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Acórdão STA de 2011-12-07

01054/11

TribunalSupremo Tribunal Administrativo, 2 Secção
Processo01054/11
Data do Acordão2011-12-07
RelatorFrancisco Rothes
DescritoresReclamação de Acto Praticado pelo Órgão da Execução Fiscal, Acto Administrativo, Acto Judicial, Recurso Jurisdicional, Conhecimento em Substituição, Fundamentação da Sentença, Erro nos Pressupostos de Facto
Nº ConvencionalJSTA00067300
Nº do DocumentoSA22011120701054
Data de Entrada2011-11-22
RecorrenteFazenda Pública
RecorridoA...
VotaçãoUnanimidade
Meio ProcessualREC JURISDICIONAL
ObjectoSENT TAF PORTO PER SALTUM
DecisãoProvido
Área TemáticaDir Proc Tribut Cont - Exec Fiscal, Dir Proc Civ
Legislação NacionalLGT98 ART52 N4 ART77 ART103 N1 CPC96 ART110 ART111 ART158 ART202 ART668 N1 B ART672 N1 ART715 N2 ART726 ART729 ART730 ART749 ART762 N2 CPCI63 ART40 PARUNICO CONST97 ART268 N3 ETAF02 ART26 N1 B
Jurisprudência NacionalAC STA PROC390/10 DE 2010/10/28; AC STA PROC500/10 DE 2011/10/20; AC STA PROC1116/08 DE 2009/02/25; AC TC 80/2003 IN DR IIS DE 2003/03/21; AC STA PROC130/09 DE 2009/04/15; AC TCAN PROC361/11 6BEVIS DE 2011/11/17
Referência a DoutrinaJOAQUIM FREITAS DA ROCHA LIÇÕES DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO 2ED PAG265 PAG297 JORGE DE SOUSA CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VI PAG69 VIII PAG233 E 5ED VII PAG645 PAG646 PAG649 ANTUNES VARELA E OUTROS MANUAL DE PROCESSO CIVIL 2ED PAG689 ALBERTO DOS REIS CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO VV PAG140

Sumário

I - Aos actos (necessariamente sem carácter jurisdicional) praticados pela AT no âmbito da execução fiscal enquanto mera “auxiliar” na prossecução do escopo judicial da execução – actos que não convocam a sua qualidade de exequente/credora e, por isso, não têm natureza administrativa tributária –, são aplicáveis, não as regras que regulam os actos administrativos tributários, mas antes as regras do CPC, que constitui a lei subsidiária em sede de processo de execução fiscal, como decorre da alínea e) do art. 2.º do CPPT. II - Consequentemente, a esses actos não pode aplicar-se nem a doutrina do acto confirmativo nem as regras que regulam a fundamentação dos actos administrativos, sem prejuízo de lhe poderem ser aplicáveis as regras que regulam o caso julgado e a fundamentação das decisões judiciais. III - O Supremo Tribunal Administrativo, ainda que revogue a decisão em consequência da qual foi considerada prejudicada alguma questão, não pode conhecer dessa questão ao abrigo do n.º 2 do art. 715.º do CPC se o tribunal a quo não fixou a factualidade pertinente para o conhecimento da mesma.


Texto Integral

1. RELATÓRIO 1.1 A…… (adiante Executado, Reclamante ou Recorrido), invocando o disposto no arts. 276.º e 278.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), reclamou junto do Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto da decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Vila do Conde que lhe indeferiu o pedido de dispensa de garantia formulado em ordem a obter a suspensão da execução fiscal que contra ele aí corre termos na sequência da impugnação judicial que deduziu contra a liquidação que deu origem à dívida exequenda. 1.2 A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto julgou a reclamação procedente e, em consequência, anulou o acto reclamado. Para tanto, em síntese, · começou por salientar que o acto reclamado não é meramente confirmativo de acto anterior, como sustentou a Fazenda Pública, pois, para além de ser duvidoso que a doutrina do acto confirmativo se possa aplicar relativamente a um acto cuja natureza administrativa não é pacífica, a verdade é que enquanto o acto que esta sustenta ser o confirmado se pronunciou sobre o pedido de dispensa da garantia que o Executado formulou antes da penhora, o acto contra o qual foi deduzida a presente reclamação decidiu o pedido de dispensa de garantia efectuado após a penhora; · pelo mesmo motivo de considerar que o acto reclamado não é confirmativo de acto anterior, também julgou improcedente a invocada excepção da caducidade do direito de reclamar, que assentou no pressuposto de que a contagem do prazo se devia fazer a partir da notificação daquele primeiro acto; · depois, conhecendo do invocado vício de falta de fundamentação (com prioridade sobre o conhecimento do erro sobre os pressupostos de facto, também invocado pelo Reclamante), julgou-o procedente com uma dupla motivação quanto ao pedido de dispensa de garantia: . o indeferimento não pode ser fundamentado com base no despacho que decidiu o anterior pedido de dispensa de garantia (A Juíza considerou que, contrariamente ao que alega o Reclamante, «a Administração Tributária não remete a fundamentação do indeferimento para despacho anterior; o que decorre do despacho reclamado é que o despacho anterior é um fundamento para o novo indeferimento».), porque entre ambos os pedidos e correspondentes decisões ocorreu a penhora e, assim, «as circunstâncias de facto subjacentes à prestação de garantia não são as mesmas, pelo que não pode aquele despacho ser fundamento do novo indeferimento» (As partes entre aspas e com um tipo de letra diferente são transcrições, aqui como adiante.); - o acto reclamado limita-se a afirmar, sem justificar minimamente, que a penhora efectuada não é suficiente para garantir a dívida exequenda; · ainda quanto ao vício de falta de fundamentação, mas relativamente àquilo que considerou ser o pedido subsidiário formulado no requerimento, considerou que a mera determinação «que o reclamante seja informado sobre as garantias a prestar nos termos do artigo 199.º do CPPT» não dá resposta cabal ao requerido por ele, não lhe permitindo ficar esclarecido quanto aos motivos do indeferimento desse seu pedido. 1.3 A Fazenda Pública (adiante também Recorrente) não se conformou com essa sentença e dela interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Norte, apresentando com o requerimento de interposição do recurso as respectivas alegações, que resumiu em conclusões do seguinte teor: « A. A douta sentença padece erro de julgamento de facto que determinou a errada aplicação do direito, em violação, nomeadamente, do disposto nos art.ºs 276º e 277º do CPPT, art.º 77º da LGT e art. 125º do CPA. B. A douta sentença, para firmar a sua decisão, começa por analisar as questões prévias que foram levantadas quer pela Fazenda Pública quer pelo Ministério Público, como a verificação da idoneidade do acto reclamado para ser objecto de reclamação por o mesmo ser meramente confirmativo de outro. C. Assim e quanto a estas questões começa o tribunal a quo por entender que os pressupostos de facto do primeiro indeferimento (em 08.07.2010) da dispensa da prestação da garantia não são os mesmos do segundo indeferimento (em 09.12.2010), pois entre os dois ocorreu a penhora do imóvel, D. donde o acto reclamado não é um acto confirmativo do acto com data de 09.12.2010. E. Ora, ao contrário do que entende o douto tribunal recorrido, a penhora do imóvel em nada altera as circunstâncias que motivaram o OEF para indeferir a pretensão do reclamante à isenção de prestação de garantia, F. uma vez que aquele apresenta um valor patrimonial tributário que fica muito aquém dos ónus resultantes da hipoteca que sobre ele já recaía antes da penhora, G. donde aquela penhora não interfere com a necessidade do reclamante prestar garantia tal como já anteriormente à sua realização tinha sido configurado do processo. H. Assim, o segundo indeferimento é confirmativo do primeiro, pois o que está em causa em ambos é o pedido de isenção de prestação de garantia, pedido esse que é o mesmo, apresenta-se com o essencial do circunstancialismo e pressupostos relevantes já delineados, I. com existência, ou sem ela, da penhora do imóvel, porque o que o reclamante sempre pretendeu foi que lhe fosse reconhecido o direito à isenção de prestação de garantia. J. A penhora entretanto realizada