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Acórdão TR Porto de 2024-05-22

12518/18.4T9PRT.P1

TribunalTribunal da Relação do Porto
Processo12518/18.4T9PRT.P1
Nº ConvencionalJTRP000
RelatorMaria Joana Grácio
DescritoresCrime de Difamação, Impugnação da Matéria de Facto, Rejeição
Nº do DocumentoRP2024052212518/18.4T9PRT.P1
Data do Acordão2024-05-22
VotaçãoUnanimidade
Privacidade1
Meio ProcessualRECURSO PENAL
DecisãoNegado Provimento
Indicações Eventuais1. ª SECÇÃO CRIMINAL
Área Temática.

Sumário

É de rejeitar a impugnação ampla da matéria de facto se: a) o recorrente realiza uma crítica genérica à apreciação da prova, pondo em causa a convicção do Tribunal a quo, assente na sua própria e subjectiva avaliação, b) não explicita qual a redacção que deve ser atribuída a todos e cada um dos pontos de facto postos em crise, ou não indica relativamente a cada um desses pontos de facto qualquer elemento probatório nos termos do art. 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPPenal c) ou mesmo quando não identifica a acta onde constam as menções da gravação da prova relevantes para os efeitos dessas normas.


Texto Integral

Proc. n.º 12518/18.4T9PRT.P1 Tribunal de origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo Local Criminal do Porto – Juiz 1 Sumário: …………………………………… ………………………………... ………………………………… Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório No âmbito do Processo Comum Singular n.º 12518/18.4T9PRT, a correr termos no Juízo Local Criminal do Porto, Juiz 1, por sentença de 01-06-2023, foi decidido: «Pelo exposto, julgo procedente e provado o douto despacho de pronúncia e, consequentemente: a) condeno o arguido AA, pela prática do crime de difamação agravado, p. e p. pelos arts. 180.º, n.º 1, 183.º, n.º 2, do Cód. Penal de que vem pronunciado -em que é ofendido BB-, na pena de 140 dias de multa, à taxa diária de €8,00, num total de €1120,00; b) condeno o arguido AA, pela prática do crime de difamação agravado, p. e p. pelos arts. 180.º, n.º 1, 183.º, n.º 2, do Cód. Penal de que vem pronunciado -em que é ofendido CC-, na pena de 140 dias de multa, à taxa diária de €8,00, num total de €1120,00; c) condeno o arguido AA, pela prática do crime de ofensa a pessoa colectiva agravado, p. e p. pelos arts. 187.º, n.ºs 1 e 2, al. a) e 183.º, n.º 2, do Cód. Penal de que vem pronunciado, na pena de 140 dias de multa, à taxa diária de €8,00, num total de €1120,00; d) em cúmulo jurídico pelas referidas penas, nos termos do art. 77.º, n.º 1, do Código Penal, condeno o arguido AA, na pena única de 320 dias de multa, à taxa diária de €8,00, num total de 2560,00.*c) Julgo parcialmente procedente, por parcialmente provado o pedido de indemnização cível de fls. 330 e ss. e, consequentemente, condeno o demandado AA, a pagar aos demandantes: - A... SAD, a quantia de €5.000,00, improcedendo quanto ao restante; - BB, a quantia de €3.000,00, improcedendo quanto ao restante; - CC, a quantia de €3.000,00, improcedendo quanto ao restante;*A estas quantias acrescem juros de mora, contados desde a sentença e à taxa legal, até integral pagamento.**Mais condeno o arguido nas custas crime, com taxa de justiça que fixo em 3 UCs., nos termos do art. 8.º, n.º 5, e tabela III do R.C.P. e demais encargos. Custas cíveis na proporção dos respectivos decaimentos.**Após trânsito, remeta boletim ao registo criminal. Notifique e deposite (arts. 372.º, n.º 5 e 373.º, n.º 2, ambos do C.P.P.). ***A sentença não será publicada nos termos do art. 189.º, do Cód. Penal, uma vez que tal não foi requerido no prazo aí previsto. ***Considerando que o arguido, previsivelmente, manterá um comportamento afastado da criminalidade, a presente decisão não será transcrita em certificados de registo criminal para efeitos não judiciais, nos termos do art. 13.º, n.º 1, da Lei 37/15, de 05/05.» * Inconformado, o arguido AA interpôs recurso desta decisão, solicitando que a sentença recorrida seja revogada e substituída por outra que o absolva dos crimes por que vem condenado, bem como do respectivo pedido de indemnização civil, apresentando em apoio da sua argumentação as seguintes conclusões da sua motivação (transcrição)[1]:«179.ºDos factos dados como provados em audiência de julgamento não pode resultar a prática dos crimes de difamação agravado e o crime de ofensa a pessoa coletiva agravado, previstos e punidos, respetivamente, pelos artigos 180.º n.º 1, 183.º n.º 2 e 187.º n.º 1 e 2 do Código Penal, por não se verificar a previsão legal dos tipos de crime indicados, existindo uma clara e objetiva inversão da prova produzida, a que acresce, por conseguinte, o facto de não existir fundamentação suficientemente que justifique o valor considerado na douta sentença para o pedido de indemnização cível apresentado pelos assistentes. 180.ºO Arguido foi considerado culpado e condenado: a)  Pela prática do crime de difamação agravado, p. e p. pelos arts. 180.º, n.º1, 183.º, n.º 2, do Cód. Penal, em que é ofendido BB, na pena de 140 dias de multa, à taxa diária de €8,00, num total de €1120,00; b)  Pela prática do crime de difamação agravado, p. e p. pelos arts. 180.º, n.º1, 183.º, n.º 2, do Cód. Penal, em que é ofendido CC-, na pena de 140 dias de multa, à taxa diária de €8,00, num total de €1.120,00; c)  Pela prática do crime de ofensa a pessoa colectiva agravado, p. e p. pelos arts. 187.º, n.ºs 1 e 2, al. a) e 183.º, n.º 2, do Cód. Penal, na pena de 140 dias de multa, à taxa diária de €8,00, num total de €1.120,00; d)  Em cúmulo jurídico pelas referidas penas, nos termos do art. 77.º, n.º1, do Código Penal, o arguido AA foi condenado na pena única de 320 dias de multa, à taxa diária de €8,00, num total de €2.560,00. Os assistentes apresentaram Pedido de Indemnização Cível que foi julgado parcialmente procedente, por parcialmente provado, e pelo qual o Arguido foi condenado a pagar aos demandantes: I. A... SAD, a quantia de €5.000,00, improcedendo quanto ao restante; II. BB, a quantia de €3.000,00, improcedendo quanto ao restante; III.   CC, a quantia de €3.000,00, improcedendo quanto ao restante; 181.ºPor tudo o que expõe nos Factos, o Arguido entende que os factos dados como provados nas alíneas 6, 7, 8, 9, 10, 12, 13, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23 e 24 não correspondem à prova produzida em audiência de julgamento. 182.º A veracidade dos factos dados como provados, a interpretação feita pelo Tribunal a quo da prova produzida é determinante para o apuramento da verdade.183.ºA decisão do Tribunal a quo não encontra fundamento na prova produzida para que se encontrem preenchidos os tipos de crimes em que decidiu condenar o Arguido. 184.º Não reconheceu o Tribunal a quo o direito constitucionalmente consagrado ao Arguido à liberdade de expressão e opinião, bem como o art.10.º da CEDH, suportado nos seus conhecimentos – diretos e indiretos, em factos que são de conhecimento público, bem como na prova produzida em Audiência de Julgamento.» * O Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu ao recurso, pugnando pela respectiva rejeição ou, assim não se entendendo, pela sua improcedência e pela manutenção da sentença recorrida.* Também os assistentes, A..., SAD, BB e CC, responderam ao recurso, pugnando pela sua rejeição ou, assim não se entendendo, pela sua total improcedência, apresentando em apoio da sua argumentação as seguintes conclusões (transcrição): «A) A decisão aqui em crise não merece qualquer reparo, designadamente na apreciação da matéria de facto, apreciando exemplarmente a prova produzida em audiência de discussão e julgamento, fundamentando, exemplarmente, a sua convicção e livre apreciação da prova, bem como aplicando corretamente o direito à matéria de facto considerada provada e não provada; B) Fundamenta a sua convicção e livre apreciação da prova de uma forma exemplar, enumerando todos os depoimentos que levaram o Tribunal a quo a formar a sua convicção, resumindo e transcrevendo as partes essenciais de cada depoimento e declarações efectuado nos autos, num resumo perfeito das partes relevantes de cada depoimento para a boa decisão da causa. C) Fazendo uma ponderação crítica de toda a prova produzida, na sua globalidade, num raciocínio decisório lógico perfeitamente perceptível para qualquer destinatário, que culminou com a condenação do arguido. D) Estando a decisão devidamente e exemplarmente fundamentada, de uma forma lógica, clarividente, completa e apreensível a qualquer destinatário. E) O Arguido descontente com a conclusão a que chegou o Tribunal a quo, avança com um Recurso numa argumentação absolutamente desgarrada da realidade processual e factual dos autos, violando, além do mais, regras processuais-penais elementares – como sendo as do recurso em matéria de facto e de direito (não indicando sequer quais as normas violadas); F) O âmbito do recurso é definido e limitado pelas conclusões, nas quais deverão estar evidentes e devidamente explícitas as razões do pedido. G) Da interpretação possível que conseguimos fazer das Conclusões do recurso, ficámos então com a impressão que o Arguido pretende que o Tribunal ad quem: i) verifique se os factos dados como provados são suficientes para subsumir ao Arguido a prática, objectiva e subjectivamente, do tipo-de-ilícito previstos nos artigos 180.º, n.º 1, 183,, n.º 2 e 187.º, n.º 1 e 2 do Código Penal; ii) Se há vício de falta de fundamentação da sentença; iii) Os factos dados como provados nas alíneas 6, 7, 8, 9, 10, 12, 13, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23 e 24 não correspondem à prova produzida em audiência de julgamento iv)Não foi reconhecido o direito constitucional á liberdade de expressão e opinião; H)  A procedência do recurso sobre a matéria de direito está dependente da indicação nas Conclusões das normas jurídicas violadas; /) A procedência do recurso sobre a matéria de facto está dependente do escrupuloso cumprimento dos requisitos formais das 3 alíneas daquele n.º 3 do artigo 412.º do CPP; J) O incumprimento das formalidades impostas pelo art. 412.