada nos pontos acima assinalados (que envolveu denuncias caluniosas, disciplinares e criminais bem como actos difamatórios). Essa conduta traduz um grau de culpa relativamente elevado, que terá quer ser considerado não só como referência para o efeito compensador pretendido mas também para o efeito punitivo que esta obrigação pecuniária encerra (67), tal como vem sendo defendido pela doutrina e jurisprudência, está na génese deste instituto. A este respeito permitimo-nos reproduzir o entendimento que defende Luís Miguel Caldas Ribeiro Silva Amorim (68) - (…) Reconheceu-se, por isso, o dever de compensar e satisfazer o lesado, tanto ao nível da doutrina como da jurisprudência, apesar de tais “danos”, não deixando de o ser, serem de índole exclusivamente moral, não fisicamente mensuráveis. Ora se o quantum atribuído a título de danos não patrimoniais consubstancia uma compensação e satisfação do lesado, capaz «de lhe proporcionar uma satisfação em virtude da aptidão do dinheiro para propiciar a realização de uma ampla gama de interesses, na qual se podem incluir mesmo interesses de ordem refinadamente ideal», parece ser, ao mesmo tempo, a “sanção adequada” a atribuir ao lesante, pois não lhe é «estranha a ideia de reprovar ou castigar, no plano civilístico e com os meios próprios do direito privado, a conduta do agente». Nesse sentido, ao lado das funções compensatória e de satisfação, descortina-se a existência de uma função punitiva que as completa, pois o montante que satisfaz o lesado também pune a conduta do lesante. Ao ter em conta o grau de culpabilidade do agente e a situação económica do lesante e do lesado, a indemnização que compensa «assume-se como uma pena privada, estabelecida no interesse da vítima, por forma a desagravá-la do comportamento do lesante»; no mesmo sentido GALVÃO TELES, para quem a indemnização por danos morais é «uma pena privada, estabelecida no interesse da vítima na medida em que se apresenta como um castigo em cuja fixação se atende ainda ao grau de culpabilidade e à situação económica do lesante e do lesado». São, por tudo isto, os artigos 496º e 494º, reguladores do montante a atribuir a título de danos não patrimoniais, os principais meios de reacção punitiva do direito privado, levando mesmo os vários autores a considerarem-no como “pena privada”, “sanção adequada” e “castigo”, o que não me deixa duvidas sobre a dupla função compensatória e punitiva da indemnização por danos não patrimoniais. Esta conclusão é suportada pela nossa jurisprudência que, na última década, reconheceu de forma expressa a função compensatório-punitiva, transpondo para as suas decisões as análises da doutrina: como por exemplo o reconhecimento da natureza mista da indemnização por danos não patrimoniais referida por ANTUNES VARELA, o recurso a expressões como “sancionar a culpa do agente” a propósito de traumas psíquicos, a ponderação do critério da intensidade da culpa para efeitos de aplicação do artigo 494º e da equidade, etc. (…) Temos, atento o exposto, de ponderar neste caso o grau de culpa apurado, os danos psíquicos relativamente graves sofridos pela lesada, a situação económica que se presume ter a Ré Apelante, a circunstância de estarmos perante lesada que exerce funções referidas em 1. e para a qual se presume serem pessoalmente determinantes os afectados valores da honra e brio profissional, sobretudo considerando as falsas imputações por alegada parcialidade ou falta de isenção. Contrariamente ao que alega, sem qualquer suporte, a Apelante X, inexiste qualquer comparação possível entre o desvalor atribuído pela primeira instância e o que actualmente se defere a título de compensação pelo dano vida, que normalmente duplica ou triplica o apontado montante de 40000 euros. Em face do exposto, julgamos que o juízo equitativo do Tribunal a quo não merece aqui reparo (69) e encontra em consonância com valores que a jurisprudência vem praticando (70) (cf. art. 8º, nº 3, do Código de Processo Civil). Improcede, assim, esta outra argumentação dos Recorrentes e a correspondente apelação. 