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Acórdão STJ de 2003-01-08

02P4746

TribunalSupremo Tribunal de Justiça
Processo02P4746
Nº ConvencionalJSTJ000
RelatorFlores Ribeiro
DescritoresHabeas Corpus, Extradição, Trânsito em Julgado, Prisão Preventiva
Nº do DocumentoSJ200301080047463
Data do Acordão2003-01-08
VotaçãoUnanimidade
Tribunal RecursoT REL LISBOA
Processo no Tribunal Recurso6870/02
Data2002-11-26
Privacidade1
Meio ProcessualREC PENAL.
DecisãoNegado Provimento ao Recurso.

Sumário

I - Se da decisão que decretou a extradição tiver havido recurso para o Tribunal Constitucional, a detenção não pode prolongar-se por mais de três meses contados da data da interposição daquele – art. 52.º, n.º 4, da Lei n.º 144/99, de 31/8. II - Porém, no caso de a decisão de extradição ter já transitado em julgado, importa ainda reter que nos termos do n.º 2 do art. 60.º da mesma Lei, o MP procede à respectiva comunicação aos serviços competentes do Ministério da Justiça para os efeitos de efectivação da transferência, sendo a data da entrega do extraditando ao país requerente estabelecida até ao limite de 20 dias a contar do trânsito. III - Para além de que, se ninguém aparecer a receber o extraditando na data acordada, será o mesmo restituído à liberdade decorridos 20 dias sobre aquela data – art. 61.º, n.º 2, da mesma Lei. IV - Finalmente importa não esquecer que, nos termos do n.º 3 deste dispositivo, o prazo referido no número anterior é prorrogável na medida exigida pelo caso concreto, até ao limite máximo de 20 dias, quando razões de força maior o justificarem. V - Assim, se o trânsito em julgado do acórdão do STJ – que definitivamente avalizou a decisão de extradição decretada pela Relação – teve lugar em 17-04-03, o prazo limite para entrega do requerente, previsto no citado art. 60.º, n.º 2, com o acréscimo legal de prazo do n.º 2 do art. 61.º, e, eventualmente, da prorrogação a que alude o n.º 3 do mesmo artigo, ainda estava longe de esgotado, aquando da decisão da providência de habeas corpus em 07-05-03.


Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: A República Francesa solicitou, ao abrigo da Constituição Europeia de Extradição de 13 de Setembro de 1957, complementada pelo disposto nos autos 59º a 66º da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengeu, de 14 de Junho de 1985, a extradição do cidadão AA, de nacionalidade Francesa, e devidamente identificado nos autos, por se encontrar indiciado como autor, reincidente de um crime de roubo e de um crime de roubo, na forma tentada, cometidos em 20 de Fevereiro de 2002, em Pau, França, e detido em Portugal, no dia 5 de Setembro de 2002, em cumprimento de um mandado de captura internacional demandado pelo Tribunal de grande Instância de Pau. Seguindo tal pedido os normais termos legais, veio o extraditando a deduzir oposição a tal pedido. Por isso, chamado a pronunciar-se, o Tribunal da relação de Lisboa, por seu acórdão de 26-11-2002, a fls. 163 e seguintes, "decidiu conceder a extradição, para França, do nacional deste Estado, AA, unicamente para efeito de procedimento criminal pelos factos, alegadamente por ele cometidos, no dia 20 de Fevereiro de 2002, na localidade de Pau, e a que se refere o Processo de Instrução de 02/02/23, penalmente no Juízo de Instrução Criminal junto do tribunal de grande Instância de Pau". Não se conformando com tal decisão, o extraditando interpôs o presente recurso, extraindo da motivação as seguintes conclusões: "a) O presente recurso visa apelar da decisão que optou por extraditar o ora recorrente por a mesma só ter sido alcançada por ter havido uma errada interpretação e aplicação dos art.s 6º, nº 2, alínea b), art. 44º, nº 1, alínea c), ambos da Lei nº 144/99, de 31 de Agosto e ainda do art. 33º, nº 5 da Constituição da República Portuguesa. b) Da errada interpretação e aplicação que foram levadas a cabo pelo Tribunal a quo do art. 6º nº 2, alínea b) da Lei nº 144/99, de 31 de Agosto, resulta a directa violação do preceituado no nº 1 do art. 30º da Lei Fundamental. c) No pretérito