não traz nenhum dado substancial novo, modificativo da relação adjectiva revelada pela execução decisivo para a concessão de isenção ou dispensa de garantia, K. afigurando-se um acto que no trâmite da execução em nada altera o fundo da questão de isenção ou dispensa de garantia e consequente suspensão do processo, até porque, como é expressamente dito no despacho do OEF de 18.11.2010, do qual o reclamante não reagiu, o imóvel penhorado não tem qualquer valor que permita garantir a divida, L. acto de penhora, diga-se, realizado na sequência da tramitação normal e legalmente programada de um processo de execução fiscal, pois como refere o nº 1 do art. 215º do CPFT “Findo o prazo posterior à citação sem ter sido efectuado o pagamento procede-se à penhora”, não se assumindo, no caso, como diligência que altere a situação que previamente já existia. M. A douta sentença considera ainda que, por não ser o acto reclamado meramente confirmativo de um anterior, nos termos já aqui vistos, tal afecta o conhecimento da excepção de caducidade do direito de impugnar invocado pela Fazenda Pública na sua contestação, improcedendo a apelada excepção. N. No entanto, como demonstrou a Fazenda Pública, o acto reclamado é meramente confirmativo do acto de 08.07.2010 no sentido de que não é o acto reclamado que afecta os direitos e interesses legítimos protestados pelo reclamante, ao invés do que se afirma na sentença recorrida, O. donde a lesividade que o reclamante invoca para suportar o direito ao uso do processo de reclamação previsto no art. 276º do CPPT já teria ocorrido àquela data, P. pelo que, não tendo o reclamante feito uso, no prazo legalmente imposto do meio processual adequado para reagir contra o acto, alegadamente lesivo, aquele firmou-se na ordem jurídica como caso decidido. Q. O procedimento administrativo ou o processo judicial é composto por fases sequenciais, logicamente encadeadas, pelo que a omissão da prática de um qualquer acto correspondente a uma certa fase retira a faculdade de o praticar numa outra. R. Pelo que, in casu, não tendo o reclamante, no andamento do processo de execução fiscal, reagido no prazo devido de acto que se deve considerar originariamente lesivo, não pode vir, mais à frente, por apelo ao mesmo enquadramento jurídico/fáctico, repor a falta de prática de um acto, que no tempo e nas circunstâncias próprias e adequadas, omitiu. S. Assim, entende a Fazenda Pública que, quando o reclamante apresenta a reclamação judicial, em 28.12.2010, surgida na sequência do acto praticado pelo OEF em 09.12.2010, já há muito havia precludido o direito ao uso daquele meio processual, na medida em que, como vimos, o acto lesivo ocorreu com o despacho de 08.07.2010, devendo o prazo de 10 [dias] para reagir judicialmente contar-se a partir desta data. T. Entende ainda a Fazenda Pública que, caso não se afira a lesividade pelo acto indicado nos termos expostos, ela sempre se verificará em relação ao acto subsequente. U. Assim, em 18.11.2010 o OEF, na sequência do pedido do reclamante para, face à penhora do imóvel, suspender a execução, considerou que o valor do imóvel para efeitos de garantia é o seu valor patrimonial abatido dos ónus que sobre eles estejam registados, V. valor patrimonial que era de €199.606,88. sendo os ónus que incidiam sobre o imóvel de € 250.360,00, cfr. informação que resulta dos autos, W. pelo que decidiu que o imóvel penhorado não tinha valor para garantir a dívida. X. Donde, atendendo à pretensão sempre manifestada do reclamante no sentido de obter a isenção da prestação da garantia, este deveria ter reagido, senão antes, deste despacho, na medida em que o imóvel penhorado não tinha valor que permitisse garantir a dívida, atendendo aos ónus que lhe recaiam, redundando afinal numa diligência estéril do ponto de vista da cobrança, Y. levando o OEF a reiterar a pronúncia no sentido de indeferir o pedido de suspensão da execução, uma vez que, tal como até aí, a dívida não se encontrar garantida. Z. Por fim, vem a douta sentença decidir julgar procedente a reclamação perante a manifesta falta de fundamentação do acto objecto da presente reclamação. AA. E alega para o efeito que o despacho reclamado indefere o pedido principal de dispensa da prestação de garantia invocando dois fundamentos: o despacho anterior de indeferimento do mesmo pedido (datado de 08.07.201.0) e a insuficiência do valor do imóvel penhorado para garantia da dívida, BB. considerando que o OEF considerou o despacho de 08.07.2010 um fundamento para o novo indeferimento. CC. Ora, salvo o devido respeito, o douto tribunal fez uma leitura incorrecta do despacho de 09.12.2010. DD. Assim, daquele despacho resulta que o OEF mantém todas as decisões de indeferimento anteriormente proferidas em matéria de garantias, incluindo, claro, a de 08.07.2010, EE. decisões várias, como se comprova dos factos dados como provados pelo tribunal a quo, e que foram promovidas em datas distintas, FF. mas tendo sempre por base o pedido de dispensa de prestação de garantia e consequente suspensão da execução fiscal. GG. Assim, na decisão de indeferimento foram consideradas as decisões tomadas ao longo do processo e que versavam sobre o mesmo pedido, objecto e fundamentos, nomeadamente para efeitos do art. 56º, nº2, al. a), da LGT, e que foram, em devido tempo, notificadas ao reclamante, ficando-se o despacho reclamado pela confirmação do já decidido, HH. decisões que aquele, como já vimos, aceitou, deixando consolidar na ordem jurídica as razões do indeferimento oportuno da pretensão da dispensa da prestação de garantia. II. Quanto ao dito na douta sentença de o despacho reclamado ser conclusivo no sentido da insuficiência do valor do imóvel penhorado para a garantia da dívida, e de não apresentar as premissas susceptíveis de levar a tal conclusão. JJ. como vimos no ponto anteriores, o despacho remete para decisões já anteriormente proferidas e que foram notificadas ao reclamante, mormente a decisão proferida em 18.11.2010, KK. onde é cabalmente informado o reclamante de que, sendo o VPT do imóvel de € 199.666,88 e incidindo sobre o mesmo ónus no valor de € 250.360,00, LL. e que sendo o valor do imóvel para efeitos de garantia o seu VPT abatido dos ónus, aquele não tem valor que lhe permita garantir a dívida. MM. Ora, a justificação da insuficiência do valor do imóvel penhorado é terminantemente salientada no despacho de 18.11.2010, tal como se expôs, informação que a douta sentença sequer pondera para decidir esta questão como decidiu. NN. Quanto ao pedido subsidiário entende o douto tribunal recorrido que o OEF não deu resposta cabal ao requerido pela reclamante, de modo a esclarecer um eventual indeferimento desse seu pedido. OO. Ora, assim não se pode entender. PP. O OEF ao mandar informar o reclamante de que as garantias a prestar são as previstas no art. 199º do CPPT está a remetê-lo para a norma tributária que prevê quais as garantias que o legislador considera como idóneas para efeitos da obtenção da suspensão da execução fiscal, QQ. donde, se o reclamante, dando cumprimento ao estatuído na norma indicada, indicasse uma garantia idónea dentre as que a lei admite, colocar-se-ia em condições mais favoráveis de o OEF deferir o pedido, porque umas de tais garantias estaria sujeita a uma menor precariedade ou discricionariedade na sua aceitação. RR. Ao invés, e contraditoriamente ao argumentado no requerimento de 07.07.2010. em que manifesta um conhecimento suficiente das possíveis garantias a prestar a propósito do pedido da sua dispensa, SS. não tem cabimento requerer ao OEF que sugira ao reclamante, em abstracto uma ou algumas formas de garantia a prestar, até porque ninguém melhor que o reclamante conhece sua a situação económica e financeira para ajuizar da conveniência de uma ou outra forma de garantia TT. Como tal, o despacho reclamado, remetendo para os termos da lei, não padece da falta de fundamentação apontada. Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida, com as legais consequências». 1.4 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito suspensivo. 1.5 O Reclamante não contra alegou. 1.6 O Tribunal Central Administrativo Norte declarou-se incompetente em razão da hierarquia, declarando que a competência para conhecer do presente recurso é do Supremo Tribunal Administrativo, ao qual os autos foram remetidos a requerimento da Recorrente. 1.7 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja concedido provimento ao recurso, remetendo para a posição assumida pelo Representante do Ministério Público junto do Tribunal Central Administrativo Norte e que, em síntese, sustentou o seguinte: - o despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Vila do Conde ora reclamado «tem os mesmos contornos fácticos e jurídicos daquele que foi proferido pelo mesmo órgão do PEF em 8.07. 0102» pois «[a]mbos os actos têm por objecto a apreciação do pedido de dispensa de prestação de garantia» e, concordando-se que seja duvidoso que o pedido de dispensa de prestação de garantia dê origem a um procedimento administrativo, a verdade é que a decisão de 8 de Julho de 2010 se consolidou na ordem jurídica, motivo por que, se não pela natureza confirmativa da segunda decisão, por força do «efeito do caso julgado quanto à decisão de mérito do pedido de isenção de prestação de garantia» sempre «será de concluir pela inadmissibilidade da presente reclamação»; se assim não se entender, - não se verifica a falta de fundamentação que determinou a procedência da reclamação uma vez que a decisão reclamada remete para a anterior decisão de indeferimento do pedido de dispensa de garantia, resultando que «perante sucessivos pedidos de dispensa de garantia, o fundamento para o respectivo indeferimento foi sempre a falta de prova sobre a alegada inexistência de bens penhoráveis»; por outro lado, «não será a falta de pronúncia sobre o pedido subsidiário, consubstanciado na sugestão de outro meio de garantia, que relevará para a falta de fundamentação do acto reclamado» uma vez que «[o]s meios e formas de prestação de garantia estão indicados na lei» e ao órgão de execução fiscal «não cabe a obrigação legal de apreciar o pedido subsidiário, pelo que a não pronúncia, sendo legal, não pode constituir omissão de fundamentação do acto reclamado»; a ser concedido provimento ao recurso apenas quanto a este segundo fundamento invocado (relativo à falta de fundamentação do acto reclamado), - não é possível conhecer do invocado vício de violação de lei por falta de fixação da pertinente base factual, impondo-se a baixa do processo à 1.ª instância para esse efeito. 1.8 Dispensaram-se os vistos dos Juízes adjuntos, atento o carácter urgente do processo. 1.9 As questões suscitadas pela Recorrente são as de saber se a sentença recorrida fez correcto julgamento quando considerou que, - o acto reclamado é susceptível de impugnação judicial, o que passa por indagar se o mesmo é meramente confirmativo de acto anterior ou, pelo menos, se está a coberto do caso decidido formado por anterior decisão proferida no mesmo processo (cfr. conclusões B) a Y)); - o acto reclamado enferma de falta de fundamentação, quer por não justificar por que indeferiu o pedido de dispensa de garantia (cfr. conclusões Z) a MM)), quer por não dar resposta ao pedido de informação sobre os demais meios de prestar garantia (cfr. conclusões NN) a TT)).* * *2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1 DE FACTO A sentença recorrida efectuou o julgamento da matéria de facto nos seguintes termos: «Para a decisão da causa, resultam provados os seguintes factos, por ordem lógica e cronológica: 1. Em 23.05.2010, foi instaurado o processo de execução fiscal com o n.º 1902 2010 01019058 contra o reclamante para pagamento da quantia de € 155.351,46, respeitante a liquidação adicional de IVA e juros compensatórios. 2. Em 28.05.2010, o reclamante assinou aviso de recepção relativo a “Citação” que lhe foi enviada pelo Serviço de Finanças de Vila do Conde, por referência ao processo de execução fiscal acima referido - cfr. fls. 4 dos autos. 3. Em 11.06.2010, deu entrada no Serviço de Finanças de Vila do Conde requerimento do reclamante pedindo, no âmbito do processo de execução fiscal em causa, a sua notificação “(...) do valor e prazo exacto da garantia a apresentar com vista à imediata suspensão do processo (...)”- cfr. fls. 5 e 6 dos autos. 4. Em 14.06.2010, foi dirigido ao reclamante, no âmbito do processo de execução fiscal em causa, o oficio n.º 7154/1902-30 do Serviço de Finanças de Vila do Conde, sob o “Assunto: notificação do valor da garantia”, com o seguinte teor: “Em resposta ao requerimento apresentado em 11 de Junho de 2010, informo que o valor da garantia a aprestar no processo de execução fiscal n.º 1902 2010 01019058, é de 160. 238,12 €(...).”- cfr. fls. 7 dos autos. 5. Em 07.07.201 0, deu entrada no Serviço de Finanças de Vila do Conde requerimento do reclamante pedindo, no âmbito do processo de execução fiscal em causa, a “(...) dispensa da prestação da garantia com os seguintes fundamentos: 1. O executado tem como único meio de subsistência os rendimentos do trabalho que aufere de acordo com o que consta das suas declarações de rendimentos. 2. Em face desse facto, o requerente não dispõe dos meios económicos ou patrimoniais necessários à prestação de uma garantia bancária ou equivalente, suficiente para caucionar a quantia aqui em execução. 3. Por outro lado, não pode prestar outro tipo qualquer de garantia, sob pena de sofrer um prejuízo irreparável. 4. Esta impossibilidade não se deve a qualquer comportamento ou atitude sua, mas a factores externos, nomeadamente a grave crise que afecta o país. (...)”- cfr. fls. 5 e 6 dos autos. 6. Em 08.07.2010, foi emitida “Informação” pelo Serviço de Finanças de Vila do Conde, por referência ao requerimento apresentado pelo reclamante em 07.07.2010, com o seguinte teor “(...) informo que, efectuada consulta à base de dados, se verifica que: - O contribuinte é sócio da sociedade B……, Lda, desde 2006; - O contribuinte é proprietário do prédio inscrito na matriz urbana sob o artigo 1521, fracção D, da freguesia de Carnide, concelho de Lisboa. (…)” - cfr. fls. 10 dos autos. 7. Em 08.07.2010, sobre a “Informação” da mesma data, recaiu “Despacho” do Chefe do Serviço de Finanças de Vila do Conde com o seguinte teor “Face à informação supra e uma vez que não foi provada a insuficiência de bens penhoráveis, não estão reunidos os pressupostos do n.º 4 do artigo 52.º da Lei Geral Tributária e n.º 3 do artigo 199º do CPPT, pelo que indefiro o pedido de dispensa da prestação de garantia.”- cfr. fls. 10 dos autos. 8. Em 09.07.2010, foi dirigido ao reclamante, no âmbito do processo de execução fiscal em causa, o ofício nº 8160/1902-30 do Serviço de Finanças de Vila do Conde, sob o “Assunto: indeferimento de dispensa de prestação de garantia”, com o seguinte teor: “Em resposta ao solicitado no requerimento apresentado a 7 de Julho de 2010, fica V. Exa. notificado que, uma vez que não foi provada a insuficiência de bens penhoráveis, não estão reunidos os pressupostos contidos no nº 4 do artigo 52º da Lei Geral Tributária e do nº 3 do artigo 199º do Código de Procedimento e Processo Tributário, foi indeferido o pedido de dispensa de prestação de garantia. A falta de apresentação da citada garantia implica o prosseguimento dos autos (...).” - cfr. fls. 11 dos autos. 9. Em 14.07.2010, o reclamante assinou aviso de recepção referente ao ofício datado de 09.07.2010 - cfr. fls. 11 (verso). 10. Em 03.08.2010, deu entrada no Serviço de Finanças de Vila do Conde requerimento do reclamante, por referência ao processo de execução fiscal nº 1902 2010 01019058 e ao processo de contra-ordenação fiscal com o nº 1902 2009 06053130 com o seguinte teor: “(...) Vem a este serviço de finanças dar conhecimento que deu entrada no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, no passado dia 27 de Julho, impugnação judicial das liquidações de IVA e juros compensatórios que lhes deram origem, com o que requer, nos termos da lei a suspensão dos mencionados processos até ao trânsito em julgado da decisão que lhes ponha termo. (...)” - cfr. fls. 12 dos autos. 