3.7.6. Da errada fixação dos juros A Apelante X e o Apelante A. M. questionam a contabilização dos juros defendendo a primeira que serão devidos apenas desde o trânsito em julgado da sentença e o segundo que tal ocorrerá apenas quando o crédito se tornar líquido. Invocam o disposto no art. 805º, nºs 1 e 3, do Código Civil, e afirmam que estamos perante crédito ilíquido emergente de responsabilidade civil profissional de advogado. A decisão em apreço considerou que os juros são devidos desde a citação, de acordo com o disposto nesse art. 805º, nº 3, e a sua interpretação do A.U.J. nº 4/2002. A Demandante pede juros legais, desde a citação sobre o montante da quantia indemnizatória reclamada. De acordo com o art. 804º, nº 1, do Cód. Civil, a simples mora constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor. Tratando-se, no caso sub judice, de obrigação indemnizatórias de natureza pecuniária, essa reparação corresponderá aos juros legais, às taxas de 4%, desde o dia da constituição em mora (cf. arts. 559º, nº 1, e 806º, nºs 1 e 2, do Cód. Civil, e Port. 291/2003, de 8.4). Sobre este termo, dita o art. 805º, do Código Civil, que 1. O devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir. 2. Há, porém, mora do devedor, independentemente de interpelação: a) Se a obrigação tiver prazo certo; b) Se a obrigação provier de facto ilícito; c) Se o próprio devedor impedir a interpelação, considerando-se interpelado, neste caso, na data em que normalmente o teria sido. 3 - Se o crédito for ilíquido, não há mora enquanto se não tornar líquido, salvo se a falta de liquidez for imputável ao devedor; tratando-se, porém, de responsabilidade por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora desde a citação, a menos que já haja então mora, nos termos da primeira parte deste número. Porém de acordo com a interpretação uniformizante realizada pelo citado Acórdão nº 4/2020 (71): Sempre que a indemnização pecuniária por facto ilícito ou pelo risco tiver sido objecto de cálculo actualizado, nos termos do n.º 2 do artigo 566.º do Código Civil, vence juros de mora, por efeito do disposto nos artigos 805.º, n.º 3 (interpretado restritivamente), e 806.º, n.º 1, também do Código Civil, a partir da decisão actualizadora, e não a partir da citação Posto isto, em concordância com esta jurisprudência, este termo inicial de contagem seria o da citação, se estivéssemos perante valores previamente liquidados ou ilíquidos, estes se tivesse sido fixados com a devida actualização. Porém, isso não sucedeu no caso: o Tribunal a quo, visto o silogismo seguido na respectiva fundamentação, não os actualizou expressamente e, como se afirma no citado Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 27.9.2018 (72), esse procedimento não se pode presumir, sem mais. Portanto parece ser absolutamente razoável – além de legal – que o tempo (subtil inimigo que ataca fugindo, como diria Gustavo Corção) não deprecie as verbas arbitradas (73), neste caso através da devida compensação com juros de mora, devidos deste a interpelação, ou seja, desde a citação. Deve, com estes argumentos, improceder esta outra pretensão recursiva. 3.7.6. Da fixação das custas A Recorrente X impugna ainda a sentença no que toca à proporção fixada na condenação em custas, propugnando que a mesma reflicta o desvalor quantitativo que resulta da sorte da lide (o Apelante A. M. voltou, neste ponto, a discutir tal matéria em sede de motivação mas não a incluiu nas suas conclusões). De acordo com a previsão geral do art. 527º, do Código de Processo Civil, (1) a decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito. 2 - Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for. 3 - No caso de condenação por obrigação solidária, a solidariedade estende-se às custas. Atendendo à limitação decorrente do disposto nos citados arts. Artigos 635º, nºs 4 e 5, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, sem prejuízo do disposto no art. 5º, nº 3, do meso Código, apreciemos. Estamos perante demanda em que o objecto se cinge a condenação em determinadas quantias pecuniárias (capital e juros). Deste modo, julgamos que, sem qualquer justificação, é impróprio fixar a proporção mencionada no citado art. 527º, nº 2, de forma que não reflicta o exacto desvalor aritmético do vencimento de cada um das partes, para