º/ 3 e 4 CPP no texto da motivação, por omissão ou por deficiência, impossibilita e inviabiliza o conhecimento do recurso em matéria de facto pela via ampla, e logo também a exequibilidade da sindicância da decisão de facto ao nível mais alargado, consubstanciando, pois, um vício insanável (neste sentido, Ac. STJ, de 01/06/2011, proc. 234/00.8JAAVR.C2.S1, www.dgsi.pt). K) O Recurso do Arguido quanto à impugnação da matéria de facto, baseia-se, em suma, na conclusão (falsa) de que os assistentes confessaram que tinham conhecimento prévio da nomeações e ainda que o arguido a dada altura durante o programa respondeu: “Eu não acho” quando perguntado se achava que o A... influenciou a mudança de árbitro. L) Jamais os assistentes referiram ou confessaram que tinham conhecimento prévio das nomeações, tendo sempre referido que tomaram conhecimento das nomeações de forma oficial, por intermédio do site da federação e do comunicado que é emitido por ela para esse efeito, ou através da comunicação social que faz notícia desse comunicado. M) Veja-se nesse sentido o depoimento do Assistente CC, cujo depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso do Tribunal, onde refere que: “soube da substituição no dia anterior ou no próprio dia do jogo, através da comunicação social ou do site da Federação, mas que soube apenas de forma oficial”; N) Igualmente o Assistente BB, cujo depoimento foi gravado através do sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática em uso do Tribunal, referiu que: “sabemos a nomeação dos árbitros pela comunicação oficial que o Conselho de Arbitragem faz (através da Federação) para todos os jogos.” O) Sendo que ignorar estas declarações dos depoimentos dos assistentes, tentando fazer o tribunal ad quem acreditar que os assistentes confessaram que tiveram conhecimento prévio das nomeações, é deturpar a globalidade das declarações prestadas, fazendo uma escolha selectiva de afirmações isoladas de forma a tentar prevalecer a sua tese. P)  Quando o Arguido responde ao Apresentador, com a expressão: “Eu não acho”, claramente se percebe que o mesmo não está a negar esse pensamento, mas sim que reitera a sua certeza sobre esse facto ou questão. Q) Pela o entoação que é dada pelo arguido durante o programa, quando refere. “EU NÃO ACHO…” (deixando subentendido que tinha a certeza), “o que eu quero perceber é o que é que o Conselho (…) (…) Conselho de Arbitragem tem feito para proteger os árbitros que apitam jogos do A..., ponto número um.” quando perguntado se achava que o A... influenciou a mudança de árbitro. R) O sentido da frase propalada pelo arguido não é no sentido de negar, ( ao contrário do que alega no seu recurso), mas sim de reafirmar que tem a certeza, acrescendo que entende que os árbitros têm de ser protegidos das pressões da Assistente. S) O que realça o juízo de suspeição e imputação de factos falsos levantado pelo arguido. T) Veja-se ainda a esse respeito o teor das afirmações propaladas pelo Arguido, no programa televisivo: I) “A questão que eu levantei aqui é muito grave e eu gostava de saber o que é que o Conselho de Arbitragem tem para explicar porque é que o árbitro DD ... foi mudado, era ele que estava designado para este jogo e apareceu EE.” II) “Porque é que os jogos do A... acontecem sempre situações destas? (…) eu acho que isto é grave”. U) O Arguido imputou factos inverídicos às assistentes, todos eles com aptidão para ofender a credibilidade dos Assistentes e desprovidos de qualquer sustentação, o que o Arguido sabia. V) As imputações de factos inverídicos aos assistentes, pelo Arguido, afectaram a honra, reputação, bom nome, respeitabilidade e credibilidade, imputando-lhes a prática de factos ilícitos, anti-éticos e anti-desportivos; W) Com efeito, dúvidas não podem existir que o Tribunal a quo, analisou e ponderou toda a prova produzidas de uma forma racional e crítica, enquadrando bem as afirmações propaladas pelo Arguido no seu contexto e com a intenção com que foram produzidas, e o seu alcance nos destinatários. X) Quanto à subsunção dos factos provados ao direito, subscrevemos o teor da douta sentença, que aqui damos por reproduzida, que não nos merece qualquer reparo. Y) Não foram violadas quaisquer normas jurídicas, não existem quaisquer nulidades» * Neste Tribunal da Relação do Porto, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto subscreveu a posição do Ministério Público junto do Tribunal recorrido, emitindo parecer no sentido da improcedência total do recurso. * Cumprido o disposto no art. 417.º, n.º 2, do CPPenal, o arguido apresentou resposta, afirmando a correcção formal do recurso e pugnando pela posição neste assumida. * Realizado o exame preliminar, e colhidos os vistos legais, foram os autos submetidos à conferência, nada obstando ao conhecimento do recurso. * II. Apreciando e decidindo: Questões a decidir no recurso É pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação que apresenta que se delimita o objecto do recurso, devendo a análise a realizar pelo Tribunal ad quem circunscrever-se às questões aí suscitadas, sem prejuízo do dever de se pronunciar sobre aquelas que são de conhecimento oficioso[2]. As questões que o recorrente coloca à apreciação deste Tribunal de recurso são as seguintes: - Erro de julgamento em sede de matéria de facto quantos aos factos provados 6, 7, 8, 9, 10, 12, 13, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23 e 24; e - Erro de julgamento em sede de direito - qualificação jurídica. * Para análise das questões que importa apreciar releva desde logo a factualidade subjacente e razões da sua fixação, sendo do seguinte teor o elenco dos factos provados e não provados e respectiva motivação constantes da sentença recorrida (transcrição): «II – FUNDAMENTAÇÃO: 1) Instruída e discutida a causa resultaram provados os seguintes factos: 1. A assistente A... SAD é uma sociedade anónima desportiva, fundada em 1997, que se dedica à participação, na modalidade de futebol, em competições desportivas de carácter profissional e à promoção e organização de espectáculos desportivos, tendo sucedido à agremiação A... na disputa de competições futebolísticas. 2. O assistente BB é dirigente desportivo, sendo, desde 1982, Presidente do A... e, desde 1997, Presidente do Conselho de Administração do A... SAD. 3. O assistente CC é, desde ../../2016, Director-Geral da A..., SAD. 4. O arguido AA foi Director de Conteúdos da B..., exercendo, à data dos factos, no mês de Agosto de 2018, funções como comentador desportivo no programa "..." emitido às segundas-feiras no canal de televisão nacional C.... 5. Programa no qual, sob a moderação de FF, e juntamente com os comentadores GG e HH, o arguido debatia e comentava semanalmente os principais temas da actualidade desportiva, sobretudo em matéria de futebol. 6. Nessa qualidade de comentador, no dia 20 de Agosto de 2018, por volta das 22h35, durante a emissão do referido programa televisivo -e a propósito da análise do encontro desportivo que opôs a D..., SAD e a A..., SAD no dia 19-08-2018 –, o arguido afirmou o seguinte: “O mais intrigante é aquilo que eu vou contar a seguir. Eu sei que há aí rumores, e isto sendo verdade é muito grave, que o árbitro deste jogo não era para ser EE era para ser DD...Pronto, e eu gostava de perceber porque é que o árbitro mudou. A mim o que me consta é que o D... não tinha nada contra DD, não queria mudar o árbitro do jogo, portanto só resta uma alternativa. Eu sei que o A... (e por isso é que eu quero saber o que é que o Conselho de arbitragem vai fazer em relação a isto), o A... tem conhecimento prévio das nomeações. Quer BB, quer CC têm conhecimento prévio de quem é que vai ser nomeado. E aquilo que me constou é que o A... se mexeu para mudar DD, e a verdade é que DD não veio apitar (....) Oh FF eu não acho, o que eu quero perceber é o que é que o Conselho (...). Vamos lá ver uma coisa, oh FF, eu acho que o Conselho de Arbitragem tem de explicar isto. E eu gostava de perceber o que é que o Conselho de Arbitragem tem feito para proteger os árbitros que apitam jogos do A..., ponto número um. Porque contrariamente ao que foi dito, até curiosamente pelo representante do E... aqui, este campeonato já vai na segunda jornada e o que é que nós temos: o F... a ganhar jogos limpinhos, sem qualquer decisão de árbitros que os beneficiaram; o A... que ganhou bem e facilmente por cinco zero, teve duas expulsões que foram poupadas II e JJ ... o A... tem um penalti que para mim é mal assinalado e acaba por dar a vitória. Portanto, ainda virem dizer que começou agora e já estão a reclamar. Mas ah FF isto para mim isto é tudo, isto são detalhes (... ) para mim o mais grave (...) FF isto que eu estou aqui a falar são detalhes, a questão que eu levantei aqui é muito grave e eu gostava de saber o que é que o Conselho de Arbitragem tem para explicar porque é que o árbitro DD ... foi mudado, era ele que estava designado para este jogo e apareceu EE, e oh FF isto tem de ser esclarecido, e esta é a informação que eu tenho. Portanto eu gostava que isto fosse explicado, o que é que o Conselho de Arbitragem consegue fazer neste momento para evitar estas pressões. (...) Oh FF eu gostava que me explicassem porquê [da mudança de árbitro], eu sei que não foi o D..., porque o D... não tem isso em relação a nenhum árbitro, eu gostava de perceber porquê. Oh FF eu espero que não estejamos a voltar aos anos 90, já só falta ver árbitros a fugirem dos jogadores do A..., já só falta! (...) Porque é que nos jogos do A... acontecem sempre situações destas? (...) Vamos lá ver uma coisa, se se confirmar que DD foi mudado porque o A... se movimentou, se mexeu, porque tem acesso às nomeações, eu acho que isto é grave. [FF] Achas isso possível? [AA] Possível? Tenho a certeza que sabe! Eu tenho a certeza que sabe!" (minutos 00:23:30 a 00:29:26). 7. Refere-se o arguido à substituição (pública) de última hora do árbitro, DD, nomeado pelo Conselho de Arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol para arbitrar a partida de futebol que opôs a D..., SAD e a A..., SAD, realizada no dia 19-08¬2018, jogo a contar para a 2.ª jornada da Liga NOS. 8. As afirmações e imputações tecidas pelo arguido, divulgadas no programa televisivo supra identificado, são falsas. 9. Assim é falso que o assistente A..., SAD, e/ou os assistentes BB e CC tivessem um conhecimento prévio das nomeações dos árbitros para os jogos em que é interveniente o A..., 10. como é igualmente inverídico que, qualquer um deles, utilizasse esse alegado conhecimento para influenciar, ou por qualquer forma condicionar, as nomeações do Conselho de Arbitragem – fazendo pressão para que estas ocorram no sentido que mais lhes conviesse. 11. É ainda falso que a substituição do árbitro DD, na partida disputada com o D... em 19-08-2018, tenha ocorrido em virtude de uma qualquer intervenção externa do aqui assistente A..., SAD, ou de algum dos seus dirigentes – nomeadamente, do seu Presidente BB ou Director-Geral CC. 12. Tal como foi amplamente divulgado e publicitado pelos diversos meios de comunicação desportivos, a substituição do árbitro DD deveu-se, pura e simplesmente, a razões de ordem pessoal imperiosas - concretamente, a morte de um seu familiar directo - que ditaram a impossibilidade de comparência do mesmo naquele encontro desportivo. 