Apura logo

Acórdão TCA Sul de 2011-12-07

05030/09

TribunalTribunal Central Administrativo Sul
Processo05030/09
SecçãoCA - 2.º JUÍZO
Data do Acordão2011-12-07
RelatorAntónio Vasconcelos
DescritoresSuspensão de Eficácia Decretada ao Abrigo da Alínea A) do Nº 1 do Artigo 120º do CPTA, Parecer da Alínea D) do Nº 1 do Artigo 44º do Cpa, Ofensa do Principio da Presunção de Inocência, Preterição da Audiência Prévia de Interessado, Vicio de Falta de Fundamentação

Sumário

I – o critério de decisão das providências cautelares previsto na al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA pressupõe que a procedência da acção principal resulte evidente, ”explícita e inequívoca”, não bastando que seja viável ou possível. II - A intervenção do Inspector-Geral Diplomático e Consular e do Secretário-Geral do MNE, anterior à reunião do Conselho Diplomático, tomando posição sobre o sentido da decisão a tomar, embora não possa ser qualificada como uma actuação de mero expediente, no mínimo também não pode qualificar-se, de forma indubitável ou inquestionável, como “parecer” para integrar o impedimento a que se refere a citada al. d) do nº 1 do art.44º do CPA, pois, só a emissão de um “parecer” propriamente dito sobre a questão material em apreço, entendido nos termos do artigo 98º do CPA, teria a virtualidade de determinar o impedimento, previsto naquela disposição, daqueles dois membros do Conselho Diplomático, exigindo, por parte do tribunal, uma indagação de direito com vista ao assentimento da convicção a formular no processo principal, o que, in limine, afasta o critério de decisão previsto na al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA. III - Mesmo no domínio dos actos discricionários o tribunal pode negar relevância anulatória ao incumprimento do art. 100º do CPA quando, pelo conteúdo do acto e pela incidência da sindicação que foi chamado a fazer, possa afirmar com inteira segurança que o cumprimento de tal formalidade em nada modificaria o conteúdo do acto. IV - Considerando que da acta do Conselho Diplomático resulta que a proposta de encurtamento do prazo de permanência da ora Recorrida na EPB aderiu aos resultados do inquérito expressos no respectivo relatório final, quer quanto à factualidade indiciada (expressamente vertida na exposição do Embaixador), quer quanto à fundamentação jurídica aí referida (expressa parcialmente na acta), impõe-se concluir que as propostas do Conselho Diplomático submetidas à decisão do Ministro dos Negócios Estrangeiros contêm uma fundamentação de facto e de direito que, numa apreciação sumária do vício em apreço, não autoriza a conclusão de evidente verificação do mesmo . V - Num juízo sumário em que deve mover-se a apreciação cautelar, o julgador não podia dar por adquirido, sem outras indagações pelo menos de direito, que o princípio da presunção de inocência vigora e é ostensivamente violado no procedimento que levou à aplicação da medida prevista no nº 3 do art. 47º do ECD, de encurtamento do prazo de permanência no posto (com inerente cessação de funções no posto e necessária subsequente colocação em outro lugar), quando essa medida não é uma qualquer das sanções disciplinares taxativamente previstas no Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos e quando há um procedimento disciplinar autónomo a correr termos.


Texto Integral

Acordam, em Conferência , na Secção de Contencioso Administrativo, 2º Juízo , do Tribunal Central Administrativo Sul: O MINISTÉRIO DOS NEGÓCIOS ESTRANGEIROS inconformado com a sentença do TAC de Lisboa, de 12 de Dezembro de 2008, que julgou procedente, ao abrigo da al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA, a providência cautelar instaurada por A..., suspendendo a eficácia do despacho do Ministro dos Negócios Estrangeiros que a exonerara das funções que exercia na Embaixada de Portugal em Budapeste e a transferira para os serviços internos daquele Ministério, mantendo, no entanto, «a eficácia do mesmo acto na vertente do ”afastamento” temporário» da mesma do exercício de funções na referida Embaixada, dela recorreu e, em sede de alegações formulou as seguintes conclusões por nós sintetizadas: 1- A decisão recorrida incorre em erro de direito, ofendendo os arts 18º, nº 1 e 44º, nºs 1, al. d) e 2 do CPA, ao considerar o Inspector-Geral Diplomático e Consular e o Secretário-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros impedidos de apreciarem e deliberarem sobre a questão vertente na reunião do Conselho Diplomático, por os actos por eles emitidos não poderem ser qualificados como pareceres mas apenas como actos de mero expediente; 2- A decisão recorrida incorre em erro de direito por, no procedimento de encurtamento do prazo de permanência em posto estabelecido no art. 47º do ECD, ter considerado exigível a realização da fase de audiência prévia dos interessados e, mesmo a não ser assim, não ter considerado essa formalidade “não invalidante da decisão suspendenda, atenta a respectiva inutilidade para a prática da decisão final”; 3- A decisão recorrida incorre em erro de direito por o acto suspendendo estar fundamentado nos termos exigidos pelo art. 47º do ECD, o que resulta claro do requerimento cautelar apresentado pela recorrida que revela ter sido compreendido o iter cognoscitivo e valorativo que conduziu à decisão suspendenda; 4- A decisão recorrida incorre também em erro de direito por, não tendo o encurtamento do prazo de permanência em posto uma estrutura acusatória, não lhe ser aplicável o princípio da presunção de inocência, que, por isso, não foi violado no caso concreto; 5- O Tribunal a quo ainda decidiu mal ao considerar o despacho suspendendo como um acto de exoneração, sendo que em causa está apenas uma decisão de encurtamento do prazo de permanência da recorrida na Embaixada de Budapeste, o que resulta do procedimento que o antecedeu, incluindo a deliberação do Conselho Diplomático, e da própria decisão suspendenda; 6- A decisão recorrida, ao considerar preenchidos os pressupostos da al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA, violou esta disposição, por o despacho suspendendo ser válido ou, pelo menos, por não ser evidente a sua invalidade. . * A Recorrida, A..., contra alegou, pugnando pela manutenção do decidido. * O Exmo Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido de que só se verifica a manifesta ilegalidade do acto suspendendo quanto à omissão de audiência prévia do interessado, devendo manter-se a sentença recorrida apenas com este fundamento. * Na pendência do presente recurso a ora Recorrida instaurou, no TAC de Lisboa, processo de execução da sentença de suspensão, com vista a retomar as funções na Embaixada de Portugal em Budapeste, vindo nesses autos a ser proferida sentença de extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, tendo a exequente interposto recurso jurisdicional dessa decisão para este Tribunal Central. * Notificado o Recorrente para esclarecer se ainda mantinha interesse na prossecução do presente recurso, o mesmo veio informar manter interesse na lide por ainda estar pendente o recurso jurisdicional no referido processo de execução. * Sem vistos foi o processo submetido à conferência para julgamento. * O Mmo Juiz a quo considerou a factualidade que a seguir se transcreve, acrescida, por razões de maior clareza, da transcrição de alguns excertos dos documentos que na sentença recorrida foram simplesmente dados por reproduzidos: 1- A Requerente integra a carreira diplomática do Quadro I do MNE; 2- Detém a categoria de primeira-secretária de embaixada; 3- Foi colocada na Embaixada de Portugal