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Acórdão TCA Sul de 2011-02-10

06999/10

TribunalTribunal Central Administrativo Sul
Processo06999/10
SecçãoCA-2º JUÍZO
Data do Acordão2011-02-10
RelatorPaulo Pereira Gouveia
DescritoresProvidência Cautelar de Função Conservatória - Meios de Prova Complexos ou Morosos – Vícios Próprios do Acto de Pvp

Sumário

1.A suspensão de eficácia de um acto administrativo é sempre, no CPTA, uma providência cautelar de função conservatória 2. Atento o teor do art. 120º, nº 1, do CPTA, e não se verificando o caso previsto na al. a) desse nº 1, o juiz deve aferir o fumus boni iuris após comprovar o interesse em agir cautelar ou o periculum in mora; 3. A autorização de introdução no mercado (AIM) e a fixação administrativa do preço máximo de venda ao público de um de medicamento comparticipado (PVP) constituem os dois actos administrativos impugnáveis principais com vista à comercialização do medicamento. 4.Num processo cautelar, seja sobre que assunto for, incluindo o dos medicamentos genéricos, suas autorizações de introdução no mercado (AIM) e a fixação administrativa dum preço máximo de venda ao público de um de medicamento genérico (PVP), o juiz não pode utilizar meios de prova complexos ou morosos, nem apreciar profundamente nenhuma questão de direito, muito menos as questões técnico-laboratoriais relativas a medicamentos, mas deve apreciar sumariamente todas as questões (que não argumentos) invocadas sob pena de ilegal omissão de pronúncia; 5. A questão relativa às novas AIMs das C-I é pouco relevante quando só está em causa a eventual suspensão de eficácia da fixação administrativa de PVP, consequente a essa AIM nova não declarada inválida por nenhum tribunal com trânsito em julgado, e ainda porque se tem o ónus de atacar directamente a eventual AIM inválida; 6. O direito das patentes, porque de natureza privada, é pouco importante neste tipo de lide cautelar de contencioso administrativo, sem prejuízo do art. 15º CPTA e de as decisões administrativas de AIMs não deverem ignorar outras AIMs prévias lícitas, em nome do respeito pela juridicidade; 7. O PVP pode lesar, por vícios próprios, os interesses comerciais de quem já está no mercado, num tipo de relação jurídica administrativa como esta, que é multilateral e que tem pelo menos dois procedimentos administrativos bem distintos (o da AIM e o do PVP) com o fim concreto de permitir a introdução no mercado (comercialização) de medicamentos; 8. Provou-se aqui, como a lei exige, um concreto e fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado (ou perigo da infrutuosidade) que prejudica o já titular de uma AIM e de um PVP, em uso no mercado, com uma quota de mercado determinada e com certa clientela legítima; 9. Provou-se aqui, como a lei exige, fumus non malus iuris quanto a duas das três ilegalidades aparentes invocadas (vícios próprios do acto de fixação dos PVP: desrespeito pela audiência prévia de todos os interessados e do dever de fundamentar as decisões administrativas multilaterais ou poligonais), irrelevando a ilegalidade aparente apontada à AIM, pois esta não atinge desde logo e sem intermediação jurisdicional o acto de fixação do PVP; 10. A ponderação global dos interesses específicos e concretos apurados e dos danos específicos e concretos apurados, num mesmo patamar, deve permitir alcançar uma decisão justa, proporcional e equilibrada, bem como suficiente.


Texto Integral

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO Laboratórios ………, Lda., com os sinais dos autos, intentou no T.A.C. de Lisboa um processo cautelar contra × (como Entidade Requerida, ER) Ministério da Economia e Inovação (Director Geral da Direcção Geral das Actividades Económicas), e (como contra-interessadas, C-I) × G……. Farmacêutica, S. A., × M……… Medicamentos, Lda., × P………. P…………. - Produtos Farmacêuticos, Sociedade Unipessoal, Lda., × Baldacci – Portugal, S.A., × K…….. F………, Sociedade Unipessoal, Lda., pedindo a SUSPENSÃO DA EFICÁCIA dos actos administrativos, datados de 17-2-10, 27-2-10 e 24-3-10, do Exmo. Senhor Director-Geral da Direcção Geral das Actividades Económicas ("DGAE"), de aprovação dos preços máximos de venda ao público (PVPs) dos medicamentos genéricos seguintes: (i) Atorvastatina Grena, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostos pela sociedade Generis Farmacêutica, S. A. ("Generis"), patentes no Despacho n.o 278/2010/DG de 24.03.2010; (ii) Atorvastatina Krevalin, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostos pela sociedade Generis, patentes no Despacho n.o 276/2010/DG de 24.03.2010; (iii) Atorvastatina Mer, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostos pela sociedade Mer Medicamentos, Lda. ("Mer"), patentes no Despacho n.o 275/2010/DG de 24.03.2010; (iv) Atorvastatina Pharmakern, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostos pela sociedade Pharmakern Portugal - Produtos Farmacêuticos, Sociedade Unipessoal, Lda. ("Pharmakern"), patentes no Despacho n.o 148/2010/DG de 17.02.2010; (v) Atorvastatina Stelma, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostos pela sociedade Generis, patentes no Despacho n.o 277/2010/DG de 24.03.2010; e (vi) Atorvastatina Tavitan, nas dosagens 10, 20, 40 e ao mg, propostos pela sociedade Baldacci - Portugal, S.A. ("Baldacci"), patentes no Despacho n.o 182/2010/DG de 26.02.2010. Após os articulados, por despacho daquele tribunal foi decidido suspender a eficácia daqueles actos administrativos de fixação de PVPs. Inconformada, vem G………… FARMACÊUTICA, S.A., recorrer para este T.C.A.-Sul, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: NULIDADE DA DECISÃO CAUTELAR «1 - A sentença a quo é nula, nos termos do artigo 668°, nº 1 alínea d) ou, subsidiariamente, alínea b), do CodProcCiv, aplicável ex vi o artigo 1º do CPTA, porquanto: a) omitiu totalmente qualquer ponderação da causalidade adequada entre os actos suspendendos e a alegada violação dos direitos da Requerente e dos danos por esta invocados; b) omitiu totalmente a ponderação sobre a possibilidade de adopção de outras providências que evitassem ou atenuassem os danos resultantes do decretamento da providência, de onde resultou violada a norma do artigo 1200 CPTA. INCOMPETÊNCIA LEGAL DA JURISDIÇÃO ADMINISTRATIVA 2 - O Tribunal Administrativo não pode conhecer da alegada ofensa/violação dos direitos de exclusivo decorrentes de patente, porquanto esse juízo cabe aos Tribunais de Comércio, nos termos do artigo 89° da LOFTJ, aprovada pela Lei n° 3/99, sendo certo que o que resulta da fundamentação do pedido da Requerente e da sentença recorrida é que o que se pretende evitar é a ofensa de direitos de propriedade industrial da Recorrida. 3 - Apenas os actos de comercialização de medicamentos são susceptíveis ou possuem a potencialidade de violar os direitos de patente, corno tal, inserem-se numa relação de direito privado a tutelar cautelarmente pelos mecanismos constantes do CPI. 4 - Os actos de fixação de PVP não são susceptíveis de violar direitos de propriedade industrial titulados por patente, porquanto não constituem requisitos suficientes e bastantes para a comercialização de medicamentos, nem invadem o conteúdo do direito patrimonial exclusivo de exploração da patente; 5 - Apenas a comercialização é susceptível de violar direitos de propriedade industrial e os actos de PVP não constituem actos de comercialização de medicamentos. FALTA DE PROVA DA VIOLAÇÃO DE DIREITOS DA REQUERENTE 6 - Não está provada, indiciariamente, a violação de qualquer direito da Requerente. 7 - O direito à parente não é um direito absoluto, mas sim um direito patrimonial que pode ser sujeito a compressões ou restrições. 8 - A patente garante ao seu titular o direito exclusivo à exploração (económica, industrial e comercial) da invenção e a existência na ordem jurídica de PVP para o medicamento genérico não lesa esse direito subjectivo do titular da patente. ERRO DE DIREITO NA RECUSA DE APRECIAR A PATENTE 9 - Não se encontra provado o conteúdo da patente nem a violação da mesma, razão pela qual incorreu em erro de direito a sentença recorrida quando se escusou a apreciar a patente e assumiu a violação não provada como pressuposto com base no qual veio a reconhecer o facto consumado e a integrar o requisito do periculum in mora. DEVERES DA DGAE 10 - A DGAE não tem qualquer obrigação legal de averiguar sobre a existência de patentes relacionadas com o medicamento de referência quando emite o PVP, devendo limitar a sua análise aos requisitos do D.L. 65/2007 e verificar que o medicamento para o qual é pedido o PVP dispõe de AIM, como é o caso. AIM e PVP vs PATENTE 12 - A única interpretação possível e adequada da disposição constante do artigo 102º-C do Código da Propriedade Industrial, à luz do artigo 14º nº 4 do Estatuto do Medicamento, da Directiva Comunitária 2004/27/CE e das conclusões da Comunicação da Comissão Europeia, é no sentido de que esta norma do CPI estabelece que os direitos conferidos pela patente não abrangem os actos realizados exclusivamente para fins de ensaio ou experimentais, incluindo as experiências para a preparação dos processos administrativos necessários à aprovação dos produtos pelos organismos oficiais competentes. Isto é, os actos de AIM e de aprovação de PVP não contendem com direitos de patente. 12 - Impedir a prática de actos administrativos preparatórios de uma eventual futura comercialização é susceptível de constituir um abuso de direito, na medida em que o conteúdo da atribuição de uma patente consiste no exclusivo temporário de comercialização e não inclui nenhum poder de vedar procedimentos preparatórios de futura entrada no mercado à luz do artigo 102º-C do Código da Propriedade Industrial. FALTA DOS REQUISITOS LEGAIS DA SUSPENSÃO DE EFICÁCIA 13 - Não se verificam os requisitos constantes do artigo 120°, n° 1, alínea b) do CPTA; PROP. INDUSTRIAL, PROTECÇÃO 14 - Ainda que se entendesse que o direito de propriedade a que se refere o artigo 62° da CRP tutela os direitos de exclusivo, a propriedade aí mencionada é-o a título de direito patrimonial privado e não de direito real, sem prejuízo da eficácia erga omnes do exclusivo - o que apenas abrange o direito a explorar e não outras potencialidades conferidas pela patente. 15 - O direito de propriedade industrial é legalmente protegido, mas não é um direito absoluto e sem limites, sendo reconhecidamente limitado pelo interesse público corolário do Estado Social de Direito. 16 - Apenas a exploração económica do medicamento portador de AIM e PVP é susceptível de poder constituir a violação de patente. ERRADA PONDERAÇÃO DOS INTERESSES 21 - A sentença impugnada violou o artigo 120 n° 2 CPTA ao ter afastado o interesse público e colectivo consagrado no direito fundamental à saúde em favor de uma manifesta e desproporcionada absolutização do direito fundamental de propriedade. 22 - O retardamento da entrada no mercado de medicamentos genéricos de menor custo, causa efectiva lesão do interesse público com custos relevantes para o consumidor e para o Estado. 23 - O interesse público consagrado no direito constitucional à protecção da saúde (direito fundamental) e à liberdade de concorrência e a respectiva influencia sobre os orçamentos públicos da saúde, sublinhados pelo Relatório Final da Comissão Europeia, deveria ter norteado o Tribunal a quo na sua decisão e a tê-lo conduzido a relevar o interesse público em detrimento de interesses privados de igual relevância entre si.» Inconformada, vem P………. P………. também recorrer para este T.C.A.-Sul, tendo formulado as seguintes CONCLUSÕES: NÃO HÁ VIOLAÇÃO DA PATENTE «A - Só haverá violação dos direitos de propriedade industrial da A. se a Contra Interessada utilizar ou seguir os processos de fabrico protegidos pela patente invocada. OMISSÃO DA PRODUÇÃO DE PROVA B - A Contra Interessada alegou expressamente factos que evidenciavam não se verificar qualquer infracção da matéria reivindicada nessas patentes. C - Mas tais factos foram ignorados pela Sra. Juiza "a quo", que não permitiu que sobre eles se produzisse qualquer prova. D - O errado julgamento da matéria de facto derivado de omissão de produção de prova é determinante de anulação da sentença por défice instrutório. AIM da C-I VÁLIDAS E - No caso sub judicie, as AIM concedidas à Contra Interessada para o medicamento “Atorvastatina Pharmakern" estão válidas e em vigor, após uma dupla apreciação jurisdicional. PVP - ACTO CONSEQUENTE F - O acto administrativo de aprovação de preço (PVP) de um medicamento genérico é um acto que é mera consequência de um outro acto que o precede, e que determina a sua validade. G - Se o acto antecedente (concessão de AIM) é válido, igualmente válido será o acto consequente - aprovação do preço máximo. DEVERES DA DGAE H - Não existe qualquer norma legal expressa que num procedimento de aprovação de preços máximos para um medicamento genérico implique para a DGAE a prévia valoração de existência ou inexistência de patentes sobre o esse medicamento. INOCUIDADE DA APROVAÇÃO DO PVP I - Do acto administrativo de aprovação do preço para um medicamento genérico não resultam, em si mesmo, quaisquer prejuízos que sejam graves e de difícil repara­ção, particularmente quando o medicamento genérico em causa possui uma AIM válida e ao seu fabrico não é imputável qualquer infracção a qualquer patente. ANTERIOR DECISÃO DO Tribunal Central Administrativo Sul J - Tendo o Tribunal Central Administrativo Sul já decidido pela não suspensão de eficácia das AIM do medicamento genérico "atorvastatina Pharmakern", a suspensão de eficácia dos actos de aprovação de preços para esses mesmos medicamentos, é manifestamente contraditória, desrespeitadora, incongruente e quiçá desafiadora com o anteriormente decidido, e constitui uma grave ofensa à segurança jurídica. INTERESSE PÚBLICO K - É do mais óbvio interesse público a existência de medicamentos genéricos de menor custo que garantam a acessibilidade de todos os portugueses aos cuidados de saúde. L - Do confronto entre os interesses privados das partes, requerente (protecção da sua patente) e contra interessada (liberdade de comércio), não existe nenhum que seja prevalecente, estando ambos no mesmo plano. M - Deve a sentença recorrida ser revogada.» K…….. F………….. apresentou CONTRA-ALEGAÇÕES, concordando com os recorrentes e concluindo: A - A sentença proferida pelo Tribunal a quo, que suspende a eficácia das AIM concedidas às Contra-interessadas referentes aos medicamentos genéricos com o princípio activo Atorvastatina, não tem fundamento na lei. B - Pois não se encontrando preenchidos os pressupostos de procedência de qualquer procedimento cautelar, mais não podia o referido Tribunal, senão decidir pela improcedência do procedimento cautelar apresentado contra as mesmas. C - De facto, para que determinado medicamento possa ser comercializado, é necessário que se obtenha uma Autorização de Introdução no Mercado. D - E ainda que a esse medicamento seja fixado um preço de venda ao público. F - Ora, no processo em apreço nos presentes Autos, apenas a AIM está concedida, ou seja, não há um processo concluído, e apenas recorrendo a dotes de adivinhação se pode presumir quando tal processo estará concluído. G - Pois pode o seu requerente suspendê-lo, ou pura e simplesmente desistir de lhe dar continuidade. H - Se, por exemplo, quando confrontado com a apertada legislação que defende