13. Motivo, sério e justificável, que não tardou a vir a público, tendo sido noticiado na generalidade da comunicação social, assim contribuindo para esclarecer, de forma clarificadora, o porquê de o árbitro da partida ter sido EE e não o inicialmente designado DD. 14. Tal situação, apesar de inesperada e excepcional, não revelou ser um problema, tendo o Conselho de Arbitragem seguido os trâmites habituais devidamente regulamentados para fazer face a este tipo de casos. 15. Estando, portanto, longe de se tratar de um assunto de carácter duvidoso ou de alguma forma envolto em mistério que necessitasse de ser desmistificado ou explicado por quem quer que fosse. 16. Apesar de serem já públicos e publicitados os motivos que justificaram a ausência do árbitro DD no jogo em apreço, o arguido não se coibiu de levantar um véu de suspeição injustificado sobre a actuação dos assistentes, optando por ignorar os concretos factos reais. 17. Escudando-se nesta concreta ocorrência, para reafirmar e reforçar o seu pretenso conhecimento sobre o alegado modus operandi ilegal (e penalmente relevante) de actuação dos aqui assistentes no que concerne à arbitragem, em geral, e à nomeação de árbitros, em particular. 18. Garantindo saber que a A..., por intermédio dos seus dirigentes, tem conhecimento prévio e privilegiado das nomeações de árbitros, usando e abusando, por essa via, do seu alegado "domínio". 19. Mais insinuando haver uma política instalada e enraizada naquela instituição desportiva de exercício de influências e pressões a árbitros – de tal modo que estes precisariam mesmo de receber "protecção" por parte do Conselho de Arbitragem. 20. As declarações do arguido no programa supra identificado, foram proferidas em manifesto prejuízo da imagem pública dos aqui assistentes, ofendendo-os, de forma inegável e evidente, no seu bom nome, honra, consideração, credibilidade e prestígio. 21. O arguido tinha perfeito conhecimento de que as suspeições que levantou eram infundadas. 22. O arguido é um comentador experiente, pelo que tinha perfeita noção das repercussões que tais afirmações iriam ter na opinião pública, bem como dos danos que eram aptos a causar aos aqui assistentes. 23. Além disso, bem sabia o arguido que, ao ser difundida num programa desportivo de destaque na televisão nacional, tal conduta teria a virtualidade de ser ampla e rapidamente divulgada, como foi, facilitando a amplificação das suas falsas imputações. 24. O arguido agiu assim de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal. Mais se provou: 25. Após os factos dos autos o arguido pediu desculpas pelas palavras proferidas, ao arbitro DD e familiares, nunca se tendo retratado, por qualquer forma, perante os aqui assistentes. 26. O arguido: a)é casado e tem 57 anos de idade; b) trabalhou como jornalista no jornal “O Independente” durante período de tempo não apurado; iniciou funções no canal B... em 2008-2009, na G... em 2013-2014 e em 2015-2016 na C..., no programa “...”; c) actualmente é comentador na G..., no programa desportivo “Mercado”, que é transmitido à sexta feira; aufere montante não concretamente apurado mas que se sabe ser pelo menos €1500,00 mensais; c) a esposa é jurista e aufere montante não apurado; d) não tem filhos a cargo; e) reside em casa própria sem pagar empréstimo bancário; f) é licenciado em Comunicação Social; g) é tido como profissional competente, pessoa que prepara e estuda os assuntos nos programas que comenta; h) Não tem antecedentes criminais. 2) Factos não provados: Não se provou: a) que com as expressões que proferiu no programa referido em 6), o arguido visasse apenas criticar o Conselho de Arbitragem e/ou alertar para a necessidade de proteger os árbitros vítimas de pressões dos clubes; b) que quando proferiu as expressões referidas no item 6) dos factos provados, o arguido não soubesse o motivo da substituição dos árbitros; c) não se provaram quaisquer outros factos para além ou em contrário dos dados como provados, com interesse para a boa decisão da causa. 3) Convicção do Tribunal: A convicção do Tribunal ao dar como provados e não provados os factos supra descritos, fundou-se na análise conjugada e crítica do conjunto da prova produzida –documental, visualização do programa em causa nos autos, prova testemunhal e declarações do arguido e assistentes-, apreciada nos termos do art. 127.º, do C.P.P., mais concretamente: a) o arguido: Apenas prestou declarações a final da prova produzida em julgamento, pelo que oportunamente as suas declarações serão consideradas. a) Os assistentes: Apenas compareceram e prestaram declarações após o depoimento da testemunha EE, pelo que oportunamente as suas declarações serão consideradas. c) As testemunhas de acusação: c.1- EE (ouvido por videoconferência): Referiu ser assistente técnico no Centro Hospitalar ...; actualmente também é director de futebol de formação. Foi árbitro desde 1992 até 2020. Só conhece o arguido da televisão; conhece os assistentes pessoalmente, por causa das suas funções; são conhecidos, não amigos. Relativamente ao caso dos autos, referiu que foi chamado de urgência para um jogo, D...-A..., segundo pensa em Agosto de 2017, para fazer uma substituição do colega DD, em virtude de lhe ter falecido o avô. Quem lhe ligou a comunicar a necessidade de substituição, na noite anterior, foi o Presidente do Conselho de Arbitragem, KK. Na altura e pensa que actualmente ainda é assim, recebiam as nomeações via e-mail à 4.ª feira; depois confirmavam junto dos serviços e o Presidente da ... a questão dos transportes. Os árbitros assistentes e o 4.º arbitro é que tinham conhecimento das nomeações. É tornado público no site da Federação 48 horas antes do jogo. Que se recorde no site não foi levantado qualquer tipo de suspeição; a substituição deve ter sido publicitada no site da Federação; quanto aos motivos da substituição, não sabe se são publicitados. Nunca foi abordado por qualquer clube relativamente às suas nomeações como árbitro. No caso dos autos não foi abordado por ninguém ligado ao A... por causa dessa substituição. Não viu o programa nem leu o que disse o arguido; só soube no âmbito do processo dos autos. As declarações não fazem sentido. O arguido insinuou que o A... teria tido ingerência na nomeação do árbitro; as coisas não funcionam assim, os clubes não têm qualquer interferência nas nomeações. O que disse é grave mas no futebol todos os dias se ouvem este tipo de declarações pelo que a gravidade é relativa. No caso foi uma substituição normal. Pensa que o A... ganhou por 2-1 ou 3-2. b) Os assistentes: b.1- BB: Referiu que conhece o arguido de vista. É presidente do A... desde ../../1982 e da SAD desde a fundação em 1998-1999. Não viu o programa a que se referem os autos em directo, viu no dia seguinte a gravação. Na altura o filho disse-lhe que estavam a dizer na televisão que o depoente escolhia os árbitros e até o LL lhe telefonou a contar. Referiu que estava indicado para arbitrar o jogo o árbitro DD e em virtude da morte dum familiar foi substituído por outro, cujo nome já não recorda. O arguido no referido programa disse que o depoente ou o A... mudaram os árbitros; estava a dizer que ia lá para os ajudar (aos árbitros). Sentiu-se indignado e ofendido; era mentira e o arguido quis prejudicar o A.... Também punha em causa a equipa de arbitragem e os próprios árbitros. Pensa que as declarações do arguido tiveram lugar antes do jogo começar, não sabe. Não sabe o nome do programa, sabe que é da G.... O arguido fala mal do A... e acha que o programa foi criado para isso. Da parte do arguido nunca houve qualquer pedido de desculpas, formal ou informal, directamente, através de terceiros ou da imprensa. Referiu ainda que soube pelo Conselho de Arbitragem da nomeação e da substituição, por morte de familiar, 1-2 dias antes do jogo. A sugestão dos árbitros não pode nem deve passar por si.***Foram visualizadas em julgamento as imagens do programa em causa nos autos, cuja transcrição se encontra a fls. 312 e ss.***Continuando o assistente a prestar depoimento, referiu que depois de ver as imagens ainda fica mais indignado; o arguido até disse que “tinha a certeza”. É uma acusação muito grave para o A..., porque diz que estava a fazer “batota”, para o Conselho de Arbitragem se fizesse substituições a pedido de qualquer clube e também para o árbitro. Não vê o programa para não se incomodar. O arguido estava a dizer factos que sabia serem falsos; primeiro levantou “suspeitas” e depois disse que “tinha a certeza”. Pensa que na comunicação não dizia o motivo da substituição. Os dois eram árbitros internacionais, a substituição só podia ser por motivo de força maior. Pensa que na data do jogo o motivo da substituição já era conhecido. Não houve qualquer problema com a arbitragem durante o jogo. Pensa que o arguido tinha ligações ao F... e a MM. Falava com muita convicção, se diz que “tem a certeza”, muita gente acredita; estava a falar para o público em geral. O arguido estava sempre a ofender o A...; se o programa tem muita audiência não sabe e desconhece se foi visto a nível internacional. As imagens tiveram impacto na honra do depoente e reflexos na credibilidade do A..., disse que o A... “fazia batota”, descredibiliza o clube; ofendeu a instituição e a pessoa do depoente. Não conhece os membros do Conselho de Arbitragem. Ficou incomodado com a situação e ainda hoje fica incomodado. b.2- CC: Referiu que é sócio do A... desde criança; é administrador da SAD há 20 anos; na data dos factos era director do A.... há 6 anos; também já foi vice-presidente do clube, só tendo estando fora de funções no clube cerca de 7 anos. Conhece o arguido pessoalmente mas nunca falou com o mesmo; também o conhece por ser comentador desportivo. Assistiu ao programa “...” a que se referem os autos; costumava assistir. O arguido disse que o depoente tinha o poder de influência na nomeação dos árbitros e que tinha sido responsável pela substituição do árbitro DD, que tinha sido uma imposição do depoente e do Presidente do A.... O programa foi depois do jogo; o jogo foi sábado ou domingo. O depoente conhecia os dois árbitros em causa nos autos; conhece todos os árbitros da Liga. Não se recorda se teve conhecimento 1-2 dias antes do jogo quem seria o árbitro, foi publicado, segundo pensa no site oficial da Federação ou da Comunicação Social. Sabia-se que a substituição ocorreu por ter falecido um familiar do árbitro. O depoente ficou pessoalmente ofendido com as declarações; o arguido dizia que “tinha a certeza”, descredibilizou