em Budapeste em 20 de Setembro de 2006; 4- O Embaixador de Portugal em Budapeste dirigiu ao Secretário-Geral do MNE a exposição constante do ofício, “secreto”, nº 016/39, de 28 de Outubro de 2007, que aqui se dá por integralmente transcrito e de onde se destaca, designadamente: “Trata-se de uma funcionária que, sem embargo de possuir algumas qualidades, é conflituosa, agressiva, mal educada, desrespeitadora, insubordinada, incumpridora, insolente e rebelde. Incompatibilizou-se com toda a gente, sem excepção, quer com pessoal de nacionalidade portuguesa, quer com o de nacionalidade húngara (o que pode ser atestado), gerando uma tensão e instabilidade permanentes na missão que muito nos prejudica (…). No meu entender, não dispõe dos requisitos mínimos de inteligência emocional para continuar nas actuais funções. Passo a citar alguns exemplos recentes do que afirmo (…), aliás registados nos últimos dias: . Ao pedir-lhe para comparecer numa reunião, em minha representação, por avaria do carro oficial, perguntou-me, de modo desabrido, se não havia táxis na cidade (!). . Quando a interpelei, posteriormente, sobre o assunto, no meu gabinete, chamando-lhe a atenção para a impertinência do que me havia dito, contestou-me, alteando de imediato a voz e, ao ver-me obrigado a retorquir-lhe no mesmo tom, saiu desabridamente, batendo com a porta. . Ao ser-lhe pedido que acompanhasse S. Exª o S.E. Adjunto da Defesa nacional e dos Assuntos do Mar, Dr. B..., ao aeroporto, uma vez que tinha, na altura, um almoço de CdM’s da U.E. com a Ministra dos negócios Estrangeiros, na residência, exigiu o carro oficial (pelas razões atrás expostas, como se sabe, avariado) ou o motorista, comentando para o pessoal da Missão que o chofer não seria necessário uma vez que ficaria na residência durante o almoço (é obvio que, com o pouco pessoal de que disponho, aquele é-me indispensável para prestar assistência a eventos sociais e compete-me a mim e a mais ninguém, enquanto chefe de missão, administrar o pessoal que se encontra ao meu serviço). Sublinho que o Sr. S.E. dispunha de transporte providenciado pela organização da conferência em que veio participar. . foi admoestada, mais de uma vez, para os seus excessos comportamentais e de uma delas adverti-a de que, se quisesse, podia queixar-se a quem de direito, informando-a, entretanto, de que eu próprio já o havia feito. Retorquiu-me, acto contínuo: “ Se o fez a queixa não foi eficaz, porque eu aqui continuo”! saindo porta fora. . Trabalha de uma forma extremamente lenta e não possui capacidade de resposta em tempo real, registando-se muitas dilações no serviço, sobretudo, em matérias que requerem atenção e reacção imediatas. . Não dispõe de qualidades de chefia. As tensões a nível da chancelaria com o pessoal que lá trabalha são constantes, gerando-se um ambiente dificilmente controlável e que só devido à minha intervenção permanente e ao bom senso dos funcionários não entra em ruptura. . A minha secretária húngara comentava-me há dias, a propósito do comportamento da supracitada: “Sr. Embaixador, isto já não se trata de impertinência, é pura e simples provocação!”. . O mais grave é que, sem qualquer razão aparente, desfeiteia permanentemente, a minha mulher, que é a embaixatriz de Portugal na Hungria, não lhe falando em público ou procurando, ostensivamente, evitá-la. Saliento que nunca por nunca ser, houve a menor troca de palavras menos cordial entre ambas, tratando-se, pois, de uma atitude incompreensível. Minha mulher não lhe chamou a atenção sobre a sua atitude porque a Drª A...é de tal forma mal educada que, não tenho dúvidas, começaria em seguida a altercar e a gritar com ela, independentemente onde se encontrasse. Sucede que minha mulher é uma senhora de 60 anos e o que menos deseja são confrontos verbais, por conseguinte limita-se a ignorá-la. Estamos, pois, perante uma situação intolerável que coloca a minha mulher e eu próprio directamente em cheque, perante os colegas, as autoridades locais e o meu pessoal. (…) Para bem do serviço público e do cabal cumprimento da minha missão na Hungria, esta situação não pode obviamente perdurar. . À luz do que antecede, rogo, pois, a Exª seja considerada a saída Drª A...(…) desta missão, com a possível brevidade – cf. doc. nº 1; 5- Perante tal comunicação e em face do seu teor, o Secretário-Geral do MNE emitiu, em 5-11-2007, o seguinte despacho: “À IGDC (Inspecção-Geral Diplomática e Consular) para os devidos efeitos” citado doc. 1; 6- Por despacho do Inspector-Geral Diplomático e Consular, de 7-11-2007, foi determinada a instauração de um processo de inquérito, visando averiguar a matéria relativa à Requerente, participada, na exposição referida em 3, pelo Embaixador de Portugal em Budapeste; 7- Encerrada a investigação, o Instrutor nomeado produziu um relatório de fls 29 a 31, datado de 3 de Março de 2008, que se dá aqui por integralmente transcrito e de que se destaca o seguinte: «I- Nota Introdutória 1. Este Processo de inquérito foi determinado por despacho, de 07.11.07, de Sª Exª o Inspector-Geral Diplomático e Consular, com base nos factos transmitidos 016/39, proc. 53, de 28-10-07, da Embaixada de Portugal em Budapeste, posteriormente comunicados «para os devidos efeitos», à IGDC pela Nota GSG (…) 2. De acordo com o teor daquele ofício, a 1ª Secretária de embaixada, Drª A...(…), colocada na referida Missão Diplomática, teria assumido comportamentos que o respectivo Embaixador considera inadmissíveis. II- Apreciação 1. Em cumprimento do despacho exarado, o signatário deslocou-se à Embaixada de Budapeste de 20 a 23.02.28, a fim de apurar os factos, clarificar a situação e proceder à inquirição da funcionária visada no ofício nº 016/39, de (…) 2. Destas declarações retiram-se diversos esclarecimentos complementares relacionados com o caso que reforçam o que já era do dos autos e foi reportado, em parte pelo ofício nº 016/39, proc. 53. 3. Analisados os factos em concreto a partir dos dados recolhidos afigura-se que é produzida prova bastante e consistente para caracterizar ilícitos disciplinares … 4. Com efeito detectaram-se elementos conclusivos da prática de infracção de modo a qualificar-se o comportamento como violação de deveres próprios da função (…) 5. Independentemente da possível aplicação de medidas de índole disciplinar, sempre algo morosas e burocráticas, cremos que deverá ser ponderada a implementação, desde já, de providências na área da mobilidade funcional, sobretudo recorrendo aos mecanismos dos artigos 8º, nº 2, alíneas i) e l) e 47º, nº 3 do estatuto da Carreira Diplomática, com observância do artigo 23º, nºs 1 e 2 deste Estatuto, e do despacho Normativo nº 14/2006, de 30 de Janeiro (DR, I Série, nº 45, de 03.03.06). (…) 6. O normal e cabal cumprimento das atribuições da Embaixada de Portugal em Budapeste, no quadro da representação externa do Estado Português, com tudo o que esta actuação implica, não se compadece com situações/ocorrências anómalas, algumas públicas perante terceiros, incluindo Missões Diplomáticas e Entidades de Estados estrangeiros, passíveis de afectar a imagem e a reputação, em geral, do país. 7. Factos como os descritos pela generalidade das pessoas inquiridas são elucidativos das consequências negativas dos comportamentos da funcionária inaceitáveis no contexto em que se verificam, pese embora a documentação apresentada (…), demonstrativa do seu trabalho e empenho, que não estão em causa, mas que extravasa do âmbito do presente processo de inquérito. 