Apura logo

Acórdão TR Lisboa de 2004-02-05

15/2004-9

TribunalTribunal da Relação de Lisboa
Processo15/2004-9
RelatorTrigo Mesquita
DescritoresEstrangeiro, Interrogatório do Detido
Nº do DocumentoRL
Data do Acordão2004-02-05
VotaçãoUnanimidade
Privacidade1
Meio ProcessualRECURSO PENAL
DecisãoProvido

Acordam na 9.ª Secção Criminal de Lisboa: I. Nos autos de interrogatório de cidadão estrangeiro n.º... do Juízo de Pequena Instância Criminal de Lisboa, o Ex.mo Magistrado do Ministério Público fez apresentar ao Ex.mo Juiz, «para interrogatório, de imediato» (despacho de 29-10-2003, a fls. 21 destes autos), o cidadão de nacionalidade romena (A), que havia sido detido, pelas 21,30 horas do dia 28-10-2003, pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, «por se não provar ser portador de qualquer visto que o habilite a permanecer legalmente em Portugal, enquadrando-se a sua situação no disposto no art. 117.º, do Decreto-Lei n.º 34/03, de 25-2» e precedendo «constituição da mesma como arguido, nos termos do art. 58.º, do CPP e cumprimento do disposto no art. 61.º, do mesmo Código». Por despacho de 29-10-2003 (fls. 24), o Ex.mo Juiz decidiu validar a detenção efectuada porque legal nos termos do artigo 117.º do Decreto-Lei n.º 34/2003, de 25-2 e determinar, uma vez que nada indica a necessidade de ser aplicada a excepcional e sempre subsidiária medida de prisão preventiva, que o cidadão estrangeiro preste, de imediato, termo de identidade e residência, havendo desnecessidade de proceder à realização de qualquer outra diligência que anteceda a aplicação deste por se traduzir, desde logo, em acto processualmente inútil; mais determinou que o estrangeiro seja notificado para comparecer no SEF, nos termos do artigo 117.º n.º 4, do referido diploma, determinando a restituição do cidadão estrangeiro à liberdade. Inconformado com a decisão, o Ex.mo Magistrado do MP junto do Tribunal a quo interpôs recurso, com os fundamentos constantes da respectiva motivação. II. Colhidos os vistos legais, cumpre agora apreciar e decidir. O presente recurso visa a impugnação do despacho judicial que, perante a apresentação de cidadã estrangeira detida em situação ilegal, depois de validar a detenção e de a sujeitar a termo de identidade e residência, a restituiu à liberdade, decidindo não proceder ao respectivo interrogatório. E da noção geral de recursos se extrai que estes (com referência ao caso) visam a eliminação dos defeitos da concreta decisão tida por ilegal, e não declarações genéricas como a requerida pelo recorrente. A intervenção judicial estabelecida no art. 117.° n.° 1, do RJE, não pode deixar de ser interpretada à luz do disposto no art. 28.° n.° 1, da CRP. E, nesta perspectiva, o cidadão, detido por uma entidade administrativa (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras), tem o direito de ser ouvido pelo juiz e que esse direito só pode ser exercitado no âmbito de um interrogatório de contornos coincidentes com os daquele que é prevenido no art. 141.°, do CPP. Concomitantemente, é o próprio texto normativo (art. 117.º n.° 1, do RJE), que, no âmbito do processo de expulsão determinada por autoridade administrativa, faz intervir o juiz para validação da detenção e para aplicação de medidas de coacção, a prisão preventiva ou qualquer das outras medidas taxativamente estabelecidas no CPP. É neste interrogatório que juiz conclui, não apenas que a detenção realizada pelo SEF é válida, como ainda que, em sede de medidas cautelares, é de aplicar apenas o TIR, remetendo a protecção dos direitos de defesa do cidadão estrangeiro para um interrogatório a levar a efeito pela entidade que realizou a detenção, nos termos prevenidos no art. 118.°, do RJE. Acresce que, se o SEF (não fazendo uso do disposto no art. 100.°, do RJE) proceder à detenção de cidadão estrangeiro que permanece ilegalmente em território nacional, e se, apresentado ao Ministério Público, este não determinar a libertação do detido (art. 261.° n.° 1, do CPP), antes requerendo a realização do interrogatório a que se refere o art. 117.° n.° 1, do RJE, tendo em vista a aplicação de uma medida de coacção (outra, que não o TIR, já aplicado pelo SEF), o juiz deve ouvir o detido, até mesmo para efeitos do disposto no art. 126.°, do RJE, após o que deve conceder ao Ministério Público a oportunidade para requerer o que tiver por conveniente (por exemplo, a formulação de perguntas ou realização de diligências no sentido do reconhecimento da medida coactiva adequada ao caso), e estabelecer o devido contraditório - de outro modo, como poderia o detido ou o Ministério Público impugnar, v. g., a decisão judicial sobre adequação e aplicação de determinada medida coactiva ? Nestes termos, o Despacho recorrido não pode deixar de ser revogado, para que o Ex.mo juiz do Tribunal recorrido o substitua por outro que, sendo caso e após investigação do estado actual do processo de expulsão em causa, determine a realização do mencionado interrogatório. III. 1.º Pelo exposto, concede-se provimento ao recurso, determinando-se que o M.mo juiz recorrido substitua o despacho sob recurso por outro que, sendo caso e após investigação do estado actual do processo de expulsão em causa, determine a realização do mencionado interrogatório. Lisboa, 05.02.2004 (Trigo Mesquita) (Maria da Luz Batista) (Almeida Cabral)

© 2024 Apura. Todos os direitos reservados.
Termos e Condições
Política de Privacidade