11. Em 06.08.2010, foi efectuada penhora sobre a fracção B do prédio urbano sito na Rua ..., n.º ..., propriedade do reclamante, para garantia do pagamento da quantia exequenda de € 163.345,14 - cfr. fls. 46 a 56 dos autos. 12. Em 25.10.2010, deu entrada no Serviço de Finanças de Vila do Conde requerimento do reclamante, por referência ao processo de execução fiscal nº 1902 2010 01019058, com o seguinte teor “(...) Tendo sido notificado da penhora efectuada no referido processo de execução fiscal, vem (...) expor a V. Exª o seguinte. 1. A divida exequenda respeita a liquidação adicional de IVA e juros compensatórios respectivos relativamente às quais foi apresentada a 27 de Julho último, impugnação judicial (...). 2. Assim sendo, em face do valor do bem penhorado de acordo com a notificação acima recebida, encontra-se integralmente garantida a dívida exequenda e acrescido, 3. Termos em que deverá, de ora em diante, suspender-se o processo de execução fiscal até decisão final do processo judicial interposto relativamente à legalidade da dívida exequenda. (…)”. - cfr. fls. 58 dos autos. 13. Em 28.10.2010, foi emitida “Informação” pelo Serviço de Finanças de Vila do Conde, por referência ao requerimento apresentado pelo reclamante em 25.10.2010, com o seguinte teor “(...) informo que: - Em 14 de Junho foi notificado para apresentar garantia no valor de 160.238,12 euros, o que não fez - Em 27 de Agosto de 2010, foi penhorado no SIPA um imóvel de valor patrimonial igual a 199.666,88 euros. - O mesmo imóvel encontra-se onerado em 250.360,00 euros. - Não se encontra garantido o processo. (…)” - cfr. fls. 71 dos autos. 14. Em 28.10.2010, sobre a “Informação” da mesma data, recaiu “Despacho” do Chefe do Serviço de Finanças de Vila do Conde com o seguinte teor “A notificar o contribuinte do indeferimento do pedido de suspensão e apresentação de garantia de forma a suspender o processo (...).” - cfr. fls. 71 dos autos. 15. Em 02.11.2010, foi dirigido ao reclamante, no âmbito do processo de execução fiscal em causa, o ofício n.º 12332/1902-30 do Serviço de Finanças de Vila do Conde, sob o “Assunto: notificação de despacho”, com o seguinte teor “Junto tenho a honra de enviar cópia de despacho de indeferimento do pedido de suspensão do processo efectuado a 25 de Outubro de 2010 (...).”- cfr. fls. 72 dos autos. 16. Em 04.07.2010, o reclamante assinou aviso de recepção referente ao ofício datado de 02.11.2010 - cfr. fls. 72 (verso) dos autos. 17. Em 16.11.2010, deu entrada no Serviço de Finanças de Vila do Conde requerimento do reclamante, por referência ao processo de execução fiscal nº 1902 2010 01019058, com o seguinte teor “(...) Tendo sido notificado do Despacho do órgão de execução fiscal, junto ao ofício nº 12332/1902-30, de 02 de Novembro de 2010 (...) vem (...) expor e requerer a V. Exa. o seguinte. (...) nos termos do artigo 37.º do CPPT, a notificação da fundamentação clara e inequívoca do despacho acima identificado, incluindo, bem assim, a clarificação das conclusões que dele deve o executado retirar. (...)” - cfr. fls. 73 e 74 dos autos. 18. Em 18.11.2010, relativamente ao requerimento de 16.11.2010, foi emitido “Despacho” pelo Chefe do Serviço de Finanças de Vila do Conde com o seguinte teor “Nos termos das normas legais em vigor, o valor do imóvel para efeitos de garantia é o seu valor patrimonial abatido dos ónus que sobre ele estejam registados Tendo por base este princípio, o imóvel já penhorado não tem valor que permita garantir a dívida, pelo que indefiro o pedido (...).”- cfr. fls. 75 dos autos. 19. Em 19.11.2010, foi dirigido ao reclamante, no âmbito do processo de execução fiscal em causa, o ofício n.º 13331/1902-30 do Serviço de Finanças de Vila do Conde, sob o «Assunto: indeferimento de pedido”, com o seguinte teor: “Em resposta ao solicitado no requerimento apresentado a 17 de Novembro de 2010, fica V. Exa. notificado que, por despacho do Chefe de Finanças e nos termos das normas legais em vigor, o valor do imóvel para efeitos de garantia é o seu valor patrimonial abatido dos ónus que sobre ele estejam registados. Tendo por base este princípio, o imóvel penhorado não tem valor que permita garantir a dívida, pelo que foi indeferido o seu pedido, mantendo-se o valor da garantia de que foi notificado em 16 de Junho, de 160.238,12 euros. A falta de apresentação da citada garantia implica o prosseguimento dos autos. (...).” - cfr. fls. 76 dos autos. 20. Em 28.11,2010, o reclamante assinou aviso de recepção referente ao ofício datado de 19.11.2010 - cfr. fls. 76 (verso) dos autos. 21. Em 07.12.2010, deu entrada no Serviço de Finanças de Vila do Conde requerimento do reclamante, por referência ao processo de execução fiscal nº 1902 2010 01019058, com o seguinte teor: “(...) Tendo sido notificado do ofício nº 13331/1902-30, de 19 de Novembro de 2010 (...) vem (...) expor e requerer a V. Exa. o seguinte. (...) 14. Encontrando-se o executado impossibilitado de obter ou prestar qualquer outra garantia, para além da já penhorada casa de família, 15. Tendo este valor suficiente para, em situação de mercado e numa hipótese de improcedência da impugnação instaurada, poder garantir a totalidade da dívida e acrescidos, 16. Vem o executado requerer a V. Exas. a dispensa, nos termos da lei de prestação de outra garantia para além da já existente penhora, pois que se encontram inequivocamente preenchidos os requisitos para tal impostos pelo nº 4 do artigo 52º da LGT, ou em alternativa e caso assim se não entenda, 17. A sugestão de outro meio idóneo e materialmente exequível para o executado de se obter o objectivo pretendido de suspender o processo de cobrança coerciva da dívida em disputa judicial (...)”- cfr. fls. 79 e 80 dos autos. 22. Em 09.12.2010, relativamente ao requerimento de 07.12.2010, foi emitido “Despacho” pelo Chefe do Serviço de Finanças de Vila do Conde com o seguinte teor “Uma vez que, por meu despacho de 08/07/2010, foi indeferido o pedido de dispensa da prestação de garantia e que o valor do imóvel penhorado não é suficiente para a garantia da dívida, mantenho todas as decisões de indeferimento anteriormente proferidas em matéria de garantias. Quanto à sugestão de outro meio idóneo, informe-se o executado que as garantias a prestar são as previstas no artigo 199º do CPPT. Notifique a mandatária (...).”- cfr. fls. 81 dos autos. 23. Em 13.12.2010, foi dirigido ao reclamante, no âmbito do processo de execução fiscal em causa, o ofício n.º 14080/1902-30 do Serviço de Finanças de Vila do Conde, sob o “Assunto: indeferimento de dispensa de prestação de garantia”, contendo o teor do despacho de 09.12.2010 - cfr. fls. 83 dos autos. 24. Em 15.12.2010, o reclamante assinou aviso de recepção referente ao ofício datado de 13.12.2010 - cfr. fls. 82 (verso) dos autos. 25. Em 27.12.2010, o reclamante enviou, por fax, para o Serviço de Finanças de Vila do Conde a petição da presente reclamação - cfr. fls. 84 dos autos.*Não se provaram quaisquer outros factos para além dos referidos». 