8.Urge preservar, com recurso aos dispositivos legais aplicáveis, o “ambiente” que rege o relacionamento pessoal e funcional no seio da Embaixada, bem como o exercício das competências inerentes que não podem ser perturbados por manifestações comportamentais menos próprias, ou seja, que se revelam contraproducentes e que poderão classificar-se, em primeira linha, como descabidas numa perspectiva tida por curial e ajustada do que deverá ser a condição diplomática, quer no interior quer no exterior da Embaixada. 9. (…) 10. A generalidade dos testemunhos prestados dão nota de factos fora do comum, desde interpelações atentatórias a dignidade pessoal, usando terminologia inapropriada, em relação a funcionários administrativos ou outros serviços da Embaixada, até comportamentos incorrectos no Gabinete de S. Exª o Embaixador (Ex: gritos e tom de voz muito alto audíveis no exterior, para além de adulterar e contrariar orientações de serviço do Chefe de Missão, não esquecendo atitudes entendidas como ofensivas para com a Sª Embaixatriz (Ex: em eventos sociais ou quando a Sª Embaixatriz se desloca à Embaixada ignora-a e não a cumprimenta), é assacada, com maior ou menor gravidade e amplitude, numa ou noutra ocasião, à funcionária a responsabilidade por uma gama alargada de irregularidades na forma e no conteúdo. 11. (…) Pelo exposto, nos termos do artigo 87º, nº 3 do Estatuto Disciplinar, propõe-se, por se ter constado a existência de infracções disciplinares, a instauração da competente acção à Drª A......, 1ª Secretária de embaixada, sem prejuízo da adopção de medidas de cariz profissional à luz do Estatuto da Carreira Diplomática» – cf. doc. nº 2; 8- Sobre esse relatório, o Inspector-Geral Diplomático e Consular emitiu, em 3 de Março de 2008, o seguinte despacho: “1. Concordo haver matéria suficiente para abertura de um processo disciplinar, devendo este processo de inquérito ser considerado como fase instrutória daquele. 2. Simultaneamente parece-me bem fundada a sugestão de pedir ao Conselho Diplomático que analise a possibilidade de propor a S. Exª. o Ministro a abreviação do prazo de permanência no Posto face ao péssimo clima de trabalho que a situação está a criar na Embaixada e às possíveis consequências negativas na imagem do país. A S. Exª” o Secretário-Geral” – cf. doc. nº 3; 9- Em 5-03-2008, o Secretário-Geral proferiu o seguinte despacho: “Concordo. Instaure-se o processo disciplinar” – cf. citado doc. 3; 10- Esta decisão, bem como o início da “instrução” do correspondente procedimento disciplinar, chegaram ao conhecimento da Requerente em 1-04-2008, por ofício da IGDC de 25 de Março, remetido à EPB por mala diplomática – cf. doc. nº 4; 11- Desde então e até à data da apresentação desta providência em Tribunal nada mais foi notificado à Requerente no âmbito do citado procedimento disciplinar; 12- Em 17-04-2008, a Requerente tomou conhecimento da Circular GSG nº 12, de 15-04-2008, referente à “Lista provisória de colocações e transferências - Movimento diplomático ordinário de 2008”, que lhe foi remetida pelo Gabinete do Secretário-Geral do MNE, informando-a do seu “regresso à Secretaria de Estado” – cf. doc. 5; 13- Perante tal comunicação e a coberto de requerimento de 22-04-2008, a Requerente solicitou ao Secretário-Geral do MNE a passagem de certidão do acto que determinou o seu “regresso à Secretaria de Estado”, em ordem a conhecer o seu autor, data, teor integral e fundamentos de facto e de direito – cf. doc. 6; 14- Em resposta, remetida por ofício de 23-05-2008, o Secretário-Geral do MNE informou “…ter sido já corrigida e divulgada a nova proposta provisória relativa ao movimento diplomático ordinário de 2008, onde já não consta o nome da Drª A......, o qual, por lapso, havia sido, nesse âmbito, inicialmente incluído” – cf. doc. 7; 15- Em face de tal resposta, a Requerente, por requerimento de 20-06-2008, solicitou ao Presidente do Conselho Diplomático (CD): a) informação sobre “…se, na sequência dos despachos do Senhor Inspector-Geral Diplomático e Consular de 3/3/2008, e do Senhor Secretário-Geral do MNE, de 05/03/2008, a proposta de abreviação do prazo de permanência da Requerente na EPB foi ou não objecto de apreciação, discussão e deliberação em alguma reunião do Conselho Diplomático”, e, no caso afirmativo, b) “…a passagem e remessa à Requerente de certidão ou cópia autenticada da acta relativa à reunião ou reuniões em causa, na parte respeitante à matéria assinalada” – cf. doc. 8; 16- Em resposta e por ofício de 17-07-2008, o Secretário-Geral do MNE remeteu a certidão requerida respeitante à reunião do CD realizada a 15 de Abril desse mesmo ano – cf. doc. 9; 17- Da acta em apreço consta, entre o mais, que: «Seguidamente, o SG informou desejar submeter ao Conselho as questões relacionadas com a Secretária de Embaixada A..., actualmente colocada na Embaixada em Budapeste. O SG começou por recordar que a funcionária assumiu funções naquela Missão em 20 de Setembro de 2006. Assim, por aplicação conjugada do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 47º do ECD e do despacho conjunto dos Ministros de Estado e dos Negócios Estrangeiros e de Estado e das Finanças nº 534/2005, de 3 de Agosto de 2005, o tempo mínimo de permanência em posto seria de 3 anos, pelo que, a possibilidade de transferência da funcionária só iria ser considerada em 2009. Acontece, porém, que foi aberto um processo de inquérito ao comportamento da funcionária ao referido posto, em cujo relatório final o instrutor sustentou que “(…) analisados os factos em concreto a partir dos dados recolhidos, afigura-se que é produzida bastante e consistente para caracterizar ilícitos disciplinares (…)”. Esse Relatório mereceu (…) despacho do Inspector-Geral Diplomático e Consular, de 3 de Março de 2008: (…) O Secretário-Geral concordou com a proposta mandando instaurar, em conformidade, um processo disciplinar, que continua a correr os seus termos. Neste quadro, o Secretário-Geral entendeu curial submeter à consideração do Conselho a conveniência de propor, a Sua Excelência o Ministro, o encurtamento do prazo de permanência da funcionária em posto, ao abrigo do disposto no nº 3 do artigo 47º do ECD, ficando entendido que, se a proposta merecer a concordância ministerial, ficaria, desde já, deliberada a transferência da funcionária para os serviços internos. O Conselho debateu demoradamente a questão e entendeu que, dado o clima de alguma tensão que a situação provocou e em nome do interesse público no correcto funcionamento do posto, seria preferível que a Secretária de Embaixada (…) não permanecesse colocada na Embaixada em Budapeste. Concomitantemente, considerou que, para facilitar a instrução do processo disciplinar e reforçar as garantias de defesa da arguida, seria benéfica a sua transferência para os serviços internos, com a brevidade possível. Em conformidade, foi decidido, por unanimidade, propor a Sua Excelência o Ministro, nos termos do estatuído no nº 3 do artigo 47º do ECD, que seja encurtado o prazo de permanência da Secretária de Embaixada A...Castro ... na Embaixada em Budapeste para o período de tempo correspondente à possibilidade material de concretização da sua transferência para os serviços internos. Deliberou, também, propor que, se a proposta anterior merecer a concordância ministerial, seja proposta a Sua excelência o Ministro a sua transferência para os serviços internos da Secretária de Embaixada A...” - citado doc. 9; 18- Na sequência de tal proposta de decisão, foi publicado no Diário da Republica, 2ª Série, nº 154, de 11-08-2008, o despacho (extracto) do Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros nº 20882/2008 do seguinte teor: “A...... – primeira secretária de