dia 17 de Setembro, o Estado Francês apresentou às autoridades Portuguesas o pedido de extradição do ora recorrente, estando o seu âmbito restringido a factos ocorridos a 20 de Fevereiro de 2002, em Pau, e os quais indiciam o ora recorrente como autor da prática de "furto com utilização de arma de fogo sob forma tentada", crime este que teria cometido enquanto reincidente (cfr. fls. 93 dos autos). d) O Estado Francês requereu a extradição do ora recorrente para que este ali seja julgado pela prática daqueles factos. e) Perante a Lei do Estado Francês, os factos ocorridos naquele dia e de cuja prática o ora recorrente é suspeito consubstanciam a prática de "furto com utilização de arma de fogo sob a forma tentada", crime este que teria cometido enquanto reincidente (cfr. fls. 93 dos autos), e são puníveis nos termos dos art.s 311, nºs 1, 8 e 14, e 315º, nº 15 e 132º, nº 8, todos do Código Penal Francês. f) Mais confirma o Estado Francês que a prática dos factos vertidos supra, poderão fazer incorrer o ora recorrente numa pena de prisão perpétua nos termos do disposto nos art.s descritos na conclusão imediatamente anterior, uma vez que é reincidente (cfr. fls. 93, dos autos). g) Neste caso em concreto, o Estado Francês deveria ter oferecido garantias de que tal pena não lhe virá de facto, a ser aplicada ou executada. h) Contudo, compulsados os presentes autos, o mais próximo que encontramos de tal garantia -é constante de fls. 93 e 95 e que são, nada mais, nada menos, que a transcrição do art. 729º, do Código de Processo Penal Francês, e uma informação sobre um Estudo Estatístico levando a cabo não se sabe sequer quando. i) Quanto ao art. 729º do Código de Processo Penal Francês retira-se, então, que, se a prova em questão for declarada culpada dos factos que lhe são imputados e condenada à pena máxima [que é a de prisão perpétua], poderá beneficiar, após um período de regime de prova de 15 anos, de uma medida consistindo na liberdade condicional. j) Quanto ao Estudo, lê-se o seguinte: " Resulta dos últimos estudos sobre a duração do cumprimento das penas que a média de prisão efectivamente cumprida pelas provas condenadas a uma pena de prisão perpétua eleva-se a 17 anos e 2 meses. k) Contudo, é precisamente socorrendo-se da "invocação expressa do art. 729º do Código de Processo Penal Francês" (cfr. nota de rodapé nº 29 do acórdão ora sob recurso) e da " invocação [daqueles] estudos estatísticos (cfr. página 7 do mesmo acórdão) que a 5ª Secção da Veneranda Relação de Lisboa, concluiu que as garantias previstas no art. 6º, nº 2 alínea a) da Lei nº 144/99, de 31 de Agosto e no art. 33º nº 5 da nossa Lei Fundamental, tinham sido, inquestionavelmente, prestadas no caso em concreto pelo Estado Francês. l) Mais considerou aquela secção da Veneranda Relação de Lisboa que tais "invocação" eram garantias suficientes. m) Pela mera leitura da fundamentação do acórdão ora sob recurso, qualquer pessoa de inteligência mediana, até, percebe uma coisa; que os próprios Desembargadores que o elaboraram mas têm uma certeza absoluta, que é o que aqui se exige, de que a pena de prisão perpétua não virá a ser aplicada ao ora recorrente. n) Com boa verdade, não existe por parte do Estado Francês qualquer garantia de que o ora oponente não lhe venha a ser aplicada uma pena de prisão perpétua e que esta não seja, de facto, executada. o) Sobre esta matéria incidiram já vários acórdãos deste Tribunal ad quem, um dos quais o Acórdão de 8 de Abril de 1992, no processo 42447. p) A fazer fé em tais "garantias", só, pelo menos, daqui a quinze anos é que poderíamos verificar se o Estado Francês iria ou não cumprido, pois que o que o art. 729º do Código de Processo Penal Francês estipula é que o condenado a que de prisão perpétua poderá (eventualmente) vir a beneficiar de liberdade condicional após ter cumprido quinze anos de pena. q) Aliás, conforme se pode constatar da mera leitura dos documentos juntos pelo ora oponente aos autos, aquando da audiência do extraditando realizada no pretérito dia 25 de Outubro, ele foi condenado, em 