2.2 DE DIREITO 2.2.1 DA IMPUGNABILIDADE DA DECISÃO RECLAMADA A primeira questão que cumpre apreciar e decidir é a que respeita à inimpugnabilidade do acto reclamado, questão que foi também invocada pela Fazenda Pública na contestação, a nosso ver menos correctamente, sob a óptica da caducidade do direito de reclamar. Sustenta a Recorrente, como tinha já feito na contestação, que o acto reclamado não é susceptível de reclamação porque é um acto meramente confirmativo de acto anterior contra o qual o Executado não reagiu. Isto, porque entende que o Serviço de Finanças de Vila do Conde tinha já decidido requerimento de dispensa de prestação de garantia anteriormente apresentado e que, apesar do Executado ter de novo feito tal pedido após a realização da penhora, esta «em nada altera as circunstâncias que motivaram o OEF para indeferir a pretensão do reclamante à isenção da prestação de garantia» (cfr. conclusão E.). A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto não atendeu essa invocação. Primeiro, começou – e bem, dizemo-lo desde já – por, louvando-se num acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, questionar a possibilidade de utilizar a doutrina do acto confirmativo para justificar a inimpugnabilidade de reclamar judicialmente da decisão do órgão de execução fiscal de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia por não ser pacífico que se possa configurar que esse pedido dá origem a procedimento administrativo. Apesar disso, resolveu avançar no sentido da averiguação da natureza do acto reclamado como confirmativo; e concluiu pela negativa com o fundamento de que, pressupondo o acto confirmativo a manutenção dos pressupostos de facto e de direito em que se baseou o acto confirmado, no caso sub judice, entre as decisões do primeiro e do segundo pedidos de dispensa de prestação de garantia (que a Fazenda Pública sustenta constituírem o acto confirmado e confirmativo, respectivamente), ocorreu um facto - a penhora - que constitui pressuposto do segundo pedido. Assim, concluiu, no que a esta questão respeita, que «os pressupostos de facto do primeiro indeferimento da dispensa de prestação de garantia (em 08.07.2010, anterior à penhora) não são os mesmos do segundo indeferimento, correspondente ao acto reclamado (posterior à penhora)» e, daí, que inexiste o referido obstáculo à impugnabilidade do acto reclamado. A Recorrente discorda deste entendimento. Em síntese, afirma que não podem subsistir dúvidas quanto à natureza do acto reclamado como acto confirmativo do acto praticado em 8 de Julho de 2010 e que, não tendo o Executado reagido contra este acto, que se firmou na ordem jurídica como caso decidido, não pode agora reclamar do acto que se limitou a confirmá-lo. Desde logo, afigura-se-nos que a Recorrente incorre num erro manifesto na caracterização de um acto como confirmativo. Na verdade, como bem salientou a Juíza do Tribunal a quo, um acto só pode considerar-se como confirmativo se se mantiverem os pressupostos de facto e de direito em que se baseou o acto confirmado: «A relação de confirmatividade entre dois actos administrativos pressupõe, além do mais, que se mantenham inalteradas, entre a prolação do primeiro e a prática do segundo, as circunstâncias de facto e de direito» (Neste sentido, para além do citado na sentença recorrida, vide, entre muitos outros e por mais recentes, os seguintes acórdãos da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: - de 28 de Outubro de 2010, proferido no processo com o n.º 390/10, publicado no Apêndice ao Diário da República de 28 de Julho de 2011 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2010/32140.pdf), págs. 2513 a 2516, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/608171a44d6fce9a802577d000452ab5?OpenDocument; - de 20 de Outubro de 2011, proferido no processo com o n.º 500/10, ainda não publicado no jornal oficial, mas disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/ada0cf92bd9c34d080257935004b4da1?OpenDocument, sendo a citação efectuada retirada deste último.). Ou seja, só terá natureza confirmativa o acto que, emanado da mesma entidade, e dirigido ao mesmo destinatário, apresenta objecto e conteúdo idênticos, limitando-se a repetir a anterior decisão perante idênticos pressupostos de facto e de direito. Ora, na situação sub judice nunca poderia afirmar-se a identidade dos pressupostos de facto porque, como bem ficou dito na sentença recorrida, entre um acto e outro se verificou uma alteração desses pressupostos, qual seja a realização da penhora. Pretende a Recorrente desvalorizar tal facto, com a argumentação de que a penhora «em nada altera as circunstâncias que motivaram o OEF para indeferir a pretensão do reclamante à isenção da prestação de garantia» (cfr. conclusão E.). E acrescenta, explicando, «uma vez que aquele [prédio penhorado] apresenta um valor patrimonial tributário que fica muito aquém dos ónus resultantes da hipoteca que sobre ele já recaía antes da penhora», «aquela penhora não interfere com a necessidade do reclamante prestar garantia tal como já anteriormente à sua realização tinha sido configurado no processo» (cfr. conclusões F. e G., respectivamente). Salvo o devido respeito, a argumentação da Recorrente enferma de um erro manifesto: o que importa não é o juízo que a Administração faça sobre a relevância do facto novo, ou seja, do facto que tenha ocorrido entre a prática dos actos ditos confirmado confirmativo; o que importa é a ocorrência desse facto que haja de ser valorado como pressuposto do segundo acto. Aliás, da argumentação da Recorrente não resulta sequer que esta não tenha procedido à valoração deste novo facto – a penhora do imóvel do Executado –, embora para concluir pela irrelevância do mesmo para a decisão no sentido da dispensa da prestação de garantia. O que podemos concluir, com segurança, é que não é o resultado do juízo efectuado pela Administração relativamente ao novo pressuposto de facto que releva para efeito de averiguar da confirmatividade do acto. A não ser assim, bastaria à AT desconsiderar qualquer novo pressuposto fáctico para afirmar a natureza confirmativa do acto e, consequentemente, a irrecorribilidade contenciosa do mesmo. Mas, como procuraremos demonstrar de seguida, a afirmação da impugnabilidade do acto reclamado não encontra a sua justificação na natureza não confirmativa de acto anterior. Na verdade, como bem começou por referir a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, não é pacífico que o pedido de dispensa da prestação de garantia dê início a um procedimento administrativo. Indo mais longe, não é pacífico que o acto reclamado – acto que indeferiu o pedido de dispensa de garantia formulado pelo Executado em ordem a obter a suspensão da execução fiscal que contra ele corre termos na sequência da impugnação judicial que deduziu contra a liquidação que deu origem à dívida exequenda – esteja sujeito às regras que regulam os actos materialmente administrativos, designadamente os actos administrativos tributários. Vejamos: O processo de execução fiscal tem natureza judicial, expressamente reconhecida pelo art. 103.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária (LGT) (Diz o art. 103.º, n.º 1, da LGT: «O processo de execução fiscal tem natureza judicial, sem prejuízo da participação dos órgãos da administração tributária nos actos que não têm natureza jurisdicional».). Como resulta deste preceito legal, admite-se que a Administração tributária (AT) pratique actos naquele processo, apenas lhe estando vedada a prática daqueles que tenham natureza jurisdicional («De aplicação da norma ao caso em concreto, mas resolvendo um litígio ou um conflito de pretensões» (JOAQUIM FREITAS DA ROCHA, Lições de Procedimento e Processo Tributário, Coimbra Editora, 2.ª edição, pág. 265).), que os princípios consagrados nos arts. 110.º, 111.º e 202.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) (Princípios da separação dos poderes e âmbito da função jurisdicional.) impõem que fique reservada ao tribunal, numa distribuição de competências a que o legislador ordinário deu concretização através dos arts. 10.º, n.º 1, alínea f) (Preceito que determina: «1. Aos serviços da administração tributária cabe: […] f) Instaurar os processos de execução fiscal; […]».), e151.º do CPPT (Na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2011), reza o art. 151.º, n.º 1, do CPPT: «1. Compete ao tribunal tributário de 1ª instância da área onde correr a execução, depois de ouvido o Ministério Público nos termos do presente Código, decidir os incidentes, os embargos, a oposição, incluindo quando incida sobre os pressupostos da responsabilidade subsidiária, e as reclamações dos actos materialmente administrativos praticados pelos órgãos da execução fiscal. 