embaixada do Quadro I do Ministério dos Negócios Estrangeiros – Pessoal Diplomático, colocada na Embaixada de Portugal em Budapeste – despacho ministerial exonerando-a das referidas funções e transferindo-a para os serviços internos do Ministério dos Negócios Estrangeiros“ – cf. doc. 10; 19- De tal despacho foi dado conhecimento à EPB, por telegrama do MNE, de 12-08-2008 – cf. doc. 11; 20- Por requerimento de 22-08-2008, a Requerente solicitou ao Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros a «…passagem de certidão de teor integral do despacho ministerial que “determinou a exoneração das suas funções na referida Embaixada e a sua transferência para os serviços internos do Ministério dos Negócios Estrangeiros» – cf. doc. 12; 21- Essa pretensão não foi satisfeita até à data da instauração deste processo. * Tudo visto cumpre decidir. Veio o presente recurso jurisdicional interposto da sentença do TAC de Lisboa que , ao abrigo da al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA, decretou a providência cautelar de suspensão da eficácia do despacho do Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros que, dado o encurtamento do prazo de permanência da ora Recorrida na Embaixada de Portugal em Budapeste, “exonerou” a mesma das funções que aí exercia e transferiu-a para os serviços internos do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Entende o Recorrente que, no caso, não se preenchem os requisitos estabelecidos naquela disposição legal, por não se verificar qualquer dos vícios imputados ao acto suspendendo que a sentença considerou demonstrados ou, pelo menos, não ser manifesta a sua verificação. Antecipemos então algumas considerações sobre a al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA, exclusivamente ao abrigo da qual foi requerida e decretada a presente providência cautelar. Esta disposição estabelece que,” Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as providências cautelares são adoptadas: a) Quando seja evidente a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal, designadamente por estar em causa a impugnação de acto manifestamente ilegal, de acto de aplicação de norma já anteriormente anulada ou de acto idêntico a outro já anteriormente anulado ou declarado nulo ou inexistente”. A norma em causa exige que, para o deferimento da pretensão, a procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal seja uma evidência. Como vem sendo repetidamente afirmado na doutrina e jurisprudência, essa evidência tem de ser entendida no sentido de que a procedência da pretensão principal se apresenta “de tal forma notória, patente”, que não necessita de qualquer indagação, quer de facto quer de direito, por parte do tribunal, com vista ao assentimento da convicção a formular, a qual deve ser dada de imediato pela mera alegação da manifesta ilegalidade do acto. Daqui resulta que não compete ao julgador cautelar apurar em profundidade se os vícios imputados ao acto administrativo se verificam ou não, cabendo-lhe apenas apreciar se os mesmos são ostensivos, evidentes, “sob pena de o processo cautelar se transmutar no processo principal”. E, conforme se pode ler nomeadamente no Ac. do STA de 23-09-04, proc. nº 893/04, a evidente procedência da pretensão formulada com fundamento na manifesta ilegalidade do acto suspendendo não ocorre, desde logo, quando “a questão jurídica fundamental subjacente ao acto se apresenta controversa”. Por conseguinte, o critério de decisão das providências cautelares previsto na al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA, pressupõe que a procedência da acção principal resulte evidente, ”explícita e inequívoca”, não bastando que seja viável ou possível. Vejamos então se é evidente a procedência da acção principal. A sentença considerou verificados, com manifesta evidência, os seguintes vícios: - violação de lei, consubstanciados: por um lado, na violação do princípio da imparcialidade, por dois dos membros do CD que votaram, na reunião de 15-04-2008, a proposta de submeter a despacho ministerial o encurtamento do prazo de permanência da ora Recorrida na Embaixada de Portugal em Budapeste (doravante EPB) e a proposta de a transferir para os serviços internos, estarem impedidos de o fazer em conformidade com o disposto nos arts 44º, nº 1, al. d) e 24º nº 3 do CPA, por terem sido os Autores dessas propostas; e, por outro, por “erro sobre os pressupostos de facto, com ofensa do princípio da presunção de inocência”; - vícios de forma, por preterição de audiência prévia da interessada e por falta de fundamentação do despacho cuja suspensão foi requerida. * Analisemos desde logo o decidido na sentença sobre o alegado vício de violação de lei, por violação do princípio da imparcialidade A propósito a sentença recorrida considerou designadamente que: Antes da reunião do CD de 15-04-2008, o Secretário-Geral do MNE e o Inspector-Geral Diplomático e Consular “tiveram efectiva e determinante intervenção no procedimento que conduziu ao encurtamento do prazo de permanência da Requerente na FPB e à sua transferência para os serviços internos, já que ambos se pronunciaram, sob a forma de despacho, sobre tal questão, nomeadamente na decisão de instaurar o processo disciplinar na sequência do inquérito realizado, sendo que o instrutor daquele inquérito também propunha a abreviação do tempo de permanência da requerente no posto, como resulta em viii supra da matéria de facto. (…) Importa verificar se aqueles dois membros que votaram no CD, ou algum deles estava ou não impedido de o fazer por ter intervindo na elaboração de parecer sobre a mesma questão. Ora, parece-nos que efectivamente existia tal impedimento. Tanto o Secretário-Geral do MNE, como também ao que se afigura pelos dados apurados, e não impugnados nesse particular, tiveram intervenção nas propostas e pareceres mencionados em viii e ix da matéria de facto e deliberaram e votaram sobre a mesma matéria na reunião a que se refere a acta de 15.04.2008, como resulta apurado em xvii e xviii acima. Assim sendo e ao abrigo daquele preceito legal do art. 44º, al. d) os mesmos estavam impedidos de estarem presentes e de intervirem na discussão e votação da deliberação sobre o mesmo assunto, como previsto no citado art. 24º, nº 3, ambos do CPA”. O Recorrente insurge-se contra o decidido na sentença em crise ao alegar não ter sido emitido, quer pelo Secretário-Geral do MNE quer pelo Inspector-Geral Diplomático e Consular, “qualquer parecer ou acto que se encontre abrangido pelo artigo 44º do CPA” sobre o encurtamento do prazo de permanência da Requerente da providência na referida Embaixada, pois aqueles limitaram-se a remeter ao órgão competente – o Conselho Diplomático – a proposta formulada no relatório final pelo instrutor do inquérito, na sequência da formulação expressa feita nesse sentido pelo Embaixador de Portugal em Budapeste, tendo, por conseguinte, havido por parte do Tribunal a quo errada interpretação dos factos dados por provados. Vejamos então. A factualidade de que a sentença se serviu para concluir ser manifesta a violação do princípio da imparcialidade, mostra-se identificada supra sob os itens 8 e 9. Ora, dessa factualidade e em conjugação com a constante dos itens nº 4 e 7, decorre que o procedimento seguido foi o seguinte: exposição do Embaixador de Portugal em Budapeste dirigida ao Secretário-Geral do MNE; remessa, por este, dessa exposição à Inspecção-Geral Diplomática e Consular, tendo o Inspector-Geral Diplomático e Consular, com base nela, ordenado a abertura de processo de inquérito; realizado este pelo instrutor nomeado, o mesmo