a instituição A.... Os árbitros olhariam para ele pensando que tinha poder de os prejudicar; até colegas da filha ligavam a dizer que o pai influenciava os árbitros. Em termos de clube também era incorrecto. Acha que as declarações do arguido tiveram a ver com o jogo, que ganharam nos últimos minutos. O arguido disse que tiveram influência em trocar o árbitro; nunca tinha ouvido tal tipo de expressão. Acredita que o arguido já tinha a informação do motivo da substituição (morte do familiar) e não obstante proferiu as declarações no programa. Nunca pediu desculpas nem se retratou. O depoente exerce funções de delegado ao jogo. Inquirido referiu que as nomeações dos árbitros são feitas pelo Conselho de Arbitragem e só se sabe qual o árbitro quando é publicado no site da Federação; todos sabem nessa altura; a antecedência é variável; por exemplo actualmente “hoje” (data do julgamento, 06/02/23, segunda feira) saem as nomeações para o jogo de quarta feira. No caso em causa nos autos não falou com nenhum dos árbitros antes do jogo, só no final. A escolha dos árbitros é definida pelo Conselho de Arbitragem, não passa pelo depoente. Não sabiam da substituição nem quem seria o substituto; depois de saberem tanto o A... como o D..., a título informal, souberam do motivo da substituição. Segundo o mesmo na altura do programa já se sabiam os motivos da substituição e o arguido era uma pessoa bem informada e até já tinha sido jornalista do Independente. Acha que as declarações do arguido eram levadas a sério, pelo menos por quem não gosta do A...; era um comentador desportivo e fazia as suas afirmações. Costumava ver o programa, acha que tinha alguma audiência. Acha que o que o arguido disse era uma acusação bastante grave, põe em causa a credibilidade da instituição (A...) e da arbitragem. Internacionalmente acha que não teve grande impacto; viu-se logo que era “mentira”. Os árbitros estão habituados a ser alvo de críticas e não tem grande protecção, mas se alguém tem o poder de os nomear ou substituir é grave. O futebol é importante em Portugal e representa o país. Se o depoente fosse mais novo acha que o podiam olhar de lado, em virtude das declarações do arguido. Na altura não foi abordado nem lhe pediram explicações, mas há sempre quem ponha em causa. Chegaram a dizer que “mudou os árbitros”, mas não ligou. O arguido pôs em causa a Federação e Conselho de Arbitragem, ofendeu o clube A... e o depoente. Continuou a fazer a sua vida profissional mas não há dúvidas que as pessoas questionaram que estivesse ligada a coisas menos correctas. ***As restantes testemunhas de acusação: b.2- DD: Referiu ser árbitro desde 2001. Só conhece o arguido da televisão. Conhece os assistentes em virtude das suas funções, se tiver que falar com eles fala mas não têm relações de amizade. Relativamente aos factos dos autos, teve que ser substituído na arbitragem do jogo A...-D..., para o qual estava escalado, em virtude do falecimento do seu avô, NN, em ../../2018. Soube do óbito cerca das 20.00 horas e ligou ao Presidente do Conselho de Arbitragem, KK, a comunicar e pedir a substituição, tal como sucede quando fica doente. Aos clubes não comunicam isso nem tem que falar com os mesmos. Não tem que saber nem soube na altura quem o ia substituir; geralmente a substituição torna-se pública antes do jogo, por comunicação pública da Federação no site oficial. Nunca ninguém dos clubes falou com o depoente, nem neste caso nem noutro. Ninguém o abordou para falar da substituição. Também nunca foi abordado pelo arguido para esclarecer a situação e segundo o mesmo, essa pergunta –relativamente à qual se mostrou incomodado-, “nem tem pés nem cabeça”. b.3- KK: Referiu ser Presidente do Conselho de Arbitragem desde ../../2016. Só conhece o arguido da televisão; quanto aos assistentes conhece-os do âmbito das suas funções mas não priva com os mesmos. Quanto à substituição dos autos, referiu que o árbitro DD ligou-lhe na véspera do jogo, à noite a comunicar o falecimento do avó e que não estava em condições de ir arbitrar o jogo. Como o árbitro EE era o vídeo árbitro nomearam-no para árbitro; foi uma substituição normal, o procedimento era sempre igual; se for “em cima do jogo”, como é o caso, a substituição tem que ser rápida; no caso às 22.00 horas a substituição já estava feita e foi publicada no dia seguinte, no próprio dia do jogo (domingo). Na altura fazem uma notícia com todas as nomeações do dia; a publicação é para toda a gente; na altura, tal como hoje, pensa que era publicada no site da Federação, mas já não tem a certeza se era só na Comunicação Social. O departamento de Futebol introduz o nome dos árbitros na plataforma e depois é tratada a logística dos hotéis, viagens, transporte para a equipa de arbitragem. Os Clubes só tiveram acesso no dia do jogo; que saiba nenhum clube soube previamente da substituição. O delegado ao Jogo também sabe por via oficial. Tudo decorreu com normalidade. A nomeação do árbitro EE foi noticiada no dia do jogo; os motivos da substituição foram noticiados no próprio dia ou no dia seguinte (1-2 dias), porque se levantaram dúvidas. Que saiba o arguido nunca o contactou a apurar o motivo da substituição; os árbitros também nunca comunicaram qualquer pressão do A.... O depoente não viu a notícia nem o programa em causa nos autos. Tem conhecimento das declarações que foram prestadas pelo arguido, que nada abonam a favor do desporto nem da equipa de arbitragem. Actualmente normalmente a nomeação é à quinta-feira e publicam para o jogo desse fim de semana; no caso dos autos foi apenas publicada a nomeação do EE sem referência ao anterior.  As pessoas que tem acesso à informação são a Federação, Conselho de Arbitragem, departamento de comunicação da Federação e depois segue para a H...; se houve fuga de informação não consegue controla-la. O árbitro DD tinha sido nomeado na quarta ou quinta e o jogo era no domingo; o nome do árbitro EE foi revelado no domingo. Actualmente a nomeação é logo divulgada; em 2018 eram conhecidas antes dos jogos, não queriam “expor” os árbitros tão cedo. Na altura havia muita mediatização em relação aos árbitros, viam o nome deles e começavam logo a falar mal nos programas televisivos; havia pressões aos árbitros, que necessitavam de protecção nos jogos com os 3 grandes clubes nacionais (A..., E..., F...). Foi confrontado com as notícias de fls. 14-15, datadas de 20/08/23, onde se refere o motivo da substituição (morte de familiar). *** d) As testemunhas de defesa: d.1- OO: Referiu ser advogado há 30 anos e ligado ao mundo do futebol há muitos anos; foi treinador dirigente e tem curso de arbitragem. O depoente foi comentador desportivo no programa “...”; foi substituir um comentador no Verão de 2018; esteve fora do programa 2 meses, por motivos profissionais e retornou em Setembro de 2018, tendo ficado até Abril de 2019. Na data dos factos não fazia parte dos comentadores do programa mas assistia ao mesmo e viu aquele a que se referem os autos. Recorda-se das declarações, não as achou fora da “genética” do programa nem dos comentadores. É um programa feito na perspectiva da captação de audiências, mais entretenimento do que informação. Às vezes criavam polémica ente os comentadores, para atrair espectadores, é mais o “espetáculo” do que o conteúdo da notícia. Este tipo de programas vive mais da polémica do que do jogo propriamente dito; eram alimentados por polémicas e havia em todos os canais. Centram-se em questões de arbitragem para criar o “incêndio”, que gera audiências. Naquele programa o “combate” mais acesso era com o arguido que estava bem preparado para aquele tipo de programas. Referiu que pensou muito antes de aceitar ser comentador daquele programa; a sua vida mudou para pior e até chegou a receber ameaças, telefonemas de todo o lado, tentativas de agressão, vandalismo no carro; defendia o E... e por causa do programa perdeu muitos amigos, não voltaria a fazer um programa desses; o futebol “gera ódios”. Quanto às nomeações dos árbitros referiu que eram secretas, os clubes não sabiam; eram comunicados 2 dias antes para a comunicação social em geral. Acha que era o próprio Conselho de Arbitragem que divulgava a informação. No futebol há egos muito elevados, alguns diziam que já sabiam quem era o árbitro e que este ou aquele não ia arbitrar o jogo dele.  O depoente fez o curso de arbitragem por curiosidade, exerceu 2 anos e desistiu. Havia observadores e avaliadores ligados aos clubes, que condicionavam as funções e acabam por ser sujeitos a todo o tipo de pressões. As alterações de última hora dos árbitros não são incomuns (doença, impedimentos, etc.); o depoente chegou a substituir colegas. As substituições de última hora podem ser feitas e comunicada no próprio dia. Em 2018 sabiam-se quem eram os árbitros nomeados à quinta ou sexta feira; mesmo sendo nomeação secreta pode haver fugas de informação e sai até na comunicação social. Eram normal que os dirigentes soubessem antes; era normal os dirigentes quererem saber quem ia ser o árbitro 2-3 dias antes; todos queriam saber; também foi treinador e gostava de dizer aos jogadores quem ia ser o árbitro, para determinar como orientava o jogo. Conheceu o arguido na década de 90 quando era jornalista no “Independente” e o depoente advogado num processo mediático; em 2000 integraram a mesma tertúlia literária e encontravam-se ou falavam uma vez por mês, que acabou com o Covid. Depois voltaram a encontrar-se no programa a que se referem os autos. Do que conhecia do arguido fora do contexto do “... era uma pessoa que surpreendia pela sua frontalidade, sem receio de opinar, sem receio de magoar o próximo mas em faltas de respeito; nunca achou que falasse por falar, é inteligente, prepara as suas opiniões. Segundo o mesmo a questão da substituição do árbitro foi levantada de forma “especulativa”, um apelo ao esclarecimento das razões, não estava a insinuar que foi o A.... Lembra-se de o arguido dirigir uma palavra de apreço ao árbitro substituído. Para si o programa não teve nada de anormal; é a animosidade do futebol; nunca interpretou que o arguido disse que tinha havido manipulação. O arguido era comentador expediente, bem preparado, metódico, levava sempre muita documentação que usava. Do que conhece do arguido tem a certeza que se soubesse o motivo da substituição não teria dito o que disse; se tivesse saído uma notícia a explicar a substituição não ia dizer o que disse. Referiu ainda que o árbitro DD era frequentemente visado pelos 3 maiores clubes portugueses. Sobre o árbitro EE nada sabe. No programa “...” interessava mais a polémica, o embate dos