usar uma expressão do Recorrente, devendo, por isso, ser dada alguma razão aos mesmos. Todavia, acresce, no caso, que estamos perante uma demanda que envolveu três demandados, um dos quais foi absolvido de todos os pedidos que, neste particular, reclamavam a condenação solidária dos mesmos. Posto isto, julgamos, como vimos decidindo em situações semelhantes, que a devida proporção deverá ser fixada nos seguintes termos. Uma vez que a demanda da Autora decaiu quanto a uma das partes, deve o vencimento dessa Recorrida na acção ser fixado equitativamente, desde logo, em 1/3 do valor da causa (40000€). Dos restantes 2/3 (26666,66€) desse valor e reflectindo a proporção do vencimento da Autora e dos Réus, por referência o original valor da demanda, devem ser imputadas a estes últimos custas na proporção de 40% (de 26666,66€), ou seja, por referência ao valor de 10666,66€. Todo o restante valor (29333,34€), 73,33% do valor da acção (40000€) corresponderão ao vencimento da Autora na acção. É nessa medida que procede esta parte dos Recursos em apreço. 4. DECISÃO Pelo exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação da Recorrente X e improcedentes as Apelações dos Recorrentes A. M. e S. L.. Em conformidade com essa parcial procedência, decide-se revogar o dispositivo da sentença recorrida na parte em que se pronuncia sobre proporção em que serão imputadas as custas e, em consonância com acima exposto em 3.7.5., substitui-se o seu ponto VI. pelo seguinte: Condenar a Autora, bem como os Réus, A. M. e X – Seguros Gerais, S.A. em custas, na proporção do respectivo decaimento, o qual se fixa em 73,33% do valor da causa para a Demandante, e, no restante, para os referidos Demandados. Custas da Apelação parcialmente procedente da X pela Recorrente, na proporção de 90% (cf. art. 527º, n.º 1, do C. P. C.). Custas da Apelação improcedente do Réu A. M., pelo Recorrente (art. 527º, do C.P.C.). A Recorrente S. L. beneficia de isenção de custas, por via do disposto no art. 17º, nº 1, al. f), da Lei n.º 21/85, de 30 de Julho (Estatuto dos Magistrados Judiciais), atenta a sua qualidade juíza de direito e parte principal nesta acção em que o tema se reconduz ao exercício das suas funções, pelo que não pode ser objecto de condenação pelas mesmas. * Guimarães, Assinado digitalmente por: Rel. – Des. José Flores 1º Adj. - Des. Sandra Melo 2º - Adj. - Des. Conceição Sampaio 1. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, Almedina, 2017, pp. 106. 2. Conforme se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7.7.2016, Gonçalves Rocha, 156/12, «Efetivamente, e como é entendimento pacífico e consolidado na doutrina e na Jurisprudência, não é lícito invocar nos recursos questões que não tenham sido objeto de apreciação da decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação». No mesmo sentido, cf. Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4.10.2007, Simas Santos, 07P2433, de 9.4.2015, Silva Miguel, 353/13. 3. Abrantes Geraldes, Op. Cit., p. 107. 4. Cf. também os Acórdãos do STJ de 7.7.94, Miranda Gusmão, BMJ nº 439, p. 526 e de 22.6.99, Ferreira Ramos, CJ 1999 – II, p. 161, da Relação de Lisboa de 10.2.2004, Ana Grácio, CJ 2004 – I, p. 105, de 4.10.2007, Fernanda Isabel Pereira, de 6.3.2012, Ana Resende, 6509/05, acessíveis em www.dgsi.pt/jtrl. 5. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21.12.2005, Pereira da Silva, acessível em www.dgsi.pt/jstj 6. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23.4.2015, Ondina Alves, 185/14. 7. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 9.6.2011, Filipe Caroço, 5/11. 8. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30.4.2014, Belo Morgado, 319/10. 9. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8.3.2001, Ferreira Ramos, acessível em www.dgsi.jstj/pt. 10. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 3.10.2002, Araújo de Barros, acessível em www.dgsi.pt/jstj . 11. Como vimos entendendo, é necessário um mínimo de individualização da decisão intercalar visada ao abrigo do disposto no art. 644º, nº 3, do Código de Processo Civil, no requerimento previsto no art. 637º, nº 1, do mesmo Código, para que se considere interposto um recurso autónomo que é dependência do recurso da sentença final mas não cuja viabilidade não deixa de ter de ser aferido de forma distinta. 