em Portugal as patentes e direitos de autor, e a possibilidade de poder ter que vir a pagar uma indemnização caso comercialize um medicamento protegido por tais direitos, opte por esperar pela cessação dos efeitos dos mesmos. I - Nada disso é todavia possível para a A. Não importa que a concessão de uma AIM seja o primeiro passo de uma caminhada, não importa o que o requerente de tal processo possa pensar fazer munido dessa AIM, não importa acima de tudo toda a protecção legal que lhes é conferida caso se verifique que há uma efectiva violação de uma patente. J - A concessão de urna AIM é para a A. a violação de uma patente, e em face de tal circunstância, é-lhe possível o recurso a um procedimento cautelar tendente à suspensão de eficácia de tal acto. K - Todavia, tal incorrecto entendimento consubstancia por um lado o caminho mais directo para tornar as entidades Recorridas fiscais de patentes, algo que não está nas suas atribuições. L - Como por outro lado faz crer que a AIM é um livre-trânsito de acesso ao mercado dos medicamentos. M - Ora, nem uma nem outra circunstância se verificam: para comercializar não basta uma AIM, e não compete ao Infarmed, que emite tais autorizações, adivinhar quais as intenções de quem as requer. N - Pelo que caem de imediato por terra quaisquer possibilidades de, por um lado, os actos administrativos em que as AIM se consubstanciam, poderem vir a ser considerados inválidos. O - Como por outro qualquer potencialidade dos mesmos virem a criar prejuízos na esfera jurídica da A., sejam eles ou não de difícil reparação. P - Nessa conformidade, em conclusão, os argumentos apresentados nas alegações de recurso apresentadas pelas R. devem motivar V. Exa. a proferir decisão diversa da proferida pela Meritíssima Juiz do Tribunal a quo. Q - Que de forma absolutamente errada encarou o procedimento cautelar como estando absolutamente provido dos fundamentos legais necessários à sua procedência. R - Decisão que deve ser revogada, assim se fazendo Justiça. LABORATÓRIOS ……………, Lda. apresentou CONTRA-ALEGAÇÕES (demasiado longas), concluindo: (a) Decidiu bem o Tribunal a quo ao deferir a providência cautelar requerida, tendo efectuado uma correcta aplicação do Direito ao caso sub judie e, não se encontrando, como tal, a Sentença Recorrida ferida de qualquer erro ou nulidade que possa afectar a sua integral validade. (b) O Tribunal a quo analisou correctamente a matéria de facto, de uma leitura atenta da Sentença Recorrida resulta claro que o Tribunal a quo tomou a sua decisão no pressuposto de que a patente nº …………. é uma patente de processo e não uma patente de produto. (c) Por outro lado, a Sentença Recorrida não incorreu em qualquer erro de julgamento por não ter seguido a "orientação" do Tribunal Administrativo Sul ao não ter decretado a providência cautelar requerida pela Recorrida para suspensão da eficácia das AIMs dos medicamentos genéricos de Atorvastatina da Recorrente P………, pois não só estes actos são autónomos e padecem de vícios distintos, como a questão da validade das referidas AIMs ainda está em apreciação em sede de acção administrativa especial. (d) Acresce que a Sentença Recorrida também não incorreu em qualquer erro de julgamento ou deficit de instrução relativamente à matéria legada pela Recorrente Pharmakern sobre a alegada não violação dos direitos de propriedade industrial da Recorrida. (e) Não só porque a análise que a Recorrente P……….defende deveria ser feita pelo Tribunal a quo seria incompatível com a sumario cognitio que caracteriza os processos cautelares, como pelo facto de a patente de que a Recorrida é titular proteger o primeiro processo de obtenção da substância activa Atorvastatina tal como esta é actualmente comercializada, beneficiando assim da presunção constante do artigo 98.0 do CPI de que qualquer produto contendo a substância activa Atorvastatina será considerado como fabricado através do processo protegido por aquela patente. (f) Ademais, esta não é a sede própria para analisar questões de propriedade industrial, pelo que não poderiam os factos alegados pela Recorrente P………conduzir a uma decisão diversa daquela plasmada na Sentença Recorrida, sendo certo que, mesmo que fosse esta a sede própria para analisar tais questões, a verdade é que os argumentos apresentados nestes autos não servem para afastar a presunção prevista no artigo 98.0 do CPI de que goza a patente da Recorrida. (g) Pois não basta a Recorrente Pharmakern ter alegado que o processo que utiliza para obter a substância activa Atorvastatina não viola a patente da Recorrida uma vez que as reivindicações protegem não apenas as características da invenção especificamente reivindicadas mas ainda aquelas que, embora não sejam idênticas, sejam equivalentes e seria necessária uma análise mais aprofundada entre a equivalência desses elementos para se chegar à conclusão a que chega a (h) Por outro lado, o Tribunal a quo não incorreu em qualquer omissão de pronúncia ou erro de julgamento relativamente ao princípio da adequação pois tendo dado por verificado - e bem - o requisito do fumus non malus iuri, tendo em conta que a mera aprovação de PVPs viola os direitos de propriedade industrial da Recorrida criando uma situação de facto consumado, tendo em conta que os documentos juntos pela Recorrida ao Requerimento Inicial demonstram o impacto que a entrada de genéricos no mercado tem na quota de mercado dos respectivos medicamentos de referência e tendo em conta as regras de experiência comum, é evidente que os actos suspendendos constituíam causa adequada dos prejuízos que foram invocados pela Recorrida. (i) Com efeito, de acordo com a mais elementar racionalidade económica, quando uma entidade obtém o PVP de um medicamento, é previsível e expectável que desenvolva todos os esforços para iniciar a comercialização do medicamento autorizado. A titularidade da patente relativa à substância Atorvastatina confere à Recorrida um direito exclusivo de comercialização temporário, sendo que os actos administrativos em causa visam exactamente permitir a comercialização de medicamentos genéricos de Atorvastatina, conduta que de outro modo estaria vedada a todas Contra-Interessadas, incluindo as Recorrentes. A plena execução de AIMs, de aprovações de PVPs, e de quaisquer outros actos administrativos permissivos (licenças de construção, de produção, etc.) são naturalmente susceptíveis de lesar os direitos de terceiros e os direitos de propriedade industrial da Recorrida são desde logo lesados pela prática dos actos administrativos em apreço. (j) Não é da competência deste Douto Tribunal (e muito menos seria em sede cautelar) analisar questões de propriedade industrial e apreciar a validade ou invalidade da patente invocada. A patente da Recorrida está inteiramente válida, não existindo qualquer decisão, de qualquer entidade competente para o efeito, em contrário. (k) A Sentença Recorrida não incorreu em qualquer erro de julgamento, no que respeita à distribuição material de competências constitucionalmente fixada entre os diversos Tribunais. Tendo em conta o efeito que com a providência cautelar se pretendia obter - a suspensão de eficácia de actos administrativos de AIM praticados pelo Infarmed, cuja validade se encontra ferida por diversos vícios - a Recorrida não poderia validamente ter requerido tal providência cautelar em quaisquer outros tribunais que não nos tribunais administrativos, pois são os tribunais competentes para dirimir os litígios emergentes de relações jurídico­-administrativas são os tribunais administrativos. O que está em causa nestes autos é a suspensão de eficácia de actos administrativos inválidos e não o reconhecimento de direitos de propriedade industrial, incorrendo as Recorrentes G…….. e M… no equívoco de não distinguirem entre o pedido e a causa de pedir. (l) Embora o Tribunal a quo não tenha concordado com a Recorrida no que respeita à manifesta ilegalidade dos actos administrativos em causa, nos termos e para os efeitos do artigo 120.°, nº 1, alínea a), do CPTA, a verdade é que concluiu que, pelo menos, não existe obstáculo ao contra-requisito previsto na segunda parte da alínea b), do artigo 120,° do CPTA. (m) No entanto, por todos os argumentos já expostos nos presentes autos, a precedência da pretensão da Recorrida no âmbito da acção principal é evidente, (n) Não obstante o Requerido na presente providência cautelar ser o Ministério da Economia e Inovação, sempre se diga, para evitar quaisquer dúvidas, que o artigo 19.0 do Estatuto do Medicamento, relativo à concessão de AIMs de medicamentos genéricos, deixa claro que a dispensa de apresentação de ensaios clínicos e pré-clínicos é reconhecida "sem prejuízo dos direitos de propriedade industrial". (o) Nem se defenda, como fazem as Recorrente G…….e M……..r, que o artigo 102.0 do Código de Propriedade Industrial legitima a concessão de AIMs em violação de direitos de propriedade industrial. É que uma coisa é realizar ensaios para preparar os processos administrativos necessários, outra bem diferente é obter uma autorização que permite a introdução do medicamento no mercado, apesar da existência de direitos de propriedade industrial conflituantes. (p) Nunca a Recorrida defendeu (ao contrário do que parecem afirmar as Recorrentes G……. e M………nas suas alegações) que é o Infarmed a autoridade competente no âmbito dos direitos de propriedade industrial. A verdade é que, existindo títulos válidos relativos a direitos de propriedade industrial, in casu, a patente da Recorrida relativa à substância activa Atorvastatina - tal como considerado provado na decisão recorrida - as autoridades administrativas não podem ignorar esses direitos. (q) Quanto muito, se confrontadas com uma qualquer dúvida sobre o âmbito e alcance dos direitos de propriedade industrial, as autoridades administrativas deveriam ter suspenso os procedimentos, nos termos do artigo 31.0 do CPA, até que a autoridade competente - o INPI - se pronunciasse sobre esta questão prejudicial à concessão dos actos administrativos. (r) No nosso ordenamento jurídico nacional, os direitos de propriedade industrial constituem direitos fundamentais de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias constitucionais e a DGAE, enquanto entidade administrativa, encontra-se vinculada ao "bloco de legalidade", que impõe o respeito pelos direitos da Recorrida, pelo que estes não poderiam ter sido ignorados pela DGAE quando da aprovação dos PVPs para os medicamentos genéricos das Recorrentes. Os actos administrativos praticados pela DGAE são, assim, manifestamente ilegais à luz da nossa lei e da nossa Constituição. (s) Os actos administrativos ora em causa são ilegais, independentemente da eventual responsabilidade das Recorrentes decorrente da comercialização dos medicamentos genéricos em causa. Os diferentes planos de responsabilidade não se confundem. (t) Nunca a Recorrida defendeu que competia à DGAE avaliar a bondade da decisão do Infarmed de concessão de AIM. O que sempre defendeu é que no processo judicial em curso intentado contra o Infarmed se suscita uma questão cuja resolução se revela essencial para a tomada de decisão por parte da DGAE: a validade (ou não) das AIMs dos medicamentos genéricos de Atorvastatina. (u) Acresce que os actos administrativos ora em causa padecem de diversos vícios como a inexistência de fundamentação e a violação do direito de audiência prévia da Recorrida. (v) Por outro lado, a detenção de AIMs válidas é condição sine qua non para a aprovação de PVPs, pelo que a DGAE não podia prosseguir com o processo de aprovação dos PVPs do medicamento genérico da Recorrente ou, pelo menos, devia ter suspendido esses processos até estar definitivamente discutida a questão relativa à (in) validade das correspondentes AIMs no âmbito das acções administrativas especiais intentadas pela Recorrida contra o Infarmed, as quais ainda não estão definitivamente julgadas. (w) Ao contrário do que as Recorrentes defendem, os actos suspendendos ofendem os direitos de propriedade industrial da Recorrida, desde logo porque estes foram completamente ignorados pela DGAE quando da aprovação dos PVPs do medicamento genérico da Recorrente. x) A mera aprovação de PVPs para o medicamento genérico em causa viola os direitos de propriedade industrial da Recorrida e implica, desde logo, a verificação de uma situação de facto consumado, enquanto durar a referida violação, não sendo necessário que as Recorrentes procedam efectivamente à comercialização dos medicamentos genéricos de Atorvastatina para que ocorra essa violação. (y) Os actos em crise permitem, nos termos da lei, que as Recorrentes procedam, sem necessidade de posteriores controlos ou autorizações das autoridades portuguesas, à comercialização de medicamentos genéricos do Zarator. Pelo que só a suspensão de eficácia de tais actos administrativos impossibilita a entrada a muito curto prazo dos medicamentos genéricos em causa no mercado. (z) Assim, e conforme elementos e documentos trazidos pela Recorrida a estes autos, a aprovação de PVPs para os medicamentos genéricos das Recorrentes conduzirá a uma redução drástica da quota de mercado e das vendas do medicamento Zarator, bem como à desmobilização de parte significativa da estrutura de apoio à sua comercialização com a consequente diminuição dos postos de trabalho - o que foi devidamente alegado e demonstrado no requerimento inicial e considerado pelo Tribunal a quo. (aa) Além do mais, face ao tempo normal que decorre até à obtenção de sentença definitiva neste tipo de processos, a patente da Recorrida relativa ao medicamento de referência Zarator poderá, entretanto, caducar. (bb) Deste modo, a concessão da providência requerida pela Recorrida torna-se necessária para evitar o risco de infrutuosidade da sentença a proferir no processo principal. (cc) Para efeitos de ponderação dos interesses públicos e privados em presença, nos termos do n. 2, do artigo 120. ° do CPTA, o Tribunal a quo fez um juízo absolutamente acertado. (dd) A Recorrida demonstrou, desde logo, que não existia qualquer prejuízo para o interesse público na disponibilidade de medicamentos para tratamento da hipercolesterolemia - não só existe o Zarator, como existem outros medicamentos para o tratamento desta patologia com base noutras substâncias activas, quer medicamentos de referência, quer medicamentos genéricos. (ee) Ao invés, permitir a introdução no mercado dos medicamentos genéricos em causa, ao arrepio de direitos de propriedade industrial válidos, originaria uma situação de concorrência desleal. (ff) Aliás, a conduta da DGAE propicia um insustentável grau de incerteza quanto ao retorno dos elevados investimentos realizados pelas empresas farmacêuticas na investigação e desenvolvimento de novas terapêuticas, o que não é, de todo, favorável ao desenvolvimento de novos fármacos, prejudicando-se, aí sim, os interesses públicos e privados em presença. (gg) Acresce que a DGAE não invoca, concretiza ou demonstra a existência da superioridade dos seus danos face aos invocados pela Recorrida, revelando, aliás, tal como as Recorrentes, uma total incapacidade de enunciar qualquer dano decorrente da eventual concessão da providência requerida. (hh) Não basta às Recorrentes invocarem a existência de danos para o interesse público - danos esses que nem mesmo a DGAE invocou. A promoção de medicamentos genéricos não pode ser feita a todo o custo, muito menos à custa da violação de direitos de terceiros. (ii) Como tal, verificam-se todos os requisitos legais para o decretamento da suspensão requerida, não merecendo a decisão recorrida qualquer censura. * O Exmº representante do Ministério Público junto deste Tribunal foi notificado para, em defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, de interesses públicos especialmente relevantes ou de algum dos valores ou bens referidos no n.