remeteu ao Inspector-Geral Diplomático e Consular o relatório final, onde indica existir matéria suficiente para a instauração de procedimento disciplinar e sugere a adopção da medida de encurtamento do prazo de permanência no Posto e a submissão dessa questão ao Conselho Diplomático; o Inspector-Geral, por sua vez, sobre esse relatório profere despacho a manifestar a sua concordância com a proposta de instauração de processo disciplinar, a dizer que lhe “parece” “bem fundada a sugestão de pedir ao Conselho Diplomático que analise a possibilidade de propor a S. Exª o Ministro a abreviação do prazo de permanência no posto face ao péssimo clima de trabalho que a situação está a criar na Embaixada e as possíveis consequências negativas na imagem de Portugal” e a ordenar a remessa do relatório ao Secretário-Geral; este, por sua vez, profere o despacho “Concordo. Instaure-se o processo disciplinar”. É esta intervenção que, no exercício das respectivas funções, o Inspector-Geral Diplomático e Consular e o Secretário-Geral do MNE tiveram antes da reunião do Conselho Diplomático, de 15-04-2008, em que foi discutida e aprovada a proposta de encurtamento do prazo de permanência da Recorrida na Embaixada de Portugal em Budapeste e de transferência para os serviços internos do MNE. E é com essas intervenções que o Mmo. Juiz a quo, qualificando-as de “pareceres”, dá por preenchida a al. d) do nº 1 do art. 44º do CPA e, com isso, manifestamente violado o princípio da imparcialidade invocado pela Requerente da providência. Ora, não resulta que a intervenção de qualquer daqueles elementos antes da reunião do Conselho Diplomático mereça, pelo menos sem uma discussão jurídica aprofundada, a qualificação de “parecer”. Na verdade, não é qualificável como parecer uma qualquer intervenção, só sendo pareceres oficiais, como é afirmado por Mário Esteves de Oliveira e outros, in Código do Procedimento Administrativo comentado, 2ª ed., 2001, págs 441/442, os “…estudos fundamentados, com as respectivas conclusões, sobre questões científicas, técnicas ou jurídicos, elaborados pelos serviços (…) funcionalmente vocacionados (apenas ou também) para o exercício de tarefas consultivas, emitidos por determinação da lei ou a solicitação dos órgãos com competência para a instrução ou decisão do procedimento, para auxiliarem a tomada dessa decisão (ou a solução de outra questão procedimental). Por isso, considerando os termos em que a evidência da violação do princípio da imparcialidade é apresentada no requerimento inicial da providência - por violação da al. d) do nº 1 do art. 44º do CPA - só a emissão de um “parecer” propriamente dito sobre a questão material em apreço, entendido nos termos do art. 98º do CPA, teria a virtualidade de determinar o impedimento, previsto naquela disposição, daqueles dois membros do Conselho Diplomático para discutirem e votarem a proposta de encurtamento do prazo de permanência da ora Recorrida na EPB e a sua transferência para os serviços internos do MNE. Ora, a intervenção daqueles membros, anterior à reunião do CD, tomando posição sobre o sentido da decisão a tomar, embora não possa ser qualificada como uma actuação de mero expediente como pretende o Recorrente, no mínimo também não pode qualificar-se, de forma indubitável ou inquestionável, como “parecer” para integrar o impedimento a que se refere a citada al. d) do nº 1 do art.44º, exigindo, por parte do tribunal, uma indagação de direito com vista ao assentimento da convicção a formular no processo principal, que, “in limine”, afasta o critério de decisão previsto na al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA. Procedem, pois, as conclusões da alegação do Recorrente atinentes ao alegado vício nos termos adiantados, pelo que a sentença em crise não procede nesta parte. * Relativamente ao decidido na sentença em crise sobre o invocado vício de forma por preterição da audiência prévia da ora Recorrida, cumpre destacar o que segue: É inquestionável que não foi dado cumprimento ao disposto no art. 100º do CPA, pelo que a primeira questão que se coloca em face da argumentação do Recorrente, é a de saber se pode afirmar-se, sem margem para dúvidas, que o referido preceito é aplicável ao caso em apreço. O MNE sustenta que o acto suspendendo – de encurtamento do prazo e de transferência da Recorrida - não está sujeito a audiência prévia dos interessados, dada a especialidade da carreira diplomática que deriva dos caracteres específicos das funções que os funcionários diplomáticos são chamados a desempenhar, maxime, “as competências para a execução da política externa do Estado, para a defesa dos interesses do Estado no plano internacional e igualmente para a protecção no estrangeiro dos direitos dos cidadãos portugueses”, competências que relevam dessa particular função política e justificam a introdução, no Estatuto da Carreira Diplomática, de regras específicas quanto à prática dos actos nele previstos, que prevalecem sobre as regras do C.P.A.. Defende que é em atenção à relevância daquelas funções, no quadro da actuação do Estado, na dimensão diplomática, que o art. 45º do DL 40-A/98, de 27- de Fevereiro (Estatuto da Carreira Diplomática, doravante ECD), estabelece a regra específica de mobilidade dos funcionários diplomáticos sem carecer nem depender da manifestação de vontade por parte do funcionário, ao contrário do que acontece na maioria das carreiras públicas. E, por isso, considera que é nesse quadro que surge a possibilidade de encurtamento do tempo de permanência em posto, nos termos do nº 3 do art. 47º do ECD, em procedimento específico para o efeito, que, não remetendo para o CPA, apenas compreende a exigência de uma proposta concreta do Conselho Diplomático e a necessidade de fundamentação do acto em causa. Mais sustenta o Recorrente que, ainda que se concluísse haver lugar à audiência prévia de interessados nesse procedimento especial, a audição da visada, no caso concreto, afigurar-se-ia desprovida de utilidade, degradando-se em formalidade não essencial e, consequentemente, não determinante da invalidade do despacho suspendendo. É que , em seu entender, estando evidenciadas razões suficientes, reconhecidas pelo Tribunal “a quo”, que revelam que, independentemente de culpa ou grau de culpa, as relações entre o Embaixador e outros funcionários, por um lado, e a Recorrida, por outro, “se mostram gravemente degradadas e (…) compreensivelmente afectarão os serviços da Embaixada e mesmo a imagem de Portugal”, estaria demonstrado que a pronúncia da Recorrida nunca seria de molde a contrariar aquele pressuposto da deliberação do Conselho Diplomático, o que imporia concluir pela inutilidade da diligência. No que respeita à parte da decisão de colocação da Recorrida nos serviços internos do MNE, entende o Recorrente que, uma vez que nunca caberia àquela a escolha do local para onde pudesse ser transferida, tanto mais que, obedecendo essa colocação ao princípio da mobilidade funcional, sempre seria o Conselho Diplomático a decidir pela afectação racional dos recursos humanos, pelo que a exigência de audiência prévia não teria, à partida, razão de ser. Ora, o Mmo Juiz a quo sobre o invocado vício de preterição de audiência prévia, decidiu designadamente o seguinte: “No caso, atenta a natureza da decisão e dos reflexos dela na situação da requerente, dúvidas não se suscitam de que teria de ser cumprido tal procedimento da audiência, e não o foi, nem foram invocados motivos para a sua dispensa. (…) Por mais acuidade que tenham determinados cargos e os reflexos deles, tal situação não permite que, como regra geral, se