12. In Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 2ª Ed., p. 132 13. Cf. Simas Santos, Borges de Pinho e Leal-Henriques, in Código de Processo Penal, 1º vol., 1996, p. 331. 14. In Prova na acção de responsabilidade civil fundada na prática de crime e factos provados na fundamentação da sentença penal, p. 3 - http://julgar.pt/prova-na-acao-de-responsabilidade-civil-fundada-na-pratica-de-crime-e-factos-provados-na-fundamentacao-da-sentenca-penal/ 15. Ob. cit., p. 339. 16. Cf. Cristina Dá Mesquita, ob.cit., p. 4/6/7 17. Cf. aliás o que resulta da certidão junta a fls. 625 – art. 662º, nº 1, do Código de Processo Civil 18. Cf., v.g., Ac. deste Tribunal da Relação de Guimarães, de 29.6.2017, in http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/-/86A318A8D00D5800802581D7003A9289 /Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 19.12.2018, in http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/e3ce0a9e0fed218c8025838d0030d251?OpenDocument 19. E não do pedido… 20. Cf., v.g., Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa de 15.3.2007, in http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/0de1c88c61aa4f7d802572bf00423c16?OpenDocument . Ou Ac. do Tribunal da Relação de Coimbra, de 2.3.2010 in http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/266a74e87cce0aaf802576e00035fc46?OpenDocument, 21. Cf., Cristina Da Mesquita, ob. cit. p. 6 22. Cf. nesse sentido: Ac. do Tribunal da Relação de Guimarães, de 17.12.2018, in http://www.dgsi.pt/JTRG.NSF/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/be0b72c7665c0e038025838a0039113b?OpenDocument - E não prevê nesta situação, do citado artº 72º, qualquer impossibilidade de dedução em separado quando não tenha sido conhecido o mérito de tal pedido na acção penal, nomeadamente com base em indeferimento por razões de extemporaneidade. VI - A interpretação deste preceito tem de se confinar aos estritos termos que dele defluem, sendo formalmente permitido, em sede de tramitação processual, quanto nele não esteja proibido. VII - O que resulta da apontada alínea c) é que é facultada a dedução em separado do pedido de indemnização civil perante o tribunal civil, sem quaisquer entraves, quando o procedimento depender de queixa, como ocorre com o ilícito penal subsumível em ofensa à integridade física simples./ Ac. do Tribunal da Relação de Évora, de 18.6.2009, in http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/fc65b7595f4203df80257de100574fdc?OpenDocument. A notificação do lesado nos termos do nº 2 do art° 77° do Código de Processo Penal, a que não se siga efectiva dedução do pedido cível, não pode fazer precludir a possibilidade de actuar o direito ao ressarcimento dos danos decorrentes do crime na jurisdição civil, verificado que seja qualquer dos casos enumerados no citado nº 1 do art° 72º do C.P.Penal 23. in “Introdução ao Processo Civil, Conceitos e Princípios Gerais”, 2ª Edição, p. 87 24. Alguma dela citada por nós… 25. Cf. Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, de 23.9.2014, in http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/e6e1f17fa82712ff80257583004e3ddc/f285bfded8457ba180257d780050d7c6?OpenDocument 26. Pontes de Miranda, apud Judith Martins-Costa, in http://www.fd.ulisboa.pt/wp-content/uploads/2014/12/Costa-Judith-Os-avatares-do-Abuso-do-direito-e-o-rumo-indicado-pela-Boa-Fe.pdf 27. In Do abuso do direito: estado das questões e perspectivas, p. 9/10, https://portal.oa.pt/comunicacao/publicacoes/revista/ano-2005/ano-65-vol-ii-set-2005/artigos-doutrinais/antonio-menezes-cordeiro-do-abuso-do-direito-estado-das-questoes-e-perspectivas-star/ 28. Ibidem, p. 1 29. In Do abuso de Direito – ensaio de um critério em direito civil e nas deliberações sociais, 1983, p. 43 e s., citado no Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 24.3.2015, in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/b8e799a5065a869a80257e120054bfc9?OpenDocument 30. Ibidem, p. 24 31. Ob. acima citada 32. In RECURSOS CIVIS O SISTEMA RECURSÓRIO PORTUGUÊS FUNDAMENTOS, REGIME E ACTIVIDADE JUDICIÁRIA, p. 5 33. Ob. cit., p. 13 34. In Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2017, 4ª Ed., p. 155 e ss. 35. Cf. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 19.2.2015, relatado por Maria dos Prazeres Pizarro Beleza: II - A impugnação da decisão de facto, feita perante a Relação, não se destina a que este tribunal reaprecie global e genericamente a prova valorada em 1.ª instância, razão pela qual se impõe ao recorrente um especial ónus de alegação, no que respeita à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação. III - Não observa tal ónus o recorrente que identifica os pontos de facto que considera mal julgados, mas se limita a indicar os depoimentos prestados e a listar documentos, sem fazer a indispensável referência àqueles pontos de facto, especificando os concretos meios de prova que impunham que cada um desses pontos fosse julgado provado ou não provado. IV - A apresentação das transcrições globais dos depoimentos das testemunhas não satisfaz a exigência determinada pela al. a) do n.º 2 do art. 640.º do NCPC (2013). V - O incumprimento de tais ónus – prescritos para a delimitação e fundamentação do objecto do recurso de facto – impedem a Relação de exercer os poderes-deveres que lhe são atribuídos para o respectivo conhecimento. – in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/83d97510a180fd5f80257df1005b598c?OpenDocument 36. Com se refere no Ac. do Supremo Tribunal de Justiçam, de 27.9.2018, infra citado: “Por outro lado, não basta transcrever os depoimentos que se invocam para alterar as respostas dadas. É necessário dizer porquê. Qual a razão pela qual deve ser num sentido e não noutro. Essa análise crítica também não foi feita pela Recorrente”. 37. E, como acentua o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça infra citado, do princípio da cooperação, pretendendo-se que, por essa via, a 2ª instância facilmente aceda à informação tida pelo recorrente como interessante, em lugar de despender tempo nessa actividade – “há um mínimo de exigência e rigor a impor ao recorrente que impugna a matéria de facto, sob pena de, perante a ambiguidade, inconcludência e prolixidade na elaboração da peça recursória, transferir para a 2ª instância tarefas funcionais desmesuradas, exorbitantes e desproporcionadas que, nos termos legais, àquele cabem. 38. In http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/9484dd49e64d74d28025863a00574f6a?OpenDocument 39. No mesmo sentido vide Ac. STJ de 01.10.2015, proc. 824/11.3TTLSB.L1.S1, relatora Ana Luísa Geraldes; Ac. 07.07.2016, proc. 220/13.8TTBCL.G1.S1, relator Gonçalves Rocha; Ac. STJ de 16.05.2018, proc. 2833/16.7T8VFX.L1.S1, relator Ribeiro Cardoso; Ac. STJ de 06.06.2018, proc. 552/13.5TTVIS.C1.S1, relator Pinto Hespanhol; Ac. STJ de 31.10.2018, proc. 2820/15.2T8LRS.L1.S1 e Ac. STJ de 06.11.2019, proc. 1092/08.0TTBRG.G1.S1, ambos relatados por Chambel Mourisco, todos acessíveis em www.dgsi.pt. 40. Nesse sentido ainda o recente Ac. do mesmo Supremo Tribunal de Justiça, de 27.9.2018, in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/9cd6ef26b3a23d8f8025831500549377?OpenDocument : I - Como decorre do art. 640.º do CPC o recorrente não satisfaz o ónus impugnatório quando omite a especificação dos pontos de facto que entende terem sido incorrectamente julgados, uma vez que é essa indicação que delimita o objecto do recurso. II - Também não cumpre os seus ónus quando se limita a discorrer genericamente sobre o teor da prova produzida, sem indicar os concretos meios probatórios que, sobre cada um dos pontos impugnados, impunham decisão diversa da recorrida, devendo ainda especificar a decisão concreta a proferir sobre cada um dos diversos pontos da matéria de facto impugnados. – “Ora, é a própria recorrente que admite que não constam – como se lhe impunha – expressamente das conclusões os pontos concretos da matéria de facto não provada e impugnado (…). “Ora, quando se verifica uma falta de conclusões sobre a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, quando existe uma falta de especificação nas conclusões dos concretos pontos de facto que a recorrente considera incorrectamente julgados e quando se verifica também uma falta de especificação dos concretos meios probatórios e uma falta de posição expressa sobre o resultado pretendido, uma análise crítica da prova, as conclusões são deficientes impondo-se a rejeição do recurso (quanto á pretendida impugnação da decisão sobre a matéria de facto).” 