º 2 do artigo 9.º do CPTA, se pronunciar sobre o mérito do recurso (art. 146º nº 1 do CPTA). Nada disse. * Sem vistos nos termos legais, importa agora em conferência apreciar e decidir. II. FUNDAMENTAÇÃO O tribunal de 1ª instância considerou provada a matéria de facto seguinte: «A) A requerente é uma sociedade comercial por quotas cujo objecto consiste no comércio e indústria de produtos químicos e farmacêuticos - ver doe n° 1 junto com o requerimento inicial. B) A requerente é titular de quatro autorizações de introdução no mercado do medicamento Zarator (10, 20, 40 e 80 mg) - ver doc n° 2 junto com o requerimento inicial. C) O medicamento Zarator é fabricado com base na substância activa Atorvastatina - ver doe n° 2 junto com o requerimento inicial. D) A patente referente a essa substância activa - a patente n° ……. - pertence à sociedade W….. L…….. Company - ver docs. n° 3 junto com o requerimento inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. E) Em 25.3.2005 a requerente, a Warner e os vários outros membros do Grupo ……. formalizaram os termos do sub-licenciamento relativo às seguintes patentes da Warner em Portugal referentes à Atorvastatina: Patente de Invenção Nacional n° …… válida até 13.9.2009, patente ……8 válida até 10.1.2012 e patente de invenção europeia n° ………válida até 8.7.2016 - ver doe n° 4 junto com o requerimento inicial. F) O sub-licenciamento antes referido está registado no Instituto Nacional de Propriedade Industrial a favor da requerente - ver doe n° 4 junto com o requerimento inicial. G) Na presente data apenas a patente…….. objecto deste contrato de sub-licenciamento se encontra ainda em vigor - ver doe n° 3 e 4 juntos com o requerimento inicial. H) A patente n° ……… refere-se ao processo para a preparação de ácido (R­(R*R *))-2-(4-fluorfenil)- .... - DI-Hidroxi-5-(1-METILETIL)-3-FENIL-4­((FENILAMINO)-CARBONIL)-lH-PIR-ROL-HEPTANOICO, da sua Lactona e sais e de composições farmacêuticas que os contêm - ver doe n° 3 junto com o requerimento inicial. I) Nos termos do contrato de sub-licenciamento, a requerente está autorizada a explorar comercialmente em Portugal, incluindo os direitos de importar, utilizar e vender, produtos farmacêuticos que contenham a substância activa Atorvastatina e/ ou sejam fabricados de acordo com os processos descritos e reivindicados na referida patente …… - ver doe n° 4 junto com o requerimento inicial. J) A requerente encontra-se também expressamente autorizada a requerer e diligenciar no sentido de obter AIMs para produtos farmacêuticos que contenham a substância activa Atorvastatina e que sejam fabricados de acordo com os processos descritos na mencionada patente - ver does n° 3 e n° 4 juntos com o requerimento inicial. K) Na titularidade da patente n° ……, foram concedidas à Warner três autorizações de introdução no mercado do medicamento Zarator (10, 20, 40 mg), por despacho de 7.6.1997 do Vogal do Conselho de Administração do requerido e depois, já à requerente, uma autorização de introdução no mercado do medicamento Zarator (80mg) por despacho de 24.7.2002 do Vogal do Conselho de Administração do requerido - ver does n° 9 e 10 juntos com o requerimento inicial. L) As referidas autorizações de introdução no mercado foram renovadas, pela primeira vez, por deliberação de 17.6.2002 do Conselho de Administração do Infarmed (nas dosagens 10, 20 e 40 mg) e, pela segunda vez, por despacho de 14.9.2007 do Director da Direcção de Medicamentos e Produtos de Saúde, no âmbito de competência subdelegada (em todas as dosagens) - ver does n° 11 e 12 juntos com o requerimento inicial. M) O resumo das características do medicamento Zarator e o respectivo folheto informativo actualizados foram aprovados por deliberação de 14.9.2007 do Conselho de Administração do Infarmed - ver doe n° 12 junto com o requerimento inicial. N) As AIMs de que a requerente é titular permitiram-lhe introduzir no mercado o medicamento Zarator, na forma de comprimidos revestidos por película, na dosagem de 10 mg em blisters de 14, 28 e 56 unidades, na dosagem de 20 mg e 40 mg em blisters de 28 e 56 unidades e na dosagem de 80 mg em blisters de 28 e 56 unidades e em frascos de 90 unidades ­ver doe n° 2 junto com o requerimento inicial. O) A requerente tomou conhecimento de que o INFARMED concedeu as seguintes AIMs para medicamentos genéricos de Atorvastatina: i) três AIMs do medicamento genérico Atorvastatina Grená, nas dosagens 10,20 e 40 mg, em 291.1.2010, à Contra-interessada Generis - ver doe n° 13 junto com o requerimento inicial, ii) três AMIs do medicamento genérico Atorvastatina Krevalin, nas dosagens 10,20 e 40 mg, em 29.1.2010, à Contra-interessada Generis - ver doe n° 14 junto com o requerimento inicial, iii) três AIMs do medicamento genérico Atorvastatina Mer, nas dosagens de 10,20 e 40 mg, em 29.1.2010, à Contra-interessada Mer - ver doe n° 15 junto com o requerimento inicial, iv) três AIMs do medicamento genérico Atorvastatina Pharmakern, nas dosagens 10,20 e 40 mg, em 29.12.2009, à Contra-interessada Pharmakern - ver doe n° 16 junto com o requerimento inicial, v) três AIMs do medicamento genérico Atorvastatina Stelma, nas dosagens 10,20 e 40 mg, em 29.1.2010, à Contra-interessada Generis - ver doe n° 17 junto com o requerimento inicial, vi) três AIMs do medicamento genérico Atorvastatina Tavitan, nas dosagens 10, 20, 40 e 80 mg, em 30.11.2009, à Contra-interessada Baldacci - ver doe n° 18 junto com o requerimento inicial. P) Em consequência, a requerente requereu o decretamento de providências cautelares de suspensão de eficácia dos actos administrativos praticados pelo Infarmed de AIM dos medicamentos genéricos acima referidos, as quais correm termos neste TAC de Sintra, sob o n° 79/10.7BESNT e n° 423/10.7BESNT - por consulta no SITAF. Q) Do requerimento das mencionadas providências cautelares contra o Infarmed deu a requerente conhecimento à DGAE, por meio de cartas datadas de 27.1.2010 e 26.3.2010 - ver doc. n° 19 e 20 juntos com o requerimento inicial. R) Por meio destas cartas, a requerente veio informar a DGAE de que existiam duas questões prejudiciais que impediriam a apreciação de qualquer pedido de aprovação de PVP que as Contra-interessadas pudessem eventualmente ter submetido ou viesse a submeter à DGAE para os medicamentos genéricos em causa nestes autos, a saber: a titularidade de uma patente válida por parte da requerente relativamente à substância activa Atorvastatina (medicamento de referência: Zarator), bem como a existência de processo judicial em curso relativo à suspensão da eficácia dos actos administrativos de AIM desses medicamentos - ver does n° 19 e 20 juntos com o requerimento inicial. S) Cumulativamente, a requerente intentou as respectivas acções administrativas especiais para impugnação dos actos administrativos de AIM dos medicamentos genéricos de Atorvastatina ora em causa, as quais correm igualmente neste TAP de Sintra, sob o n° 679/l0.5BESNT e n° 274/l0.9BESNT - sob consulta no SITAF. T) Para além das cartas acima referidas, a requerente havia já trocado diversas comunicações com a DGAE no âmbito de outros procedimentos tendentes à aprovação de PVPs de medicamentos genéricos de Atorvastatina - ver doe n° 21 junto com o requerimento inicial. U) Entretanto, as Contra-interessadas desencadearam junto da DGAE procedimentos tendentes à aprovação de PVPs dos medicamentos genéricos em causa nos presentes autos - por acordo. V) Actos suspendendos: O Director Geral da Direcção Geral das Actividades Económicas aprovou os preços de venda ao público dos medicamentos genéricos: - Atorvastatina Grena, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostos pela sociedade Generis Farmacêutica, SA (Contra-interessada), por despacho n° 278/20l0/DG, de 24.3.2010; - Atorvastatina Krevalin, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostos pela sociedade Generis, por despacho n° 276/20l0/DG, de 24.3.2010; - Atorvastatina Mer, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostas pela sociedade Mer Medicamentos, Lda. (Contra-interessada), por despacho n° 275/20l0/DG, de 24.3.2010; - Atorvastatina Pharmakem, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostas pela sociedade Pharmakem Portugal - Produtos Farmacêuticos, Sociedade unipessoal, Lda. (como Contra - interessada), por despacho n° l48/20l0/DG, de 17.2.2010; - Atorvastatina Stelma, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostas pela sociedade Generis, por despacho n° 277/20l0/DG, de 24.3.2010; - Atorvastatina Tavitan, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostas pela sociedade Baldacci - Portugal, SA (como Contra-interessada), por despacho n° l82/20l0/DG, de 26.2.2010 - ver does n° 13 a 18 juntos com o requerimento inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. W) Estes actos administrativos de aprovação dos PVPs foram conhecidos pela requerente por meio dos elementos que, a seu pedido, lhe foram remetidos pela DGAE, em 23.4.2010 - ver does n° 22 a 27 juntos com o requerimento inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. X) Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor dos documentos n° 33, 36, 37 juntos com o requerimento inicial. A convicção do Tribunal quanto à matéria de facto com relevo para a decisão da causa fundou-se na apreciação crítica do conjunto da prova documental junta e, depois, indicada em cada alínea dos factos provados.» Foi invocada a nulidade da decisão cautelar. Veremos. II.2. APRECIAÇÃO DO RECURSO O âmbito do recurso jurisdicional, cujo objecto é a decisão recorrida, é delimitado pelas Recorrentes nas conclusões das suas alegações (sem prejuízo do conhecimento das questões de conhecimento oficioso). Vejamos. 1º DA INCOMPETÊNCIA LEGAL DA JURISDIÇÃO ADMINISTRATIVA Os tribunais administrativos são competentes, em razão da matéria, para conhecerem do processo cautelar de suspensão de eficácia dos actos administrativos de AIM de medicamentos genéricos, tal como o são quanto à fixação do PVP (fixação dos preços máximos dos medicamentos de uso humano sujeitos a receita médica e dos medicamentos não sujeitos a receita médica comparticipados). Com efeito, é simples de concluir que a relação jurídica existente entre a DGAE e os interessados no PVP tem natureza administrativa como se exige no art. 212º-3 CRP e no art. 1º do ETAF: é aquela em que um dos sujeitos, pelo menos, seja uma entidade pública ou uma entidade particular no exercício de um poder público, actuando com vista à realização de interesse público legalmente definido no Decreto-Lei n. ° 65/2007. Cfr. assim o Ac. deste Tribunal Central Administrativo Sul de 23-9-2010, P. nº 6592/10. Pelo que improcede esta excepção. 2º A DECISÃO RECORRIDA, em sede de Direito, disse em síntese o seguinte (falando demais nas AIMs, em entender deste tribunal superior): «Ao apreciar a providência cautelar em apreço o Tribunal deve avaliar, sumariamente, qual o grau de probabilidade de procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal. Se considerar que é evidente a procedência da acção principal, designadamente por estar em causa um acto manifestamente ilegal, deve, nos termos do art. 120°, n° 1, al. a) do CPTA, decretar a providência solicitada independentemente da prova de qualquer outro pressuposto. Este critério da aparência do bom direito ou do fumus boni iuris - previsto na al. a) do n° 1 do art. 120° do CPTA é decisivo, sem mais, e uma vez preenchido, para a concessão da providência requerida. Com efeito, o processo cautelar visa assegurar a utilidade da sentença que vier a ser proferida na acção principal e tem, ainda, como características típicas a provisoriedade, porque não resolve definitivamente o litígio em presença e a cognição sumária da situação de facto e de direito. Assim, não cabe no âmbito dos presentes autos avaliar se os actos administrativos de aprovação do preço de venda ao público dos medicamentos Genéricos Atorvastatina Grena, Krevalin, Mer, Pharmakem, Stelma, Baldacci são legais ou ilegais, antecipando desse modo para um processo sumário, a da acção principal, acção administrativa especial de impugnação de actos administrativos, mas tão só avaliar se a invalidade que a requerente lhes imputa é tão manifesta e evidente que não deixe dúvidas sobre a necessária procedência da pretensão material a julgar na acção principal, caso em que a providência será adoptada sem mais, ou se, pelo menos, não sendo manifesta, é provável a procedência da acção principal e, então, se analisam os demais pressupostos da providência requerida. Os presentes autos foram intentados como preliminar da acção administrativa especial de impugnação de actos administrativos. E nestes autos, de providência cautelar, a requerente sustenta a ilegalidade dos actos suspendendos em: 1. Vício de forma por falta de fundamentação; 2. Vício de forma por violação do direito de audiência prévia (a requerente na qualidade de interessada deveria ter sido ouvida antes de serem proferidos os actos suspendendos); 3. Vício de violação de lei, por violação do art. 4° do DL n° 65/2007, art. 1°, n° 1 da Portaria n° 300-A/2007; 4. Violação de direitos fundamentais (direitos de propriedade industrial da requerente) de natureza análoga a direitos, liberdades e garantias; A requerente sempre defendeu que a DGAE deveria indeferir os requerimentos de aprovação de PVPs para medicamentos genéricos de Atorvastatina na pendência da validade das suas patentes relativas a esta substância activa. Ou que, no limite, a DGAE deveria suspender os respectivos procedimentos de aprovação de PVP com base no art. 31° do Código de Procedimento Administrativo, que determina que se a decisão final de um procedimento administrativo depender da resolução de outro órgão administrativo ou dos Tribunais, o procedimento deve ser suspenso até que o órgão ou Tribunal competente se pronuncie, salvo se da não resolução imediata do assunto resultarem graves prejuízos. Nas acções intentadas pela requerente contra o Infarmed, suscita-se uma questão cuja resolução se revela essencial para a tomada de decisão por parte da DGAE: a validade ou não das AIMs de medicamentos genéricos de Atorvastatina. Apesar da DGAE não ser parte nessas acções, a matéria que aí se encontra em discussão condiciona a sua actuação na aprovação dos preços dos medicamentos genéricos a que aquelas autorizações se referem. Porque a aprovação do PVP de medicamentos não pode ocorrer sem que estes possuam uma AIM válida. Com efeito, a decisão sobre a invalidade das AIMs é prejudicial em relação à questão de saber se a Contra-interessada preenche todos os pressupostos para a aprovação dos PVPs dos medicamentos genéricos em causa. Sucede, refere a requerente, que o juízo de legalidade das AIMs só será proferido no âmbito das acções intentadas contra o Infarmed, as quais se encontram ainda pendentes. Nestes termos o requerido devia ter indeferido os pedidos de aprovação dos PVPs para os medicamentos genéricos das