2. O disposto no presente artigo não se aplica quando a execução fiscal deva correr nos tribunais comuns, caso em que cabe a estes tribunais o integral conhecimento das questões referidas no número anterior».) Mas, o facto de a AT poder praticar no processo de execução fiscal actos de natureza não jurisdicional não implica que todos os actos por ela praticados naquele processo constituam actos administrativos em sentido estrito. No âmbito do processo de execução fiscal, a AT pratica, não só actos administrativos de natureza tributária, que lhe competem na sua condição de exequente, quando o seja, mas também outros actos processuais, cuja competência lhe está cometida enquanto órgão da execução fiscal, nos termos do disposto no já referido art. 10.º, n.º 1, alínea f), do CPPT. Relativamente a estes últimos, a lei constitucional não impõe que hajam de ser praticados por um juiz, podendo o legislador ordinário atribuir a competência para o efeito a um funcionário ou ao juiz, desde que, no primeiro caso, fique salvaguardada a possibilidade de discutir judicialmente a sua legalidade, sob pena de violação do art. 20.º da CRP (Cfr. o acórdão n.º 80/2003 do Tribunal Constitucional, publicado no Diário da República, II Série, n.º 68, de 21 de Março de 2003, (http://dre.pt/pdf2sdip/2003/03/068000000/0452604528.pdf), págs. 4526 a 4528, também disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20030080.html.)). Ou seja, no processo de execução fiscal, sendo certo que está vedada à AT a prática de actos jurisdicionais, é-lhe permitida a prática quer de actos administrativos de natureza tributária, que respeitam à dívida tributária e integram procedimentos tributários (v.g., a reversão, a dação em pagamento, o pagamento em prestações, a aprovação de garantias (Neste sentido, o acórdão desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Abril de 2009, proferido no processo com o n.º 130/09, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Setembro de 2009 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2009/32220.pdf), págs. 547 a 550, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/80951b7d1748e6668025759f004efccb?OpenDocument.), em que estamos perante actos «praticados por entidades diferentes do órgão da execução fiscal, na sequência de procedimentos tributários autónomos, que correm paralelamente ao processo de execução fiscal e em conexão com ele» (Vide o acórdão desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 25 de Fevereiro de 2009, proferido no processo com o n.º 1116/08, publicado no Apêndice ao Diário da República de 30 de Abril de 2009 (http://www.dre.pt/pdfgratisac/2009/32210.pdf), págs. 321 a 326, também disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/05868b3c29c9dc3c8025756f00556c32?OpenDocument.)),cuja prática está reservada à AT enquanto exequente, enquanto credora (Podendo, inclusive, não ser do órgão da execução fiscal, mas de outra autoridade da AT.), quer de actos de natureza processual, constituindo alguns meras operações materiais (remessa do título executivo ao órgão da execução, instauração da execução) e outros actos judiciais de tramitação processual sem natureza jurisdicional (citação, penhora, venda), cuja prática o legislador pôs a cargo da AT enquanto órgão da execução fiscal, a qual age aí como um mero “auxiliar” (Aliás, era como juiz auxiliar que o Código de Processo das Contribuições e Impostos se referia ao chefe da repartição de finanças (cfr. art. 40.º, § único), a quem, fora de Lisboa e do Porto, competia instaurar os processos de execução fiscal e realizar os actos a eles respeitantes, com excepção dos de natureza jurisdicional e sempre com recurso para o juiz do tribunal tributário.) na prossecução do escopo judicial da execução (a cobrança das dívidas), numa «colaboração operacional com a administração da justiça segundo os termos em que esta se encontra cometida pela Constituição aos tribunais» (Vide o acórdão referido em (10).) A natureza destes últimos actos, que não tenham natureza administrativo-tributária, é discutível, mas será idêntica à dos actos de natureza não jurisdicional que são praticados no âmbito de todos os processos judiciais. É certo que todos estes actos estão sempre sujeitos ao controlo judicial, como resulta do disposto no art. 103.º, n.º 2, da LGT, controlo que, quando efectuado a pedido dos interessados, se concretiza através do meio processual previsto no art. 276.º do CPPT e que o legislador denominou reclamação. É através desse meio que os interessados (executado ou outros) podem reagir contra todos os actos praticadas por órgãos administrativos no âmbito da execução fiscal, independentemente da natureza que estes possam revestir. Aliás, é essa diversidade da natureza dos actos praticados pela AT na execução fiscal que gera as consabidas dificuldades de conceptualização deste meio processual (JOAQUIM FREITAS DA ROCHA refere que esta reclamação «tem um misto de recurso contencioso – pois trata-se do controlo de um acto de um órgão administrativo por parte do tribunal – e de recurso jurisdicional – na medida em que o acto a ser controlado pelo tribunal é um acto praticado num processo» (ob. cit., pág. 297).) e dá origem a várias críticas dirigidas à sua inadequada denominação como reclamação (JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 5.ª edição, volume II, anotação 2. ao art. 276.º, págs. 645/647.) Dito isto, e estes considerandos já vão mais longos do que nos propúnhamos, regressemos à questão nuclear, de saber se a decisão reclamada pode, ou não, considerar-se como um acto administrativo em sentido estrito. A nosso ver, não. O pedido de dispensa de prestação de garantia não dá origem a qualquer procedimento de natureza tributária; a dispensa da prestação de garantia visa apenas disciplinar os termos em que a execução pode ficar suspensa ou prosseguir, integrando o quadro normativo que regula o seu andamento. Daí que a decisão desse pedido fique a cargo da AT, não enquanto exequente, enquanto credora, no exercício da actividade tributária, mas simplesmente enquanto órgão da execução fiscal, ou seja, no exercício das funções que lhe estão confiadas enquanto auxiliar ou colaborador operacional no processo de execução fiscal. A decisão que recair sobre esse pedido é, nas impressivas palavras da declaração de voto lavrada no acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 30 de Novembro de 2011, um mero acto judicial (de natureza não jurisdicional) sujeito a estritas regras processuais (Porque o acórdão ainda não está publicado no jornal oficial nem disponível do sítio da Direcção-Geral dos Serviços Informáticos (http://www.dgsi.pt/), permitimo-nos aqui transcrever, na parte que se nos afigura mais relevante para a situação sub judice, essa declaração de voto, lavrada pela Conselheira DULCE NETO, na qual se distingue com notável precisão a natureza dos vários actos que a AT pratica em sede de execução fiscal, sendo que, na situação aí tratada estava em causa um pedido de pagamento em prestações de dívida tributária efectuado pelo executado no âmbito do processo de execução fiscal: «[…] apesar de a administração tributária ser chamada a colaborar com o tribunal na cobrança dos seus próprios créditos, dirigindo o respectivo procedimento processual (definido como uma sequência ordenada de actos dirigidos à cobrança coerciva do crédito exequendo), praticando nele actos judiciais (de natureza não jurisdicional) sujeitos a estritas regras processuais (como é o caso da citação, das diligências para penhora e venda dos bens, da convocação dos credores e verificação e graduação de créditos, da extinção da execução), a lei permite-lhe, ainda, em determinadas situações, agir no processo executivo na qualidade de credora, como acontece, por exemplo, quando decide responsabilizar outras pessoas pelo pagamento da dívida, praticando um acto administrativo de asserção dos pressupostos legais para essa responsabilização (despacho de reversão), quando aprecia e decide os pedidos que os devedores/executados lhe dirigem no sentido de autorizar a liquidação da dívida através de dação em pagamento de bens, ou quando aprecia e decide pedidos de pagamento da dívida em prestações. Nessas situações, abre-se dentro do processo executivo um procedimento administrativo de natureza tributária, ou procedimento tributário, que é apreciado e decidido pela administração tributária na qualidade de credora/exequente, como resulta à evidência do disposto nos artigos 196.