29 de Janeiro de 1971, pelo Tribunal Francês de ... a uma pena de prisão perpétua. r) Tendo sido, sobretudo, determinada a sua liberdade condicional em 10 de Julho de 1998, a verdade é que esta lhe foi totalmente revogada por decisão proferida pelo Tribunal de Apelação de Nímes a 17 de Novembro de 1999. s) Tendo o ora oponente, entretanto, sido condenado a mais uma pena de quinze anos de prisão efectiva, por decisão proferida a 13 de Fevereiro de 1996, pelo Tribunal Francês de Hante - ...., o Tribunal de Apelação de Nímes, na mesma data em que lhe revogou totalmente a liberdade condicional, determinou que esta pena de quinze anos só começaria, por ele, a ser cumprida após ter cumprido todo o tempo da pena de prisão perpétua que lhe havia sido aplicada anteriormente. t) Esta é a verdade por mais absurda e ilógica que possa parecer, e é. u) É por esta razão que as garantias em falta e previstas nos art.s 6º nº 2, alínea b) e art. 44º nº 1 alínea c), ambos da Lei nº 144/99, de 31 de Agosto e no art. 33º nº 5 da Constituição da República Portuguesa, revestem especial importância para este caso em concreto, e sem as quais o ora recorrente não poderá ser extraditado. v) Por outro lado, não ofereceu, igualmente, o Estado Francês garantia formal de que o ora oponente não será detido "para cumprimento de pena ou para outros fins, por actos diversos dos que fundamentaram o pedido e lhe sejam anteriores ou contemporâneos", garantia esta prevista no art. 44º nº 1 c) da Lei nº 144/99, de 31 de Agosto. w) A apresentação desta garantia é sempre obrigatória devendo a sua falta dar lugar ao arquivamento do processo nos termos do art. 45º nº 2 da Lei nº 144/99, de 31 de Agosto. x) De resto, no texto do acórdão ora sob recurso, e à míngua de qualquer garantia segura, o Tribunal a quo faz um curioso exercício de lógica: porque o pedido de extradição formulado pelo Estado Francês "se reporta unicamente aos factos ocorridos em 20 de Fevereiro de 2002 constitui (...) garantia suficiente de que o requerido não será detido para cumprimento de pena que lhe haja sido imposta por factos anteriores. y) Ora, se o facto de um pedido de extradição está confinado e limitado somente a determinados factos, fosse garantia suficiente de que a pessoa a extraditar, "não seria detida para procedimento penal para cumprimento de pena ou para outro fim, por factos diversos dos que fundamentaram o pedido e lhe sejam anteriores ou contemporâneos", então o art. 44º, nº 1 alínea c) não teria campo de aplicação prática: z) A 5ª Secção da Veneranda Relação de Lisboa ao ter interpretado da forma como interpretou a al. b) do nº 2 do art. 6º, da Lei nº 144/99, de 31 de Agosto, violou, claramente, o art. 30º nº 1 da Constituição da República Portuguesa que proíbe qualquer pena ou medida de segurança privativa da liberdade ilimitada ou indefinida. aa) Estando, por isso, aquela norma ferida de inconstitucionalidade. bb) Pois que, no acórdão ora sob recurso, aquele tribunal procedeu à interpretação daquela norma "de modo a não proibir a extradição por casos em que seja juridicamente possível a aplicação da pena de prisão perpétua, embora não seja previsível a sua aplicação, por terem sido dadas garantias (e no caso sub judic, nem sequer foram efectivamente dados) nesse sentido pelo citado requisitante"- Ac. do Tribunal Constitucional nº 474/95, de 17 de Agosto de 1995, no Processo nº 518/94 (in Bol. do Min. Da Justiça, 451, 426). cc) No mesmo sentido vai o douto acórdão de 18 de Janeiro de 1996, proferido por esse Grande Tribunal no processo nº 25/94 in Col. De Jur. 1996, 1, 178). dd) Pelo exposto, é certo que o Tribunal a quo ao ter decidido da forma e com a fundamentação como decidiu, extraditar o ora recorrente, fez uma errada interpretação e aplicação do art. 33º nº 5 da Constituição da República Portuguesa e do art. 6º nº 2, alínea b) e 44º, nº 1 alínea c) ambos da Lei nº 144/99, de 31 de Agosto. ee) Bem como pela interpretação que fez da alínea b) do nº 2 do art. 6º da Lei nº 144/99, de 31 de Agosto, violou directamente o nº 1 do art. 30º da Constituição da República Portuguesa". Na resposta que apresentou à motivação, o Ministério Público defendeu doutamente a improcedência do recurso. Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir. Em face dos elementos constantes dos autos, pode dar-se como assente o seguinte: - o extraditando foi condenado em 29.1.71, pela Cour d' ... ... ... a prisão perpétua, pela prática dos crimes de homicídio voluntário, furtos qualificados e associação de malfeitores; - foi ainda condenado em 14.4.73, pela Cour d' .... du ..., numa pena de 15 anos de prisão por furto qualificado, e em 6 outros penas de 3 anos a 15 meses, acumuladas com a primeira pena, a qual foi absolvida pela de prisão perpétua; - detido desde 16.3.69, foi colocado em liberdade condicional em 30.8.88; - detido em 28.3.93, foi de novo, condenado, em 19.12.96, pela Cour d' Assisses de ...-Garoume a 15 anos de prisão por uma série de crimes de roubo, cometidos de 30.11.91 a 14.3.93; - viu totalmente revogada a liberdade condicional, por decisão de 10.7.98, confirmada pelo Cour d'Appel de Nimes, em 11.11.99; - em consequência desta decisão, passou a cumprir, cumulativamente a última condenação, por um tempo igual à pena que lhe restava cumprir no momento da sua colocação em liberdade condicional; - evadiu-se do Centro Penitenciário de ... a 13.02.02; - o extraditando encontrava-se indiciado no tribunal de grande Instância de Pau, France, pela prática, em autoria, e como reincidente, de um crime de roubo e de um crime de roubo, na forma tentada, cometidos a 20-2-2002; - os factos imputados ao extraditando e nos quais se fundamenta o pedido de extradição, são puníveis, nos termos dos art.s 311º-1, 311º-8, 311º-14, e 315º-15 do Cód. Penal Francês, com a pena de prisão de 20 anos; - nos termos do art. 132º-8 do mesmo diploma, dado que em 19.12.96 o mesmo foi definitivamente condenado na pena de 15 anos de prisão, por factos de idêntica natureza , o máximo da pena aplicável é a de prisão perpétua; - a República Francesa, solicitada a informar, nos termos do nº 1 do art. 14º, da Convenção Europeia de Extradição, se as autoridades francesas pretendiam alargar o pedido de extradição, informou que tal pedido se reporta unicamente aos factos ocorridos em 20.2.2002 - fls. 96; - a República Francesa, através do seu Ministro da Justiça, ofereceu a garantia de que "nos termos do artigo 729º do Código de Processo Penal, se a pessoa em questão for declarada culpada dos factos que lhe são imputados e condenada à pena máxima, poderá beneficiar, após um período de regime de prova de 15 anos, de uma medida consistindo na liberdade condicional. Resulta dos últimos estudos sobre a duração do cumprimento das penas que a média de prisão efectivamente cumprida pelas pessoas condenadas a uma pena de prisão perpétua eleva-se a 17 anos e 2 meses" - fls. 93. De acordo com as conclusões apresentadas -que, como sabemos balizam o objecto o conhecimento do recurso- o recorrente levanta como questões a resolver as de saber se não haverá o risco manifesto de lhe vir a ser aplicada prisão perpétua, dada a sua reincidência, ou se não poderá vir a ficar preso à ordem de um outro processo onde terá de cumprir prisão perpétua. Estabelece o nº 4 do art. 33º, da Constituição da República que "só é admitida a extradição por crimes a que corresponda, segundo o direito do Estado requisitante, pena ou medida de segurança privativa ou restritiva da liberdade com carácter perpétuo ou de duração indefinida, em condições de reciprocidade estabelecida em convenção internacional e desde que o Estado requisitante ofereça garantias de que tal pena ou medida de segurança não será aplicada ou executada". E o nº 5 dispõe que "O disposto nos números anteriores não prejudica a aplicação das normas de cooperação judiciária penal estabelecidas no âmbito da União Europeia". Portugal ratificou a Convenção Europeia de Extradição de 13.12.1957, de que a França é parte contratante, tendo-lhe feita a reserva constante da al. c) do art. 1, onde se estabelece que "Portugal não concederá a extradição de