Contra-interessadas ou, em última análise, devia ter suspendido os respectivos procedimentos de aprovação, ao abrigo do disposto no art. 31° do CPA. As contra-interessadas não entendem que assim seja, defendem a legalidade dos actos em crise, considerando, designadamente, que apenas com a comercialização dos medicamentos genéricos poderia ocorrer violação do direito de patente da requerente. O que não acontece, porque quer as AIMs quer os PVP somente criam nas Contra-interessadas uma expectativa de se verificar a caducidade da patente e, então, proceder à comercialização dos genéricos. Em suma, embrenham-se as partes do litígio em extensas alegações, de facto e de direito, sobre a legalidade do procedimento administrativo levado a cabo pelo requerido, para aprovação dos preços dos medicamentos genéricos Atorvastatina Grena, Krevalin, Mer, Pharmakern, Stelma, Baldacci versus o direito de propriedade industrial titulado pela patente PT 94778. Ora, a diversidade e complexidade da matéria de facto e das questões jurídicas em torno do requerimento inicial apresentado revelam, com evidência, não se estar perante qualquer invalidade ostensiva, óbvia ou flagrante, como se exigiria para se proceder à aplicação do art. 120°, n° 1, al. a) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. (…) Do exposto, atentas as posições assumidas pelas partes, a factualidade apurada e a análise e decisão sobre a qualificação jurídica da situação em apreço, não podemos concluir pela verificação, in casu, de ilegalidade manifesta, que «entre pelos olhos dentro» na actuação da Administração (DGAE - Ministério da Economia) ao praticar os actos administrativos de aprovação do preço de venda ao público dos medicamentos genéricos Atorvastatina Grena, Krevalin, Mer, Pharmakern, Stelma, Baldacci (cfr Ac do Tribunal Central Administrativo Norte, de 9.9.2004, processo n° 65/04 e Ac do Tribunal Central Administrativo Sul, de 24.11.2005, processo n° 1117/05, ambos, sob consulta em http:í/www.dgsí.pt/jtcn). Nos autos não foi alegada e provada ilegalidade manifesta donde, em consequência, seja evidente a procedência da pretensão a formular no processo principal, designadamente por estar em causa a impugnação de acto manifestamente ilegal. As ilegalidades assacadas aos actos em crise carecem de uma averiguação apurada no âmbito da acção principal, por neste processo cautelar não podermos afirmar serem as mesmas evidentes. Mas, porque existe esta necessidade, podemos, ainda, afirmar que não é manifesta a falta de fundamento do pedido a formular no processo principal. Termos em que, não pode ser decretada a providência cautelar requerida, sem mais, ao abrigo do disposto no art. 120°, n° 1, al. a) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Pelo que passamos a analisar os pressupostos da concessão da providência cautelar vertidos na al. b) do n° 1 do art. 120° e no n° 2 do mesmo preceito legal do Código do Processo nos Tribunais Administrativos. Porque não é evidente que a requerente, sem mais indagações, tenha razão quanto ao fundo da causa, passemos, nos termos do art. 120°, n° 1, al. b) do Código do Processo nos Tribunais Administrativos, à verificação do periculum in mora e do fumus boni iuris. (…) As ilegalidades invocadas do PVP prendem-se com a potencial violação da patente e dos direitos da requerente que a mesma protege. Ora, como ficou escrito no Ac do Tribunal Central Administrativo Sul, de 28.1.2010, processo n° 5790/09 «o direito de patente consome-se no preciso momento em que cada produto abrangido pela patente é comercializado, cessando nesse momento e em relação a cada um deles tal privilégio». É certo que na acção principal terá de se averiguar se o medicamento das Contra-interessadas será obtido por um processo igual ou diferente do utilizado no medicamento de referência da requerente. No entanto, como foi decidido no citado acórdão, a «noção de irreparabilidade do direito está intimamente ligada ao conceito de facto consumado, isto é, a impossibilidade de reposição do status quo ante, sem prejuízo da reparabilidade poder operar por outra via, qual seja a prevista no art. 566° do Código Civil». E o que sucede nos autos é que a violação do direito da requerente «causa duas situações de facto consumado: (a) por um lado a perda irreversível de quota de mercado, que não se mede apenas pela perda dos rendimentos correlativas, já que afecta a performance pública da empresa, (b) e por outro a perda do exclusivo de produção e ou comercialização do produto que a patente protege, impossível de ser reposto». Tanto basta para que dos factos provados seja possível subsumir, em juízo perfunctório, o requisito do periculum in mora nos termos do art. 120°, nº 1, al. b), do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. A somar ao que vimos de dizer, resulta que não é seguro concluir pela improcedência da pretensão material da requerente, do direito que se arroga. Apurados que se encontram pendentes acções sobre a legalidade das AIMs concedidas aos medicamentos genéricos Atorvastatina das Contra-interessadas, não estamos em condições de afirmar que, com a comercialização dos medicamentos genéricos das mesmas, não existe qualquer infracção ao direito de exclusivo da requerente. Assim, deve-se concluir que não é manifesta a falta de fundamento da pretensão anulatória dos actos de 2.6.2010 a formular ou formulada pela ora requerente no processo principal. Em conformidade com o exposto, o Tribunal decide estar verificado também o fumus boni iuris constante da 2a parte da al. b) do n° 1 do art. 120° do Código do Processo nos Tribunais Administrativos. (…) Ponderados os interesses em presença (públicos e/ ou particulares), a providência requerida deve ser recusada sempre que os prejuízos que resultariam da sua adopção se mostrem superiores aos prejuízos que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências (cfr art. 120°, n° 2 do CPTA). (…) Porém, «se estiver em causa o fundado receio de tal lesão ilegal de um direito fundamental do particular, o Tribunal deverá, na dúvida, decretar a providência cautelar, concedendo, assim, prioridade ao direito fundamental do particular sobre a prossecução do interesse público» (cfr. Freitas do Amaral in Cadernos da Justiça Administrativa, n° 40, pág. 14, e citação inserta no Ac do Tribunal Central Administrativo Sul de 22.10.2009, processo n° 5276/09). Ora, o requerido não invocou, não concretizou, não demonstrou a existência de danos superiores do interesse público em relação aos danos invocados pela requerente. Já as Contra-interessadas defenderam a necessidade de protecção do interesse público à protecção da saúde e do direito que assiste às Contra-interessadas de, não violando os direitos de propriedade industrial de que são titulares as sociedades W….. e requerente, se apresentarem ao mercado em condições de poder iniciar a comercialização dos respectivos medicamentos. Mas, como refere a requerente, os consumidores têm acesso a medicamentos genéricos neste grupo terapêutico. O que significa que não fica demonstrada lesão para o interesse público e o interesse particular das Contra-interessadas sempre depende de se considerar que os actos suspendendos são legais. Assim, estando em causa a eventual lesão de um direito fundamental e não estando demonstrada lesão efectiva, real, concreta para o interesse público (na introdução de genéricos no mercado - emergente da diminuição de encargos com o orçamento da saúde e das vantagens que confere aos particulares) ou para os interesses privados das Contra-interessadas resultante da concessão da suspensão de eficácia requerida, sempre se deve dar prevalência àquele e determinar a suspensão de eficácia dos actos suspendendos (cfr Acs. do Tribunal Central Administrativo Sul de 22.10.2009, processo n° 5276/09, e de 30.10.2008, processo n° 4205/08).» 3º DA AIM e DO PVP Medicamentos são substâncias ou composições de substâncias que possuam propriedades curativas ou preventivas das doenças e dos seus sintomas, do homem ou do animal, com vista a estabelecer um diagnóstico médico ou a restaurar, corrigir ou modificar as suas funções. Para ser comercializado, o medicamento precisa de obter a respectiva autorização de introdução no mercado (AIM). Esta autorização é concedida pelo INFARMED, após avaliação, por peritos e técnicos especializados, da documentação que comprova a qualidade, segurança e eficácia do medicamento. Os critérios utilizados para a concessão da AIM são os constantes nas disposições legais nacionais e nos normativos comunitários. A entidade à qual é atribuída esta autorização, e da qual depende a comercialização do medicamento, designa-se por Titular de Autorização de Introdução no Mercado (AIM). A legislação contempla algumas excepções à obrigatoriedade de AIM; são exemplos, os medicamentos manipulados (preparados oficinais e fórmulas magistrais) e medicamentos destinados aos ensaios de verificação e de desenvolvimento (medicamentos experimentais). O INFARMED pode ainda autorizar, com carácter excepcional, a utilização de medicamentos não possuidores de AIM, através da Autorização de Utilização Especial (AUE), concedida a instituições de saúde licenciadas para aquisição directa de medicamentos. O Decreto-Lei n.° 176/2006, de 30 de Agosto estabeleceu o regime jurídico dos medicamentos de uso humano, transpondo a Directiva n.° 2001/83/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Novembro, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano, bem como as Directivas n.os 2002/98/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de Janeiro, 2003/63/CE, da Comissão, de 25 de Junho, e 2004/24/CE e 2004/27/CE, ambas do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março, e altera o Decreto-Lei n.° 495/99, de 18 de Novembro. O Estatuto do Medicamento, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de Agosto (1), estabelece, no artigo 103.º, que o regime de preços dos medicamentos sujeitos a receita médica e dos medicamentos não sujeitos a receita médica comparticipados é fixado por decreto-lei. A al. nn) do n.° 1 do art.º 3.° define medicamento genérico como o "medicamento com a mesma composição qualitativa e quantitativa em substâncias activas, a mesma forma farmacêutica e cuja bioequivalência com o medicamento de referência haja sido demonstrada por estudos de biodisponibilidade apropriados". O medicamento genérico caracteriza-se, essencialmente, por conter o mesmo fármaco (princípio activo responsável pelo efeito terapêutico), na mesma dosagem e forma farmacêutica, com a mesma via de administração e indicação terapêutica do medicamento de referência, que sendo normalmente inovador, foi autorizado com base em documentação completa, incluindo resultados de ensaios farmacêuticos, pré-clínicos e clínicos [al. ii) do n.° 1 do art.º 3.°] ou seja, cuja eficácia, segurança e qualidade foram comprovadas cientificamente. O medicamente de referência encontra-se, por regra, há bastante tempo no mercado: tendo uma marca comercial conhecida e registada. Como os medicamentos genéricos são comercializados e prescritos pelo nome do princípio activo, não suportam os chamados custos de marca, pelo que apresentam preços significativamente mais baixos do que os fixados para medicamentos de referência. Como qualquer medicamento o genérico está sujeito a AIM, cuja concessão não prejudica a responsabilidade, civil ou criminal, do respectivo titular (art.º 14.°, n.° 4). O art.º 25° prevê os casos em que um pedido de AIM possa ser indeferido, dele não constando qualquer referência a protecção de patentes ou semelhantes, contrariamente ao que sucedia na legislação anterior. A iniciativa económica privada da comercialização de medicamentos de uso humano em Portugal, não sendo uma actividade proibida, é uma actividade fortemente regulada desde logo por imposição constitucional – cfr. artigo 64º, nº 3, alínea e) da CRP – em vista dos interesses públicos da saúde da população e do acesso aos medicamentos por via da tabelação de preços máximos e comparticipação, regulação expressa na intervenção permissiva do Estado objectivada em dois actos administrativos, cujo procedimento se inicia a requerimento do interessado. A autorização de introdução no mercado [AIM] da competência do INFARMED – cfr. artigos 14º, nº 1, 15º, nº 1 e 23º, nº 1, do DL nº 176/2006, de 30/8 –, tem por finalidade remover o limite de exercício do direito pré-existente da iniciativa económica privada, constitucionalmente configurado no artigo 62º da CRP (Ac. deste Tribunal Central Administrativo Sul de 13-1-2011, P. nº 6988/10). A AIM é, portanto, uma decisão administrativa do tipo previsto no art. 120º CPA e que tem a ver directamente com a qualidade técnica do medicamento, a saúde pública e, logicamente, com a introdução do medicamento no mercado. Mediante a prática do acto administrativo de AIM, a Administração define um complexo de relações jurídicas concretas de direito público e, através deste acto autorizativo, investe o requerente de AIM num título capaz de, pela força jurídica que lhe é inerente, produzir efeitos jurídicos concretos e específicos, v.g., o poder de o sujeito titulado comercializar o medicamento a que a AIM respeita (v. Ac. deste Tribunal Central Administrativo Sul de 13-1-2011, P. nº 6988/10). Este Tribunal Central Administrativo Sul já decidiu o seguinte, a que aqui aderimos: O direito de propriedade consagrado no art. 62º. da C.R.P., que abrange os direitos de propriedade industrial, onde se incluem os direitos fundados em patentes de medicamentos, tem sido considerado um direito fundamental de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias para efeitos de aplicação do regime constante dos arts. 17º. e 18º. da CRP. A concessão de AIM de medicamentos genéricos configura a decisão central no procedimento administrativo tendente à comercialização de tais medicamentos, sendo este o único efeito que com aquela concessão é pretendido. Estando os órgãos da Administração vinculados directamente aos direitos, liberdades e garantias e devendo interpretar e aplicar as normas em conformidade com os direitos fundamentais, atribuindo-lhes o sentido que melhor promova a sua efectividade, o Infarmed tem o dever de indeferir qualquer pedido de AIM quando a atribuição dessa autorização viabilize a violação dos direitos protegidos por patente. Assim, verifica-se o requisito do “fumus boni iuris”, por não ser manifesta a falta de fundamento da pretensão anulatória que tem por objecto as referidas AIMs. Estando em causa o fundado receio de lesão ilegal de um direito fundamental da recorrente, deve dar-se prevalência ao interesse desta para efeitos do disposto no nº 2 do art. 120º. do CPTA. A concessão da suspensão de eficácia das AIMs de medicamentos genéricos obsta à fixação dos PVP e impede a sua comercialização, satisfazendo, assim, integralmente os interesses que levaram a recorrente a intentar a intimação para abstenção da fixação desses preços (Ac. de 23-9-2010, P. nº 6592/10). Se o direito de propriedade industrial sobre um processo de fabrico confere ao respectivo titular direito de impedir a terceiros, sem o seu consentimento, nomeadamente, o fabrico, a introdução no comércio ou a utilização de um produto objecto de patente, então a caducidade ou o termo de vigência desse direito obviamente que tem o efeito contrário, findando nestes casos a exclusividade concedida ao particular. Não basta, porém, para que o medicamento seja comercializado que seja concedida AIM. É necessário, ainda, que o seu preço de venda ao público seja fixado administrativamente. O artigo 103° estabelece que o regime de preços dos medicamentos sujeitos a receita médica é fixado por decreto-lei, o que veio a ser feito pelo Decreto-lei nº 65/2007, de 14 de Março, cujo art. 1. ° atribuiu à (actualmente) DGAE a competência fixar os preços dos medicamentos de uso humano sujeitos a receita médica e dos medicamentos não sujeitos a receita médica comparticipados pelo Serviço Nacional de Saúde, todos eles sujeitos a regime de preços máximos (art. 3.