protagonistas; um comentador calado e respeitoso não servia. Enquanto árbitro nunca teve contacto com dirigentes de clubes nem privou com os mesmos. Enquanto comentador o alvo do depoente era mais o F..., defendido pelo arguido. Referiu ainda que as pressões sobre os árbitros podem ser feitas por qualquer um, fomentado o ódio nas redes sociais ou comunicação social. d.2- PP: Referiu ser empresário e comentador há 14 anos no B.... Conhece o arguido há 14 anos, o qual também trabalhou no B.... O depoente já foi árbitro, conhece os assistentes mas não tem contacto com eles. Assistiu ao programa dos autos, falava-se de arbitragem. Segundo o mesmo no jogo existiu uma falta gravíssima e não foi contra o D.... No programa a acerta altura falou-se sobre a questão da substituição do árbitro e o arguido questionou ao Conselho de Arbitragem a razão e tal substituição, queria saber a razão; só disse que o Conselho de Arbitragem era o responsável; o arguido pauta-se pela verdade; havia secretismo na nomeação dos árbitros, o que gerava comentários. O depoente esteve 21 anos na arbitragem, até 1998; nunca se sentiu pressionado, ia para os jogos no próprio dia e nunca lia jornais. Acha que no dia se disse que a substituição foi por morte dum familiar do árbitro. d.3- QQ: Referiu ser empresário ligado ao futebol, trabalhando como intermediário na contratação de jogadores. Falou 3-4 vezes com o arguido e uma com o assistente CC, por questões profissionais. Assistiu ao programa dos autos como telespectador. No programa falou-se da arbitragem e falou-se que as nomeações do árbitros deviam ser confidenciais, que se sabiam 48 horas antes dos jogos; sabia toda a gente; o próprio também denunciou isso na polícia e facebook. Os dirigentes e as claques tinham acesso à informação. A substituição do arbitro verificou-se depois que tinha ocorrido por morte de familiar; o arguido só se referiu a isso, ao conhecimento da nomeação. Referiu ainda que o árbitro DD foi muitas vezes criticado pelo A.... As questões levantadas foram sempre “suspeições”, não só pelo arguido, como outros comentadores, não só ao A... mas no geral. Segundo o mesmo no próprio programa colocou-se a informação de que a substituição tinha sido porque tinha falecido um familiar do árbitro e o arguido ficou surpreendido com isso. d.4- RR: Referiu ser empresário, trabalhando na área da gestão desportiva. É amigo do arguido que conhece há 10-12 anos, tendo pelo mesmo muita consideração. Era espectador assíduo do programa em causa nos autos; por ser testemunha voltou a rever o programa para estar mais inteirado. Referiu que o programa tinha e comentadores que representavam e defendiam os 3 maiores clubes portugueses; fazem como se estivessem num jogo de futebol, as regras são aceites por todos e às vezes há um confronto mais agressivo; não houve qualquer ofensa directa a ninguém. O depoente já foi comentador desportivo mas não defendia nenhum clube. O arguido é dos comentadores que conhece que melhor se prepara para os programas, leva malas com documentação, fala publicamente, não pode defraudar o público. Segundo o mesmo no programa dos autos fala de fugas de informação, de saberem coisas por antecipação, que foi transformado em algo muito grave. Os queixosos sentiram uma coisa que de facto não aconteceu. Em 2018 as nomeações dos conselhos de arbitragem eram confidenciais e só eram nomeados no dia do jogo, mas havia muitos palpites e fugas de informação. O depoente foi dirigente desportivo muitos anos do D..., E... e F.... O que o arguido disse é um facto, numa altura em que o A... precisava de ganhar para ser campeão, “tinha interesse” (na mudança de árbitro) e o D... não. Sabe o que é público; muitas vezes os dirigentes têm que alertar, faz parte da estratégia de comunicação, desde que não haja ofensa pessoal. Segundo o mesmo é público que há imagens de jogadores do A... (e outros clubes) a correr atrás de árbitros para os pressionar. Falar disso, desde que não haja ofensas pessoais é válido no debate desportivo. Referiu que o arguido teve programas em que não foi simpático, é um comentador agressivo, que veste a camisola do F... mas é educado e bem formado, não o conhece como mentiroso ou que use o que diz para denegrir a imagem de alguém.   Quanto à substituição dos árbitros a Federação normalmente explicava oficialmente e no caso não o fez; no caso nem o apresentador FF tinha conhecimento do motivo da substituição, só no fim do programa o referido apresentador alertou para o motivo de substituição do árbitro, até aí ninguém sabia. O Clube consegue saber antecipadamente a nomeação dos árbitros, mesmo quando é confidencial; é um clube que tem as suas fontes de informação. Não é inócuo dizer que alguém consegue interferir na nomeação dos árbitros. Há clubes bem organizados que muitas vezes condicionam a nomeação dos árbitros através de declarações públicas, antes dos jogos, para pressionar. Tudo que seja para alterar decisões quanto aos árbitros não é inócuo. d.5- FF, jornalista: Referiu conhecer o arguido há 12-13 anos, desde que começou a apresentar o programa ...; têm apenas relações profissionais. Na emissão a que se referem os autos estavam a discutir várias questões; o arguido suscitou a questão do árbitro DD ter sido nomeado para o jogo e substituído, que lhe causou estranheza. Depois souberam que um familiar do mesmo tinha falecido, o que suscitou comentários. Arbitragem é sempre um tema polémico, que faz parte da “cultura portuguesa” e fazia parte do programa falar disso. Desconhece como se nomeavam os árbitros na altura. Sabe que num sentido de protecção dos árbitros só muito perto do jogo é que era divulgada a identidade dos árbitros, para não se prolongar a discussão. Tem memória que o arguido suscitou estranheza quanto à mudança do árbitro e não haver uma comunicação oficial. Chegaram à conclusão que a mudança tinha ocorrido por morte de um familiar. Após pesquisa na internet e informação da Regi, chegaram a essa conclusão. Na altura do programa não conheciam o motivo da substituição dos árbitros. Sabe que às vezes, por motivos imponderáveis, os árbitros eram substituídos; no caso acha que não se conheciam os motivos da substituição. Referiu que o arguido era dos que melhor se preparava para os programas, levava muita documentação escrita e era apaixonado pelo F.... Se o arguido tivesse conhecimento do motivo da substituição não teria levantado a questão. O arguido tinha um discurso provocador para os outros membros do painel e do clube. Pessoalmente não lhe causou estranheza a substituição, acontecia por razões pessoais dos árbitros; o depoente não teve qualquer suspeição. O arguido é que levantou a questão da substituição. Referiu depois que o motivo da substituição foi dado a conhecer durante o programa, o próprio depoente o referiu e mostrou as notícias. O arguido disse que não entendia a substituição e o GG (outro comentador) disse que podia ser por razões pessoais. Às vezes havia excessos, injustiças. Referiu que depois de conhecerem o motivo, o arguido não ficou convencido. Mais tarde sabe que o arguido pediu desculpas ao árbitro DD e família; não sabe se foi nesse programa ou no seguinte. No programa a responsabilidade dos comentários é dos próprios comentadores. Se no programa o arguido disse que o A... se mexeu para mudar o árbitro é grave; se houve factos que comprovassem isso era muito grave. Não tem memória das palavras concretas proferidas pelo arguido. Não tem memória de ter havido pedido de desculpas aos assistentes. Acha que o arguido não conhecia o motivo da substituição, quando levantou a questão mas acha que o motivo já constava da imprensa. Normalmente o arguido documenta-se bem dos assuntos, tem um alinhamento com o que se passou nos jogos e fim de semana. A substituição do árbitro não fazia parte do alinhamento; a substituição era pública, o motivo é que não. Mesmo depois de saber o motivo o arguido ficou desconfiado, deve ter confiado mais na fonte dele. ***a) O arguido: Depôs apenas a final. Referiu que está perplexo com o processo. Começou a trabalhar no B... em 2008-2009, na G... em 2013-2014 e em 2015-2016 na C... 24, no programa “...”. Um dos assuntos que lhe foi dito ser polémico e de interesse era a arbitragem, prendia a atenção dos espectadores. O depoente pertence a uma comunidade futebolística e tem o entendimento que ao ser comentador (independentemente de ser do F...), tem um papel e uma missão de suscitar questões que lhe merecem reflexão sobre o que se passa no mundo do futebol. No programa em causa nos autos estava em análise um jogo muito polémico entre A... e D..., que terminou com 2 penaltis uma a favor de cada clube, sendo o do A... na recta final. Na edição de domingo teve uma informação que não comentou porque não tinha comprovada a informação que o árbitro nomeado seria DD e não EE e tinha havido troca. Na segunda feira confirmou a informação da troca. Se soubesse qual era o motivo da troca não iria dizer nada, perderia credibilidade. O programa a que se referem os autos ocorreu na segunda feira. Referiu que o foco ao fazer os comentários dos autos era o Conselho de Arbitragem, não são os clubes que nomeiam os árbitros. Em Janeiro de 2018 o árbitro DD apitou o jogo I...