lhes não aplique esta exigência legal, sendo certo que, para situações concretas, prevê a lei modos de dispensar essa audiência, como seja o caso de fundamentada urgência (…). Depois, como se disse, trata-se não apenas de exigência da lei ordinária, do CPA, mas de exigência constitucionalmente consagrada, contra a qual não podem Estatutos de determinados Organismos dispor em contrário, além de princípio geral aplicável a toda a administração sem excepção como resulta entre outros do art. 8º do mesmo CPA. (…) Por isso que se conclua que (…) se mostra violado este preceito legal do art. 100º do CPA (…)”. Analisemos a questão. O art. 8º do CPA, acolhendo o direito de participação dos interessados “na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito” consagrado no art. 267º, nº 5 da CRP, estabelece um princípio geral que vincula a Administração a assegurar a participação dos particulares nas decisões que lhes respeitam. Como é jurisprudência firme do STA, aquela disposição pretende, de forma clara, que se apliquem as regras sobre o direito de audiência previstas no CPA a todos os procedimentos, mesmo aos especiais [cfr. entre outros, os acórdãos Supremo Tribunal Administrativo (Pleno da 1ª Secção) de 18-09-2008–proc. 0941/05, de 19-6-2008–proc. 0260/08, 27-2-2008–proc.1089/04, de 12-12-01–proc. 39893 e, na doutrina, ESTEVES DE OLIVEIRA e outros, Código de Procedimento Administrativo, anotado, pág. 452]. De acordo com este entendimento, que se afigura incontroverso, não se vislumbra como é que o nº 3 do art. 47º do ECD afastaria a aplicação do art. 100º do CPA, já que não existe norma expressa que o estabeleça (e que, a existir, seria, pelo menos em princípio, inconstitucional), sendo certo que o preceito deve ser interpretado sem derrogar o direito de audiência, que encerra um princípio geral da actividade administrativa ditado por imposição constitucional, garantindo o direito de participação de todos os particulares na formação das decisões que lhes dizem respeito. Por conseguinte, não tendo sido oportunamente invocada e fundamentada qualquer causa de inexistência ou de dispensa da audiência, previstas respectivamente nos nºs 1 e 2 do art. 103º do CPA, tal como entendeu o Mmo Juiz a quo, houve manifesta violação do art. 100º do mesmo diploma. Porém, como se disse, o Recorrente, para a hipótese de ser este o entendimento do Tribunal, veio ainda defender que aquela formalidade, no caso concreto, ter-se-ia degradado em formalidade não essencial, porque o que relevou para a decisão de encurtamento do prazo de permanência no posto foi a verificação pelo relator do processo de inquérito de que a relação entre a Recorrida, por um lado, e o Embaixador e demais funcionários da EPB, por outro, se encontrava degradada a ponto de afectar o funcionamento adequado daqueles serviços da Embaixada e de prejudicar a imagem de Portugal na Hungria, pelo que a participação da ora Recorrida em nada alteraria o sentido da decisão tomada. Deste modo, atendendo a que a preterição de formalidades essenciais pode ser objecto de desvalorização, o que importa saber agora é se, face às circunstâncias concretas do caso, é possível que, apesar da verificação da preterição da audiência prévia da Recorrida, o despacho suspendendo não venha, na acção principal, a ser anulado com esse fundamento. Como pode ler-se designadamente no Acórdão do STA de 06-09-2011, proc. nº 0787/10, “a desvalorização dos vícios de forma pode ocorrer por uma de duas vias, a saber, a degradação de formalidades essenciais em não essenciais e a desvalorização dos vícios formais, sendo que a degradação apenas se verifica nos casos em que se demonstra que a finalidade exigida com a formalidade preterida foi alcançada; no segundo caso, a desvalorização do vício formal apenas pode ocorrer em casos em que o acto que foi praticado foi o acto devido em face da discipA...aplicável, não podendo ter conteúdo e sentido diverso, vigorando o princípio do aproveitamento dos actos administrativos, nesse caso”. Como se referiu supra, o Recorrente alega, que, tendo ficado demonstrada a degradação das relações a ponto de afectar o funcionamento adequado daqueles serviços da Embaixada e de prejudicar a imagem de Portugal na Hungria e que o próprio Tribunal deu isso por assente, a pronúncia da recorrida nunca seria de molde a contrariar aquele pressuposto da deliberação do Conselho Diplomático e, portanto, a alterar o sentido da decisão de encurtamento do prazo de permanência na EPB (com a inerente cessação das funções nesse posto e consequente transferência). Neste contexto importa destacar o seguinte trecho da sentença em crise: “em termos meramente indiciários”, estão “exteriorizadas razões suficientes, principalmente no relatório final do inquérito, (…) que alguns factos imputados e considerados como infracção aos deveres funcionais por parte da requerente” permitem retirar a conclusão de que, “independentemente da culpa, ou grau de culpa, as relações entre o embaixador e a Srª Funcionária requerente se encontram gravemente degradadas e compreensivelmente afectarão os Serviços e mesmo a própria imagem de Portugal”. Ora, será que a factualidade de onde o Mmo Juiz a quo retira esta conclusão, a ficar provada na acção principal, é susceptível de determinar a degradação da omissão da audiência prévia em formalidade não essencial? Afigura-se-nos que não há lugar à degradação do vício por resultar evidente que a finalidade da formalidade preterida não foi, por qualquer forma, alcançada. Mas não havendo lugar à degradação do vício, será que o acto suspendendo “foi o acto devido em face da discipA...aplicável”, que teria sido praticado com ou sem a audição prévia da ora Recorrida, podendo vir a não ser anulado na acção principal? Embora conscientes de que o despacho suspendendo emana do âmbito do poder discricionário, em que a aplicação do princípio geral de direito que se exprime pela fórmula utile per inutile non vitiatur (com esta ou com outras formulações e designações, como a de “princípio da inoperância dos vícios”, a de “princípio antiformalista”, a de “princípio da economia dos actos públicos” e a “de princípio do aproveitamento do acto administrativo”) apresenta maiores dificuldades e exige redobradas cautelas, não podemos ter por liminarmente excluída, apenas com o fundamento de estarmos no domínio da discricionariedade, a possibilidade de desvalorização da omissão da formalidade em apreço. Com efeito, pode ler-se, designadamente no Ac. do STA de 11-10-2007, proc. nº 01521, que “Mesmo no domínio dos actos discricionários o tribunal pode negar relevância anulatória ao incumprimento do art. 100º do CPA quando, pelo conteúdo do acto e pela incidência da sindicação que foi chamado a fazer possa afirmar com inteira segurança que o cumprimento de tal formalidade em nada modificaria o conteúdo do acto”. O âmbito de aplicação daquele princípio, continua o citado aresto a discorrer, “(…) não se determina mecanicamente pela antítese vinculação <-> discricionariedade, em termos de sempre ser de excluir no domínio dos actos praticados no exercício de um poder discricionário. (…) há erros respeitantes a actos praticados no uso de um poder discricionário cuja anulação o juiz administrativo pode abster-se de decretar por invocação do referido princípio, atendendo à razão que o justifica. Mesmo neste domínio, o tribunal pode negar relevância anulatória ao erro, sem risco de substituir-se à Administração (Cfr. Prof. Afonso Queiró, RLJ-117º, pags. 148 e sgs.), quando, pelo conteúdo do acto e pela incidência da sindicação que foi chamado a fazer, possa