° desse diploma). Os medicamentos de uso humano sujeitos a receita médica e os medicamentos não sujeitos a receita médica comparticipados estão sujeitos ao regime de preços máximos. A natureza poligonal ou multipolar da situação jurídica administrativa em que se insere o acto de concessão de AIM fundamenta a legitimidade de intervenção de terceiros titulares de direitos exclusivos assentes em patente/certificado complementar de protecção do medicamento de referência, no procedimento autorizativo para o medicamento genérico e de controlo participado no iter de formação da decisão, ao abrigo do estatuto jurídico de contra-interessados - artºs. 52º e 53º CPA (v. Acs. deste Tribunal Central Administrativo Sul de 13-1-2011, P. nº 7000/10; e de 25-11-2010, P. nº 6772/10). O Decreto-Lei n.° 65/2007 foi regulamentado pela Portaria n.º 300-A/2007, de 19 de Março, cujo art.º 4.° dispõe que os preços fixados pela DGAE "podem ser praticados pelos titulares das AIM, ou os seus representantes legais, após recepção das respectivas comunicações ou, na falta de qualquer comunicação por parte da DGAE, no prazo de 60 ou 45 dias, consoante se trate de medicamentos em geral ou genéricos, contados da data de recepção do pedido, considerando-se, neste caso, tacitamente autorizados os preços propostos pelo requerente". O Decreto-Lei 65/2007 vem consagrar uma nova metodologia da formação dos preços dos novos medicamentos, sendo que uma das alterações consiste em o preço inicial do medicamento ser formado através da comparação com a média dos preços dos países de referência, sendo o preço assim obtido o preço máximo a praticar nos estádios de produção ou de importação. Resulta do Decreto-Lei 65/2007 o seguinte: 1. - Compete à DGAE fixar os preços dos medicamentos abrangidos pelo Decreto-Lei 65/2007 (medicamentos de uso humano sujeitos a receita médica e dos medicamentos não sujeitos a receita médica comparticipados). 2. - São considerados preços máximos os PVP fixados pela DGAE. 3. - Compete ao Instituto Nacional da Farmácia e do Medicamento (INFARMED) regular os preços dos medicamentos comparticipados ou a comparticipar nos termos definidos no regime jurídico de comparticipação do Estado no preço dos medicamentos. 4. - O preço de venda ao público do medicamento é composto por: a) Preço de venda ao armazenista; b) Margem de comercialização do distribuidor grossista; c) Margem de comercialização do retalhista; d) Taxa sobre a comercialização dos medicamentos; e) Imposto sobre o valor acrescentado (art. 5º do Decreto-Lei 65/2007). 5. - O PVP dos medicamentos a introduzir pela primeira vez no mercado nacional ou os referentes a alterações da forma farmacêutica e da dosagem não podem exceder a média que resultar da comparação com preços nos estádios de produção ou importação (PVA) em vigor nos países de referência para o mesmo medicamento ou, caso este não exista, para as especialidades farmacêuticas idênticas ou essencialmente similares, nos termos adiante definidos, sem taxas nem impostos, acrescido das margens de comercialização, taxas e impostos vigentes em Portugal. Os países de referência mencionados são a Espanha, a França, a Itália e a Grécia. 6. - O PVA em Portugal não pode exceder: a) A média dos PVA em vigor em todos os países de referência para o mesmo medicamento ou, caso este não exista em todos eles, a média do PVA em vigor em pelo menos dois desses países; b) No caso de só existir o mesmo medicamento num dos quatro países de referência, o PVA em vigor nesse país; c) No caso do mesmo medicamento não existir em nenhum dos países de referência, a média dos PVA mais baixos das especialidades farmacêuticas idênticas ou essencialmente similares desse medicamento em vigor no maior número possível destes países, excluindo os medicamentos genéricos; d) No caso de não existir o mesmo medicamento nem especialidades farmacêuticas idênticas ou essencialmente similares desse medicamento em qualquer dos países de referência e existir em Portugal, o PVA fixado para especialidade farmacêutica idêntica ou essencialmente similar que esteja a ser comercializada no mercado nacional; e) No caso de não existir o mesmo medicamento ou a especialidade farmacêutica idêntica ou essencialmente similar desse medicamento em qualquer dos países de referência e no mercado nacional, o PVA em vigor no país de origem. 7. - O PVP dos medicamentos genéricos a introduzir no mercado nacional, bem como os que sejam objecto do procedimento previsto no n.º 3 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de Agosto, é inferior no mínimo em 35% ao PVP do medicamento de referência, com igual dosagem e na mesma forma farmacêutica. 8. - O PVP dos medicamentos genéricos a introduzir no mercado nacional, bem como os que sejam objecto do procedimento previsto no n.º 3 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 176/2006, de 30 de Agosto, é inferior no mínimo em 20% ao PVP do medicamento de referência, com igual dosagem e na mesma forma farmacêutica, desde que este seja inferior a (euro) 10 no PVA em todas as apresentações. 9. - O medicamento de referência para tais efeitos é o medicamento que esteja, ou tenha sido, autorizado há mais tempo em Portugal com base em documentação completa, incluindo resultados de ensaios farmacêuticos, pré-clínicos e clínicos com a mesma composição qualitativa e quantitativa em substâncias activas. 10. - Os PVP de medicamentos objecto de importação paralela a introduzir no mercado nacional devem ser inferiores no mínimo em 5% ao PVP do medicamento considerado e dos medicamentos idênticos ou essencialmente considerados objecto de autorização de introdução no mercado em Portugal. 11. - A fixação das margens máximas de comercialização é definida em legislação própria. 12. - Os pedidos de autorização de preços dos medicamentos, nos termos do Decreto-Lei n.º 65/2007, de 14 de Março, devidamente instruídos, são apresentados pelos titulares de autorização de introdução no mercado, ou pelos seus representantes legais, junto da DGAE. 13. - Os titulares de AIM, ou os seus representantes legais, podem proceder a variações daqueles preços, desde que a nível inferior ao estipulado, e voltar a praticar os PVP autorizados, os quais são, para efeitos de aplicação do diploma, os preços oficialmente aprovados (art. 3º-2 da Portaria 300-A/2007). 14. - Os preços fixados pela DGAE, nos termos dos artigos 6.º e 9.º do Decreto-Lei n.º 65/2007, de 14 de Março, podem ser praticados pelos titulares das AIM, ou os seus representantes legais, após recepção das respectivas comunicações ou, na falta de qualquer comunicação por parte da DGAE, no prazo de 60 ou 45 dias, consoante se trate de medicamentos em geral ou genéricos, contados da data de recepção do pedido, considerando-se, neste caso, tacitamente autorizados os preços propostos pelo requerente (art. 4º da Portaria 300-A/2007). A fixação do PVP é, portanto, uma decisão administrativa do tipo previsto no art. 120º CPA, que tem a ver directamente com a defesa do consumidor, a regulação das despesas públicas com a saúde dos cidadãos e, logicamente, a fixação dum elemento essencial da compra e venda de medicamentos. Dito isto, conclui-se que a comercialização de um medicamento genérico impõe que seja obtida AIM, a conceder pelo INFARMED (autoridade administrativa), e que depois seja fixado o seu preço máximo (PVP) pela DGAE (autoridade administrativa), tratando-se, em ambos os casos, de verdadeiros actos administrativos (art. 120º CPA), praticados no primeiro caso por uma pessoa colectiva de direito público (INFARMED) e no segundo por um órgão na dependência do Ministério da Economia e Inovação. Porém, do regime legal não decorre expressamente que nesses actos administrativos tenha de ser averiguada a existência de eventuais direitos de propriedade industrial de contra-interessados, cabendo ao INFARMED controlar, essencialmente, a qualidade e a segurança do medicamento, de harmonia com o disposto no art.º 25° do Estatuto do Medicamento, e cabendo à DGAE fixar os respectivos preços dentro dos objectivos parâmetros legais. Mas, a AIM tem de considerar a violação ou não de outra AIM anterior pertença do titular de patente, pois esta e os seus consequentes direitos económicos para o dono da patente são base da AIM. Irreleva aqui o facto de haver questões de direito privado ou não. Há um acto administrativo que tem de cumprir a lei. O resto são questões de competências jurisdicionais, que não dispensam nunca o previsto no art. 15º CPTA. Já quanto à posterior determinação administrativa do PVP, que nos ocupa neste processo cautelar, entendemos que a determinação administrativa do PVP nada tem a ver com outra eventual AIM de um terceiro ou com eventuais direitos de propriedade industrial de terceiro, devido à sua natureza própria decorrente do modo como é legalmente regulamentada (objectiva e pormenorizadamente) e do momento em que surge no caminho até à comercialização (após a AIM). Trata-se simplesmente de atribuir um PVP a um medicamento “licenciado” pelo INFARMED, cujos parâmetros legais são muitos e objectivos. Dali resulta, no entanto, que a fixação de um PVP pela DGAE é susceptível de, por si ou também por si, lesar ou prejudicar, por vícios seus e não da AIM pressuposta, uma AIM alheia ou um direito de P.I. alheio, relativos ao mesmo medicamento, pois que o PVP é um dos dois elementos essenciais para alguém poder introduzir um medicamento no mercado, em competição com quem já lá está, como é o caso da ora recorrida. Portanto, estamos ante um acto administrativo com eficácia externa, i.e. impugnável, ao abrigo do art. 51º-1 CPTA. Um acto administrativo é acto consequente de outro anterior quando este é seu pressuposto essencial, de tal forma que o acto considerado só tenha sido praticado ou dotado de certo conteúdo em virtude da prática desse outro acto, pressupondo, para a sua validade, que o acto administrativo anterior, de que emergem, seja válido; se o acto administrativo anterior sofre de qualquer vício, este último repercute-se no acto consequente. O PVP é consequente da AIM. Este Tribunal Central Administrativo Sul tem considerado, por vezes e bem, que o acto administrativo de AIM assume a natureza de condição do procedimento a desencadear pelo interessado junto da DGAE para fixação dos máximos de PVP - artº 77º /1/3, DL 176/06 de 30.08 e artº 1º/1, Portaria 300/A/07 de 19.03 (v. Acs. do Tribunal Central Administrativo Sul de 13-1-2011, P. nº 7000/10; de 25-11-2010, P. nº 6772/10). Enfim: · A comercialização de um medicamento genérico impõe que seja obtida AIM, a conceder pelo INFARMED (autoridade administrativa), e que depois seja fixado o seu preço máximo (PVP) pela DGAE (autoridade administrativa), tratando-se, em ambos os casos, de verdadeiros actos administrativos (art. 120º CPA), praticado no primeiro caso por uma pessoa colectiva de direito público (INFARMED) e no segundo por um órgão na dependência do Ministério da Economia e Inovação; · A aprovação do PVP não é inócua, pois é um mais em relação à AIM (decisão administrativa principal, central ou nuclear relativamente à colocação no mercado de um medicamento) para que o medicamento seja colocado no mercado; · A DGAE não tem qualquer obrigação legal de averiguar sobre a existência de patentes relacionadas com o medicamento de referência quando emite o PVP, devendo limitar a sua análise aos requisitos do D.L. 65/2007 e verificar que o medicamento para o qual é pedido o PVP dispõe de AIM, mas sempre sob a égide do CPA; · A fixação ou aprovação de PVP é, pois, um acto consequente da AIM, com procedimento administrativo diferente. O que significa que, se a AIM for inválida, também o será o PVP, mas não o oposto necessariamente. Também significa que devemos separar ou identificar separadamente os vícios de um e de outro. 4º DAS NULIDADES DA DECISÃO CAUTELAR (ART. 668º CPC) Como as partes sabem e por elas pôde ser discutido, o r.i. também invoca, contra os actos suspendendos, além da aparente violação de patente, a falta de fundamentação do acto de fixação do PVP pela DGAE e a falta da sua audiência prévia pela DGAE. A sentença recorrida, como vimos, entendeu decretar a suspensão de eficácia dos actos administrativos (providência cautelar de função conservatória) de fixação do PVP de certos medicamentos, por considerar o seguinte: · Tais actos não padecem de ilegalidades simples manifestas; · Em sede de perigo na demora, está em causa a ilegalidade resultante da violação de patentes da requerente e de seus direitos consequentes, sendo que a quota de mercado da requerente pode ser prejudicada e pode ocorrer uma perda do exclusivo de produção e comercialização do medicamento; · Em sede de aparência do direito invocado, a decisão recorrida considerou que a comercialização destes novos medicamentos genéricos pode ser infracção ao direito de exclusivo da requerente; · Na ponderação, decidiu dar prioridade ao direito fundamental da requerente, já que, do outro lado, há o facto de haver já acesso a este tipo de medicamento, e não relevando nada quanto aos interesses das C-I. No essencial, o despacho cautelar recorrido incorpora teses do Ac. deste Tribunal Central Administrativo Sul de 28-1-2010, P. nº 5790/09, e do Ac. deste Tribunal Central Administrativo Sul de 22-10-2009, P. nº 5276/09. O sumário deste último é: I - No processo cautelar de suspensão de eficácia dos actos de AIM de medicamentos genéricos, verifica-se o requisito do “periculum in mora”, vertido na al. b) do nº 1 do art. 120º. do CPTA, quando é o decretamento dessa suspensão que anula o prejuízo da demora do processo. II - O direito de propriedade consagrado no art. 62º. da C.R.P., que abrange os direitos de propriedade industrial, onde se incluem os direitos fundados em patentes de medicamentos, tem sido considerado um direito fundamental de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias para efeitos de aplicação do regime constante dos arts. 17º. e 18º. da C.R.P. III - A concessão de AIM de medicamentos genéricos configura a decisão central no procedimento administrativo tendente à comercialização de tais medicamentos, sendo este o único efeito que com aquela concessão é pretendido. IV - Estando os órgãos da Administração vinculados directamente aos direitos, liberdades e garantias e devendo interpretar e aplicar as normas em conformidade com os direitos fundamentais, atribuindo-lhes o sentido que melhor promova a sua efectividade, o Infarmed tem o dever de indeferir qualquer pedido de AIM quando a atribuição dessa autorização viabilize a violação dos direitos protegidos por patente. V - Assim, verifica-se o requisito do “fumus boni iuris”, por não ser manifesta a falta de fundamento da pretensão anulatória que tem por objecto as referidas AIMs. VI - Não estando