41. “Acresce que, na definição do sentido decisório a ser tomado, a recorrente manteve, em especial, nos pontos em que ocorreu rejeição liminar do recurso, clara ambiguidade e incerteza, isto mesmo no corpo alegatório em que sugere um conteúdo ou qualquer outro diferente do que foram assumido pela 1ª instância.”, assim se considerando frustrado o propósito legislativo subjacente à previsão da al. a), do nº 2, do art. 640º do Código de Processo Civil, “já que prática, transpôs para a Relação o ónus de discernir, em concreto, quais os meios probatórios e real sentido decisório relativamente aos blocos de questões que agrupou, sem os relacionar com cada facto concreto, como seria ajustado.” / “Era mister que, perante tais circunstâncias, fosse precisa e concisa na indicação dos factos concretos, com reporte directo aos meios probatórios, análise crítica dos mesmos e expressa definição do sentido decisório que caberia a cada um desses factos. 42. Salienta-se que “a recorrente não se afadigou em fazer corresponder a cada uma das pretendidas alterações da matéria de facto o (s) segmento(s) dos depoimentos testemunhais e a parte concreta dos documentos que fundou as mesmas” (…) concluindo que é inviável estabelecer uma concreta correlação entre estes e aquelas. 43. In http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/8e86daac001d58518025799f00505946?OpenDocument 44. cf. LUÍS FILIPE SOUSA, in Prova Testemunhal, 2013, pp. 319-330 45. cf. LUÍS FILIPE SOUSA, in Prova por Presunção no Direito Civil, 2017, 3ª ed., pp. 165-180. 46. Ob.cit., p. 159 47. Cf. nesse sentido Abrantes Geraldes, ob. cit., p. 291 48. Devem ser desatendidas as conclusões que não encontram correspondência na motivação, como afirma Abrantes Geraldes em anotação ao art. 635º, do Código de Processo Civil – Ob. Cit., p. 106. 49. In http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/55cf452f705839cd80257de10056f76a?OpenDocument 50. In Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 2º, 1945, p. 124 e ss. 51. Cf. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 29.5.2019, in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/1dc3fdebb5a1e9238025840b0055eb51?OpenDocument : Não desconhecendo a arguida (mandatária judicial do co-arguido) que tanto as expressões em causa nos autos eram susceptíveis de lesar a honra e consideração dos visados, então a arguida tornou-se co-autora do arguido. Tal apenas não sucederia se a mesma provasse que foi constrangida pelo arguido a escrever o que consta da participação, ou não teve intervenção na elaboração do seu conteúdo, tendo-se limitado a subscrever o requerimento de denúncia. À Sra. Advogada sempre restaria a renúncia ao mandato, sendo que ao advogado cabe a direcção, organização e condução da defesa do representado o que inclui o dever de refrear a impulsividade e paixão coenvolvente ao litígio 52. In http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/400688a9df7cbb18802583fd002f16f1?OpenDocument. Nesse sentido vide ainda, v.g., O mencionado Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 14.12.2016, in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/e0bb3ab31dd57c64802580890063cd14?OpenDocument em que ficou dito que: Conferindo o que está estatuído no n.º 4 do art.º 101.º do Dec. Lei n.º 72/2008, de 16 de Abril - o disposto nos n.ºs 1 e 2 não é oponível aos lesados em caso de seguro obrigatório de responsabilidade civil, ficando o segurador com direito de regresso contra o incumpridor relativamente às prestações que efectuar, com os limites referidos naqueles números - havemos de discorrer que, estando nós perante a perscrutação de saber se existe responsabilidade da ré/seguradora no contexto daquele pormenorizado contrato de seguro de grupo firmado com a Ordem dos Advogados (tomadora de seguro), não é permitida à recorrente “CC - Seguros Gerais, S.A.” que oponha à ré Dr.