pessoas: c) Quando reclamadas por infracção a que corresponda pena ou medida de segurança com carácter perpétuo." Mais tarde, Portugal veio a ratificar a Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen de 14 de Junho de 1985, através de acordo de adesão, ratificada por Decreto do Presidente da República nº 55/93, de 25.11.93. No art. 5º do acordo de adesão ficou estatuído o seguinte: " Para efeitos de extradição entre as Partes Contratantes da Convenção de 1990, a alínea c) de reserva formulada pela República Portuguesa no artigo 1º da Convenção Europeia de Extradição de 13 de Dezembro de 1957 é entendida do seguinte modo: A República Portuguesa não concederá a extradição de pessoas quando reclamadas por infracções a que corresponda pena ou medida de segurança com carácter perpétuo. Todavia, a extradição será concedida sempre que o Estado requerente assegure promover, nos termos da sua legislação e da sua prática em matéria de execução das penas, as medidas de alteração de que poderia beneficiar a pessoa reclamada". Mais tarde, Portugal veio a ratificar a Convenção Estabelecida com base no artigo 12.3 do Tratado da União Europeia, relativa à Extradição entre o Estado Membros da União Europeia, através do Decreto do Presidente da República nº 40/98, de 5.9.98. Conforme estabelece o art. 8º, nº 2, da Constituição da República, as normas constantes das convenções internacionais regularmente ratificadas vigoram na ordem interna após a sua publicação oficial e enquanto circularem internacionalmente o Estado Português. Por sua vez, o nº 1 do art. 3º, da Lei nº 144/99, de 31.8, estabelece que "As formas de cooperação a que se refere o artigo 1º regem-se pelas normas dos tratados, convenções e acordos internacionais que vinculam o Estado Português, na sua falta em insuficiência, pelas disposições deste diploma". Perante tudo quanto acaba de ficar exposto, não pode haver dúvidas de que se encontra em vigor na ordem interna portuguesa as Convenções referidas, com a limitação constante do art. 5º do Acordo de Adesão. Daí que tenhamos que ver se a República Francesa, com as atitudes que tomou ao solicitar a extradição do ora recorrente, assegurou "promover nos termos da sua legislação e da sua prática em matéria de execução das penas, as medidas de alteração de que poderia beneficiar a pessoa reclamada". Como consta do acima referido, a República Francesa, através do seu Ministério da Justiça, esclareceu que a extradição é apenas para efeito de o extraditando ser julgado pelos factos cometidos a 20.2.02, por um lado, e, por outro, que, de acordo com a lei francesa, praticamente não é executada a pena de prisão perpétua, saindo o agente sujeito a tal pena após cerca de 17 anos de prisão em regime de liberdade condicional. Em face dos textos das garantias fornecidas pela República Francesa - ver fls. 74, 84, 93 e 95 - somos levados a crer que o extraditando o será apenas em relação aos factos imputados ao ora recorrente e levados a cabo a 20.2.02, não lhe podendo, pois, ser sacada qualquer responsabilidade por actos anteriores; e que não irá cumprir prisão perpétua, uma vez que esta e por imperativo legal, tendencialmente o não é. Sendo a República Francesa parte contratante das aludidas Convenções, não pode deixar de saber quais as obrigações que para si resultam dos mesmos, pelo que nos parece que um comportamento violador de tais obrigações terá que ser afectado. Dentro deste entendimento, pode citar-se o acórdão deste S.T.J. de 1.3.2001, Proc. nº 606/02, 5ª. Por tudo isto, parece-nos inteiramente correcta a decisão recorrida, por estar de acordo com as Convenções Internacionais em vigor em Portugal -incluindo as reservas feitas pelo Estado Português- pelo que nenhuma norma constitucional portuguesa se mostra, por isso ofendida. Nestes termos, acordam em negar provimento ao recurso. Sem tributação (sem prejuízo do que está disposto no art. 73º nº1, da Lei nº 144/99, de 31.8). Lisboa, 8 de Janeiro de 2003 Flores Ribeiro Sousa Martins Borges de Pinho

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