alegado pela autoridade recorrida o prejuízo do interesse público, sendo meramente patrimoniais os prejuízos da contra-interessada e estando em causa o fundado receio de lesão ilegal de um direito fundamental da requerente, deve dar-se prevalência aos interesses desta para efeitos do disposto no nº 2 do art. 120º. do CPTA. VII - Padece da nulidade de “omissão de pronúncia”, a sentença que não decidiu da verificação do requisito do “fumus boni iuris”. Omitiu-se totalmente qualquer ponderação da causalidade adequada entre os actos suspendendos e a alegada violação dos direitos da Requerente e dos danos por esta invocados, em sede de art. 668º-1-d CPC? Não há que apreciar assim esta questão. Com efeito, o que o art. 668º-1-d cit. visa é algo bem diferente. Não se trata de o tribunal ter de referir todos os lados jurídicos de uma questão, mas sim e apenas de pronúncia sobre as matérias/assuntos em litígio (cfr. Ac. deste Tribunal Central Administrativo Sul de 13-1-2011, P. nº 1581/06). Se tal omissão concreta invocada ocorreu, é assunto já do fundo da decisão cautelar, a ver eventualmente noutra sede (art. 120º-2 CPTA). Omitiu-se totalmente, em sede de art. 668º-1-b CPC, a ponderação sobre a possibilidade de adopção de outras providências que evitassem ou atenuassem os danos resultantes do decretamento da providência, de onde resultou violada a norma do artigo 1200 CPTA? Não há que apreciar assim esta questão. De todo. É manifesto. É ilógico. Com efeito, o que o art. 668º-1-b cit. visa é algo bem diferente. Trata-se de a decisão do juiz conter ou não os fundamentos fácticos e de direito. Se tal omissão concreta invocada ocorreu, é assunto já do fundo da decisão cautelar, a ver eventualmente noutra sede (art. 120º-3 CPTA). Mas a verdade é que a decisão recorrida nada disse, de todo, sobre a aparente violação dos arts. 100º e 124º CPA. E isso é uma nulidade, por omissão de pronúncia, ao abrigo do art. 668º-1-d) do CPC. Prosseguiremos ao abrigo do art. 715º CPC. 5º Os FACTOS PROVADOS são: A) A requerente é uma sociedade comercial por quotas cujo objecto consiste no comércio e indústria de produtos químicos e farmacêuticos - ver doc. n° 1 junto com o requerimento inicial. B) A requerente é titular de quatro autorizações de introdução no mercado do medicamento Zarator (10, 20, 40 e 80 mg) - ver doc. n° 2 junto com o requerimento inicial. C) O medicamento Zarator é fabricado com base na substância activa Atorvastatina (2) - ver doc. n° 2 junto com o requerimento inicial. D) A patente referente a essa substância activa - a patente n° 94778 - pertence à sociedade W………. L……….Company - ver doc. n° 3 junto com o requerimento inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. E) Em 25.3.2005 a requerente, a Warner e os vários outros membros do Grupo ………. formalizaram os termos do sub-licenciamento relativo às seguintes patentes da W……… em Portugal referentes à Atorvastatina: Patente de Invenção Nacional n° ……… válida até 13.9.2009, patente ………. válida até 10.1.2012 e patente de invenção europeia n° …………. válida até 8.7.2016 - ver doc. n° 4 junto com o requerimento inicial. F) O sub-licenciamento antes referido está registado no Instituto Nacional de Propriedade Industrial a favor da requerente - ver doe n° 4 junto com o requerimento inicial. G) Na presente data apenas a patente 94778 objecto deste contrato de sub-licenciamento se encontra ainda em vigor - ver doc. n° 3 e 4 juntos com o requerimento inicial. H) A patente nº………….. refere-se ao processo para a preparação de ácido (R­(R*R *))-2-(4-fluorfenil)- .... - DI-Hidroxi-5-(1-METILETIL)-3-FENIL-4­((FENILAMINO)-CARBONIL)-lH-PIR-ROL-HEPTANOICO, da sua Lactona e sais e de composições farmacêuticas que os contêm - ver doc. n° 3 junto com o requerimento inicial. I) Nos termos do contrato de sub-licenciamento, a requerente está autorizada a explorar comercialmente em Portugal, incluindo os direitos de importar, utilizar e vender, produtos farmacêuticos que contenham a substância activa Atorvastatina e/ ou sejam fabricados de acordo com os processos descritos e reivindicados na referida patente …………..- ver doc. n° 4 junto com o requerimento inicial. J) A requerente encontra-se também expressamente autorizada a requerer e diligenciar no sentido de obter AIMs para produtos farmacêuticos que contenham a substância activa Atorvastatina e que sejam fabricados de acordo com os processos descritos na mencionada patente - ver doc. n° 3 e n° 4 juntos com o requerimento inicial. K) Na titularidade da patente n° …………, foram concedidas à Warner três autorizações de introdução no mercado do medicamento Zarator (10, 20, 40 mg), por despacho de 7.6.1997 do Vogal do Conselho de Administração do requerido e depois, já à requerente, uma autorização de introdução no mercado do medicamento Zarator (80mg) por despacho de 24.7.2002 do Vogal do Conselho de Administração do requerido - ver doc. n° 9 e 10 juntos com o requerimento inicial. L) As referidas autorizações de introdução no mercado foram renovadas, pela primeira vez, por deliberação de 17.6.2002 do Conselho de Administração do Infarmed (nas dosagens 10, 20 e 40 mg) e, pela segunda vez, por despacho de 14.9.2007 do Director da Direcção de Medicamentos e Produtos de Saúde, no âmbito de competência subdelegada (em todas as dosagens) - ver doc. n° 11 e 12 juntos com o requerimento inicial. M) O resumo das características do medicamento Zarator e o respectivo folheto informativo actualizados foram aprovados por deliberação de 14.9.2007 do Conselho de Administração do Infarmed - ver doc. n° 12 junto com o requerimento inicial. N) As AIMs de que a requerente é titular permitiram-lhe introduzir no mercado o medicamento Zarator, na forma de comprimidos revestidos por película, na dosagem de 10 mg em blisters de 14, 28 e 56 unidades, na dosagem de 20 mg e 40 mg em blisters de 28 e 56 unidades e na dosagem de 80 mg em blisters de 28 e 56 unidades e em frascos de 90 unidades ­ver doc. n° 2 junto com o requerimento inicial. O) A requerente tomou conhecimento de que o INFARMED concedeu as seguintes AIMs para medicamentos genéricos de Atorvastatina: i) três AIMs do medicamento genérico Atorvastatina Grená, nas dosagens 10,20 e 40 mg, em 291.1.2010, à Contra-interessada Generis - ver doc. n° 13 junto com o requerimento inicial, ii) três AMIs do medicamento genérico Atorvastatina Krevalin, nas dosagens 10,20 e 40 mg, em 29.1.2010, à Contra-interessada Generis - ver doc. n° 14 junto com o requerimento inicial, iii) três AIMs do medicamento genérico Atorvastatina Mer, nas dosagens de 10,20 e 40 mg, em 29.1.2010, à Contra-interessada M………- ver doc. n° 15 junto com o requerimento inicial, iv) três AIMs do medicamento genérico Atorvastatina Pharmakern, nas dosagens 10,20 e 40 mg, em 29.12.2009, à Contra-interessada P………… - ver doc. n° 16 junto com o requerimento inicial, v) três AIMs do medicamento genérico Atorvastatina Stelma, nas dosagens 10,20 e 40 mg, em 29.1.2010, à Contra-interessada G…………… - ver doc. n° 17 junto com o requerimento inicial, vi) três AIMs do medicamento genérico Atorvastatina Tavitan, nas dosagens 10, 20, 40 e 80 mg, em 30.11.2009, à Contra-interessada B……………- ver doc. n° 18 junto com o requerimento inicial. P) Em consequência, a requerente requereu o decretamento de providências cautelares de suspensão de eficácia dos actos administrativos praticados pelo Infarmed de AIM dos medicamentos genéricos acima referidos, as quais correm termos neste TAC de Sintra, sob o n° 79/10.7BESNT e n° 423/10.7BESNT - por consulta no SITAF. Q) Do requerimento das mencionadas providências cautelares contra o Infarmed deu a requerente conhecimento à DGAE, por meio de cartas datadas de 27.1.2010 e 26.3.2010 - ver doc. n° 19 e 20 juntos com o requerimento inicial. R) Por meio destas cartas, a requerente veio informar a DGAE de que existiam duas questões prejudiciais que impediriam a apreciação de qualquer pedido de aprovação de PVP que as Contra-interessadas pudessem eventualmente ter submetido ou viesse a submeter à DGAE para os medicamentos genéricos em causa nestes autos, a saber: a titularidade de uma patente válida por parte da requerente relativamente à substância activa Atorvastatina (medicamento de referência: Zarator), bem como a existência de processo judicial em curso relativo à suspensão da eficácia dos actos administrativos de AIM desses medicamentos - ver doc. n° 19 e 20 juntos com o requerimento inicial. S) Cumulativamente, a requerente intentou as respectivas acções administrativas especiais para impugnação dos actos administrativos de AIM dos medicamentos genéricos de Atorvastatina ora em causa, as quais correm igualmente neste TAP de Sintra, sob o n° 679/l0.5BESNT e n° 274/l0.9BESNT - sob consulta no SITAF. T) Para além das cartas acima referidas, a requerente havia já trocado diversas comunicações com a DGAE no âmbito de outros procedimentos tendentes à aprovação de PVPs de medicamentos genéricos de Atorvastatina - ver doc. n° 21 junto com o requerimento inicial. U) Entretanto, as Contra-interessadas desencadearam junto da DGAE procedimentos tendentes à aprovação de PVPs dos medicamentos genéricos em causa nos presentes autos - por acordo. V) São aqui actos suspendendos os do Sr. Director Geral da Direcção Geral das Actividades Económicas em que se aprovou o preço de venda ao público dos medicamentos genéricos seguintes: - Atorvastatina Grena, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostos pela sociedade Generis Farmacêutica, SA (Contra-interessada), por despacho n° 278/20l0/DG, de 24.3.2010; - Atorvastatina Krevalin, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostos pela sociedade Generis, por despacho n° 276/20l0/DG, de 24.3.2010; - Atorvastatina Mer, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostas pela sociedade M…….. Medicamentos, Lda. (Contra-interessada), por despacho n° 275/20l0/DG, de 24.3.2010; - Atorvastatina Pharmakem, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostas pela sociedade P………. P……… - Produtos Farmacêuticos, Sociedade U unipessoal, Lda. (como Contra - interessada), por despacho n° l48/20l0/DG, de 17.2.2010; - Atorvastatina Stelma, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostas pela sociedade G………., por despacho n° 277/20l0/DG, de 24.3.2010; - Atorvastatina Tavitan, nas dosagens 10, 20 e 40 mg, propostas pela sociedade B……… - Portugal, SA (como Contra-interessada), por despacho n° l82/20l0/DG, de 26.2.2010 - ver doc. n° 13 a 18 juntos com o requerimento inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. W) Estes actos administrativos de aprovação dos PVPs foram conhecidos pela requerente por meio dos elementos que, a seu pedido, lhe foram remetidos pela DGAE, em 23.4.2010 - ver doc. n° 21 a 27 juntos com o requerimento inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. X) Dá-se aqui por integralmente reproduzido o teor dos documentos n° 33, 36, 37 juntos com o requerimento inicial. A convicção do Tribunal quanto à matéria de facto com relevo para a decisão da causa fundou-se na apreciação crítica do conjunto da prova documental junta e, depois, indicada em cada alínea dos factos provados. 6º DAS PROVIDÊNCIAS CAUTELARES NO CPTA As medidas ou providências cautelares referidas no art. 112º CPTA (umas típicas (3), outras não) visam, com base num julgamento muito sumário da questão de direito donde se conclua pela aparência do direito invocado (fumus boni iuris), × assegurar que o tempo do julgamento do processo principal não determine a inutilidade da sentença nele proferida (periculum in mora; prejuízo específico e particular) e, consequentemente, × impedir que o Requerente, aquando do fim do processo principal, fique numa situação de facto consumado (situação em que se tornará depois impossível, no caso de o processo principal proceder, operar a reintegração factual da situação conforme à legalidade) ou numa situação em que o volume ou a qualidade dos prejuízos sofridos inviabilize a possibilidade de reverter à situação que existiria se a ilegalidade (por ora, meramente aparente) não tivesse sido cometida (situação em que se tornará depois impossível, no caso de o processo principal proceder, operar a reintegração factual da situação conforme à legalidade). Têm, afinal, o propósito de evitar a deterioração do equilíbrio de interesses existente à partida, procurando que ele se mantenha, a título provisório, até que a questão de fundo seja dirimida no processo principal. O prejuízo decorrente para o direito que se visa acautelar da demora normal do processo principal é, pois, o thema-regra de qualquer processo cautelar (ISABEL FONSECA, Processo Temporalmente Justo…, p. 1013). Tem legitimidade para impugnar contenciosamente um acto administrativo quem, com a sua anulação, consiga uma vantagem que se repercuta na sua esfera jurídica (pessoalidade do interesse) de forma actual e imediata (carácter directo do interesse) – art. 55º-1-a) CPTA. Tal pessoa pode pedir a tutela cautelar (art. 112º-1 CPTA). É o que aqui ocorre com a requerente. De acordo com a lei (CPTA: arts. 112º-1 e 120º-1), as providências são conservatórias ou antecipatórias; nada mais. É a tradicional divisão, com base a) na função conservatória ou de manutenção do status quo do requerente (que visa tutelar situações finais, estáticas ou opositivas; tem o propósito de evitar a deterioração do equilíbrio de interesses existente à partida, procurando que ele se mantenha, a título provisório, até que a questão de fundo seja dirimida no processo principal); aqui, o juízo cautelar é o de que não é manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular no processo principal, em resposta à pergunta seguinte: existe ou não um mínimo de verosimilhança dos fundamentos invocados, em termos de se não evidenciar o carácter manifesto da falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular no processo principal? ou b) na função antecipatória ou de alteração do status quo do requerente (que visa tutelar situações instrumentais, dinâmicas ou pretensivas; tem o alcance de antecipar provisoriamente a constituição de uma situação jurídica nova, que é a que se pretende obter a título definitivo com a sentença a proferir no processo principal) (4). Releva a teleologia da medida cautelar, tendo como ponto de referência a situação existente no momento imediatamente anterior ao da eclosão do litígio (cfr., por todos, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA et al., Comentário…, 3ª ed., 2010, ano. 4 ao art. 112º, e jurisprudência e autores aí citados). Aqui, o juízo cautelar é o de que é provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente. Normalmente a providência antecipatória acorre ao periculum de retardamento (suprindo provisoriamente a falta de uma resolução definitiva do litígio, antecipando provisoriamente os efeitos de uma possível sentença favorável) e a conservatória acorre ao periculum in mora de infrutuosidade (evitando a destruição ou a modificação do status quo ante, garantindo provisoriamente a manutenção do estado de coisas preexistente). Outra coisa, bem distinta, é a análise estrutural e de conteúdo da concreta medida cautelar, a que o CPTA não atribui especial consequência (5). São 3 as características essenciais da tutela cautelar: 1ª) A sua instrumentalidade em relação a um processo principal (v. arts. 112º-1, 113º-1 e 123º CPTA), pelo que a tutela cautelar só se justifica se for