ª BB (Advogada), lesada/beneficiária do seguro celebrado, as excepções de direito material fundadas na relações estabelecidas entre Ordem dos Advogados (a tomadora do seguro) e a beneficiária do seguro (Dr.ª BB), relativamente às excepções que se prendam com o incumprimento, por parte do segurado ou do tomador de seguro, de deveres contratualmente fixados. O citado Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 9.11.2017, in http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/95946c6c01a8f4fd802581e5004f9853?OpenDocument onde se afirma que: Num contrato de seguro obrigatório, não são oponíveis ao lesado beneficiário, enquanto terceiro que nele não é parte, as excepções que ali são previstas e que se referem ao incumprimento ou omissão por parte do segurado ou do tomador do seguro dos deveres que para ele decorrem de tal contrato ou da lei, sem prejuízo do direito de regresso da seguradora, nos termos do art.º 101.º n.º 4 da Lei do Contrato de Seguro. O recente Ac. deste Tribunal da Relação de Guimarães, de 3.10.2019, in http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/5342501c82ed524a8025849a00465634?OpenDocument no qual se concluiu que: I- Os contratos de seguro previstos no artigo 104º do Estatuto da Ordem dos Advogados revestem natureza de seguro obrigatório. II- Estando em causa um contrato de seguro obrigatório, não é oponível ao autor, enquanto lesado (beneficiário), alheio à relação contratual titulada pela apólice, a excepção peremptória de direito material fundada na falta de oportuna comunicação/participação dos factos potencialmente geradores de uma reclamação por responsabilidade civil. Os Ac.s do Tribunal da Relação de Évora, por sinal citados pela própria Recorrente X, datados de, respectivamente, 2.10.2016 e 8.11.2018, anotados, onde ficou dito, respectivamente que: Em caso de responsabilidade profissional civil de advogado, não é oponível ao cliente lesado a falta de participação do sinistro à Seguradora por parte daquele advogado, tanto mais que se trata de um contrato a favor de terceiro, sendo inoponíveis ao lesado, as excepções de direito material fundadas nas relações estabelecidas entre o tomador do seguro e/ou o segurado e a seguradora, maxime, quando as mesmas se prendem com o incumprimento por parte do segurado de deveres contratualmente fixados, sem prejuízo do exercício do direito de regresso por parte da Seguradora./ Daí que não seja oponível ao lesado a falta de participação do sinistro por parte do 1.º R., como resulta do art. 101.º, n.º 4, do DL 72/2008, de 16 de Abril, tanto mais que se trata de um contrato a favor de terceiro, sendo inoponíveis ao lesado, as excepções de direito material fundadas nas relações estabelecidas entre o tomador do seguro e/ou o segurado e a seguradora, maxime, quando as mesmas se prendem com o incumprimento por parte do segurado de deveres contratualmente fixados, sem prejuízo do exercício do direito de regresso por parte da seguradora. 53. 1. Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver. 2. As partes podem ainda reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei. 54. 1. O devedor solidário demandado pode defender-se por todos os meios que pessoalmente lhe competem ou que são comuns a todos os condevedores. 2. Ao credor solidário são oponíveis igualmente não só os meios de defesa comum, como os que pessoalmente lhe respeitem. 55. 3 — As partes podem fixar franquias, escalões de indemnização e outras previsões contratuais que condicionem o valor da prestação a realizar pelo segurado 56. In http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/59c9048135fe4e4a80258059003b295c?OpenDocument – “de acordo com a mesma apólice, a franquia foi definida como a importância que fica a cargo do Segurado e que pode ser oponível a terceiros – art. 1.º n.º 15 das Condições Especiais”/ http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/d419390e465f04fc8025834a003751f8?OpenDocument – “Ainda de acordo com a mesma apólice, a franquia foi definida como a importância que fica a cargo do Segurado e que pode ser oponível a terceiros …” 57. In http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/-/1F40DE455569F64D802580050054ED36 58. In http://www.dgsi.pt/jtrg.nsf/86c25a698e4e7cb7802579ec004d3832/4ca8c35887f2420c802581d100401a11?OpenDocument 59. In https://dre.pt/web/guest/pesquisa-avancada/-/asearch/545004/details/normal?emissor=Supremo+Tribunal+de+Justi%C3%A7a&perPage=50&types=JURISPRUDENCIA&search=Pesquisar 60. Cf. Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, se 29.5.2019, supra anotado 61. 1. A integridade moral e física das pessoas é inviolável. 62. A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação. 63. Cf. Fernando José da Cruz Santos, sob a orientação do Professor Doutor Germano Marques da Silva, in DOS CRIMES CONTRA A HONRA Dignidade Penal, Constrangimento da Comunicação e Consequências - https://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/28241/1/DOS%20CRIMES%20CONTRA%20A%20HONRA_Tese%20Mestrado_Fernando%20Jos%C3%A9%20da%20Cruz%20Santos%20pdfa.pdfJurídicas 64. 1. A lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral. 2. Independentemente da responsabilidade civil a que haja lugar, a pessoa ameaçada ou ofendida pode requerer as providências adequadas às circunstâncias do caso, com o fim de evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da ofensa já cometida. 65. Quem afirmar ou difundir um facto capaz de prejudicar o crédito ou o bom nome de qualquer pessoa, singular ou colectiva, responde pelos danos causados. 66. Quando a responsabilidade se fundar na mera culpa, poderá a indemnização ser fixada, equitativamente, em montante inferior ao que corresponderia aos danos causados, desde que o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem. 67. Cf. Vg. o estudo "A INDEMNIZAÇÃO PUNITIVA E OS CRITÉRIOS PARA A SUA DETERMINAÇÃO", de PAULA MEIRA LOURENÇO, p. 11 e ss., que se pode encontrar em http://www.stj.pt/ficheiros/coloquios/responsabilidadecivil_paulameiralourenco.pdf 68. in A FUNÇÃO PUNITIVA DA RESPONSABILIDADE CIVIL, p. 20, acessível em https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/34853/1/A%20Funcao%20Punitiva%20da%20Responsabilidade%20Civil.pdf 69. Cf., e.g., Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 26.10.2016, in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/-/B1D351E68A305B41802580590052CD5F - Estando em causa a fixação do valor da indemnização por danos não patrimoniais, necessariamente com apelo a um julgamento segundo a equidade, o tribunal de recurso deve limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, «as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida». 70. Cf., e.g., o citado Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, de 26.10.2016, Está provada a ilicitude civil e respectiva culpa do demandado civil, bem como a existência de danos morais para a assistente, causalmente decorrentes da conduta dolosa assumida pelo demandado em incidente de suspeição da assistente, que pela sua gravidade merecem tutela do direito, por repercutidos sobretudo na sua honra funcional de magistrada judicial em efectividade, e no exercício das suas funções, que pela sua gravidade merecem a tutela do direito, entendendo-se por adequada uma indemnização de 15.000,00€. Ac. do Tribunal da Relação de Évora, de 5.7.2016, in http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/-/F224F1E2D6F8467B80257FEE00394B30 - Sendo as imputações em causa falsas e ofensivas, em grau muito elevado, da honra e consideração do magistrado visado, inexistindo fundamento sério para que o arguido as pudesse ter reputado como verdadeiras, os factos provados realizam a prática, pelo jornalista subscritor das notícias, de um crime de difamação agravada dos arts 180.º, 183.º nºs1, als. a) e b) e 2, 184.º e 132.º nº2, al. l), do CP, e é devida a indemnização de € 15.000,00 ao assistente, a título de danos não patrimoniais, a pagar solidariamente pelo autor da notícia e pela empresa proprietária do jornal. 71. In https://dre.pt/pesquisa/-/search/140138/details/maximized 72. In http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/ad6fa78f7f6d65fd8025833d00502794?OpenDocument 73. Usando as doutas palavras do Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, no seu Ac. de 17.12.2019, in http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/1d10a4950714dcf9802584d3005bdaf9?OpenDocument

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