º a 199.º do CPPT (no que toca ao pagamento em prestações) e do disposto nos artigos 201.º e 202.º do mesmo Código (no que toca à dação em pagamento). Tanto assim é que a entidade competente para apreciar esses pedidos pode nem ser o órgão da execução fiscal, mas outro órgão da administração tributária (cfr. n.º 2 do art.º 197.º e n.ºs 2 e 3 do art.º 201.º do CPPT). Tratando-se de procedimentos tributários, que culminam com a prolação de um acto administrativo em matéria tributária, e não de um mero acto judicial ou processual dirigido à cobrança coerciva do crédito exequendo, há que aplicar-lhe as normas que a Lei Geral Tributária prevê para esses procedimentos […]».). Tudo resulta mais claro nas situações em que a dívida em cobrança no processo executivo não tenha natureza tributária, v.g., uma dívida ao Estado que deva ser paga por força de acto administrativo ou um reembolso ou reposição, como o permitem as alíneas a) e b) do n.º 2 do art. 148.º do CPPT. Nesse caso, por certo ninguém sustentaria que a pessoa colectiva pública a quem devessem ser pagas as dívidas exequendas pudesse intervir no processo de execução fiscal para apreciar e decidir o pedido de dispensa de garantia. A competência para esse efeito sempre seria do órgão da execução fiscal, no exercício das suas funções de auxiliar operacional nas funções de justiça executiva e nunca ao abrigo da actividade tributária, possibilidade que nem sequer era configurável nessa concreta execução. Estes actos que a AT pratica no processo executivo enquanto órgão da execução fiscal, ou seja, no exercício das funções que lhe estão confiadas enquanto auxiliar ou colaborador operacional no processo de execução fiscal, estão, por isso, subordinados às mesmas regras processuais a que se sujeitam os actos de natureza não jurisdicional praticados nos demais processos judiciais tributários e não às regras dos actos administrativos tributários ou do procedimento administrativo tributário (Neste sentido, vide o recente acórdão da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte de 17 de Novembro de 2011, proferido no processo com o n.º 361/11.6BEVIS, disponível em http://www.dgsi.pt/jtcn.nsf/89d1c0288c2dd49c802575c8003279c7/b555f9e3669664c7802579560042803a?OpenDocument.). Ou seja, a nosso ver, porque o pedido de dispensa de garantia e a respectiva decisão se inserem no âmbito de um processo judicial (e aquele não dá origem a um procedimento tributário que nele seja “enxertado”, como deixámos dito), devem ficar sujeita às regras do Código de Processo Civil (CPC), que constitui a lei subsidiária em sede de processo de execução fiscal, como decorre da alínea e) do art. 2.º do CPPT (Salienta JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume I, anotação 6 ao art. 2.º, pág. 69: «Refere-se nesta norma que a legislação indicada como sendo de aplicação subsidiária será aplicada «de acordo com a natureza do caso omisso». Assim, a ordem por que tal legislação vem indicada não é relevante para determinação do regime aplicável, sendo as características do caso que hão-de levar à determinação da lei a aplicar»). Podemos, pois, concluir que, como adiantámos supra, nunca poderia na situação sub judice justificar-se a inimpugnabilidade do acto reclamado na natureza confirmativa de acto anterior. Isto não significa, no entanto, que a inimpugnabilidade da decisão que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia não pudesse encontrar justificação ao abrigo da força do caso julgado formal, nos termos do art. 672.º, n.º 1, do CPC. Se a questão da dispensa da prestação de garantia estivesse definitivamente decidida, não seria possível discutir de novo a questão e, muito menos, decidi-la de novo, eventualmente em sentido diverso. No entanto, como é bom de ver, a força do caso julgado formal só cobriria a situação caso se pudesse concluir que uma e outra decisão tinham sido proferidos em face dos mesmos pressupostos fácticos, o que, como resulta do que deixámos já dito, se não verifica. Entre o primeiro e o segundo pedidos de dispensa de prestação de garantia e respectivas decisões ocorreu um facto que, em abstracto, tem a potencialidade de interferir na decisão a proferir, qual seja a penhora que foi efectuada. Não podemos, pois, afirmar que, porque o Executado não reagiu contenciosamente daquela primeira decisão, esteja agora impedido de suscitar a sindicância judicial da segunda decisão. Face ao exposto, o recurso não pode ser provido com fundamento em erro de julgamento quanto à questão da inimpugnabilidade da decisão reclamada. 2.2.2 DA FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA A sentença recorrida julgou a reclamação procedente com fundamento na insuficiência da fundamentação da decisão reclamada. Isto, quanto ao pedido de dispensa de garantia, com uma dupla motivação: o indeferimento não pode ser fundamentado com base no despacho que decidiu o anterior pedido de dispensa de garantia porque entre ambos os pedidos e correspondentes decisões ocorreu a penhora e, assim, «as circunstâncias de facto subjacentes à prestação de garantia não são as mesmas, pelo que não pode aquele despacho ser fundamento do novo indeferimento»; por outro lado, o acto reclamado limita-se a afirmar, sem o mínimo de justificação, que a penhora efectuada não é suficiente para garantir a dívida exequenda. Considerou ainda, relativamente ao pedido de informação sobre «outro meio idóneo e materialmente exequível para o Executado, de se obter o objectivo pretendido de suspender o processo», que a resposta que lhe foi dada na decisão reclamada – «que o reclamante seja informado sobre as garantias a prestar nos termos do artigo 199.º do CPPT» – não dá resposta cabal ao requerido por ele, não lhe permitindo ficar esclarecido quanto aos motivos do indeferimento desse seu pedido. Também aqui a Recorrente discorda da sentença. Considera, em síntese, que a decisão sobre o pedido de dispensa de prestação de garantia está suficientemente fundamentada, designadamente por remissão para as anteriores decisões constantes do processo (cfr. conclusões Z) a MM)) e que o órgão de execução fiscal não tinha que dar ao Executado outra informação sobre os demais meios de prestar garantia senão aquela que deu, remetendo para a norma legal aplicável (cfr. conclusões NN) a TT)). Antes do mais, em face do que deixámos dito no ponto anterior, cumpre ter presente que a legalidade da fundamentação da decisão reclamada não deve ser aferida à luz das regras legais respeitantes à fundamentação dos actos administrativos tributários (designadamente, o disposto nos arts. 268.º, n.º 3, da CRP, 77.º da LGT e 125.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos), mas antes em face nas normas que regulam a fundamentação das decisões judiciais, sejam sentenças ou despachos, sendo que o art. 158.º do CPC (Diz o art. 158.