-A...; o A... não prestou declarações mas disse que ia fazer uma exposição ao Conselho de Arbitragem sobre o árbitro DD, apontando-lhe 7 erros e sabe que a fez; não leu a exposição, só a notícia; achou que era uma forma de pressão. Depois disso DD nunca mais foi nomeado para um jogo do A.... O treinador LL também criticava esse árbitro. O Dr. SS, presidente da Federação ... que tutela os árbitros denunciou no parlamento a situação de árbitros ameaçados. Achou que a Federação não conseguia assegurar a segurança dos árbitros. Terminou a época 17-18 e começou a 18-19. Estava nomeado o árbitro DD para o jogo a que se referem os autos. O seu foco era o Conselho de arbitragem. Os clubes não se sentem confortáveis com os árbitros e na altura não se sabiam os motivos da substituição. Em 5 de Janeiro de 2017 os árbitros foram ameaçados na ..., num jogo com o A...; a claque dos ... ameaçou várias vezes um árbitro e família que tinham um estabelecimento comercial. Achava que o Conselho de Arbitragem não estavam a dar conta do recado. Dizia o mesmo se fosse do F.... Não achou normal estar designado um árbitro e ser mudado. Acha que o processo dos autos é perseguição do A... ao depoente e já não é o primeiro. Tem a noção que arbitrar não é fácil e admite que possa ter exagerado nas críticas à arbitragem. Confrontado com o teor da acusação, referiu que a ideia era perceber porque tinha sido mudado o árbitro; desde Janeiro que não era nomeado DD para o A... e a verdade é que o A... ganhou o jogo. Relativamente à expressão que o A... “se mexeu para mudar o DD…”, referiu que tinha a ver com o jogo com o I... onde o A... apontou 7 erros ao referido árbitro e antes já tinha falado mal dele. Como comentador tem o direito de dizer isso. O presidente do Conselho de Arbitragem KK disse que não aceitava a tentativa de vetar árbitros. No programa questionaram a questão da arbitragem e a mudança dos árbitros. Não sabe como soube da mudança, foi uma das suas fontes. Quando soube o motivo da substituição pediu desculpas ao árbitro e família. É a favor do sorteio de árbitros. Sente-se constrangido mas tudo o que falou tem a ver com o Conselho de Arbitragem. As nomeações passaram a ser reservadas a partir das pressões. Se disse “aquilo que me consta é que o A... se mexeu para mudar DD”, não se revê nessa frase. Referiu ainda que o jogo acabou com penalti a favor do A..., que ganhou o jogo. Depois de saber o motivo da substituição não pediu desculpa a nenhum dos assistentes, achou que não tinha ofendido. Segundo o mesmo só quis criticar o Conselho de Arbitragem, o critério de troca; não se sabia o motivo da troca. Prepara-se para os comentários; conforme o tema, fala com especialistas. Inquirido referiu que não viu a notícia da mudança no dia do programa (segunda), senão não levantava a questão. No dia anterior já sabia da mudança mas não tinha a certeza, não disse nada; quando levantou a questão já tinha a certeza da troca. Passam 90% dos programas a falar da arbitragem. Depôs quanto à sua situação pessoal.****Tiveram-se ainda em conta os seguintes documentos: notícias de fls. 14-15 (datadas de 20/08/2018, publicadas uma às 11.53 horas e a outra às 12.04 horas, nas quais se fala que o árbitro DD foi substituído pelo árbitro EE, em virtude de morte de um familiar); teor de fls. 42-49, 56 e 735 (documentos/informações enviados pela Federação ...); transcrição de fls. 311-313 (da entrevista dos autos) e teor/informações de fls. 732-733.***Quanto à situação pessoal do arguido, tiveram-se em conta as suas declarações, as das testemunhas de defesa e o seu CRC de fls. 486. ***Analisando, então a prova produzida e para além do já referido, caberá referir que as expressões proferidas pelo arguido e que deram origem aos presentes autos, foram proferidas num programa televisivo, cuja gravação e transcrição da mesma se encontram juntas aos autos. As imagens foram visualizadas em julgamento e a transcrição junta aos autos corresponde ao vertido na acusação particular. O arguido foi ouvido apenas a final –conforme manifestação de vontade nesse sentido- e, não pondo em causa as expressões transcritas na acusação referiu que apenas quis questionar o Conselho de Arbitragem sobre os motivos da substituição, a falta de protecção dos árbitros face às pressões dos clubes sobre os árbitros e o facto de estes terem conhecimento das nomeações (secretas) previamente.  Referiu ainda que não sabia o motivo da substituição, caso contrário, não falaria do assunto; quando soube pediu desculpas ao árbitro DD e família mas não aos assistentes, porque acha que não os ofendeu. Confrontado com o facto de ter dito que o A... se mexeu para mudar o árbitro, referiu que se disse, não se revê nessa expressão. Foram ouvidos os assistentes particulares por si e como representantes do A..., que se mostraram ofendidos e indignados com as expressões proferidas pelo arguido, por ter levantado suspeições e até certezas que os mesmos conheciam previamente as nomeações e tiveram influência na substituição dos árbitros a que se referem os autos, do que resulta que teriam agido de forma desonesta, pondo em causa o seu bom nome e consideração e abalando a credibilidade do clube, com a imputação de tais factos. Face à prova produzida resultou que na altura as nomeações dos árbitros eram secretas e publicitadas 1-2 dias antes do jogo no site da Federação de Arbitragem e na Comunicação Social. Não resultou dos autos que os assistentes tivessem qualquer conhecimento anterior a essa publicitação. Por outro lado, conforme se apurou a substituição do árbitro DD ocorreu “em cima do dia do jogo”, por motivos de falecimento dum familiar do referido árbitro e o nome do árbitro que o veio substituir, EE, foi publicitado no próprio dia. De acordo com as notícias juntas aos autos, publicadas nos meios de comunicação social no dia 20/08/2018, durante a manhã (dia do programa a que se referem os autos), foi publicitado o motivo da substituição (morte do familiar do árbitro). Assim, quando o programa dos autos teve lugar, já era público o motivo da substituição. De qualquer forma o arguido referiu que não tinha conhecimento do motivo da substituição, caso contrário não falaria do assunto e o jornalista que dirigia o programa, FF, referiu que também não tinha conhecimento; durante o programa souberam os motivos da substituição mas segundo o referido apresentador mesmo assim o arguido não ficou convencido. Analisando brevemente as declarações do arguido, dúvidas não restam que o mesmo questiona a substituição do árbitro, diz que o A.... é que teria interesse na mudança e do que sabe, os assistentes, sabendo com antecedência a nomeação do árbitro DD, “se mexeram” para mudar o árbitro, o que não pode deixar de considerar-se ofendivo para os assistentes, uma vez que alterar o árbitro ou ter poderes para o fazer, é um comportamento ilegal, desonesto e reprovável.  Por outro lado, dúvidas não existem que tais expressões foram proferidas num programa televisivo, meio de comunicação social, o que facilita a propagação da notícia ou de tais afirmações. Por outro lado, o carácter sensacionista do programa –referido por todas as testemunhas de defesa-, onde interessa a polémica e a questão da arbitragem, não pode servir de justificação para as imputações graves feitas pelo arguido aos assistentes, uma vez se que não correspondem à verdade. Assim, há que concluir face à prova produzida que o arguido divulgou factos falsos (sendo certo que nada resultou provado no sentido da veracidade dos mesmos) e que objectiva e subjectivamente ofendem a honra e consideração dos assistentes pessoas singulares e o prestígio do assistente A..., enquanto pessoa colectiva.» * Apreciando. Erro de julgamento em sede de matéria de facto quantos aos factos provados 6, 7, 8, 9, 10, 12, 13, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23 e 24 Na análise deste segmento do recurso importa ter presente que resulta do texto do art. 412.º, n.º 3, do CPPenal que não é uma qualquer divergência que pode levar o Tribunal ad quem a decidir pela alteração do julgado em sede de matéria de facto. As provas que o recorrente invoque e a apreciação que sobre as mesmas faça recair, em confronto com a valoração realizada pelo Tribunal a quo, devem revelar que os factos foram incorrectamente julgados e que se impunha decisão diversa da recorrida em sede de elenco dos factos provados e não provados. Ou seja, não basta estar demonstrada a possibilidade de existir uma solução em termos de matéria de facto alternativa à fixada pelo Tribunal a quo, é necessário que essa versão seja a única admissível. E, na verdade, é raro o julgamento onde não estão em confronto duas, ou mais, versões dos factos (arguido/assistente ou arguido/Ministério Público ou mesmo arguido/arguido), qualquer delas sustentada, em abstracto, em prova produzida, seja com base em declarações dos arguidos, seja com fundamento em prova testemunhal, seja alicerçada em outros elementos probatórios. Por isso, haver prova produzida em sentido contrário, ou diverso, ao acolhido e considerado relevante pelo Tribunal a quo não só é vulgar como é insuficiente para, só por si, alterar a decisão em sede de matéria de facto. É necessário que os recorrentes demonstrem que a prova produzida no julgamento só poderia ter conduzido à solução por si pugnada, e não à consignada pelo Tribunal em sede de elenco de matéria de facto provada e não provada. E na análise da prova que apresentam na sua impugnação da matéria de facto têm os recorrentes de argumentar fazendo uso do mesmo raciocínio lógico e exame crítico que se impõe ao Tribunal na fundamentação das suas decisões, com respeito pelos princípios da imediação e da livre apreciação da prova. Esta ideia sobressai do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23-11-2017, onde se afirmou[3]: «I - Há uma dimensão inalienável consubstanciada no princípio da livre apreciação da prova consagrado no art. 127.º, do CPP. A partir de um raciocínio lógico feito com base na prova produzida afigura-se, de modo objectivável, ter por certo que o arguido praticou determinados factos. Exige-se não uma certeza absoluta mas apenas e só o grau de certeza que afaste a dúvida razoável, a dúvida suscitada por razões adequadas. O que há-de ser feito mediante uma «valoração racional e crítica de acordo com as regras comuns da lógica, da razão e das máximas da experiência comum». II - Percorrido este caminho na fundamentação, a impugnação dos factos há-de ser feita com a indicação das concretas provas que imponham decisão diversa da recorrida sob pena de tal impugnação redundar em mera discordância acerca da apreciação da prova desses mesmos factos, respeitável decerto, mas sem consequências de índole processual.» E esta posição está igualmente associada à ideia – que é preciso não perder de vista – de que o reexame da matéria de facto não de destina a realizar um segundo julgamento pelo Tribunal da Relação, mas tão-somente a corrigir erros de julgamento em que possa ter incorrido a 1.ª Instância. Neste sentido, que é pacífico, decidiu-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20-09-2017[4]: «I - O reexame da matéria de facto pelo tribunal de recurso não constitui, salvo os casos de renovação da prova, uma nova ou uma suplementar audiência, de e para produção e apreciação de prova, sendo antes uma actividade de fiscalização e de controlo da decisão proferida sobre a matéria de facto, rigorosamente delimitada pela lei aos pontos de facto que o recorrente entende erradamente julgados e ao reexame das provas que sustentam esse entendimento – art. 412.º, n.º 2, als. a) e b), do CPP. II - O recurso da matéria de facto não visa a prolação de uma segunda decisão de facto, antes e tão só a sindicação da já proferida.» Contextualizado, de forma sumária, o quadro legal e jurisprudencial em que assenta o reexame da matéria de facto pelos Tribunais da Relação, apreciemos a argumentação do recurso, mostrando-se relevante nessa análise perceber se foi dado, ou não, cumprimento ao formalismo de impugnação ampla da matéria de facto, tanto mais que tal deficiência foi invocada pelo Ministério Público e pelos assistentes nas respectivas respostas ao recurso. Para a perfectibilização do recurso com esta amplitude, formalmente, têm os recorrentes de cumprir o preceituado no art. 412.