afirmar, com inteira segurança, que a representação errónea dos factos ou do direito aplicável não interferiu com o conteúdo da decisão administrativa porque não afectou as ponderações ou as opções compreendidas (efectuadas ou potenciais) nesse espaço discricionário.” – vide também, entre outros, acórdão do TCA Norte de 22-06-2011-proc. nº 00462/2000 e demais jurisprudência citada, quer neste último quer no anterior acórdão do STA. É, por esta ordem de razões, que entendemos que, no caso em apreço, em sede cautelar (num juízo sumário em que deve mover-se a apreciação do julgador cautelar), não é possível, sem outras indagações de facto e de direito, afirmar, com segurança, a insusceptibilidade de desvalorização, por via da aplicação do princípio utile per inutile non vitiatur, do apurado vício de forma por preterição da audiência prévia. Em consequência, não pode ter-se por certo que o despacho suspendendo vai ser anulado na acção principal. Assim, a sentença recorrida, confrontada com a argumentação do Requerido, que não é despicienda como deixámos demonstrado, não podia ter concluído pela manifesta procedência da acção principal suportada apenas na ostensiva verificação daquele vício de forma e ter decretado a providência da suspensão da eficácia do acto suspendendo ao abrigo da al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA. Deste modo, procedem também nesta parte , nos limites do exposto, as alegações de recurso atinentes a tal vício. * Relativamente ao decidido na sentença sobre o vício de forma por falta de fundamentação, impõe-se dizer o seguinte: O despacho suspendendo usou a expressão “exoneração” da ora Recorrida. Atendendo a que a sentença impugnada não se apresenta muito clara quanto ao sentido que atribuiu a essa expressão usada no despacho suspendendo, esclarece-se que ela tem necessariamente o sentido só de cessação do exercício das funções que a ora Recorrida desempenhava na EPB, que é inerente à decisão de encurtamento do prazo de permanência nessa Embaixada e implica a transferência para outros serviços do MNE. Posto isto, vejamos o que há a dizer sobre o decidido na sentença a respeito do vício de falta de fundamentação. Não está em causa que o despacho suspendendo é um daqueles actos administrativos obrigatoriamente sujeitos a fundamentação [cfr. 124º, nº 1, als a) e e) do CPA]. Do art. 125º do CPA resulta que fundamentar é enunciar explicitamente as razões ou motivos que conduziram o órgão administrativo à prática de determinado acto, acto este que deverá conter expressamente os fundamentos de facto e de direito em que assenta a decisão, bastando que, de forma sucinta, dê a conhecer as premissas de facto e os preceitos legais aplicados, sendo certo que essa fundamentação se basta com a remissão para anteriores pareceres, informações ou propostas que, neste caso, constituirão parte integrante do respectivo acto (cfr. n.º 1 do preceito). Conforme jurisprudência uniforme, a fundamentação assume-se como um conceito relativo que varia em função do tipo concreto de cada acto e das circunstâncias concretas em que é praticado, cabendo ao tribunal, em face de cada caso, ajuizar da sua suficiência mediante a adopção de um critério prático que consiste na indagação sobre se um destinatário normal, face ao itinerário cognoscitivo e valorativo constante do acto em causa, fica em condições de saber o motivo porque se decidiu num sentido e não noutro. Como já dissemos antes, a “exoneração” da ora Recorrida, na linguagem do despacho suspendendo, tem necessariamente o sentido só de cessação do exercício das funções que a mesma desempenhava na Embaixada de Portugal em Budapeste, que é inerente à decisão de encurtamento do prazo de permanência nessa Embaixada e implica a transferência para outros serviços do MNE. Por isso, os motivos que determinaram a proposta do CD de encurtamento do prazo de permanência são os mesmos que determinaram a cessação das funções naquela concreta Embaixada e, naturalmente, a transferência da funcionária. Ora, no relatório final do inquérito destinado a apurar os factos transmitidos pelo ofício nº 016/39 (exposição do Embaixador), apesar de não estarem transcritos os factos aí relatados, recolhe-se, com clareza, a remissão para eles e a consideração de que os mesmos ficaram suficientemente indiciados, tudo a justificar a instauração de processo disciplinar e, independentemente do resultado desse processo, a sugestão de recurso, na área da mobilidade funcional, sobretudo aos mecanismos dos arts 8º, nº 2, als i) e l) e 47º nº 3 do ECD para preservar o correcto “ambiente” de relacionamento pessoal e funcional no seio da Embaixada (cf. items 4 e 7 da factualidade dada como assente). Considerando que da acta do Conselho Diplomático resulta que a proposta de encurtamento do prazo de permanência da ora Recorrida na EPB aderiu aos resultados do inquérito expressos no respectivo relatório final, quer quanto à factualidade indiciada (expressamente vertida na exposição do Embaixador), quer quanto à fundamentação jurídica aí referida (expressa parcialmente na acta), impõe-se concluir que as propostas do CD submetidas à decisão do Ministro dos Negócios Estrangeiros contêm uma fundamentação de facto e de direito que, numa apreciação sumária do vício em apreço, não autoriza a conclusão de evidente verificação do mesmo (cf. item 17 da factualidade dada como assente). É que não há dúvida que, conhecidos e dados por indiciados os comportamentos da ora Recorrida (descritos na exposição do Embaixador a título exemplificativo), qualquer destinatário normal percebe suficientemente a conclusão de degradação das relações funcionais entre o Embaixador e outros funcionários por um lado, e a Recorrida por outro, a determinar, ao abrigo do art. 47º, nº 3 do ECD, a proposta do CD de encurtamento do prazo normal de permanência naquela Embaixada, a inerente cessação das funções exercidas nesse posto e a transferência para outro serviço do MNE, em vista de garantir o adequado funcionamento da Embaixada e a imagem de Portugal em Budapeste. Essa fundamentação de facto e de direito revela, de forma perceptível, o itinerário cognoscitivo e valorativo que determinou aquelas propostas. Por conseguinte, se o despacho suspendendo tiver aderido a essas propostas, está afastada qualquer possibilidade de se considerar verificado, pelo menos ostensivamente, o vício de falta de fundamentação (seja por obscuridade, contradição ou insuficiência). Na verdade, como resulta dos próprios termos do requerimento inicial da providência cautelar e vem expressamente referido a folhas 437 das contra-alegações deste recurso, a Recorrida conheceu a exposição do Embaixador (que contém o relato de factos concretos), o relatório do Inspector e a proposta do Conselho Diplomático, não podendo, por isso, ter deixado de entender o itinerário cognoscitivo e valorativo que determinou a decisão de encurtamento do prazo de permanência, a cessação das funções na EPB e a transferência para os serviços internos do MNE. Deste modo, a única questão que há a colocar é a de saber se ainda se pode entender que o acto suspendendo (da autoria do Ministro dos Negócios Estrangeiros) acolheu essa fundamentação, remetendo para as propostas do CD ou referindo expressamente a sua concordância com elas, em conformidade com o nº 1 do art. 125º do CPA. É líquido que o acto suspendendo que nos é dado a conhecer, quer pelo Recorrente quer pela ora Recorrida, é apenas o extracto do despacho do Ministro que está sujeito a publicação no Diário da República, em que não se vê qualquer alusão à concordância ou remissão para a proposta