º do CPC: «1. As decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas. 2. A justificação não pode consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição»). impõe a obrigação de fundamentar todas as decisões proferidas no processo judicial. Na verdade, as decisões judiciais estão sujeitas a fundamentação em ordem a cumprir duas funções: a primeira, «baseada na função dos tribunais como órgãos de pacificação social, consiste na necessidade de a decisão judicial explicitar os seus fundamentos como forma de persuasão das partes sobre a legalidade da solução encontrada»; a segunda, tem a ver com a recorribilidade das decisões judiciais pois «para que a parte lesada com a decisão que considera injusta a possa impugnar com verdadeiro conhecimento de causa, torna-se de elementar conveniência saber quais os fundamentos» em que se baseou (ANTUNES VARELA, J. MIGUEL BEZERRA e SAMPAIO E NORA, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2.ª edição, pág. 689.). A falta de fundamentação da decisão judicial é cominada com a nulidade da decisão, como decorre do disposto no art. 125.º, n.º 1, do CPPT e no art. 668.º, n.º 1, alínea b), do CPC, normas que, embora se refiram à sentença, se entende reportarem-se a todas as decisões judiciais. No entanto, como tem vindo a salientar a doutrina e a jurisprudência, a falta de fundamentação que constitui nulidade é a falta absoluta de fundamentação. «Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de fundamentação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade» (ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil Anotado, volume V, pág. 140.). No caso sub judice, o Executado pediu a dispensa de prestação de garantia para além da penhora efectuada sobre a sua casa, alegando, em síntese, que o imóvel tem valor suficiente para garantir a dívida exequenda e o acrescido e que está impossibilitado de apresentar outra garantia. Mais pediu, para a eventualidade de ser indeferido o pedido de dispensa de prestação de garantia, «A sugestão de outro meio idóneo e materialmente exequível para o Executado, de se obter o objectivo pretendido de suspender o processo». A decisão reclamada, proferida em resposta a esses pedidos, é do seguinte teor: «Uma vez que, por meu despacho de 08/07/2010, foi indeferido o pedido de dispensa da prestação de garantia e que o valor do imóvel penhorado não é suficiente para a garantia da dívida, mantenho todas as decisões de indeferimento anteriormente proferidas em matéria de garantias. Quanto à sugestão de outro meio idóneo, informe-se o executado que as garantias a prestar são as previstas no artigo 199º do CPPT. Notifique a mandatária […]». Pese embora as manifestas exiguidade e desadequação do discurso exarado pelo órgão de execução fiscal como motivação do indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia – dispensa que depende da verificação dos pressupostos enumerados no art. 52.º, n.º 4, da LGT (Para que seja concedida a dispensa da prestação de garantia, «é necessário que se satisfaçam três requisitos, cumulativamente, embora dois deles comportem alternativas, pelo que o executado deverá na petição tê-los em conta: ˗ que haja uma situação de inexistência de bens ou sua insuficiência para pagamento da dívida exequenda e acrescido; ˗ que essa inexistência ou insuficiência não seja imputável ao executado; ˗ que a prestação da garantia cause prejuízo irreparável ao executado ou que seja manifesta a sua falta de meios económicos» (cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, volume III, anotação 4.c) ao art. 170.º, pág. 233).) –, dificilmente se poderá sustentar que a decisão reclamada enferma de falta de fundamentação, tanto mais que no despacho de 8 de Julho de 2010, para o qual remete a decisão reclamada há referência expressa aos preceitos legais aplicáveis e, ainda que por remissão para uma informação prestada no processo, há também referência aos pressupostos de facto em que se alicerçou a decisão (cfr. factos que foram dados como provados na sentença recorrida sob os n.ºs 6. e 7.). Concluímos, pois, que a decisão reclamada não pode ser anulada com fundamento em falta de fundamentação, motivo por que a sentença recorrida, que decidiu em sentido contrário (ainda que aferindo essa falta de fundamentação por referência às exigências dos actos administrativos e não das decisões judiciais), será revogada com esse fundamento, tal como pedido pela Recorrente, ainda que por motivos bem diversos dos por esta invocados. O que leva a que se tenha por prejudicado o conhecimento da invocado erro de julgamento da sentença recorrida quanto à falta de fundamentação da decisão reclamada na parte respeitante ao pedido dito subsidiário. 2.2.3 DO VÍCIO QUANTO AOS PRESSUPOSTOS DE FACTO Impunha-se agora conhecer da legalidade da decisão reclamada em face do outro vício que o Executado lhe assacou – erro nos pressupostos de facto – e cujo conhecimento a sentença deu expressamente como prejudicado em face da solução que deu à questão da falta de fundamentação daquela decisão. Assim o determina o disposto no art. 715.º, n.º 2, do CPC (Diz o art. 715.º, n.º 2, do CPC: «Se o tribunal recorrido tiver deixado de conhecer certas questões, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, a Relação, se entender que a apelação procede e nada obsta à apreciação daquelas, delas conhecerá no mesmo acórdão em que revogar a decisão recorrida, sempre que disponha dos elementos necessários».), norma que é aplicável ao recurso de revista interposto para o Supremo Tribunal Administrativo por força do disposto nos artigos 749.º e 762.º, nº 1 e do preceituado no artigo 726.º, todos do CPC. Acontece, porém, que não se encontra fixada nos autos a matéria de facto pertinente para conhecer dessa questão, o que bem se compreende porque a sentença recorrida a considerou prejudicada. Ora, como é sabido, este Supremo Tribunal Administrativo, enquanto tribunal ad quem dos recursos interpostos das decisões proferidas pelos tribunais tributários não tem competência em matéria de facto (cfr. art. 26.º, n.º 1, alínea b), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (Nos termos do art. 26.º, n.º 1, alínea b), do ETAF: «Compete à Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo conhecer: […] b) Dos recursos interpostos de decisões dos tribunais tributários com exclusivo fundamento em matéria de direito; […]».). Assim, como bem salientou o Procurador-Geral Adjunto junto do Tribunal Central Administrativo Norte, para conhecer da referida questão, impõe-se que os autos regressem à 1.ª instância, a fim de aí ser fixada a base factual necessária, tudo como prescrevem os arts. 729.º e 730.º do CPC. É nesse sentido que decidiremos a final. 2.2.4 CONCLUSÕES Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões: I - Aos actos (necessariamente sem carácter jurisdicional) praticados pela AT no âmbito da execução fiscal enquanto mera “auxiliar” na prossecução do escopo judicial da execução – actos que não convocam a sua qualidade de exequente/credora e, por isso, não têm natureza administrativa tributária –, são aplicáveis, não as regras que regulam os actos administrativos tributários, mas antes as regras do CPC, que constitui a lei subsidiária em sede de processo de execução fiscal, como decorre da alínea e) do art. 2.º do CPPT. II - Consequentemente, a esses actos não pode aplicar-se nem a doutrina do acto confirmativo nem as regras que regulam a fundamentação dos actos administrativos, sem prejuízo de lhe poderem ser aplicáveis as regras que regulam o caso julgado e a fundamentação das decisões judiciais. III - O Supremo Tribunal Administrativo, ainda que revogue a decisão em consequência da qual foi considerada prejudicada alguma questão, não pode conhecer dessa questão ao abrigo do n.º 2 do art. 715.º do CPC se o tribunal a quo não fixou a factualidade pertinente para o conhecimento da mesma.* * *3. DECISÃO Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo acordam, em conferência, conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, e ordenar que os autos regressem à 1.ª instância, a fim de aí, após a pertinente fixação da matéria de facto, se conhecer a questão do erro sobre os pressupostos de facto, suscitada na petição inicial.*Sem custas neste Supremo Tribunal Administrativo.*Lisboa, 7 de Dezembro de 2011. - Francisco Rothes (relator) -Valente Torrão -Dulce Neto.

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