º, n.º s 3 e 4, do CPPenal, isto é: «3 - Quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) As concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; c) As provas que devem ser renovadas. 4 - Quando as provas tenham sido gravadas, as especificações previstas nas alíneas b) e c) do número anterior fazem-se por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 364.º, devendo o recorrente indicar concretamente as passagens em que se funda a impugnação.» Mais, devem explicitar relativamente a cada facto impugnado, fazendo uso do mesmo raciocínio lógico e exame crítico que se impõe ao Tribunal na fundamentação das suas decisões, com respeito pelos princípios da imediação e da livre apreciação da prova, os elementos de prova que impõem decisão diversa e qual o sentido dessa decisão. Ora, o que se observa da motivação do recurso é que o recorrente começa por impugnar genericamente todos os pontos de factos acima referidos, sem explicitar qual a redacção que lhes deve ser atribuída ou se devem ser dados como não provados. Depois, critica a apreciação que o Tribunal a quo realizou das declarações do arguido, considerando que não foram devidamente enquadradas, apresentando a sua própria leitura daquelas, transcrevendo os segmentos da gravação que considera importantes, sem referência à acta onde se mostram mencionadas as indicações da respectiva gravação. O mesmo se diga de segmentos das declarações dos assistentes BB e CC, tudo até ao art. 94.º da motivação, onde não vem identificada a acta[5] onde estarão mencionadas as referências relevantes quanto às gravações. Tudo o que é alegado até este art. 94.º, inclusive, é apresentado de forma genérica, sem especificação de qualquer ponto de facto impugnado em concreto[6], reflectindo apenas uma outra versão dos factos e da análise da prova. Este procedimento de modo algum dá cumprimento às enunciadas exigências de impugnação, falhando desde logo a particularização necessária entre cada facto impugnado e cada meio de prova, mas também o necessário sentido a dar a cada um dos pontos de facto impugnados, matéria que tem de ser clara e insusceptível de equívocos. Nesse sentido, é jurisprudência pacífica a que considera que «[a] censura dirigida à convicção do julgador «não pode assentar, de forma simplista, no ataque da fase final da formação de tal convicção, isto é, na valoração da prova; tal censura terá de assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade de formação da convicção. Doutra forma seria uma inversão da posição das personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar pela convicção dos que esperam a decisão» e que, por isso, «para que a impugnação de facto proceda, é necessário que as provas indicadas pelo recorrente imponham, quanto à matéria impugnada, uma decisão diversa da proferida, não bastando que permitam uma diferente leitura, consoante a pessoa que as analisa e valora.»[7] O que a argumentação do recorrente revela neste segmento do recurso (até ao art. 94.º, inclusive) é que o mesmo procurou, aqui e noutras situações adiante identificadas, como se verá, de forma genérica, substituir a convicção do Tribunal a quo pela sua subjectiva análise da prova, conferindo, desde logo, diferente credibilidade aos diversos meios de prova, desvalorizando em especial, e desvirtuando, as declarações dos assistentes, mas o mesmo não invocou ou salientou nesses casos qualquer verdadeiro erro de julgamento, qualquer argumento jurídico objectivado em passagens da prova produzida que pudessem levar o Tribunal de recurso a considerar, perante a análise dos vários elementos de prova invocados, ter ocorrido uma qualquer falha na formação da convicção do Tribunal a quo e que a solução por si [recorrente] proposta seria a única que se impunha em face da prova produzida relativamente aos pontos de factos especificamente tratados, o que não ocorreu. Assim, no caso do apontado segmento e nos adiante referidos, atentas as falhas indicadas na formulação da impugnação, e em concreto também por inexistir neste segmento qualquer outro vício de conhecimento oficioso, deve ter-se por definitivamente assente a matéria de facto fixada, devendo o recurso nesta parte ser rejeitado por se mostrar afastada a possibilidade de ser formulado convite ao aperfeiçoamento, conforme resulta do disposto no art. 417.º, n.º 4, do CPPenal. Neste sentido, recusando o dever de convite ao aperfeiçoamento no caso de deficiência da própria motivação, como ocorre no caso em apreço, vejam-se, entre muitos outros, os acórdãos da Relação de Coimbra de 09-01-2012, Proc. n.º 7/10.0GAAVR.C1[8], do Supremo Tribunal de Justiça de 19-05-2010, Proc. n.º 696/05.7TAVCD.S1 - 5.ª Secção[9], e do Tribunal Constitucional de 14-10-2014, onde se decidiu «Não julgar inconstitucional a norma do artigo 412.º, n.ºs 3 e 4, do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que a falta, na motivação e nas conclusões de recurso em que se impugne matéria de facto, da especificação nele exigida tem como efeito o não conhecimento desta matéria e a improcedência do recurso, sem que ao recorrente seja dada oportunidade de suprir tais deficiências», salientando-se no seu texto que «a questão de constitucionalidade suscitada nos presentes autos não se confunde com uma outra - essa sim já objeto de vários juízos positivos de inconstitucionalidade (cfr., entre outros, os acórdãos n.ºs 259/2002, 405/2004, 357/2006 e 485/2008, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt) – também incidente sobre o artigo 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPP, mas desta feita quando interpretado no sentido de que a falta, apenas nas conclusões da motivação do recurso– e não na motivação- das menções aí referidas determina a imediata rejeição do recurso, sem possibilidade de convite ao aperfeiçoamento.»[10] Impõe-se, assim, a rejeição deste segmento do recurso. Nos arts. 95.º a 97.º da motivação, o recorrente questiona o ponto 7 da matéria de facto provada, mas não invoca qualquer elemento probatório, inviabilizando qualquer possibilidade de infirmar a solução do Tribunal a quo, pelo que, pelas razões já supramencionadas, é igualmente de rejeitar esta parcela do recurso. Nos arts. 98.º a 104.º da motivação, o recorrente procura impugnar os pontos 8 e 9 da matéria de facto provada, recorrendo, para além «de tudo o que foi exposto e de tudo o que foi dito pelos assistentes em audiência de julgamento» a segmentos do depoimento da testemunha KK, que transcreveu, mais uma vez sem indicação da acta de julgamento onde se encontram identificadas as referências a que alude o art. 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPPenal. Como facilmente se percebe em face do que já foi anteriormente exposto, a menção a «de tudo o que foi exposto e de tudo o que foi dito pelos assistentes em audiência de julgamento» é irrelevante para a modificação pretendida, pois é uma remissão genérica e sem qualquer correspondência directa com os pontos de facto indicados. Por outro lado, ainda que se entendesse que os segmentos do depoimento da testemunha KK, apesar de incorrectamente identificados, podiam ser ponderados por este Tribunal ad quem, já que transcritos no recurso, sempre seria de julgar improcedente esta pretensão do recorrente, pois nada se retira das parcelas invocadas, por si só, que possa infirmar o consignado nos pontos 8 e 9 da matéria de facto provada, confrontando-nos, uma vez mais, com uma questão de diferente leitura da prova e diferente convicção e não com qualquer erro de julgamento. Por isso, também será de rejeitar esta parcela do recurso. Nos arts. 104.º a 106.º da motivação procura o recorrente questionar o ponto 10 da matéria de facto provada, mas à semelhança do que se verificou com os arts. 95.º a 97.º já mencionados, apenas remete genericamente para as “afirmações do arguido”, sem indicar qualquer elemento probatório nos termos do art. 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPPenal, inviabilizando qualquer possibilidade de infirmar a solução do Tribunal a quo, pelo que, pelas razões já supramencionadas, é igualmente de rejeitar esta parcela do recurso. Nos arts. 107.º e 108º. da motivação o recorrente pretende impugnar o ponto 11 da matéria de facto provada, apesar de não o identificar nas conclusões, mas limita-se a remeter para afirmações que terá feito no programa televisivo em causa, sem qualquer identificação das mesmas nos termos do art. 412.º, n.ºs 3 e 4, e desconsiderando que o Tribunal a quo já ponderou as declarações descritas no ponto 6 da matéria de facto provada, não acolhendo as explicações do arguido quanto ao seu significado. Também aqui se impõe a rejeição do recurso. Nos arts. 109.º a 113.º o recorrente procura impugnar o ponto 12 da matéria de facto provada, indicando para o efeito, pelo que se percebe, a sua síntese de afirmações produzidas no programa televisivo em causa pelo comentador GG, não ouvido em Tribunal, e pelo moderador, FF, testemunha de defesa, mencionando apenas referência temporal respeitante ao próprio programa, mas sem qualquer indicação do mesmo enquanto elemento de prova dos autos, a sua localização no processo e eventual audição em julgamento, quando e onde (acta de julgamento), incumprindo, pois, o disposto no art. 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPPenal. Mas, ainda que, em termos idênticos ao referido quanto aos arts. 98.º a 104.º da motivação, se entendesse que aqueles alegadas afirmações podiam ser ponderados por este Tribunal ad quem, sempre seria de julgar improcedente esta pretensão do recorrente, pois nada se retira das mesmas relativamente à conduta do arguido, sendo certo que o Tribunal a quo justificou, para além do mais, que teve em conta as notícias de fls. 14-15, publicadas às 11h53 e às 12h04 do dia do programa televisivo em causas, passado no período da noite, e nas quais se refere a substituição do árbitro DD em virtude da morte de um familiar. Mais uma vez, confrontamo-nos com uma questão de diferente leitura da prova e diferente convicção e não com qualquer erro de julgamento, impondo-se a rejeição do recurso nesta sede. Nos arts. 114.º a 123.º da motivação o recorrente procura impugnar os pontos 13, 15 (apesar de não o indicar nas conclusões) 16, 17 e 18 da matéria de facto provada, mas limita-se a negá-los, com comentários baseados numa realidade não provada e alusões genéricas sobre as declarações do arguido e dos assistentes, sem indicar qualquer elemento probatório nos termos do art. 