condição sine qua non da utilidade e da eficácia da decisão a proferir no processo principal; 2ª) A sumariedade da apreciação jurisdicional, i.e., o tribunal deve proceder a apreciações perfunctórias, baseadas num juízo sumário sobre os factos a apreciar, quer para efeitos de apreciação do fumus boni iuris, quer de apreciação do periculum in mora, sendo por isso um processo urgente (6); portanto, o juiz não pode fazer apreciações ou análises exaustivas. E daqui também a conclusão, quanto à al. a) cit., de que ali se tratam de situações em que a normal apreciação perfunctória que, em sede de processo cautelar, cumpre ao juiz realizar, permite identificar um ou mais casos de evidência que autorizem a formulação de um juízo de muito forte probabilidade de êxito do processo principal; 3ª) A provisoriedade das providências cautelares decretadas (v. art. 124º CPTA), ou seja, a sua duração é provisória e o seu conteúdo é provisório, sendo proibido antecipar a resolução definitiva do litígio ou prejudicar o sentido da decisão principal e o interesse no julgamento da causa principal (i.e., a decisão cautelar não pode ter efeitos de direito irreversíveis). A suspensão da eficácia tem essas 3 características. Os requisitos para a sua decretação no CPTA (art. 120º), que os recorrentes consideram não estar preenchidos, são: 1. O periculum in mora, perigo na demora normal do processo principal, perigo de dano: fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado (ou perigo da infrutuosidade) ou fundado receio da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente pretende ver reconhecidos no processo principal (ou perigo do retardamento) (7); o CPTA, ao contrário do art. 381º CPC, não exige que o prejuízo seja grave; (8) 2. O fumus non malus iuris ou fumus boni iuris suave (ou não ser manifesta a falta de fundamento da pretensão formulada ou a formular no processo principal ou da existência de circunstâncias que obstem ao seu conhecimento de mérito), se a providência em causa tiver função conservatória; o fumus boni iuris (ou ser provável que a pretensão formulada ou a formular no processo principal venha a ser julgada procedente), se a providência em causa tiver função antecipatória - tem o alcance de antecipar provisoriamente a constituição de uma situação jurídica nova, que é a que se pretende obter a título definitivo com a sentença a proferir no processo principal; o requerente pretende provisoriamente que as coisas mudem a seu favor; 3. A ponderação global dos interesses específicos e concretos apurados e dos danos específicos e concretos apurados, num mesmo patamar, alcançando uma decisão justa, proporcional e equilibrada. Deve fazer-se uma comparação do peso relativo dos interesses em presença, comparação a fazer à luz do circunstancialismo fáctico do caso concreto, cumprindo assegurar que, entre dois prejuízos, a decisão cautelar seja aquela que objectivamente provoque prejuízos em menor grau. Limitando-se eventualmente o requerente a alegar meros juízos ou conclusões, recorrendo a generalidades e a conceitos indeterminados, sem concretizar através de factos e exemplos da vida corrente os específicos prejuízos que advirão da execução do acto, não está preenchido o requisito referido. Esta ponderação judicial é feita com referência directa aos danos ou prejuízos em jogo e não com referência directa aos interesses; 4. A suficiência (e necessidade) da providência concreta relativamente ao fim a que legalmente se destina. A específica norma contida no art. 120º-1-a) do CPTA, que o tribunal a quo recusou aplicar, presume iuris tantos a utilidade da tutela cautelar (9) (10) quando haja uma aparência muito forte de uma ilegalidade simples manifesta: o presumível conteúdo favorável da sentença de mérito a emitir no processo principal é incontestável, não admite dúvida e é quase automático. Esta situação, teoricamente mais rara (11) no âmbito genérico do art. 120º CPTA, significa que o tribunal deve conceder a providência cautelar se ficar facilmente convencido (num raciocínio quase automático), aquando da decisão cautelar, que é simples e evidente que, naquelas circunstâncias de facto e de direito, o processo principal irá proceder (é certo e simples para o juiz cautelar que o processo principal irá ser julgado procedente: fumus boni iuris muito intenso)(12). Ali as considerações do interesse público (o interesse geral de uma comunidade, ligado à satisfação das necessidades colectivas desta, o bem comum) predeterminado pela Administração são aqui irrelevantes. (13) Portanto e quanto ao “acto manifestamente ilegal” referido no art. 120º-1-a) CPTA, se certo facto aparentemente ilegal necessitar, ou tiver necessitado, por parte do juiz cautelar de indagação jurisdicional probatória ou jurídica que não seja muito simples e de resultado imediatamente óbvio, a situação respectiva não caberá na cit. al. a). O Requerente não está, assim, impedido de invocar dezenas de manifestas ilegalidades aparentes e o tribunal não está, obviamente, dispensado de as analisar superficialmente (sumaria cognitio), de forma a aferir da simplicidade e evidência (14) de, pelo menos, uma delas (anulabilidade incluída (15)). E não será pelo facto de, eventualmente, existir a prova (clara e simples) de só uma aparente ilegalidade manifesta, de entre muitas ilegalidades invocadas, que não se aplicará a al. a) àquela.(16) Bastará que uma das ilegalidades aparentes invocadas necessite apenas de indagação probatória e de direito muito simples e com resultado imediatamente óbvio por parte do tribunal com vista ao assentimento da convicção a formular, para aí se preencher a previsão do art. 120º-1-a) CPTA. É lógico e imperativo, no entanto, que haja um mínimo de indagação jurisdicional do fumus boni iuris, pressuposto da situação regulada na citada alínea a). Não poderia, em coerência, o CPTA falar em “acto manifestamente ilegal” se o juiz cautelar não tivesse de aferir, “à maneira cautelar” (sumaria cognitio: análise breve ou perfunctória), a ilegalidade: em sede cautelar, “acto manifestamente ilegal” só pode ser um acto (aparentemente) viciado por uma ilegalidade simples e patente. Enfim, o deferimento imediato do meio cautelar, previsto no art. 120º, n.º 1, al. a), do CPTA, deve resultar de alguma ilegalidade flagrante, capaz de convencer primo conspecto, e sem necessidade de um laborioso discurso coadjuvante da procedência da acção principal. A qualidade de cognição exigida pelo artº 120º nº 1 a) CPTA para o fumus boni iuris traduzida na expressão «evidente procedência da pretensão formulada» mede-se pelo carácter incontroverso (que não admita dúvida), patente (quase automática, imediata) e irrefragável (irrecusável, incontestável) do presumível conteúdo favorável da sentença de mérito da causa principal, derivado da cognição sumária das circunstâncias de facto e consequente juízo subsuntivo na lei aplicável, efectuados no processo cautelar. (17) No fundo, ali, a “aparência do bom direito” é de tal forma intensa e imediata que se impõe facilmente a todos os sujeitos processuais do processo cautelar; a questão de facto e a questão de direito são muito simples, independentemente dos obstáculos jurídicos manifestamente infundados alegados pelos demandados. Mas, atenção: não se trata, evidentemente, dum juízo de fundo como previsto no art. 121º CPTA ou no processo principal normal. É um juízo perfunctório de simplicidade e evidência. E este aqui não se verifica, como alias decidiu o tribunal a quo. O nº 3 do art. 120º é também aplicável à situação cit. de fumus boni iuris muito intenso. Nesta sede ainda, i.e. de ilegalidade simples e evidente, deve ser recusada a providência cautelar se o tribunal concluir que existe o risco sério de a mesma causar um prejuízo excepcional ao interesse público (v. arts. 45º-1, 49º e 120º-5 CPTA) ou se a entidade requerida demonstrar que existe o risco sério de se provocar grave prejuízo àquele interesse (v. arts. 163º e 120º-5 CPTA) (assim: Ac. do STA de 6.3.2007, Rec. nº 01143/06). Não se compreenderia, dum ponto de vista lógico e ao abrigo do art. 9º-1 CC, que fosse possível desconsiderar na tutela cautelar um excepcional ou grave prejuízo para o interesse público que se teria de considerar na tutela principal. O juízo de proporcionalidade cede perante a exigência da célere reposição da legalidade, salvo se ocorrer o risco sério de a providência cautelar em causa implicar um prejuízo para o interesse público ou o bem comum conforme referido nos arts. 45º-1 e 163º CPTA (v. ainda o art. 120º-5). Quanto ao perigo na demora normal do processo principal e ao interesse processual ou necessidade objectiva de tutela jurisdicional, relação de difícil elaboração teorética, a prática às vezes exige uma diferenciação de grau por causa da al. a) do nº 1 do art. 120º CPTA, de molde a se identificar um interesse processual geral ou suave, que não coincida com o periculum in mora (cfr. assim MÁRIO AROSO DE ALMEIDA et al., Comentário ao CPTA, 3ª ed., 2010, ano. 1 ao art. 120º, pp. 796-797; e ainda O Novo Regime do Processo…, 4ª ed., p. 41-43 (18)). Parece-nos, no entanto, algo de forçado, pois a realidade é que a tutela cautelar existe, precisa e unicamente, para acautelar uma necessidade que resulta directa e imediatamente do perigo de infrutuosidade ou de retardamento. Isto é, sem a invocação ou prova deste perigo não existe aquela necessidade de vir a juízo (interesse processual). Afinal, nesta sede, o interesse processual não é um pressuposto processual, mas sim uma condição de procedimento do pedido (condição da acção; assim A. VARELA et al., Manual de P.C., 2ª ed., p. 189). Exigir o periculum in mora é, pois, o mesmo que exigir o interesse processual ou a necessidade de tutela jurisdicional cautelar. Portanto, se faltar o periculum falta o interesse processual (a necessidade objectiva de tutela jurisdicional) e vice-versa; dá lugar à perda do processo cautelar. Dali resulta que, na verdade, a excepcional al. a) do nº 1 do art. 120º CPTA configura uma tutela especial principal sumária (admitindo esta hipótese, cfr. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, O Novo Regime do Processo…, 2005, 4ª ed., p. 307-308). O tribunal a quo não concedeu tal tipo de tutela. E bem. O fundado receio referido nas alíneas b) e c) do art. 120º-1 CPTA há-de corresponder a uma prova, em princípio a cargo do requerente, de que as consequências das eventuais providências são suficientemente prováveis para que se possa considerar "compreensível ou justificada" a cautela que é solicitada, não bastando ao Tribunal, para a formulação do tal juízo de prognose ou a mera alegação vaga e abstracta dos prejuízos, devendo os autos conter razões, isto é, factos que fundamentem o pedido, para que se possa concluir pelo deferimento da pretensão. Ressalvada a hipótese prevista no art. 120º, n.º 1, al. a), do CPTA, só é possível suspender a eficácia dos actos administrativos cuja imediata execução traga, certa ou provavelmente, (1) prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente pretenda defender na acção principal (Ac. do STA de 31.10.2007, P. nº 0471/07) ou (2) uma situação em que se tornará depois impossível, no caso de o processo principal proceder, operar a reintegração factual da situação conforme à legalidade. Logicamente, o processo cautelar deverá improceder se o juiz cautelar concluir que é evidente que o processo principal irá improceder. O CPTA admite todos os meios de prova estritamente necessários e úteis ao esclarecimento sumário do caso concreto objecto de tutela cautelar e permite a aplicabilidade do art. 523º-2 CPC, sendo certo que o juiz deve evitar, sob a égide da celeridade e da utilidade probatórias, que a prova no processo cautelar seja tão profunda e demorada como no processo principal. No sistema cautelar administrativo italiano, nunca há, na prática, meios de prova além da assente em documentos. No caso em apreço, também é colocada uma questão relativa à prova. Veremos adiante. Funcionam no processo cautelar administrativo as regras gerais do ónus da prova (arts. 342º ss CC, 112º-2-a, 114º-3-f-g, 118º e 120º CPTA, e 514º CPC). Pelo que, fora do caso previsto na al. a) do nº 1 do art., 120º CPTA, o requerente, além da aparência do bom direito, tem de descrever detalhadamente os factos consubstanciadores do periculum in mora. Sobre o ónus da prova, cfr. CARLOS CADILHA, in Cadernos de Justiça Administrativa nº 69. A urgência própria destes processos exclui logicamente os incidentes de intervenção de terceiros em casos de litisconsórcio voluntário. O TCAS, no entanto, tem ido mais longe: considera que, conforme resulta do art. 1º. do CPTA, a aplicação da lei de processo civil é supletiva, ou seja, está dependente da inexistência de um regime especial estabelecido nas leis do contencioso administrativo. Estabelecendo o CPTA um regime especial sobre a citação dos contra-interessados nos processos cautelares (art. 114º., nº 3, al. d)) e sobre a regularização do requerimento inicial, nomeadamente por falta de indicação dos contra-interessados a quem a adopção da providência possa directamente prejudicar (arts. 114º., nº 4 e 116º., nº 2, al. a)), não tem lugar a aplicação do C. P. Civil em matéria de incidente de intervenção de terceiros como forma de correcção do requerimento inicial. Assim, após ter sido proferido despacho a ordenar a citação dos requeridos e estes terem apresentado a sua oposição, não se pode utilizar, em processo cautelar, o incidente de intervenção principal para regularizar o requerimento inicial. Cfr. MÁRIO AROSO DE ALMEIDA et al., Comentário ao CPTA, 3ª ed., 2010. 7º DA PRODUÇÃO DE PROVA (DÉFICE INSTRUTÓRIO) A Contra Interessada PH. alegou expressamente factos que evidenciavam não se verificar qualquer infracção da matéria reivindicada nessas patentes, mas tais factos foram ignorados pela Sra. Juiza "a quo", que não permitiu que sobre eles se produzisse qualquer prova? Está em causa a al. D) dos factos provados e os arts. 25 ss da Oposição da C-I PH. Os arts. relevantes para esta argumentação são os 25 ss cits. Mas, na verdade, o art. 26 é vago e logo inútil, sendo que os arts. 27 ss requereriam efectiva e logicamente prova pericial, naturalmente rara na tutela cautelar e aqui inadmissível dada a complexidade aparente em questão e a natureza urgente e superficial deste processo. E a C-I PH. nenhuma prova requereu (art. 118º-2 CPTA). Pelo que o tribunal a quo, caso a decisão não sofresse de omissão de pronúncia, diríamos que não actuou com défice instrutório. E aqui decidimos o mesmo (art. 715º CPC). 8º DA PATENTE E nem havia que apreciar a violação pelo consequente acto de fixação do PVP de direitos de patente, pois estes só podem ser lesados pelos direitos de propriedade industrial (Direito privado), aqui irrelevantes, e pelas AIMs, aqui não discutíveis nesta concreta lide. 9º DAS AIMs VÁLIDAS Também neste contexto, é irrelevante que as C-I tenham AIMs válidas ou não, porque o que aqui se pode discutir é o periculum e o fumus relacionados com eventuais vícios próprios da fixação do PVP. Neste ponto, a nula decisão recorrida, na parte referente à alegada violação de patente, foi portanto incoerente. 