do Conselho Diplomático [pese embora a Recorrida ter solicitado ao Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, por requerimento de 22-08-2008, a "…passagem de certidão de teor integral do despacho ministerial…” (cf. item 20 da factualidade dada como assente), pretensão que não foi satisfeita pelo menos até à data da instauração da providência, em 18-10-2008]. Acontece que a medida de encurtamento do prazo de permanência no posto, em conformidade com a alínea l) do nº 2 do art. 8º do ECD, é necessariamente decidida pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros sobre a proposta do Conselho Diplomático e, sendo assim, a decisão de aquele aplicar a medida tem, quase obrigatoriamente, o sentido da adesão do autor do acto à referida proposta. Mas, ainda que assim não se entenda, uma coisa é segura: a falta do teor integral do acto suspendendo não permite afirmar a inexistência da expressa remissão para, ou concordância com a proposta do Conselho, o que só em sede da acção principal poderá ser confirmado. Acresce que na sentença em crise grande parte da argumentação dispendida no âmbito da apreciação deste vício, respeita a um acto, que, no entender do Mmo. Juiz a quo, seria o acto que deveria ter sido praticado, e que colheria o seu fundamento jurídico designadamente no art. 54º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos (“de suspensão preventiva”). Ora, para além de o vício de falta de fundamentação ter de ser apreciado em ordem ao concreto acto administrativo, tal como foi praticado pela Administração, não cabe na análise desse vício aferir da sua legalidade interna, mesmo que evidenciada na sua fundamentação. O acto concreto praticado pela Administração não foi produzido no âmbito disciplinar, para o qual foi instaurado processo disciplinar que corre os seus termos, mas no âmbito da gestão dos recursos humanos do MNE, com recurso aos mecanismos específicos de mobilidade dos funcionários diplomáticos. Por isso, andou seguramente mal o Mmo. Juiz a quo: - Por um lado, não dando a conhecer, através de um discurso lógico e claro dirigido ao concreto acto suspendendo, o que considerou estar suficiente ou insuficientemente fundamentado e o que considerou manifestamente não fundamentado (exemplificativamente: ora admite “com alguma reserva que esteja fundamentada a situação de encurtamento do prazo de permanência no posto da requerente, ao abrigo do art. 47º, nº 3 do ECD”, referindo adiante que “…entendemos que, quer pelo dito relatório final do inquérito, quer participação que lhes deu causa, existir fundamentação suficiente quer em termos do afastamento temporário daquelas funções, quer da transferência para outro serviço (…); ora diz que, «…como dissemos, não está minimamente fundamentada a ordem de “exoneração” porque a mesma, neste contexto, pressupõe que o seja em sede de sanção disciplinar, atentos os concretos motivos invocados…», vindo a afirmar posteriormente que “não resulta capaz fundamentação para a proposta redução do prazo normal de permanência naquela embaixada”, e termina com o seguinte - “Em conclusão diremos que neste particular no que respeita ao concreto acto suspendendo, principalmente na parte relativa à exoneração, não se encontra o mesmo fundamentado, e por isso que, neste particular proceda o invocado vício de forma por falta de fundamentação, à qual se equipara a sua insuficiência ou contradição – nº 2 do citado art. 125º do CPA”). - Por outro lado, considerando tudo o que foi dito a propósito da fundamentação das propostas do Conselho Diplomático, por ter concluído ostensivamente apurado o vício de falta de fundamentação do acto suspendendo sem sequer conhecer o seu conteúdo integral. Por todas as razões expostas, no mínimo, não podia ter sido dada por verificada, sem outras indagações (de facto e de direito), a manifesta falta de fundamentação em que a sentença também sustentou o decretamento da providência ao abrigo da al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA. Do mesmo modo a sentença em crise incorreu em erro de julgamento nesta parte pelo que procedem as conclusões da alegação do Recorrente nos termos antecedentes, atinentes a tal vicio. * Finalmente quanto ao decidido na sentença sobre o vício de violação de lei, “por erro sobre os pressupostos de facto, com ofensa do princípio da presunção de inocência”, importa tecer as seguintes considerações. Da sentença em crise recolhe-se, quanto a este vício invocado pela Requerente da providência, apenas o seguinte: “…como se adiantou já, entendemos que igualmente procede a invocada “violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto, com ofensa do princípio da presunção de inocência (…) na medida em que foi decidida a exoneração, sem que tenha sido, como devia, no processo disciplinar que pende termos, e de qualquer modo sem que hajam sido garantidos os direitos de defesa da requerente, nem sequer em sede de audiência prévia ainda que se considerasse prevalecer apenas a “parte administrativa” da questão por oposição à disciplinar”. O Recorrente insurge-se contra o decidido, argumentando que, “no caso concreto não está em causa uma decisão disciplinar”, mas tão só “uma decisão administrativa de gestão de recursos diplomáticos à disposição do Estado”. Considera que, tendo concluído pela degradação das relações entre a ora recorrida, por um lado, e o Embaixador e outros funcionários, por outro, independentemente de quem contribuiu mais para essa degradação que faz perigar o serviço da Embaixada ou a imagem de Portugal, decidiu encurtar o prazo de permanência da Recorrida no posto, por ser essa decisão a que melhor se adequa aos factos apurados e às conclusões alcançadas em sede procedimental. É evidente que, num juízo sumário em que deve mover-se a apreciação cautelar, o julgador não podia ter dado por adquirido, sem outras indagações pelo menos de direito, que o princípio da presunção de inocência vigorava e foi ostensivamente violado no procedimento que levou à aplicação da medida prevista no nº 3 do art. 47º do ECD, de encurtamento do prazo de permanência no posto (com inerente cessação de funções no posto e necessária subsequente colocação em outro lugar), quando essa medida não é uma qualquer das sanções disciplinares taxativamente previstas no Estatuto Disciplinar dos Funcionários Públicos e quando há um procedimento disciplinar autónomo a correr termos. Em face disto, a sentença recorrida também incorreu em erro de julgamento ao decretar a providência ao abrigo da al. a) do nº 1 do art. 120º do CPTA, suportada no vício de “violação de lei, por erro sobre os pressupostos de facto, com ofensa do princípio da presunção de inocência”. Procedem pelo exposto as conclusões da alegação do Recorrente nos termos enunciados, atinentes a tal vício. * Em conformidade com todo o exposto, procedem as conclusões da alegação do Recorrente nos termos enunciados, sendo de conceder provimento ao presente recurso jurisdicional por não estarem reunidos os pressupostos que permitem a adopção da providência cautelar ao abrigo da al. a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, e revogar a sentença recorrida com as legais consequências. * Acordam, pois, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo, 2º Juízo, deste TCAS, em conceder provimento ao presente recurso jurisdicional e revogar a sentença recorrida com as legais consequências. * Custas pela recorrida em ambas as instâncias. Lisboa, 7 de Dezembro de 2011 ANTÓNIO VASCONCELOS PAULO CARVALHO ANA CELESTE CARVALHO

© 2024 Apura. Todos os direitos reservados.
Termos e Condições
Política de Privacidade