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Acórdão STJ de 2011-12-07

5526/04.4TDLSB-A.S1

TribunalSupremo Tribunal de Justiça
Processo5526/04.4TDLSB-A.S1
Nº Convencional3ª SECÇÃO
RelatorHenriques Gaspar
DescritoresRecurso de Revisão, Caso Julgado, Novos Factos, Novos Meios de Prova, Documento, Falsidade
Data do Acordão2011-12-07
VotaçãoUnanimidade
Privacidade1
Meio ProcessualRECURSO DE REVISÃO
DecisãoNegada a Revisão

Sumário

I - A falsidade de meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão, isto é, que tenham decisivamente conformado e fundamentado a convicção do tribunal, inquinando no mais essencial a decisão, constitui motivo de revisão, sobrepondo-se ao caso julgado; porém, vista a seriedade do fundamento, a falsidade só pode existir quando tiver sido reconhecida por «outra sentença transitada em julgado». II - São factos novos ou novos meios de prova os que não tenham sido apreciados no processo que levou à condenação, e que, sendo desconhecidos da jurisdição do acto do julgamento, permitam suscitar graves dúvidas acerca da culpabilidade do condenado; para efeito de fundamentar o pedido de revisão de decisões penais, os meios de prova são novos quando não foram administrados e valorados no processo que conduziu à condenação, embora não fossem ou pudessem não ser ignorados pelo arguido no momento em que o julgamento teve lugar. III - Novos meios de prova são aqueles que são processualmente novos, ou seja, que não foram apresentados no processo da condenação. Se foram apresentados no processo da condenação, não são novos no sentido da “novidade” que está subjacente na definição da al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP. IV - A novidade, neste sentido, refere-se a meio de prova – seja pessoal, documental ou outro –, e não ao resultado da produção. V - De outro modo, criar-se-iam disfunções sérias contra a estabilidade e segurança do caso julgado, abrindo caminho a possíveis estratégias probatórias moldáveis numa atitude própria da influência da “teoria dos jogos” no processo. VI - Os factos invocados pelo recorrente não são referidos a qualquer fundamento; vista a sua formulação e natureza (falsificação de meios de prova) integrariam o fundamento previsto na al. a) do n.º 1 do art. 449.º do CPP. Porém, para este efeito, é inteiramente irrelevante a singela alegação da «falsidade» do documento; independentemente de todas as considerações que pudessem, ou não, ser pertinentes, o fundamento exige o reconhecimento prévio da «falsidade» por outra sentença transitada em julgado.