10º DO PERICULUM IN MORA No caso presente, é evidente que foi requerida e decretada uma providência conservatória, à qual se aplica o art. 120º-1-b) do CPTA. Em sede de perigo na demora, o tribunal a quo considerou, mal, que está em causa a ilegalidade resultante da violação de patentes da requerente e de seus direitos consequentes, sendo que a quota de mercado da requerente pode ser prejudicada e pode ocorrer uma perda do exclusivo de produção e comercialização do medicamento. Ora, o que entendemos nesta sede é que · a AIM e o PVP permitem conjuntamente a comercialização do medicamento, como resulta implícito da decisão recorrida; · o PVP nunca pode violar directamente uma AIM alheia, por natureza, ao contrário do decidido na 1ª instância; · mas, como decidido na 1ª instância, o PVP, ao também ser decisivo para a comercialização, pode logicamente prejudicar quota de mercado e exclusivo de comercialização preexistentes. E reafirmamos: a concessão de AIM de medicamentos genéricos na pendência da vigência de patente/CCP sobre a substância activa dos medicamentos de referência e obtido o PVP, constituem causa provável, em juízo de normalidade, de decréscimo do volume de negócios e descida de réditos, probabilidade fáctica notória no sentido adjectivo do artº 514º nº 1 CPC, que não carece de prova, não sendo necessário trazer à acção cautelar as demonstrações financeiras dos dois ou três últimos anos para, a partir delas, extrapolar projecções contabilísticas de perdas operacionais e decréscimo de proveitos e ganhos de exercício (Ac. deste Tribunal Central Administrativo Sul de 13-1-2011, P. nº 7000/10). Há assim periculum in mora. 11º APRECIAÇÃO PERFUNCTÓRIA DO DIREITO. DO FUMUS No caso presente, a requerente invocou no r.i. o seguinte: 1. A violação da sua patente relativamente ao mesmo medicamento pelas C-I, de que resultaria a ilegalidade das AIM dadas pelo INFARMED às C-I, 2. A falta de fundamentação do acto de fixação do PVP pela DGAE e 3. A falta da sua audiência prévia pela DGAE. Em sede de aparência do direito invocado, a decisão recorrida considerou que a comercialização destes novos medicamentos genéricos pode ser infracção ao direito de exclusivo da requerente. Mal. Notemos que aqui não se discutem as AIMs dadas pelo INFARMED às C-I ou anteriormente à requerente, mas sim a fixação de um PVP pela DGAE a medicamentos genéricos de entidades munidas de AIMs concedidas pelo INFARMED após a AIM da requerente e na pendência alegada da vigência do direito de exploração económica exclusivo por parte da requerente, dona da patente. A 1ª ilegalidade citada é um vício próprio das AIMs, que aqui não deve ser discutido, mas sim nos processos impugnatório e cautelar referentes a tais AIMs. As AIMs podem lesar o interesse do titular da patente, mas não a aprovação dos PVP, a qual só deve ser discutida quanto aos eventuais vícios próprios ou em consequência de uma ilegalidade antecedente já apurada. Donde resulta que esta alegada ilegalidade é insusceptível de causar uma situação concreta de periculum in mora (não está em causa o fumus): a ora recorrida não carece da presente tutela cautelar para evitar os prejuízos que invoca, quanto a tal ilegalidade aparente invocada. Neste ponto, a decisão recorrida e nula era, portanto, incorrecta. Mas há que analisar se as outras duas ilegalidades aparentes invocadas, próprias do acto de fixação do PVP, satisfazem o cit. fumus non malus iuris (art. 120º-1-b) cit.). O acto em causa é a fixação dos PVPs a favor das C-I e não quaisquer AIMs. Estando nós em sede de relações jurídicas administrativas multilaterais, há que aplicar o art. 100º CPA. E como a requerente, interessada no como e quando da comercialização dos medicamentos concorrentes, não foi ouvida em audiência prévia quanto a este 2º elemento essencial para a introdução no mercado do medicamento, ocorre aqui aparência do bom direito por desrespeito do art. 100º cit., por aparente vício próprio deste procedimento multilateral. Há fumus non malus iuris. Quanto à questão da falta de fundamentação da fixação dos PVP (boa ou má, correcta ou incorrecta, algo nem discutido nos articulados), a ser feita de acordo o Decreto-Lei cit. de 2007, basta atentarmos no teor dos docs. 22 a 27 juntos com os articulados r.i. Dali conclui-se que os arts. 124º-1-a) e 125º nº 1 do CPA foi desrespeitado quanto aos cits. interesses comerciais da requerente, interessada em toda a procedimentação que põe em causa potencialmente interesses seus (art. 55º CPA). Há fumus non malus iuris, por aparente vício próprio deste procedimento multilateral. 12º DA PONDERAÇÃO DOS INTERESSES (art. 120º-2 CPTA cit.). DO INTERESSE PÚBLICO Há que dar aqui, e não sempre, prioridade ao direito fundamental de natureza económica da requerente (art. 62º CRP), com óbvio risco de decréscimo do volume de negócios e descida de réditos, já que do outro lado há o facto positivo de existir já acesso a este tipo de medicamento no mercado sem prejuízo concreto apurado para o interesse público, e não contra-relevando nada de concreto quanto aos interesses também económicos das C-I. Com efeito, nada de factualmente relevante foi apurado, além do acima referido, que permita concluir que os danos concretos para as C-I, para o Estado e para os doentes sejam superiores aos dos da requerente. O que sucede nos autos é que a violação do direito da requerente causa duas situações de facto consumado: por um lado a perda irreversível de quota de mercado, que não se mede apenas pela perda dos rendimentos correlativas, já que afecta a performance pública da empresa, por outro lado, a perda do exclusivo de produção e ou comercialização do produto que a patente protege, impossível de ser reposto. 13º Portanto, no caso em apreço, concluiu-se que a) A suspensão de eficácia de um acto administrativo é, no CPTA, sempre uma providência cautelar de função conservatória; b) Num processo cautelar, seja sobre que assunto for, incluindo o dos medicamentos genéricos, o juiz não pode utilizar meios de prova complexos ou morosos, nem apreciar profundamente nenhuma questão de direito, muito menos as das AIMs, mas deve apreciar sumariamente todas as questões (que não argumentos) invocadas sob pena de ilegal omissão de pronúncia; c) A questão relativa às AIMs das C-I é aqui pouco relevante, porque só está em causa a eventual suspensão de eficácia da fixação administrativa dum PVP (para um genérico, a atorvastatina (19)) consequente a uma AIM ainda não declarada inválida por nenhum tribunal com trânsito em julgado, e porque se tem o ónus de atacar directamente a eventual AIM inválida; d) O direito privado das patentes é pouco importante neste tipo de lide de contencioso administrativo, sem prejuízo de as decisões administrativas de AIMs não deverem ignorar outras AIMs prévias lícitas; e) O PVP pode lesar, por vícios próprios, os interesses comerciais de quem já está no mercado, num tipo de relação jurídica administrativa como esta, que é multilateral e que tem pelo menos dois procedimentos administrativos bem distintos (o da AIM e o do PVP); f) Provou-se aqui um concreto fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado (ou perigo da infrutuosidade) que prejudica o já titular de uma patente, de uma AIM e de um PVP, em uso no mercado; g) Provou-se aqui fumus non malus iuris quanto a duas das três ilegalidades aparentes invocadas (vícios próprios do acto de fixação dos PVP); h) A ponderação global dos interesses específicos e concretos apurados e dos danos específicos e concretos apurados, num mesmo patamar, permite alcançar aqui uma decisão justa, proporcional e equilibrada, bem como suficiente, que é a pedida no r.i. III. DECISÃO Pelo que acordam os juizes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar parcialmente procedentes os recursos, declarar nula a decisão cautelar recorrida por omissão de pronúncia e, ao abrigo do art. 715º CPC, suspender a eficácia dos actos citados de determinação de PVPs pela DGAE, pelos motivos ora apresentados. Custas a cargo dos recorrentes neste Tribunal Central Administrativo Sul e a cargo dos oponentes na 1ª instância. Lisboa, 10-2-2011 Paulo Pereira Gouveia Cristina Santos António Vasconcelos (1) Transpõe: a Directiva nº 2001/83/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de Novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano; o artigo 31.º da Directiva n.º 2002/98/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, que estabelece normas de qualidade e segurança em relação à colheita, análise, processamento, armazenamento e distribuição de sangue humano e de componentes sanguíneos; a Directiva n.º 2003/63/CE, da Comissão, de 25 de Junho de 2003, que altera a Directiva n.º 2001/83/CE; a Directiva n.º 2003/94/CE, da Comissão, de 8 de Outubro de 2003, que estabelece princípios e directrizes das boas práticas de fabrico de medicamentos para uso humano e de medicamentos experimentais para uso humano; a Directiva n.º 2004/24/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março de 2004; e a Directiva n.º 2004/27/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de Março de 2004. (2) A atorvastatina é um antilipémico; redutor do colesterol; redutor de triglicéridos [inibidor da redutase HMG-CoA; estatina; atorvastatina sódica]. (3) Por exemplo, entre outros (suspensão de eficácia), o pedido cautelar de intimação de alguém para que provisoriamente se abstenha de um certo comportamento, alegadamente violador de normas de direito administrativo, supõe que haja um vazio decisório, isto é, que não exista ou subsista uma qualquer pronúncia justificativa de tal comportamento (Ac. do STA de 10.1.2008, Rec. nº 0675/07). Sobre este tema, ver: FREITAS DO AMARAL, in Cadernos de Justiça Administrativa nº 43, e MÁRIO AROSO DE ALMEIDA et al., Comentário ao CPTA, 3ª ed., notas ao art. 112º. (4) Ac. do Supremo Tribunal Administrativo de 24-11-2004, P. nº 1011/04: «A providência é conservatória quando o Interessado pretenda manter ou conservar um “ direito”, ou seja, aqui o que se almeja é manter o status quo, procurando que ele se não altere. A providência é antecipatória quando o Interessado vise alterar o status quo, mediante a antecipação de uma situação que não existia anteriormente.» (5) É algo exposto por ISABEL FONSECA, in Introdução ao Estudo Sistemático da Tutela Cautelar…, 2002. Esta autora socorre-se a pp. 125 ss da obra cit. de um autor italiano, TOMMASEO, hoje juiz no Tribunal Administrativo Regional (TAR) da Lazio, em Roma.Mas que o nosso CPTA dispensa regra geral. (6) Não obstante, o CPTA admite todos os meios de prova estritamente necessários e úteis ao esclarecimento sumário do caso concreto objecto de tutela cautelar. O CPC (v. arts. 384º-3 e 303º) e o CPTA (arts. 1º, 114º-3-g e 118º-2) não parecem permitir a aplicabilidade do art. 523º-2 CPC. (7) Por exemplo, constituem prejuízos de difícil reparação os danos morais cuja especial intensidade desaconselhe que o lesado os sofra, podendo ser deles livrado, bem como aqueles cuja indemnização só seja atingível por um processo de cálculo mais árduo, problemático e controverso do que é usual nos danos dessa espécie. (8) Da qualificação do perigo de dano como causa de pedir, e não como pressuposto processual, decorre que a sua falta de alegação dá lugar a ineptidão do r.i. por falta parcial da causa de pedir e a sua falta de prova dá lugar a absolvição do pedido (RUI PINTO, A Questão de Mérito na Tutela Cautelar…, pp. 588 ss, maxime p. 598). (9) Cfr. assim ANA GOUVEIA MARTINS, A Tutela Cautelar no Contencioso Administrativo…, 2005, p. 508. (10) Cfr. ainda MÁRIO AROSO DE ALMEIDA/CARLOS CADILHA, Comentário ao CPTA, 2010, notas ao art. 120º, onde os autores tentam lidar com a (necessária?) restrição à aplicação da al. a) (falam em «“evidência palmar”, sem necessitar de quaisquer indagações»). O mesmo se passa na 4ª edição, de 2005, de O Novo Regime..., de MÁRIO AROSO DE ALMEIDA (nº 11.5.1), onde o autor fala em “especial evidência” e onde se explica que esta al. a) é uma norma derrogatória do regime de que depende em circunstâncias normais a concessão de providências normais, em que o único propósito é proteger quem se afigure evidente que tem razão no processo principal. (11) Dizemos “teoricamente”, porque existem áreas jurídicas em que, devido ao tipo de legislação em causa e suas violações mais frequentes, a nulidade com base em simples prova documental será algo de comum. É o caso, por ex., de institutos regulados no DL 380/99 (RJIGT) e no DL 555/99 (RJUE). (12) Já os casos normais, previstos nas al. b) e c) do nº 2 do art. 120º CPTA, têm outra formulação quanto ao direito invocado (além do periculum in mora): - na al. b) (providências conservatórias), o juiz conclui que há uma improbabilidade de inêxito do processo principal, fumus non malus iuris ou fumus boni iuris suave; - e na al. c) (providências antecipatórias), o juiz conclui que há probabilidade de êxito da causa principal, fumus boni iuris (normal). (13) Cfr. PAULO H. PEREIRA GOUVEIA, As realidades da nova tutela cautelar administrativa, in Cadernos de Justiça Administrativa nº 55. (14) Se a questão jurídica for discutível ou duvidosa, não há tal evidência. Tal pode acontecer, por exemplo, nalgumas relações entre leis nacionais e leis regionais. Sobre relações entre leis nacionais e leis regionais, cfr. PAULO H. PEREIRA GOUVEIA, Estudo sobre o Poder Legislativo das Regiões Autónomas, ed. Almedina, 2003. (15) Quanto mais não fosse, a total ausência de fundamentação de um acto administrativo lesivo. Aqui, a lei não distingue a violação da CRP (anulabilidade, regra geral) da violação dum PDM (nulidade). (16) V. assim MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, O Novo Regime…, 4ª ed., p. 302 nº 11.4.2 e p. 306 nº 11.5.1. Concordamos com este autor quando afirma: «o preceito só deve intervir em situações de especial evidência, que seja manifesta a todas as luzes e sem necessidade de grandes indagações»; o que é diferente de “nenhuma indagação”. Cfr., ainda, PAULO H. PEREIRA GOUVEIA, As realidades da nova tutela cautelar administrativa, in Cadernos de Justiça Administrativa nº 55. (17) Ac. do TCAS de 28.6.2007, P. nº 02225/07. (18) Para este autor, em sede de art. 55º-1-a) CPTA, “interesse directo” é interesse processual ou actual e “interesse pessoal” é legitimidade processual. Mas, ANA G. MARTINS, in A Tutela Cautelar…, 2005, pp. 369-370, dá notícia de que “interesse directo” tem a ver com a relação de causalidade entre acto impugnado e prejuízo sofrido, bem como à imediatividade e actualidade do interesse na anulação. (19)Antidislipidémico. A atorvastatina está indicada como adjuvante da dieta para a reducao de niveis elevados de colesterol total, colesterol LDL, apolipoproteina B e trigliceridos em doentes com hipercolesterolemia primaria incluindo hipercolesterolemia familiar (variante heterozigotica) ou hiperlipidemia combinada (mista) (correspondente aos Tipos IIa e IIb da Classificacao de Fredrickson), quando a resposta a dieta e a outras medidas não farmacológicas e inadequada. A Atorvastatina Generis também esta indicada na redução do colesterol total e colesterol LDL em doentes com hipercolesterolemia familiar homozigotica como adjuvante a outras terapêuticas de redução de lípidos (por ex., aferese das LDL), ou quando essas terapêuticas não estão disponíveis. Prevenção da doença cardiovascular. Prevenção de eventos cardiovasculares em doentes nos quais se estima existir um risco elevado de ocorrência do primeiro evento cardiovascular, como complemento para a correcção de outros factores de risco.

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