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPPenal, inviabilizando qualquer possibilidade de infirmar a solução do Tribunal a quo, pelo que, pelas razões já supramencionadas, é igualmente de rejeitar esta parcela do recurso. Nos arts. 124.º a 126.º da motivação o recorrente retoma a fórmula do comentário à formação da convicção do Tribunal a quo, afirmando que este parece desconhecer vários factos históricos do futebol que envolvem o A..., procurando assim impugnar o ponto 19 da matéria de facto provada. Porém, para além da pouca elegância com que se referiu ao Tribunal a quo, o recorrente parece entrar em contradição com as suas próprias afirmações, reconhecendo que a testemunha KK, através de excerto que transcreveu, mais uma vez sem identificação da acta onde constam as menções relevantes para efeitos do disposto no art. 412.º, n.ºs 3 e 4 do CPPenal, deu a conhecer alguns episódios que se passaram há alguns anos, obrigando a segurança adicional para árbitros de todos os jogos da primeira liga, de equipas grandes, como o A..., E... e F.... Contudo, de acordo com a mesma transcrição, a testemunha também referiu que não tinha conhecimento de pressões sobre o Conselho de Arbitragem, seja por pessoas ligadas à estrutura do A..., seja por pessoas não ligadas a essa estrutura, mas indirectamente ligadas ao A.... Assim, para além da deficiente alegação formal, deparamo-nos de novo com uma questão de diferente leitura da prova e diferente convicção e não com qualquer erro de julgamento, impondo-se, igualmente, a rejeição do recurso nesta sede. Nos arts. 127.º e 128.º da motivação o recorrente procura impugnar o ponto 20 da matéria de facto provada, mas limita-se a negá-lo, com comentários baseados numa realidade não provada e alusões genéricas sobre as declarações do arguido e dos assistentes, sem indicar qualquer elemento probatório nos termos do art. 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPPenal, inviabilizando qualquer possibilidade de infirmar a solução do Tribunal a quo, pelo que, pelas razões já supramencionadas, é igualmente de rejeitar esta parcela do recurso. Nos arts. 129.º a 136.º da motivação o recorrente coloca em causa os pontos de facto provados 21 e 22 a 24, mas a única prova que invoca em seu apoio é uma parcela das declarações do assistente BB, mais uma vez sem identificação da acta onde constam as menções relevantes para efeitos do disposto no art. 412.º, n.ºs 3 e 4 do CPPenal, respeitante a um comentário que o mesmo terá feito ao filho sobre o árbitro DD. Porém, para além da deficiente alegação formal, deparamo-nos de novo com uma questão de diferente leitura da prova e diferente convicção e não com qualquer erro de julgamento, impondo-se, igualmente, a rejeição do recurso nesta sede. Nos arts. 137.º a 152.º da motivação o recorrente procura demonstrar a ausência de prova em julgamento para sustentar o pedido de indemnização e os elementos objectivos e subjectivos dos crimes por que foi condenado. Comenta excertos de declarações dos assistentes BB e CC, mais uma vez sem identificação da acta onde constam as menções relevantes para efeitos do disposto no art. 412.º, n.ºs 3 e 4 do CPPenal, e não identifica qualquer ponto de facto provado que especificamente pretende atingir. Em face do que já ficou repetidamente exposto, também aqui é de rejeitar esta parcela do recurso. Em suma, quanto à impugnação ampla da matéria de facto, pelas razões expostas quanto aos vários artigos da motivação, por padecer de deficiente formulação face ao disposto no art. 412.º, n.ºs 3 e 4, do CPPenal e apenas procurar apresentar uma diferente leitura da prova, pondo em causa a convicção do Tribunal a quo, sem apresentar verdadeiros erros de julgamento, mostra-se a mesmo votada à sua total rejeição. E mesmo olvidando as deficiências detectadas e mencionadas, sempre se dirá que as alegações do recorrente, a serem validadas na sua substância, apenas representariam uma diferente e possível versão dos acontecimentos, mas nunca poderiam impor uma decisão diversa em sede de matéria de facto, pois face às regras de experiência comum é válido o raciocínio levado a cabo pelo Tribunal a quo. Por outro lado, como já se referiu, este tribunal de recurso também não observa no texto da sentença recorrida qualquer deficiência de ordem lógica que pudesse enquadrar um dos vícios a que se reporta o art. 410.º, n.º 2, do CPPenal, designadamente erro notório na apreciação da prova, mostrando-se a argumentação do Tribunal a quo organizada de forma lógica e coerente com as regras da experiência comum, pelo que deve ter-se por inalterada a matéria de facto provada e não provada. * Erro de julgamento em sede de direito - qualificação jurídica Considera ainda o recorrente que «[n]ão existe qualquer fundamento legal para que se considerem preenchidos os tipos legais dos crimes de difamação e ofensa a entidade, quando tal não resultou da prova produzida e das afirmações do Arguido, e que levaram à sua condenação pelo Tribunal a quo» (art. 178.º da motivação). Ora, como resulta bem patente da antecedente afirmação, a diferente qualificação jurídica dos factos por que pugna o recorrente, com a sua absolvição dos crimes de difamação agravado e do crime de ofensa a pessoa coletiva agravado, p. e p. pelos arts. 180.º n.º 1, 183.º n.º 2 e 187.º n.ºs 1 e 2, do Código Penal, e bem assim do pedido de indemnização civil deduzido, tem por fundamento, não os factos efectivamente dados como provados na sentença, mas antes a prova produzida e as afirmações do Arguido. Esta ideia encabeça este segmento do recurso, através da afirmação constante do art. 154.º da motivação de que «[f]ace a todos os factos expostos e à prova efetivamente produzida em Audiência de Julgamento, cumpre-nos verificar se à luz do Código Penal, da jurisprudência e da doutrina aqueles factos preenchem os elementos objetivos e subjetivos dos crimes em que o Tribunal a quo condenou o Arguido.» Significa isto que a análise de direito que o recorrente realiza pressupõe uma alteração da matéria de facto que não ocorreu. Assim, não se tendo verificado o pressuposto de que o recorrente fez depender a alteração da qualificação jurídica, mostra-se prejudicada a apreciação deste segmento do recurso, que tem inevitavelmente de improceder. * III. Decisão: Face ao exposto, acordam os Juízes desta 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em negar total provimento ao recurso interposto pelo arguido AA, rejeitando-se o mesmo quanto à impugnação ampla da matéria de facto, e em confirmar a sentença recorrida. Custas pelo recorrente, fixando-se em 4 UC a taxa de justiça devida (arts. 513.º, n.ºs 1 e 3, do CPPenal e 8.º, n.º 9, do RCP e Tabela III anexa). Notifique. Porto, 22 de Maio de 2024 (Texto elaborado e integralmente revisto pela relatora, sendo as assinaturas autógrafas substituídas pelas electrónicas apostas no topo esquerdo da primeira página) Maria Joana Grácio Paula Cristina Guerreiro Maria do Rosário Martins___________________________ [1] A numeração dos artigos das conclusões não é autónoma, antes sequencial à dos da motivação. [2] É o que resulta do disposto nos arts. 412.º e 417.º do CPPenal. Neste sentido, entre muitos outros, acórdãos do STJ de 29-01-2015, Proc. n.º 91/14.7YFLSB.S1 - 5.ª Secção, e de 30-06-2016, Proc. n.º 370/13.0PEVFX.L1.S1 - 5.ª Secção. [3] Proc. n.º 146/14.8GTCSC.S1 - 5.ª Secção, acessível in www.stj.pt (Jurisprudência/Acórdãos/Sumários de Acórdãos). [4] Proc. n.º 772/10.4PCLRS.L1.S1 – 3.ª Secção, acessível in www.stj.pt (Jurisprudência/Acórdãos/Sumários de Acórdãos). [5] Decidiu-se no acórdão do TRC de 25-01-2017, relatado por Orlando Gonçalves no âmbito do Proc. n.º 802/14.0GCVIS.C1, acessível in www.dgsi.pt, que: «Na impugnação da matéria de facto o recorrente deverá indicar a sessão de julgamento em que as declarações ou depoimentos constam e localizar a passagem em causa na gravação, entre os minutos em que produziu prova oralmente, de modo a deixar claro qual a parte da declaração ou depoimento que se quer que o Tribunal de recurso ouça ou aprecie.» [6] No acórdão do TRP de 02-12-2015, relatado por Artur Oliveira, no âmbito do Proc. n.º 253/06.0GCSTS.P1, acessível in www.dgsi.pt, perfilhou-se o entendimento, estabilizado, de que «[v]isando o recurso sobre a matéria de facto remediar erros de julgamento, estes erros devem ser indicados ponto por ponto e com a menção das provas que demonstram esses erros, sob pena de não o fazendo a impugnação não ser processualmente válida». [7] Cf. acórdão do TRL de 10-07-2018, relatado por José Adriano no âmbito do Proc. n.º 485/16.3GDTVD.L1-5, acessível in www.dgsi.pt. [8] Acessível in www.dgsi.pt, aí se concluindo que «Se o recorrente não faz, nem nas conclusões, nem no texto da motivação, as especificações ordenadas pelos números 3 e 4, do artigo 412.º do C. Proc. Penal, não há lugar ao convite à correcção das conclusões, nos termos do n.º 3, do art.º 417º, do mesmo Código, uma vez que o conteúdo do texto da motivação constitui um limite absoluto que não pode ser extravasado através do referido convite.» [9] Acessível in www.stj.pt (Jurisprudência/Acórdãos/Sumários de Acórdãos), aí se perfilhando o entendimento de que «VIII - O convite ao aperfeiçoamento pressupõe que não se esteja perante uma deficiência substancial da própria motivação, que necessariamente se reflectirá em deficiência substancial das conclusões. IX - Não se estando perante deficiências relativas apenas à formulação das conclusões mas perante deficiências substanciais da própria motivação, o princípio constitucional do direito ao recurso em matéria penal não implica que ao recorrente seja facultada oportunidade para aperfeiçoar em termos substanciais a motivação do recurso quanto à matéria de facto.» [10] Também o acórdão do Tribunal Constitucional n.º 685/2020, de 26-11, proferiu decisão em que julgou «inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, a norma constante dos n.ºs 3 e 4 do artigo 412.º do Código de Processo Penal segundo a qual a falta de indicação, nas conclusões da motivação do recurso em que o arguido impugne a decisão sobre a matéria de facto, das menções contidas nas alíneas a), b) e c) daquele n.º 3, pela forma prevista no referido n.º 4, tem como efeito o não conhecimento da impugnação daquela matéria e a improcedência do recurso nessa parte, sem que ao recorrente seja dada a oportunidade de suprir tal deficiência».

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