Texto Integral

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça:             1. AA, arguida, vem interpor recurso de revisão da sentença proferida no processo indicado, com os seguintes fundamentos:             l. A sofre de miopia grave. 2. Tendo compulsando os autos, constatou apesar de alguma dificuldade, que o cheque dos autos não foi preenchido nem assinado pela arguida.  3. Portanto, a letra aposta no cheque dos autos não é do seu punho. 4. A arguida, lembrou-se de que entregou dois cheques ao advogado do Banco: um em branco e outro assinado pela arguida. 5. A A. sofre d problemas do foro cardiológico e psíquico que a levam a confundir os factos, tal como eles se passaram. 6. De isto, a arguida nunca foi confrontada em sede de audiência com o cheque dos autos. 7. O cheque é falso, bem como as provas. Termina, pedindo o provimento do recurso, requerendo «exame à letra e assinatura aposta no cheque». 2. A recorrente foi condenada por sentença de 13 de Dezembro de 2010 como autora material de um crime de emissão de cheque sem provisão, previsto e punido pelo art 11°, n° l, alínea b), do Decreto-Lei n°454/91, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n°316/97, de 19 de Novembro, e actualmente pela Lei n°48/2005, de 29 de Agosto, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa à taxa diária de €3,00 (três euros) no montante global de €540,00 (quinhentos e quarenta euros), e, na procedência do pedido de indemnização cível, a pagar à Caixa Geral de Depósitos, SA a importância de €7500,00 (sete mil e quinhentos euros). O Magistrado do Ministério Público pronuncia-se pela rejeição do recurso. 3. No 4º Juízo Criminal de Lisboa, a juiz informou, como dispõe o artigo 454º do CPP. Referindo que a arguida não indica qual o fundamento legal do recuso, e que se limita «a invocar que sofre de miopia grave e que só agora constatou que o cheque dos autos não foi por si preenchido, que a letra aposta no mesmo não é do seu punho, que só agora se lembrou que entregou dois cheques ao advogado do Banco um em branco e outro por si assinado, que o cheque é falso, e a provas também, e a requerer um exame pericial à letra e assinatura aposta no cheque em causa», conclui que «as circunstâncias alegadas pela arguida não se enquadram em nenhum dos fundamentos de revisão de sentença nem a arguida o indica». 4. No Supremo Tribunal, o Exmº Procurador-Geral Adjunto pronuncia-se pela não autorização da revisão, pois, «para além da “imperfeição” da motivação», «verifica-se que o fundamento do recurso assenta na falsidade do cheque, bem como [d]as provas, ou seja, na não indicada alínea a) do n.° l do artigo 449° do Código de Processo Penal». «Porém, tal fundamento é de excluir liminarmente por não existir uma outra sentença transitada em julgado que tenha considerado falsos meios de prova que tenham determinado a condenação.» «Para alcançar tal desiderato a recorrente terá que obter uma sentença (transitada) a considerar que o cheque foi falsificado (como afirma, o que não se mostra feito». 5. Colhidos os vistos, o processo foi à Conferência, cumprindo decidir. Dispõe o artigo 449º, nº 1, do Código de Processo Penal que a revisão de uma sentença transitada em julgado é admissível a) quando «uma sentença transitada em julgado tiver considerado falsos meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão, e d) «se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação».  A falsidade de meios de prova que tenham sido determinantes para a decisão, isto é, que tenham decisivamente conformado e fundamentado a convicção do tribunal, inquinando no mais essencial a decisão, constitui motivo de revisão, sobrepondo-se ao caso julgado; porém, vista a seriedade do fundamento, a falsidade só pode existir quando tiver sido reconhecida por «outra sentença transitada em julgado». Podem constituir também fundamento da revisão a existência de factos novos ou novos meios de prova, que não tenham sido apreciados  no  processo  que  levou  à condenação, e que, sendo desconhecidos do tribunal na data do julgamento, possam ser susceptíveis de suscitar dúvidas sérias sobre a justiça da decisão. São factos novos ou novos meios de prova os que não tenham sido apreciados no processo que levou à condenação, e que, sendo desconhecidos da jurisdição no acto do julgamento, permitam suscitar graves dúvidas acerca da culpabilidade do condenado; para efeito de fundamentar o pedido de revisão de decisões penais, os meios de prova são novos quando não foram administrados e valorados no processo que conduziu à condenação, embora não fossem ou pudessem não ser ignorados pelo arguido no momento em que o julgamento teve lugar (cfr., por todos, a indicação de jurisprudência do STJ, no acórdão do STJ, de 10 de Março de 2011, proc. nº 483/91.0GBVRM). Novos meios de prova são aqueles que são processualmente novos, ou seja, que não foram apresentados no processo da condenação. Se foram apresentados no processo da condenação, não são novos no sentido da “novidade” que está subjacente na definição da alínea d) no nº 1 do artigo 449º do CPP. A novidade, neste sentido, refere-se a meio de prova – seja pessoal, documental ou outro, e não ao resultado da produção; no caso de provas pessoais, a “novidade” refere-se à testemunha na sua identidade e individualidade e não ao resultado da prova efectivamente produzida; no caso de documento De outro modo, criar-se-iam disfunções sérias contra a estabilidade e segurança do caso julgado, abrindo caminho a possíveis estratégias probatórias moldáveis numa atitude própria da influência da “teoria dos jogos” no processo. Os factos invocados pelo recorrente não são referidos a qualquer fundamento; vista a sua formulação e natureza (falsificação de meios de prova), integrariam o fundamento previsto na alínea a) do nº 1 do artigo 449º do CPP. Porém, para este efeito, é inteiramente irrelevante a singela alegação da «falsidade» do documento; independentemente de todas as considerações que pudessem, ou não, ser pertinentes, o fundamento exige o reconhecimento prévio da «falsidade» - «meios de prova falsos» - por outra sentença transitada em julgado. Fundamento que a recorrente não alega, nem se verifica no presente caso. Assim, a revisão não pode ser autorizada. 6. Nestes termos, nega-se a revisão (artigo 453º CPP).  Henriques Gaspar (relator) Armindo Monteiro

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